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Proc. nº 730/02 Acórdão nº 6/03
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. A deduziu reclamação, ao abrigo do disposto no artigo 76º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional, do despacho do Relator que, no Supremo Tribunal de Justiça, não admitiu o recurso que pretendia interpor para o Tribunal Constitucional do acórdão proferido pelo mesmo Supremo Tribunal, através do qual se rejeitara o recurso por si interposto de anterior acórdão do Tribunal da Relação de Évora.
2. Resulta dos autos que:
2.1. Em processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, A respondeu, sob acusação do Ministério Público, tendo sido condenado, pela prática de um crime de burla previsto e punível pelo artigo 218º, nº 2, alínea a), do Código Penal de 1995, na pena de cinco anos de prisão.
2.2. Interposto pelo arguido recurso da decisão da 1ª Instância, foi o mesmo rejeitado, com fundamento em manifesta improcedência, por acórdão do Tribunal da Relação de Évora.
2.3. Inconformado, o arguido interpôs novo recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, que, em acórdão de 20 de Junho de 2002, considerando que o recurso não era admissível, perante o disposto nos artigos 400º, nº 1, alínea f), e
432º, alínea b), do Código de Processo Penal, o rejeitou, nos termos dos artigos
414º, nº 2, e 420º, nº 1, do mesmo Código (fls. 8 e 9 destes autos de reclamação).
2.4. A interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, invocando como fundamento as alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, através do requerimento junto a fls. 18 e seguintes destes autos, onde pode ler-se:
'Foi violado o disposto pelo artigo 29, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, de 2 de Abril de 1976, na redacção dada pela Lei Constitucional nº
1/82, de 30 de Setembro; Lei nº 1/89, de 8 de Julho; 1/92, de 25 de Novembro;
1/97 de 20 de Setembro, e 1/2001 de 12 de Dezembro. Pois As normas jurídicas, Art. 217º e art. 218º, introduzidas com a entrada em vigor do D.L. 48/95, de 12 de Março, não são de aplicar-se a factos ocorridos na data de 1992. O artigo 217º do C.P., na redacção dada pelo D.L. 48/95, introduz claras alterações à qualificação do facto típico ilícito e culposo, em relação ao art.
313º do C.P. aprovado pela Lei nº 24/82, de 23 de Agosto. O artigo 218º do D.L. 48/95, de 12 de Março (não pode nem deve equiparar-se ao disposto pelo art. 314º do Código Penal de 1992, quer na sua previsão, quer na medida da pena aplicável.
[...].'
2.5. Por despacho de 12 de Julho de 2002 (fls. 10), o Relator, no Supremo Tribunal de Justiça, determinou a notificação do recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 75º-A, nº 5, da Lei do Tribunal Constitucional, 'para, em dez dias, indicar a norma ou normas cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal aprecie, bem como a peça processual em que suscitou tal questão'.
2.6. Decorrido o prazo, o recorrente não respondeu. O Relator proferiu o despacho de fls. 11 e 11vº, em que, pelas razões a seguir indicadas, decidiu não admitir o recurso para o Tribunal Constitucional:
'O recorrente veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional com fundamento nas als. b) e c) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. No que concerne ao fundamento assente na al. b) do nº 1 do referido art. 70º, o recorrente não indicou a norma ou normas cuja inconstitucionalidade pretende que aquele Tribunal aprecie nem a peça processual em que suscitou tal questão, pelo que foi notificado para, ao abrigo do disposto no art. 75º-A, nºs 1, 2 e 5 da referida Lei, indicar aqueles elementos em falta. Sucede que decorreu o prazo legal para o efeito – dez dias – sem que o recorrente tenha vindo aos autos suprir as referidas deficiências, pelo que não cabe recurso para o T. C. com este fundamento. Por outro lado, no que toca ao fundamento previsto na al. c) do nº 1 do art. 70º da Lei nº 28/82, é evidente que é totalmente inaplicável ao presente caso, pois não estamos perante a recusa de aplicação de norma constante de diploma regional com fundamento na sua ilegalidade por violação da lei com valor reforçado. Assim, com este fundamento, não cabe recurso para o Tribunal Constitucional da decisão ora impugnada.
[...]'
2.7. A veio então deduzir reclamação do despacho de não admissão do recurso, ao abrigo do disposto no artigo 76º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional (fls. 1 a 5).
No requerimento apresentado, invocou, entre o mais:
'[...] VI. Não subsiste dúvidas de que o muito ilustre Relator fundamentou o seu indeferimento nos termos do disposto na alínea d) nº 1 do artigo 70 da Lei
28/82.
[...] Conforme se infere, a referida fundamentação legal apresentada pelo ilustre Relator que indefere o presente recurso nos termos do disposto pelo nº 2 do artigo 76º não coincide com o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 70º da Lei
28/82. VII. O recorrente, aqui reclamante, [...], arguiu e fundamentou factos relativos
à violação do disposto pela alínea c) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82
[...].'
2.8. O Relator, no Supremo Tribunal de Justiça, manteve o despacho reclamado, 'pelos fundamentos que dele constam'.
3. No Tribunal Constitucional, o Ministério Público emitiu parecer, pronunciando-se no sentido de que 'a presente reclamação é manifestamente improcedente' (fls. 23 e 23 vº).
Cumpre apreciar e decidir. II
4. O ora reclamante pretendia interpor recurso de constitucionalidade da decisão proferida nos autos pelo Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
O Relator, no Supremo Tribunal de Justiça, não admitiu o recurso, por entender que não estavam verificados no caso os pressupostos processuais exigidos pelas disposições invocadas.
5. Não merece censura o despacho reclamado.
5.1. Na verdade, o ora reclamante não indicou as normas cuja inconstitucionalidade pretende ver apreciada, mesmo depois de notificado no tribunal a quo para completar o requerimento de interposição do recurso.
Assim, e porque não cabe ao Tribunal Constitucional suprir as omissões das partes, não pode o recurso ser admitido. Isto mesmo determina o artigo 76º, nº 2, primeira parte, da Lei do Tribunal Constitucional.
5.2. Acrescente-se, de todo o modo, que, quanto ao fundamento a que se refere a alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, as considerações feitas pelo ora reclamante, quer no requerimento de interposição do recurso, quer no requerimento em que deduziu a reclamação do despacho de não admissão do presente recurso, não se reportam às normas que constituíram o fundamento da decisão recorrida – as normas constantes dos artigos 400º, nº 1, alínea f), e 432º, alínea b), do Código de Processo Penal, aplicáveis em conjugação com os artigos 414º, nº 2, e 420º, nº 1, do mesmo Código.
5.3. E, no que diz respeito ao fundamento previsto na alínea c) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, é manifesto que não está verificado o pressuposto processual enunciado na disposição, pois na decisão recorrida não foi recusada a aplicação de qualquer norma legal por 'ilegalidade reforçada'. III
6. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta.
Lisboa, 15 de Janeiro de 2003- Maria Helena Brito Pamplona de Oliveira Luís Nunes de Almeida