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Processo nº 488/02
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa (9ª Secção), proferiu o Relator a seguinte DECISÃO SUMÁRIA:
'1. C, com os sinais identificadores dos autos, veio interpor recurso para este Tribunal Constitucional, ‘nos termos do artº 75º da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, (Lei nº 28/82 de 15 de Novembro, com a alteração introduzida pela Lei nº 13-A/98 de 26 de Fevereiro e com os efeitos e regime de subida do artº. 78º da citada Lei nº 28/82 de 15 de Novembro’, do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (9ª Secção), de 11 de Abril de 2002, esclarecendo, a convite do Relator nesse Tribunal, que o ‘presente recurso é interposto ao abrigo das alíneas a) b) e f) do nº 1 do artº 70º da L.T.C.’ e pretendendo-se que ‘o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitucionalidade ou ilegalidade da violação do princípio de reformatio in pejus (artº 409º do C.P.C.) porque a decisão recorrida deveria ter-se atido aos precisos termos do Acórdão da Relação de 98/02/03, devendo limitar-se a aplicar a pena imposta pelo Tribunal do 1º Julgamento devendo ainda ter-se tido em conta os perdões das Leis nº 23/91 e
15/94 e a prisão preventiva sofrida, o que não aconteceu’. E remata assim o esclarecimento:
‘- Há nulidade do processo por falta de diligências no inquérito. o O procedimento criminal está prescrito, nos termos da legislação em vigor, que melhor será especificada em Alegações. o Houve violação da alínea c) do nº 3 do artº 412 do C.P.C., e bem assim a da norma que permite a gravação da prova, violando-se assim os princípios constitucionais contidos nos artº 20, 29, e 32 da C.R.P.’
2. No acórdão recorrido foi decidido ‘ao abrigo dos artºs 419, nº 4 e 420º, nº 1 do CPP’, rejeitar o recurso interposto pelo recorrente, que havia sido ‘julgado e condenado pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão do art.
11º, nºs 1 e 2 do Dec. Lei nº 316/97, de 15 de Novembro, na pena de 5 anos de prisão’.
3. Tendo em conta os fundamentos do recurso de constitucionalidade invocados pelo recorrente, é bom de ver desde logo que não tem razão de ser o fundamento da alínea a), do nº 1, do artigo 70º, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, porque não houve da parte do acórdão recorrido nenhuma recusa de aplicação de norma com fundamento em inconstitucionalidade (se com isso o recorrente quer referir-se à não aplicação ‘dos perdões das Leis nºs 23/91, 15/94’, a verdade é que no acórdão reconhece-se que não foi recusada a sua aplicação e que ‘não está em causa, por ora, uma decisão do Tribunal recorrido de não aplicação sendo certo que, como o desconto da prisão preventiva, tal aplicação resulta da lei’, bastando que ‘oportunamente o recorrente o requeira ao tribunal se aquele não o fizer oficiosamente’). E também não tem razão de ser o fundamento da alínea f) do mesmo nº 1 do artigo
70º, pois ele tem de relacionar-se ‘um qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)’, e estas nada tem a ver com o presente caso (basta a leitura das alíneas para o comprovar sem margem a dúvidas, não interessando a referência que o recorrente faz à ‘ilegalidade da violação do princípio de reformatio in pejus (artº 409 do C.P.C.)’, pois tal ilegalidade teria de derivar do quadro que é retractado nas citadas alíneas a), d) e e), manifestamente fora da hipótese sub judicio).
4. Resta o fundamento da alínea b), do nº 1, do artigo 70º, mas aqui falha um pressuposto específico do recurso fundado nessa alínea, o da suscitação durante o processo de uma questão de inconstitucionalidade com as exigências derivadas do nº 2 do artigo 72º, da Lei nº 28/82, na redacção do artigo 1º, da Lei nº
13-A/98 de 26 de Fevereiro.
É que da leitura da motivação do recurso e respectivas conclusões não se encontra arguida nenhuma questão de inconstitucionalidade normativa, quer quando se aborda a matéria de facto, quer quando se toca no enquadramento jurídico dos factos e no assunto da prescrição. Há em toda a sua extensão apenas uma censura
à sentença recorrida no plano infra-constitucional. Aliás, não se detecta nessa peça processual nenhuma referência a norma ou princípio constitucional e apenas no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade o recorrente refere os ‘princípios constitucionais contidos nos artºs 20, 29 3 32 do C.P.P.’, que teriam sido violados (mas tais princípios não estão sequer identificados na dita motivação do recurso). Tanto assim que o acórdão recorrido não tem nenhuma pronuncia sobre qualquer matéria de inconstitucionalidade, quando decidiu que ‘deve ser rejeitado o pedido do recorrente para a renovação da prova’, quando concluiu que o recorrente não tem razão sobre ‘a não aplicação no princípio da aplicação da lei mais favorável, da violação do princípio da reformatio in pejus e da violação da decisão do acórdão deste Tribunal de 98.02.03’ ou quanto ‘à invocada nulidade do processo por falta de diligências no inquérito’ ou ainda quando conclui que ‘é patente’ que não ocorreu a ‘invocada prescrição do procedimento criminal’. Com o que não pode tomar-se conhecimento do recurso.
5. Termos em que, DECIDINDO, não tomo conhecimento do recurso e condeno o recorrente nas custas, com a taxa de justiça fixada em seis unidades de conta'. B. O recorrente veio então 'reclamar da decisão sumária do Exmº Juiz Conselheiro Relator, nos termos do nº 3 do artº 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional
(L.T.C.) redacção da Lei nº 13-A/98 de 26 Fev', começando por dizer que 'embora não tenha havido da parte do acórdão recorrido nenhuma recusa de aplicação de norma com fundamento em inconstitucionalidade a verdade é que foi invocada, pelo recorrente, a inconstitucionalidade, sendo certo que o douto acórdão recorrido não se pronunciou sobre tal matéria', para depois afirmar que nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação, 'suscitou-se a inconstitucionalidade na aplicação de normas, tais como a não aplicação do princípio da aplicação da lei mais favorável; da violação do princípio da reformatio in pejus; e mesmo ainda, a invocada nulidade do processo por falta de diligências no inquérito, bem como, a invocada prescrição do procedimento criminal (tal como o recorrente pretendeu demonstrar nas alegações de recurso)', mas sem deixar de 'admitir que não houve uma declaração expressa sobre a inconstitucionalidade na motivação do recurso para o Tribunal da Relação. Contudo, tal declaração está tacitamente contida quando se denuncia a violação dos princípios constitucionais atrás referidos'. C. Na sua resposta o 'representante do Ministério Público junto deste Tribunal' veio dizer que a 'presente reclamação é manifestamente infundada', pois o reclamante não pôs 'minimamente em causa o fundamento da decisão impugnada e a evidente inverificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso interposto para o Tribunal Constitucional'. D. Tudo visto, cumpre decidir.
É fácil de ver que o reclamante não conseguiu abalar minimamente os fundamentos da DECISÃO reclamada e, atendo-se somente ao fundamento da alínea b), do nº 1, do artigo 70º, da Lei nº 28/82 (por lapso indica-se a alínea a)), faz na reclamação afirmações despidas de qualquer demonstração de que teria suscitado uma qualquer questão de inconstitucionalidade normativa perante o tribunal de relação (pelos vistos uma suscitação 'tácita', como o próprio reclamante admite). Só que, e contrariamente às afirmações do reclamante, está claro na DECISÃO reclamada que 'da leitura da motivação do recurso e respectivas conclusões não se encontra arguida nenhuma questão de inconstitucionalidade normativa, quer quando se aborda a matéria de facto, quer quando se toca no enquadramento jurídico dos factos e no assunto da prescrição. Há em toda a sua extensão apenas uma censura à sentença recorrida no plano infra-constitucional'. O reclamante não demonstrou agora o contrário, reportando-se àquela motivação, para se ver se foi realmente arguida alguma questão de inconstitucionalidade normativa. Tanto basta para concluir que não pode proceder a presente reclamação. E. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação e não se toma conhecimento do recurso, condenando-se o reclamante nas custas, com a taxa de justiça fixada em 15 unidades de conta. Lisboa, 13 de Novembro de 2002 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa