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Proc. nº. 124/02
1ª Secção Relator: Consº. Artur Maurício
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 – A, identificado nos autos, interpôs em 4 de Março de 1999 recurso contencioso de anulação do despacho do Secretário de Estado da Administração Educativa, datado de 13.11.1998, proferido ao abrigo do Despacho de Delegação de Competências nº. 21-XIII/ME/95, publicado in Diário da República, II série, de
7.12.1995, afirmando, nessa peça processual, que '(...) Encontra-se, pois, o Acto Recorrido, inquinado do vício de violação de lei, por violação dos princípios da Justiça e Igualdade, nos termos do Art. 266.º n.º 2 da C.R.P.'
O Secretário de Estado da Administração Educativa apresentou a sua resposta em
28 de Maio de 1999, tendo pugnado pela extemporaneidade da interposição do recurso e, a não se entender assim, pela improcedência do mesmo porque o despacho recorrido foi proferido em '(...) estrita obediência aos princípios gerais que vinculam a actividade administrativa, maxime o da legalidade previsto no artigo 266 nº. 2 da CRP (...)'.
Por acórdão de 8 de Março de 2001, o Tribunal Central Administrativo julgou improcedente a questão prévia da extemporaneidade do recurso e, quanto ao mérito, negou provimento ao mesmo (cfr. fls. 81 a 91).
Inconformado, o recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo formulando as seguintes conclusões, com interesse para o presente recurso:
'17. Pelo que, a exigência do art. 5º do D.L.. 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo D.L. 16/96 de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso os professores contratados, e ao considerar-se que tal requisito tem que estar preenchido à data da abertura do concurso, como o fez o Despacho Recorrido, aquela norma mais não faz que pôr em causa a unidade do sistema.
18. Criando, assim, desigualdade e injustiça
19. Em manifesta violação dos princípios Constitucionais da igualdade e Justiça previstos no Art. 266º n.º2 da C.R.P.
20. Pelo que, a permanência daquela norma na Ordem Jurídica se mostra inadmissível, pelo menos, com o sentido, alcance e efeito que a decisão recorrida lhe empresta.
21. Encontra-se, pois, o Despacho do Exmo Senhor Secretário de Estado da Administração Educativa de 13/11/98, inquinado do vício de violação de lei, por violação dos princípios da Justiça e Igualdade, nos termos do Art. 266º nº.2 da C.R.P.
22. Pelo que deve o mesmo ser anulado com todas as legais consequências.
23. E a prova de que aquela norma cria injustiça está em que o D.L.n.º15-A/99 de
19 de Janeiro veio dar nova redacção ao Art.5º do D.L. nº.384/93, de 18 de Novembro, e em que desapareceu a referida exigência dos professores se encontrarem contratados à data da abertura do concurso, sendo requisito suficiente que tenham estado contratados nos últimos dois anos lectivos.
24. Encontra-se, pois, o referido despacho inquinado do vício de violação de lei, por violação dos princípios da justiça e Igualdade, nos termos do Art. 266º n.º2 da C.R.P.
25. Pelo que ao decidir como decidiu violou a Decisão Recorrida o disposto no art. 266º, nº. 2 da C.R.P.
26. Pelo que, deve ser concedido provimento ao presente Recurso e anulada a Decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo e consequentemente anulado o Despacho do Exmo Secretário de Estado da Administração Educativa de
13/11/98, com todas as legais consequências.'
Por acórdão de 4 de Dezembro de 2001, o STA negou provimento ao recurso; quanto
à questão de constitucionalidade suscitada pelo recorrente pronunciou-se nos seguintes termos:
'Por outro lado não especifica o recorrente em que consiste a invocada violação dos princípios constitucionais da justiça e da igualdade estabelecidos no artº.
266º, nº. 2 da Constituição. Não vêm, aliás, referidos casos idênticos ao do recorrente em que a administração tenha decidido diferentemente, nem parece injusto que, tendo o recorrente deixado de trabalhar para fazer curso de mestrado a fim de obter as almejadas vantagens, tenha que ter tratamento diferenciado dos restantes concorrentes que optaram por continuar a trabalhar mesmo em regime de contrato. De resto, como diz a Exmª. Magistrada do Ministério Público, a violação daqueles princípios, no âmbito do acto administrativo, releva essencialmente no exercício de poderes discricionários que aqui não teve lugar. Não vindo invocada a inconstitucionalidade das normas aplicadas, a obediência àquelas garantiu a observância dos princípios consignados no artº 266º, nº. 2 da Constituição que assim também não se mostra violado. Improcedem, nos termos expostos, as conclusões do recorrente pelo que acordam em negar provimento ao recurso, mantendo-se o acórdão recorrido.'
De novo inconformado, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo do artigo 70º, nº. 1, alínea b) da Lei nº. 28/82, de 15 de Novembro, nos seguintes termos:
'1. O presente Recurso é interposto ao abrigo da al. b) do nº. 1 do Art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei nº. 28/82, de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei nº. 13-A/98 de 26 de Fevereiro.
2. Pretende ver-se apreciada a inconstitucionalidade da norma prevista no Art.
5º do D.L. nº 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo D.L. 16/96 de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao Concurso de Professores para os Quadros de Zona Pedagógica /QZP), os professores contratados à data da abertura do Concurso, interpretação essa defendida quer pelo Tribunal Central Administrativo, quer pelo Acórdão Recorrido.
3. Tal disposição legal viola o disposto no Art. 266º, nº. 2 da C.R.P..
4. Efectivamente, a exigência consagrada no Art. 5º do D.L. nº. 384/9, na redacção introduzida pelo D.L. 16/96 de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao Concurso para os QZP os professores contratados, e ao considerar-se, como entendeu o Acórdão Recorrido, que tal requisito tem que estar preenchido à data da abertura do concurso, aquela norma mais não fez do que pôr em causa a unidade do sistema.
5. Com efeito, não pode, por um lado exigir-se como condição de progressão na Carreira Docente a valorização profissional e, paralelamente existir uma norma que exige (para se poder ser opositor ao Concurso para os lugares de Zona Pedagógica) que os professores se encontrem contratados à data da abertura do concurso, sem atender à razão pela qual tal requisito se encontra preenchido.
6. Criando, assim, manifesta desigualdade e injustiça, violando, pois, o disposto no Art. 266º, nº. 2 da CRP.
7. De facto, o Recorrente, exerceu funções durante anos consecutivos, tendo a sua ligação ao Ministério da Educação para o exercício da actividade docente sido feito sempre através de contrato, ou seja, sempre foi Professor contratado.
8. É certo que à data da abertura do Concurso, o recorrente não se encontrava contratado, mas tal só sucedeu porque constitui imperativo da progressão na Carreira Docente a valorização profissional, ou seja achava-se no cumprimento de um dever funcional.
9. Em conformidade com tal objectivo e dever, o Recorrente encontrava-se na data da abertura do Concurso em causa a frequentar o Curso de Mestrado em Filosofia da Natureza e Ambiente.
10. O que fez em consonância com os objectivos da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº. 46/86 de 14 de Outubro), do Estatuto da Carreira Docente dos Educadores de Infância e dos Professores do Ensino Básico e Secundário (D.L. nº.
139-A/90 de 28 de Abril), e enquadrado no Regime Jurídico da Formação Contínua de Professores (D.L. 249/92 de 9 de Novembro e D.L. nº. 344/85 de 11 de Outubro.
11. Assim sendo, não podia o Recorrente ser penalizado, como o foi, por tal facto e por se encontrar no cumprimento de um dever.
12. Acresce que, jurídica e materialmente a conclusão do Mestrado e o exercício da actividade docente se mostram legalmente incompatíveis.
13. Razão pela qual o Recorrente se viu obrigado a dedicar-se em exclusivo durante o ano lectivo de 1997/98 ao desenvolvimento e conclusão do seu projecto de Mestrado, o que fez em manifesta consonância com as exigências de progressão e valorização que a Carreira docente exige.
14. Tendo solicitado a concessão de uma Bolsa de Mestrado no âmbito do Programa Praxis XXI do Ministério da Ciência e Tecnologia, que lhe veio a ser atribuída por Despacho do Exmº Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia.
15. E a atribuição da referida Bolsa de Mestrado é legalmente incompatível com o exercício da actividade docente.
16. Pelo que teve necessariamente de optar por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu Projecto de Mestrado.
17. Acontece que, contrariamente às expectativas legítimas criadas pelo Recorrente, o facto de ter optado por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu projecto de Mestrado, ao invés de o beneficiar, acabou por prejudicá-lo.
18. Em manifesta violação dos princípios da justiça e igualdade.
19. É que um professor que se encontrasse, à data dos factos, em situação idêntica à do Recorrente, mas que não se achasse no cumprimento das exigências de progressão e valorização que a carreira Docente impõe, obteria colocação no Concurso para os QZP.
20. Enquanto que o Recorrente, por se ter dedicado exclusivamente ao desenvolvimento e conclusão do seu projecto de Mestrado, em manifesta consonância com as exigências de progressão e valorização que a Carreira docente exige, veio a ser prejudicado com a anulação, por tal motivo, da sua colocação no Concurso para os QZP, no ano lectivo de 1998/1999.
21. Perante tal quadro, tem de entender-se que a subsistência daquela norma na Ordem Jurídica se mostra inadmissível, pelo menos, com o sentido e alcance e efeito que o Acto Impugnado lhe empresta, e confirmado pelo Tribunal Central Administrativo e Acórdão ora Recorrido.
22. Encontrando-se, por consequência, a referida norma em manifesta e ostensiva contradição com o disposto no Art. 266º, nº. 2 da C.R.P.
23. A questão de constitucionalidade foi suscitada pelo recorrente quer na Petição de Recurso quer no Recurso Jurisdicional.
24. O presente Recurso deverá subir nos próprios Autos e com efeito suspensivo, nos termos do Art. 78º, nº. 4 da Lei do Tribunal Constitucional'.
Neste Tribunal, apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:
'1 – Foi interposto Recurso Contencioso de Anulação para o Tribunal Central Administrativo do Despacho do Exmo Secretário de Estado da Administração Educativa que negou provimento ao Recurso Hierárquico interposto pelo Recorrente do Acto que anulou a colocação obtida no Concurso para os QZP – Ano lectivo de
1998/99.
2 – Entendeu o Tribunal Central Administrativo negar provimento ao referido recurso, tendo tal Decisão sido confirmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, na sequência de Recurso Jurisdicional.
3 – Contudo, a interpretação da norma prevista no Art. 5º do D.L. nº 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo D.L. 16/96 de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao Concurso de Professores para os QZP os professores contratados à data da abertura do Concurso, viola o disposto no Art. 266º, nº. 2 da CRP.
4 – Efectivamente, a colocação obtida no Concurso aos Quadros de Zona Pedagógica, a que o Recorrente foi opositor, foi anulado por este não reunir as condições exigidas no citado diploma legal.
5 – Sucede que o Recorrente exerceu funções durante anos consecutivos, tendo a sua ligação ao Ministério da Educação para o exercício da actividade docente sido feita sempre através de contrato.
6 – E não obstante o Recorrente não se encontrar contratado à data da abertura do Concurso, tal só aconteceu porque constitui imperativo da progressão na Carreira Docente a valorização profissional.
7 – Pelo que, e em conformidade com tal objectivo e dever, o Recorrente encontrava-se na data da abertura do Concurso em causa a frequentar o Curso de Mestrado em filosofia da Natureza e Ambiente.
8 – Tanto mais que jurídica e materialmente a conclusão do Mestrado e o exercício da actividade docente se mostram legalmente incompatíveis.
9 – Razão pela qual o Recorrente se viu obrigado a dedicar-se em exclusivo durante o ano lectivo de 1997/98 ao desenvolvimento e conclusão do seu projecto de Mestrado, o que fez em manifesta consonância com as exigências de progressão e valorização que a Carreira docente exige.
10 – Pelo que solicitou a concessão de uma Bolsa de Mestrado no âmbito do Programa Praxis XXI do Ministério da Ciência e tecnologia, que lhe veio a ser atribuída por Despacho do Exmo Senhor Ministro da Ciência e Tecnologia.
11 – Ora, a atribuição da referida Bolsa de Mestrado é legalmente incompatível com o exercício da actividade docente.
12 – Daí que o Recorrente teve necessariamente de optar por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu Projecto de Mestrado.
13 – Acontece que, o facto de ter optado por se dedicar em exclusivo ao desenvolvimento do seu projecto de Mestrado, ao invés de o beneficiar, acabou por prejudicá-lo.
14 – Em manifesta violação dos princípios da justiça e igualdade.
15 – É que um professor que se encontrasse, à data dos factos, em situação idêntica à do Recorrente, mas que não se achasse no cumprimento de exigências de progressão e valorização que a Carreira Docente e a lei impõem, obteria colocação no Concurso para os QZP.
16 – Perante tal quadro, tem de entender-se que a subsistência daquela norma na Ordem Jurídica se mostra inadmissível, pelo menos, com o sentido e alcance e efeito que o Acto Impugnado lhe empresta, e confirmado pelo Tribunal Central Administrativo e Acórdão ora Recorrido, já que cria manifesta desigualdade e injustiça, violando, pois, o disposto no Art. 266º, nº. da CRP.
17 – Devendo consequentemente ser declarada como materialmente inconstitucional, por violação do disposto no Art. 266º, nº. 2 da C.R.P., e ser revogado o Acórdão Recorrido, com todas as legais consequências.'
Não houve contra-alegações.
Cumpre apreciar e decidir.
2 –Pretende o recorrente ver apreciada a constitucionalidade da norma prevista no artigo 5º do Decreto-Lei nº 384/93, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº. 16/96 de 8 de Março, no sentido de que só podem ser opositores ao concurso de professores para os quadros de zona pedagógica (QZP), os professores contratados à data da abertura do concurso, por violação dos princípios da igualdade e da justiça e do disposto no artigo 266º, nº. 2 da C.R.P. E isto, fundamentalmente, porque assim se impede a ponderação de outras situações em que, muito embora se não verifique a vinculação contratual do candidato à data da abertura do concurso, impõem a admissibilidade da candidatura, como era o caso do recorrente em que a não vinculação se devia unicamente ao facto de ter frequentado um curso de mestrado, no cumprimento de um dever de valorização profissional, o que era incompatível com a celebração de um contrato de docência.
Ora, antes do mais, importa salientar a impertinência da invocação do artigo
266º nº 2 da CRP, como norma constitucional violada.
Com efeito, a imposição de a Administração Pública se subordinar à Constituição e à lei, devendo actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé dirige-se aos órgãos e agentes administrativos e não ao legislador.
A sua violação só é assim, em bom rigor, reportável a actos (ou omissões) da Administração e, nomeada ou dominantemente, no exercício de poderes discricionários, onde a lei, visando determinados fim, deixa aos órgãos e agentes administrativos a opção entre diversos meios para alcançar esse fim.
A inconstitucionalidade, neste caso, não se configura, pois, directamente, como uma inconstitucionalidade normativa, sendo certo que só esta cabe nos poderes de cognição do Tribunal Constitucional, no âmbito do recurso de constitucionalidade, em fiscalização concreta.
Não significa o que se deixa dito que a invocada inconstitucionalidade não possa, no caso, ser conhecida; só que a norma em causa terá como parâmetros de constitucionalidade, considerando a pretensa violação dos princípios da igualdade e da justiça, os artigos 13º e 2º da CRP, onde o primeiro daqueles princípios se mostra consagrado em termos gerais e o segundo se integra no princípio do Estado de Direito.
3 – É o seguinte o teor da norma cuja constitucionalidade foi suscitada nos autos - artigo 5º do Decreto-Lei nº. 384/93, de 18 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº. 16/96, de 8 de Março -:
'Artigo 5º Podem ser opositores ao concurso referido no artigo anterior, além dos professores já pertencentes a um dos quadros de zona pedagógica, os professores contratados que reúnam, cumulativamente, as seguintes condições: a. Serem titulares de habilitação profissional ou própria; b. Terem obtido colocação nos 2º e 3º ciclos do ensino básico ou do ensino secundário nos últimos quatro anos lectivos; c. Terem completado, até 31 de Agosto do ano anterior ao da abertura do concurso, quatro ou mais anos de serviço docente; d. Terem prestado no ano lectivo anterior, no mínimo, 180 dias de serviço, em horários não inferiores a doze horas semanais.'(sublinhado nosso).
O princípio da igualdade abrange fundamentalmente três dimensões ou vertentes: a proibição do arbítrio, a proibição de discriminação e a obrigação de diferenciação, significando a primeira, a imposição da igualdade de tratamento para situações iguais e a interdição de tratamento igual para situações manifestamente desiguais (tratar igual o que é igual; tratar diferentemente o que é diferente); a segunda, a ilegitimidade de qualquer diferenciação de tratamento baseada em critérios subjectivos (v.g., ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social) e, a última surge como forma de compensar as desigualdades de oportunidades.
É pacífica a jurisprudência deste Tribunal neste sentido; cita-se, a título de exemplo, o Acórdão nº. 180/99, de 10 de Março, in 'Acórdãos do Tribunal Constitucional', vol. 43º, págs. 135 a 144, onde se escreveu:
'6. O Tribunal Constitucional tem considerado que o princípio da igualdade impõe que situações da mesma categoria essencial sejam tratados da mesma maneira e que situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tenham tratamento também diferente. Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de tratamento, desde que fundamentados à luz dos próprios critérios axiológicos constitucionais. A igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram destituídas de fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos nºs 39/88,
186/90, 187/90 e 188/90, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol. (1988), p. 233 e ss., e 16º vol. (1990), pp. 383 e ss., 395 e ss. e 411 e ss., respectivamente; cf., igualmente, na doutrina, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, tomo IV, 2ª ed., 1993, p. 213 e ss., Gomes Canotilho, Direito Constitucional, 6ª ed., 1993, pp. 564- 5, e Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 1993, p.125 e ss.]'.
Também no Acórdão nº. 409/99, de 29 de Junho, in 'Acórdãos do Tribunal Constitucional', vol. 44º, págs. 461 a 485, se disse:
'O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente. Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional. O princípio da igualdade enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio (cf., quanto ao princípio da igualdade, entre outros, os Acórdãos nºs 186/90,187/90,188/90,1186/96 e 353/98, publicados in 'Diário da República', respectivamente, de 12 de Setembro de 1990, 12 de Fevereiro de 1997, e o último, ainda inédito).'
Ora, a norma em causa que fixa os requisitos de admissibilidade ao concurso, exigindo, antes do mais, que os candidatos, sejam, ou professores já pertencentes a um dos quadros da zona pedagógica, ou 'professores já contratados', não ofende, quanto a esta última condição, o princípio da igualdade.
Desde logo, trata por igual, sem qualquer discriminação, todos aqueles que se encontram na mesma situação – a de professores vinculados por contrato.
Não é, porém, aqui que o recorrente vislumbra ofensa ao princípio da igualdade: a violação ocorreria por, alegadamente, poder concorrer um professor que, sem ter frequentado um qualquer curso de valorização profissional, está vinculado por contrato á data da abertura do concurso, mas já não aquele que só não se encontra em tal situação por, em cumprimento de um dever de valorização profissional, ter frequentado um curso de mestrado, o que era incompatível com a contratação.
Por outras palavras, o que o recorrente questiona é o facto de a norma não conferir o mesmo direito (o direito de se candidatar ao concurso) a quem se encontre em situação diferente, mas merecedora (ou até mais) da outorga daquele direito.
Mas não tem razão.
Com efeito e dada a matéria em causa, justificava-se que, na definição de condições de candidatura ao concurso, o legislador assentasse em critérios, tanto quanto possível, objectivos.
A exigência de o oponente ao concurso se encontrar contratado nada tem de discriminatório, considerando que se trata de uma situação que revela uma permanência no exercício de funções docentes justificativa da oportunidade de uma estabilização profissional que se obtém com a contratação para os quadros da zona pedagógica, do mesmo passo que, cumulativamente com os requisitos previstos na mesma norma, oferece a garantia de uma experiência no ensino necessária para aquela contratação.
Dificilmente, aliás, o legislador poderia equiparar outras situações - designadamente aquela em que o recorrente se encontrava - em que se não verificasse a referida condição, alargando as margens de apreciação da Administração com a ponderação e valorização das múltiplas razões que pudessem justificar a interrupção de funções docentes, com prejuízo da objectividade que deve presidir à verificação dos requisitos de admissibilidade ao concurso.
É certo que o legislador poderia ter acolhido outros factores de admissibilidade ao concurso, como de resto veio a suceder com a nova redacção dada à norma em causa pelo Decreto-Lei nº 15-A/99, de 19 de Janeiro; mas isto insere-se, ainda, na sua margem de liberdade de conformação, no âmbito da qual a Constituição apenas impõe que se não consagrem soluções arbitrárias, discriminatórias ou manifestamente injustas.
O que se deixa dito no que respeita à não violação do princípio da igualdade vale também quanto à invocada violação do princípio da justiça.
Com efeito, os fundamentos apontados, que demonstram a racionalidade da medida legislativa em causa – e sem embargo da plausibilidade de outra ou outras racionalidades – não são suficientes para se concluir que a norma consagra uma solução injusta.
4 – Decisão:
Pelo exposto, e em conclusão, decide-se negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs.
Lisboa, 10 de Outubro de 2002- Artur Maurício Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida José Manuel Cardoso da Costa