Imprimir acórdão
Proc. n.º 749/01 Acórdão nº 411/02
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito (Cons.º Artur Maurício)
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. A, identificado nos autos, recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra do despacho proferido pelo Juiz de instrução da comarca de Aveiro que, antecedendo a sua pronúncia como autor material de sete crimes de aborto, previsto e punível pelos artigos 140º, n.º 2, 141º, n.º 2, e 77º, do Código Penal, indeferiu a arguição de nulidades (de escutas telefónicas como meio de prova, de elementos de prova recolhidos com base em buscas efectuadas em consultório médico sem a presença de um elemento da Ordem dos Médicos e de exames de sexologia forense) por ele feita no requerimento de abertura da instrução.
O Tribunal da Relação de Coimbra negou provimento ao recurso, por acórdão de fls. 2336 e seguintes. Lê-se nesse acórdão, para o que aqui releva:
'[...] o incumprimento dos requisitos e condições legais previstos para as operações de escuta telefónica, quais sejam os enumerados nos arts. 187º e 188º, com excepção da falta de ordem ou autorização do juiz para a realização do acto, fere as respectivas operações de nulidade que se deve qualificar de relativa ex vi artº. 189º. Por outro lado, a realização de busca em consultório médico presidida pessoalmente pelo juiz, mas sem a convocação do presidente do conselho local da Ordem dos Médicos e sem a presença daquele ou de um seu delegado, constitui mera irregularidade, posto que a lei não comina a falta de convocação daquela referida entidade ou a sua não comparência ou de um seu delegado com a sanção da nulidade (arts. 177º e 118º, n.ºs. 1 e 2). Certo é que quer a nulidade (relativa) das escutas telefónicas decorrentes do incumprimento do formalismo (requisitos e condições) previsto nos arts. 187º e
188º, quer a irregularidade das buscas em consultórios médicos resultante da não convocação do presidente do conselho local da Ordem dos Médicos e a sua não comparência ou de um seu delegado, a terem-se por sanadas, em nada afectam a validade da prova que dos respectivos autos resulta, uma vez que obtida através de meios válidos, pelo que pode e deve ser plenamente utilizada. Consabido que a eventual nulidade relativa atinente às escutas realizadas nos autos deveria ter sido arguida no prazo geral de 10 dias, posto que a lei adjectiva penal não estabelece para a mesma prazo especial de arguição (art.
105º, n.º 1) e que a eventual irregularidade respeitante à busca efectuada deveria ter sido arguida no prazo de 3 dias previsto no n.º 1, do art. 123º, sendo certo que uma e outra vieram a ser arguidas (apenas) no requerimento para abertura da instrução o qual deu entrada em juízo no dia 29 de Abril de 1999, ou seja, fora dos referidos prazos, há que considerar as mesmas sanadas, a significar que o recurso se revela improcedente nesta parte. Termos em que se acorda: a. Rejeitar o recurso na parte em que vem impugnada a decisão que se pronunciou sobre a eventual nulidade dos exames de sexologia realizados às arguidas B, C e D; b. Negar provimento ao recurso quanto às demais questões suscitadas.'
2. Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal Constitucional nos seguintes termos:
'1 – O presente recurso é interposto ao abrigo do artigo 70º, n.º 1, al b) da Lei n.º 28/82, de 15 de Setembro.
2 – Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da aplicação da norma do artigo 105º, n.º 1, na interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida, isto é, que tal prazo é aplicável à nulidade das escutas telefónicas, quando tal nulidade foi praticada em inquérito.
3 – Tal norma com a interpretação com que foi aplicada viola os artigos 26º, n.º
1 e 32º, n.º 1 da CRP.
4 – A questão da inconstitucionalidade não foi suscitada anteriormente, porquanto a interpretação dada ao caso na decisão recorrida foi de todo imprevisível, não podendo, razoavelmente, o recorrente contar com a sua aplicação.
5 – Na verdade, mesmo quem tem entendido tratar-se de nulidade dependente de arguição, tem defendido que ao caso se aplica a previsão da alínea c) do n.º 3 do artigo 120º do CPP (cfr. v.g., Ac. da Relação de Coimbra, proferido no processo n.º 2380/01, de 16 de Agosto).'
3. Nas alegações que apresentou neste Tribunal, o recorrente concluiu do seguinte modo:
'1 – A nulidade das escutas telefónicas, a entender-se como nulidade processual dependente de arguição, se cometida em inquérito, pode ser arguida, face ao disposto no artigo 120º, n.º 3, al. c) do CPP, até ao encerramento do debate instrutório.
2 – Ao ter entendido de outra forma, aplicando-lhe o prazo do artigo 105º, n.º1 do CPP, e impedindo, pois, o seu conhecimento, violou a decisão recorrida o artigo 32º, n.º 1 da CRP, por ter obstado ao exercício do direito no prazo que a lei estipula, por amputar este. Porém,
3 – O caso nem sequer é de nulidade processual dependente de arguição, já que se trata mesmo de prova proibida: intromissão abusiva nas telecomunicações, por ter ocorrido fora do formalismo legal.
4 – Sendo nulidade de prova, nulidade insanável, a mesma é invocável a todo o tempo.
5 – Ao ter entendido de outra forma, violou a decisão recorrida, para além do normativo já invocado, o n.º 8 do mesmo artigo.
6 – Assim, deve ser julgada inconstitucional a interpretação que a decisão recorrida fez do artigo 105º, n.º 1 do CPP, ao pretender aplicá-lo quer às nulidades processuais ocorridas em inquérito, com prazo específico maior que aquele, quer às nulidades de prova, nulidades insanáveis.'
O Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
'1 – É inconstitucional a interpretação normativa do n.º 1 do artigo 105º do Código de Processo Penal que se traduza em considerar precludida pelo decurso do prazo-regra de 10 dias, aí previsto, a possível invocação de uma nulidade, decorrente de eventual violação das formalidades exigidas quanto à efectivação de escutas telefónicas, presumindo o seu imediato conhecimento, sem previamente indagar e fixar em que momento foi efectivamente cognoscível pelo interessado tal vício procedimental, ocorrido numa fase processual legalmente submetida à regra do 'segredo de justiça', imposto pelo artigo 86º do Código de Processo Penal.
2 – Termos em que deverá proceder o presente recurso.'
Cumpre apreciar e decidir.
II
4. Importa, em primeiro lugar, delimitar o objecto do presente recurso, tendo em conta que ele fica definido no requerimento de interposição de recurso, não sendo lícito ao recorrente ampliá-lo nas subsequentes alegações.
Ora, desse requerimento resulta claro que o recurso se restringe à matéria respeitante à alegada nulidade das escutas telefónicas e, quanto a esta, apenas no que se refere ao prazo da sua arguição.
Na verdade, como assinala nas suas alegações o Procurador-Geral Adjunto em exercício neste Tribunal, o recorrente limitou o objecto de recurso à norma constante do artigo 105º, n.º 1, do Código de Processo Penal (prazo-regra para a prática de actos processuais), tecendo embora considerações de ordem vária quanto à constitucionalidade da qualificação ou natureza do vício
(nulidade/irregularidade) respeitante ao meio de obtenção da prova, acabando, contudo, por não mencionar, nas 'normas' que elege como objecto do recurso, qualquer disposição legal ou interpretação normativa relativa à qualificação ou
à natureza do vício em causa.
Consequentemente, não se conhecerá da matéria das conclusões 3ª a 5ª das alegações.
5. Limitado, assim, o objecto do recurso à matéria do prazo de arguição da nulidade das escutas telefónicas, convirá, ainda, precisar esse objecto e a interpretação feita no acórdão recorrido da norma do artigo 105º, n.º 1, do Código de Processo Penal.
Como resulta do texto transcrito, o Tribunal da Relação de Coimbra entendeu aplicável à referida arguição aquela norma, que fixa em 10 dias, salvo disposição legal em contrário, o prazo para a prática de qualquer acto processual. Não aplicou portanto a norma do artigo 120º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal, que faculta a arguição de nulidade respeitante a inquérito até ao encerramento do debate instrutório, tendo, no caso, ocorrido a arguição em momento anterior (no requerimento de abertura da instrução).
E, ao aplicar o direito aos factos, a Relação considerou a arguição extemporânea, limitando-se, porém, a assinalar que a nulidade apenas foi deduzida no requerimento para abertura da instrução, que dera entrada em 29 de Abril de 1999, 'ou seja, fora do(s) referido(s) prazo(s)'.
Expirado o prazo de arguição à data da abertura da instrução, segundo o acórdão recorrido, fica-se, deste modo, sem saber qual o termo inicial na contagem daquele prazo de 10 dias que permitiu aquela conclusão.
Mas não se revelando qualquer indagação sobre o momento em que o arguido tomou conhecimento, ou podia tomar conhecimento, agindo com a diligência devida, da eventual nulidade respeitante às escutas telefónicas, certo é, no entanto, que a ilação de o prazo de 10 dias se mostrar expirado na data em que foi requerida a instrução (29/4/99) é compatível com a localização do termo inicial em múltiplos momentos, designadamente o que ocorre no encerramento do inquérito com a notificação da acusação ao arguido (esta ocorreu em 9/4/99 pelo que, a ser este o termo inicial do prazo de arguição de nulidade, ele expirava ainda antes do requerimento de interposição do recurso).
Não pode, assim, aceitar-se que a questão a resolver, como vem sugerido nas contra-alegações do Ministério Público, seja a da constitucionalidade da norma interpretada no sentido de que a eventual nulidade das escutas telefónicas efectuadas nos autos durante o inquérito deve ser imediatamente arguida no prazo regra de 10 dias, sem ser fixado o momento a partir do qual começa a contar esse prazo e sem aguardar pelo termo da fase processual de inquérito, sob pena de sanação dessa mesma nulidade. A eventual decisão de provimento do presente recurso com base num juízo de inconstitucionalidade relativamente a uma interpretação normativa do artigo
105º, n.º 1, do CPP, tal como é assinalada pelo MP, teria como pressuposto a
(absoluta) não fixação pelo acórdão recorrido do termo inicial do prazo de 10 dias para arguição de nulidades sob pena de sanação e estaria necessariamente dependente da demonstração desse pressuposto. Decisivo para não aceitar este entendimento, que envolve uma suposta interpretação da norma ínsita no artigo 105º do Código de Processo Penal, é a circunstância de o recorrente não ter identificado como objecto do seu recurso uma tal interpretação normativa, a ele – e só a ele – cabendo fazê-lo.
Na verdade, o que o recorrente diz é que enferma de inconstitucionalidade uma interpretação daquela norma que a torne aplicável aos casos em que a nulidade em causa respeita ao inquérito, quando nesse caso o prazo de arguição, segundo o recorrente, deveria ser determinado pelo disposto no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal; em seu entender, tal interpretação conduziria portanto ao encurtamento do prazo de arguição da nulidade em causa, respeitante ao inquérito.
E, pese embora a apontada relativa 'opacidade' do acórdão recorrido
– que, eventualmente, demandaria um pedido de esclarecimento –, não pode deixar de se reconhecer que tal interpretação se contém necessariamente no aresto (para este, o disposto no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do CPP não integra, no caso, o inciso do n.º 1 do artigo 105º do mesmo Código 'salvo disposição legal em contrário').
A questão de constitucionalidade a apreciar será, pois, a de saber se viola as garantias de defesa do arguido uma interpretação normativa que torne inaplicável ao prazo de arguição de nulidade respeitante a escutas telefónicas o que vem consagrado no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do CPP e aplicável o estabelecido no n.º 1 do artigo 105º do mesmo Código, do que resulta um prazo necessariamente mais curto, que expira antes do termo do prazo para requerer a abertura da instrução.
Ou seja, o que está em causa é a ponderação, em termos de constitucionalidade (por violação das garantias de defesa do arguido), do encurtamento do prazo (10 dias) para arguição de eventuais nulidades cometidas na fase de inquérito.
6. A norma cuja constitucionalidade vem suscitada, inserida no Título III do Código de Processo Penal, com a epígrafe 'Do tempo dos actos e da aceleração do processo', é do seguinte teor:
'Artigo 105º Prazo e seu excesso
1. Salvo disposição legal em contrário, é de 10 dias o prazo para a prática de qualquer acto processual.
[...].'
Esta norma, que dispõe sobre o prazo geral para a prática de actos processuais, nada estabelece sobre o momento a partir do qual se começa a contar esse mesmo prazo, questão que igualmente não foi expressamente definida no acórdão recorrido.
Neste apenas se disse:
'Consabido que a eventual nulidade relativa atinente às escutas realizadas nos autos deveria ter sido arguida no prazo geral de 10 dias, posto que a lei adjectiva penal não estabelece para a mesma prazo especial de arguição
(art. 105º, n.º 1) e que a eventual irregularidade respeitante à busca efectuada deveria ter sido arguida no prazo de 3 dias previsto no n.º 1, do art. 123º, sendo certo que uma e outra vieram a ser arguidas (apenas) no requerimento para abertura da instrução o qual deu entrada em juízo em 29 de Abril de 1999, ou seja, fora dos referidos prazos (...)'
7. Como já antes se disse, embora não mencione expressamente o termo inicial do prazo de 10 dias, o acórdão recorrido, ao considerar esse prazo exaurido aquando da apresentação do requerimento para abertura da instrução, é susceptível de ser interpretado no sentido de que, para o Tribunal a quo, tal prazo se iniciou com a notificação da acusação ao arguido, momento processual a partir do qual deixa de vigorar o segredo de justiça e que vedaria, durante o inquérito, o conhecimento pelo arguido de eventuais nulidades praticadas nessa fase processual.
E, sendo assim, a suposta inconstitucionalidade, alegada pelo Ministério Público, que consistiria na violação de uma imposição constitucional, decorrente das garantias de defesa do arguido, de só poder iniciar-se a contagem do prazo de arguição de nulidades com o conhecimento (ou susceptibilidade de conhecimento) das nulidades pelo arguido (considerado relevante, por este Tribunal, v. g., nos acórdãos n.º 148/2001 e n.º 468/2001, in DR, II Série, de 9 de Maio e DR, II Série, de 28 de Novembro, ambos de 2001, respectivamente) é – repete-se – questão que se situa fora do objecto do recurso.
Aqui do que se trata é de ponderar, em termos de constitucionalidade, se o encurtamento do prazo para arguição de eventual nulidade para 10 dias, a terminar antes do fim do prazo para requerer a abertura da instrução, viola as garantias de defesa do arguido, impondo-lhe uma restrição excessiva e desproporcionada do seu direito de impugnar as nulidades e vícios processuais ocorridos durante o inquérito.
Ora, impor ao arguido um encurtamento do prazo para a arguição de eventual nulidade decorrente da violação do formalismo na realização de escutas telefónicas efectuadas no inquérito, para 10 dias, representa, como se demonstrará, um ónus excessivo e desproporcionado das garantias de defesa do arguido consagradas no artigo 32º, n.º1, da Constituição.
Em primeiro lugar, porque tal encurtamento do prazo normalmente implicará a necessidade de apresentação de requerimento diverso do requerimento para abertura da instrução, precisamente destinado a arguir a nulidade verificada. Tal necessidade de apresentação de requerimento diverso não cumpre qualquer função útil, atendendo a que, pelo menos nos casos em que o conhecimento da nulidade só ocorre com a notificação da acusação (como se admite ter sucedido no caso sub judice), será apenas na fase da instrução que o juiz irá decidir a arguição da nulidade: no mesmo momento, pois, em que conhecerá das restantes nulidades enunciadas no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do CPP.
Não cumpre, assim, qualquer função útil – designadamente, a de obrigar o juiz a pronunciar-se sobre a nulidade alegada em momento anterior
àquele em que conhece das restantes nulidades arguidas no requerimento de abertura da instrução – o encurtamento do prazo para a arguição de eventual nulidade decorrente da violação do formalismo na realização de escutas telefónicas, redundando na mera exigência de apresentação de uma nova peça processual. Ainda que se considere que tal exigência não é de cumprimento materialmente impossível, não se vê por que motivo não há-de admitir-se a dedução da referida nulidade na mesma peça processual em que as restantes são deduzidas e se onera o arguido com a apresentação de mais uma peça processual.
Em segundo lugar, a aplicação do prazo geral de 10 dias à dedução de nulidades decorrentes da violação do formalismo na realização de escutas telefónicas efectuadas no inquérito significa a desconsideração de tais nulidades relativamente às demais nulidades referenciadas no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do CPP. Assim, por exemplo, a insuficiência do inquérito poderia ser arguida no requerimento para abertura da instrução, mas já não o poderiam ser aquelas nulidades, sendo certo, por um lado, que a insuficiência do inquérito pode vir a resultar da anulação de operações de escutas realizadas e, por outro lado, que o artigo 32º, n.º 8, da Constituição comina expressamente com a nulidade a abusiva intromissão nas telecomunicações.
Independentemente de se considerar que o prazo geral de 10 dias não
é exíguo, ou que o artigo 32º, n.º 8, da Constituição não impõe a insanabilidade das nulidades que prevê, a verdade é que não se encontra qualquer justificação para uma menor severidade no tratamento das nulidades decorrentes da violação do formalismo na realização de escutas telefónicas efectuadas no inquérito relativamente às demais nulidades respeitantes ao inquérito e referenciadas no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do CPP.
Pode, assim, concluir-se que a interpretação normativa que torna inaplicável ao prazo de arguição de nulidade respeitante a escutas telefónicas o que vem consagrado no artigo 120º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal e aplicável o estabelecido no artigo 105º do mesmo Código viola o disposto no artigo 32º, n.º 1, da Constituição, na medida em que restringe excessiva e desproporcionadamente o direito do arguido de impugnar as nulidades e vícios processuais ocorridos durante o inquérito. III
8. Pelos fundamentos acima expostos, o Tribunal Constitucional decide:
a) Julgar inconstitucional, por violação do disposto no artigo 32º, n.º 1, da Constituição, a norma constante do artigo 105º do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual abrange a arguição de nulidade respeitante a escutas telefónicas ocorrida durante o inquérito;
b) Consequentemente, conceder provimento ao recurso, determinando a reforma do acórdão recorrido na parte impugnada.
Lisboa, 10 de Outubro de 2002- Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida Artur Maurício (vencido, nos termos da declaração de voto junta) José Manuel Cardoso da Costa
Declaração de voto
Vencido, pela seguinte ordem de razões:
Entendo, antes do mais, que o acórdão converte em inconstitucionalidade uma solução (judicial) que, a meu ver, não passaria de mau direito.
Soluções aberrantes ou pouco congruentes no nosso Direito não são, infelizmente, raras, sem que, por isso, elas justifiquem, necessariamente, um juízo de inconstitucionalidade, como é o caso.
Na verdade, se pode configurar-se como aparentemente injustificado o estabelecimento de um prazo para arguição de nulidades cometidas em inquérito, relativas a escutas telefónicas, mais curto do que se prevê para as nulidades, em geral, ocorridas na mesma fase processual e não estando em causa (por estar fora do objecto do recurso) a qualificação daquelas como nulidades relativas, considero que a solução do acórdão recorrido, compatível com o entendimento de que o prazo de dez dias se conta a partir da notificação da acusação, não ofende as garantias de defesa do arguido.
Se, desde logo, tese contrária teria que assentar em que só o prazo geral (até ao encerramento da instrução)assegura essas garantias – o que não aceito, nem o acórdão ousa defender – certo é que o referido prazo permite, considerando até a matéria específica em causa (regularidade das escutas), que o arguido verifique e argua, com a devida ponderação, a pertinente nulidade; e não posso, ainda, aceitar que a consequência de o arguido poder ver-se constrangido a deduzir a nulidade em peça processual própria (antes do requerimento de abertura de instrução) constitua um ónus desproporcionado e excessivo, limitativo das aludidas garantias de defesa.
Artur Maurício