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Proc. nº 230/02
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. A, deficiente das forças armadas, interpôs no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto recurso contencioso de anulação do despacho do General Comandante de Pessoal da Força Aérea, que indeferiu a sua pretensão de exercer o direito de opção pelo serviço activo.
2. O Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, por decisão de 3 de Outubro de
1996, decidiu negar provimento ao recurso.
3. Inconformado com o teor desta decisão, dela recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo que, por acórdão de 17 de Janeiro de 2002 fls. 116 a 120), negou provimento ao recurso.
4. Foi deste acórdão que foi interposto, ao abrigo das alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, o presente recurso de constitucionalidade 'por violação do princípio constitucional da igualdade na não aplicação do art. 1º e 7º do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio'.
5. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do recurso (fls. 134 a 136). É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
'O recorrente indica as alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º, da Lei do Tribunal Constitucional, como fundamento do recurso.
É, porém, manifesto, como vai sumariamente ver-se, que não se verificam os pressupostos de admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional exigidos por qualquer daquelas alíneas do nº 1 do artigo 70º da LTC. A alínea c) refere-se aos recursos de decisões que 'recusem a aplicação de norma constante de acto legislativo, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado'. É, porém, por demais evidente, que o acórdão recorrido não recusou a aplicação dos artigos 1º e 7º do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio (que nem sequer refere) com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado, pelo que carece de qualquer sentido a indicação da alínea c) do nº 1 do artigo 70 da LTC, como norma ao abrigo da qual o recurso é interposto. E o mesmo se diga no que se refere à indicação da alínea f) do mesmo preceito legal. Nos termos desta alínea cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que 'apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)'. Ora, mais uma vez, é manifesto que não foi aplicada Supremo Tribunal Administrativo qualquer norma (designadamente a dos artigos 1º e 7º do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, referida pelo recorrente) cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com fundamento em violação de lei de valor reforçado (alínea c), do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República – no caso de norma constante de diploma regional – (alínea d); ou, finalmente, do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República – no caso de norma emanada de órgão de soberania – (alínea e).
É assim por demais evidente - e não carece, por isso, de mais aprofundada demonstração - que não estão preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso exigidos pelas alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, pelo que não se pode, com este fundamento, conhecer do seu objecto'.
6. Inconformado com esta decisão o recorrente apresentou, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, nº 3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência, que fundamentou nos seguintes termos
' Salvo o muito e devido respeito, A decisão sumária não se encontra devidamente fundamentada de facto e de direito. A decisão de que ora se reclama apenas refere, sem qualquer motivação ou explicação, que: «o acórdão recorrido não recusou a aplicação dos artigos 1º e
7º do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio (que nem sequer refere) com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado...
(...) não foi aplicada Supremo Tribunal Administrativo qualquer norma (designadamente a dos artigos 1º e 7º do Decreto-Lei nº 210/73, de 9 de Maio, referida pelo recorrente) cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com fundamento em violação de lei de valor reforçado (alínea c)...
É assim por demais evidente - e não carece, por isso, de mais aprofundada demonstração - que não estão preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso exigidos pelas alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional». Impedindo que o reclamante tenha conhecimento da fundamentação factual, lógica e jurídica que presidiu à elaboração da decisão, ainda que sumária. Nos termos do nº 1 do art. 205º da Constituição «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei». Por sua vez, O art. 158º do Código de Processo Civil refere:
«As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas (nº 1). A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição (nº 2). Sendo certo que, Como foi reconhecido pelo acórdão nº 55/85 do TC, de 25.3.1985: Acs. TC, 5º -
467 e ss.,
«A necessidade de fundamentação prende-se com a própria garantia do direito ao recurso e tem a ver com a legitimação da decisão em si mesma». Assim, E salvo o muito e devido respeito, deverá a mesma decisão ser declarada nula, nos termos do disposto no art. 668º, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil. SEM PRESCINDIR Quanto à admissibilidade do recurso, nos termos da al. c) do nº 1 do art. 70º da LTC, sempre se dirá que, O acórdão recorrido faz errada interpretação dos art.s 1º e 7º do Decreto-Lei nº
210/73, de 9 de Maio, e não os aplicando viola o princípio constitucional da igualdade. Com efeito, O recorrente – ora reclamante – ao ser qualificado DFA nos termos do DL 43/76 de
20 JAN, em 22JUN76, ficou abrangido pelas disposições deste diploma e também pelos artigos 1º e 7º do Decreto-Lei nº 210/73, que se mantiveram em vigor «ex vi» do art. 20º do DL 43/76 de 20 JAN, e pela Portaria 162/76, de 24 de Março. A razão de ser deste procedimento (da manutenção em vigor daqueles artigos 1º e
7º) é justamente a defesa da igualdade e coerência do sistema, bem explicitada na al. A) do nº 6 da PRT 162/76 de 24MAR.
É que o legislador salvaguardou a defesa do princípio da igualdade e quis aplicar a mesma legislação a todas as situações decorrentes da mesma solicitação: as deficiências relacionadas com as campanhas do ultramar posteriores a 1 de Janeiro de 1961. De referir que, Ao longo de todo o processo foi invocada a inconstitucionalidade da al. a) do nº
7 da Portaria 162/76, de 24 de Março – decisão do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 563/96, publicado no DR 114, 1ª Série- A, de 16 de Maio de
1996 – não tendo sido dada qualquer relevância ao efeito jurídico daquela inconstitucionalidade. De facto, Se é verdade que o DL 43/76 de 20 JAN, teve uma preocupação manifesta de respeitar o princípio da igualdade constitucional (art. 13º da Constituição da República Portuguesa), tratando de forma igual todos os DFA das campanhas do ultramar pós 61, designadamente em relação ao direito de opção pelo serviço activo, como se refere, desde logo, no seu preâmbulo, depois corroborado na Portaria 162/76, de 24 de Março, O certo é que, A confirmar-se esse espírito e enorme preocupação foi publicado o Acórdão nº
563/76 do Tribunal Constitucional em que justamente se declara inconstitucional a alínea a) do nº 7 da Portaria 162/76 por impedir o exercício do direito de opção a determinados DFA que, não obstante já terem tido a possibilidade do seu exercício no âmbito do DL 210/73, de 9 de Maio, não podiam usufruir dele – apenas uma vez – no âmbito do DL 43/76 de 20 JAN, e com o conteúdo que este novo diploma introduziu neste direito de opção. Pelo que é admissível o recurso, nos termos da al. f) do nº 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional'.
7. Notificado para responder a esta reclamação, o reclamado nada disse. Dispensados os vistos legais, cumpre decidir. II – Fundamentação
8. Na decisão sumária reclamada decidiu o Relator não conhecer do objecto do recurso, interposto ao abrigo das alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, por não estarem preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso exigidos por aquelas alíneas.
8.1. Na reclamação desta decisão refere o reclamante, em primeiro lugar, que a decisão reclamada é nula, por não se encontra devidamente fundamentada de facto e de direito. Porém, manifestamente, sem razão, uma vez que na decisão reclamada (que supra já transcrevemos na sua parte decisória) se explicitam claramente quer os pressupostos de que depende a admissibilidade do recurso interposto pelo ora reclamante (o previsto nas alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da LTC), quer as razões da sua não verificação no caso dos autos.
8.2. Afirma ainda o reclamante que - ao contrário do que se decidiu na decisão reclamada - estão preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso exigidos pelas alíneas c) e f) do nº 1 do art. 70º da LTC. Mas, quando seria de esperar que, na sequência dessa afirmação, o reclamante viesse demonstrar que foi desaplicada pela decisão recorrida uma norma constante de acto legislativo com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei de valor reforçado – demonstrando, assim, a admissibilidade do recurso ao abrigo da alínea c) do nº 1 do referido artigo 70º – ou que foi aplicada uma norma cuja ilegalidade havia sido suscitada durante o processo com fundamento em violação de lei de valor reforçado; do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República – no caso de norma constante de diploma regional; ou do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República – no caso de norma emanada de órgão de soberania - demonstrando, assim, a admissibilidade do recurso ao abrigo da alínea f) – verificamos que, sobre isto, o reclamante nada diz, ignorando por completo a fundamentação utilizada na decisão reclamada para não conhecer do objecto do recurso. Assim, pelas razões já constantes da decisão reclamada, que mais uma vez agora se reiteram porquanto em nada são abaladas pela reclamação apresentada, é efectivamente de não conhecer do objecto do recurso que o recorrente pretendeu interpor. III - Decisão Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta Lisboa, 27 de Junho de 2002- José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Luís Nunes deAlmeida