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Procº nº 174/2002.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Invocando a alínea c) do nº 1 e a alínea g) do nº 2 do artigo
281º da Constituição, veio o Ministro da República para a Região Autónoma da Madeira solicitar a este Tribunal que declarasse, com força obrigatória geral, a ilegalidade das normas contidas nos números 1 a 3 do artº 1º do Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M, de 28 de Fevereiro, que procedeu a adaptação
àquela Região dos normativos constantes do Decreto-Lei nº 309/93, de 2 de Setembro, diploma este - posteriormente alterado pelos Decretos-Leis números
218/94, de 20 de Agosto, 151/95, de 24 de Junho, 113/97, de 10 de Maio, e
380/99, de 22 de Setembro - que regula a elaboração e aprovação dos planos de ordenamento da orla costeira.
Em síntese, sustentou o requerente - após larga e profusamente discretear sobre a matéria regulada no Decreto-Lei nº 309/93, em que avultava que ao segmento das áreas dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira correspondentes à «margem do mar» se estaria perante uma definição e regime dos bens do domínio público - que, ao não respeitar o princípio fundamental definido na actual redacção do artº 17º do Decreto-Lei nº 309/93, na parte em que, conquanto utilize a asserção sem prejuízo do disposto no artigo 17º. do Decreto-Lei n.º 309/93, permite, até à aprovação dos POOC, a atribuição de usos privativos que impliquem novas construções e instalações fixas e indesmontáveis na área por eles abrangidas, a norma ínsita no nº 1 do artº 1º do Decreto Legislativo Regional em causa extravasou o âmbito da competência legislativa regional que se extrai da alínea a) do nº 1 do artigo 227º da Lei Fundamental e da alínea c) do nº 1 da Lei nº 13/91, de 5 de Junho, na redacção conferida pela Lei nº 130/99, de 21 de Agosto, pelo que a mesma padecerá de ilegalidade, vício que contaminará igualmente os números 2 e 3 do mesmo artº 1º, cuja subsistência, declarada que fosse a ilegalidade do nº 1, careceria de suporte e razão de ser.
Na pronúncia que, nos termos do artigos 54º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, ofereceu, o Presidente da Assembleia Legislativa Regional da Madeira veio referir que aquele órgão colegial, em 16 de Abril de 2002, aprovou um Decreto Legislativo Regional por intermédio do qual, com efeitos reportados a
1 de Março de 2002 e com entrada em vigor prevista para o dia seguinte ao da sua publicação, revogou o Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M.
Apresentado memorando pelo Presidente deste Tribunal, foi fixada a orientação do mesmo, cumprindo agora formar a respectiva decisão.
2. Dispõe-se no Decreto Legislativo Regional onde se inserem os questionados normativos:- Artigo 1.º Usos privativos
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 17.º do Decreto- -Lei n.º
309/93, de 2 de Setembro, com as alterações que lhe foram introduzidas pelos Decretos-Leis n.ºs 218/94, de 20 de Agosto, e 113/97, de 10 de Maio, até à aprovação dos planos de ordenamento da orla costeira (POOC), podem ser atribuídos usos privativos que impliquem novas construções e instalações fixas e indesmontáveis na área por eles abrangida, desde que localizadas em espaço classificado como de produção de solo urbano no Plano para o Ordenamento do Território na Região Autónoma da Madeira (POTRAM) ou em plano municipal de ordenamento do território eficaz.
2 - A atribuição de usos privativos a que se refere o número anterior
é precedida de parecer das entidades com competências respeitantes à área em causa, nomeadamente da Direcção Regional de Ordenamento do Território e da Direcção Regional do Ambiente.
3 - Nos respectivos pareceres, a Direcção Regional de Ordenamento do Território e a Direcção Regional do Ambiente procurarão acautelar a prossecução dos princípios e atender na elaboração dos POOC e salvaguardar a articulação e coerência da proposta com os objectivos e regras já consignados nos instrumentos de gestão territorial eficazes para o território em causa.
Artigo 2.º Competências
1 - A competência a que se refere o n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 309/93, de 2 de Setembro, preceito aditado pelo Decreto-Lei n.º
218/94, de 20 de Agosto, é exercida, mediante portaria conjunta, pelos secretários regionais que detenham a tutela dos sectores do ambiente e do ordenamento do território e pelos secretários regionais competentes em razão da matéria.
2 - A competência a que se refere o n.º 6 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 309/93, de 2 de Setembro, preceito aditado pelo Decreto-Lei n.º
218/94, de 20 de Agosto, é exercida, mediante portaria, pelo secretário regional que detenha a tutela do sector do ordenamento do território.
Artigo 3.º Revogação
É revogado o Decreto Legislativo Regional n.º 20/95/M, de 30 de Agosto.
Artigo 4.º Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
3. Em 15 de Maio de 2002 foi publicado na I Série-A do Diário da República o Decreto Legislativo Regional nº 7/2002/M, que contém as seguintes disposições:- Artigo 1.º Revogação
É revogado o Decreto Legislativo Regional n.º 1/2002/M, de 28 de Fevereiro.
Artigo 2.º Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e reporta os seus efeitos a 1 de Março de 2002.
No seu preâmbulo pode ler-se:-
'Através do Decreto Legislativo Regional n.º 1/2002/M, de 28 de Fevereiro, procedeu-se a adaptação do Decreto-Lei n.º 309/93, de 2 de Setembro, alterado pelos Decretos-Leis n.ºs 218/94, de 20 de Agosto, 151/95, de 24 de Junho, 113/97, de 10 de Maio, e 380/99, de 22 de Setembro, relativo à elaboração dos planos de ordenamento da orla costeira (POOC), visando-se, designadamente, possibilitar, anteriormente à aprovação de tais planos, a atribuição de usos privativos que implicassem novas construções e instalações fixas e indesmontáveis na área por eles abrangida, desde que localizadas em espaço classificado como de produção de solo urbano no Plano para o Ordenamento do Território na Região Autónoma da Madeira (POTRAM) ou em plano municipal de ordenamento do território eficaz.
Estabeleceu-se ainda como pressuposto dessa atribuição a emissão de prévio parecer pelas entidades com competências respeitantes à área em causa e, em ordem a acautelar uma adequada protecção do litoral, fixaram-se os critérios a considerar em tal pronúncia.
Sucede, porém, que estão prestes a ser concluídos os estudos que se reputaram indispensáveis a um correcto ordenamento da orla costeira, a consignar nos POOC, encontrando-se, assim, reunidas as condições para que seja dado prosseguimento à sua elaboração. Nesta conformidade, o Conselho do Governo Regional, pela Resolução n.º 49/2002, de 17 de Janeiro, determinou já, com tal propósito, a reactivação das respectivas comissões mistas de acompanhamento.
Perspectivando-se, pois, para breve a aprovação dos POOC, que abrangerão, por troços, toda a costa das ilhas da Madeira e de Porto Santo, não se justifica manter em vigor as normas do Decreto Legislativo Regional n.º
1/2002/M, cuja principal estatuição tem, aliás, uma natureza explicitamente transitória, caducando assim que os POOC viessem a configurar-se como instrumentos de planeamento territorial eficazes.
Acresce referir que o diploma não teve, entretanto, qualquer execução, pelo que, não sendo de considerar aspectos atinentes à protecção de direitos adquiridos, nem sequer expectativas juridicamente relevantes, determina-se que a sua revogação reporte os seus efeitos à data do início da respectiva vigência'.
4. Em face da revogação, operada pelo Decreto Legislativo Regional nº 7/2002/M, do Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M, revogação essa cujos efeitos se reportaram à data da entrada em vigor deste último diploma, coloca-se a questão de saber se o vertente pedido conserva, no caso, utilidade ou interesse relevante ou se, mesmo, não se haverá de concluir que o mesmo perdeu objecto.
Não se pode, é evidente, escamotear que, a ser proferida uma declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, os respectivos efeitos se produziriam ex tunc (cfr. nº 1 do artigo 282º da Constituição), pelo que não seria da mera circunstância de o diploma sobre o qual incide o pedido de declaração ter sido revogado que adviria inquestionavelmente a inutilidade ou falta de interesse no conhecimento desse pedido.
Simplesmente, no caso sub specie, é necessário não olvidar que a entrada em vigor do Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M ocorreu em 1 de Março de 2002, justamente no dia a que os efeitos revogatórios do Decreto Legislativo Regional nº 7/2002/M se reportaram.
A isto acresce, e decisivamente, que, como se extrai do transcrito exórdio do Decreto Legislativo por último citado, o Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M não teria tido qualquer execução em termos de conferência de qualquer permissão de atribuição de usos privativos da área territorial da Região Autónoma da Madeira abrangida pelos planos de ordenamento da orla costeira, permissão essa exercida nos termos do artº 1º daquele Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M.
A circunstância de, de facto, não terem ocorrido repercussões, mormente nas esferas jurídicas de quem, em abstracto, pudesse vir a peticionar a aludida atribuição de usos privativos, bem como a impossibilidade, decorrente da revogação do Decreto Legislativo Regional nº 1/2002/M, de, para o futuro, os normativos sindicados poderem produzir efeitos, conduz, desta arte, a que o Tribunal tenha de concluir que o pedido em apreço não carece de utilidade ou interesse relevante, para além de, inclusivamente, até ser sustentável a carência do respectivo objecto, atenta a eficácia retroactiva da sua revogação.
5. Em face do exposto, não toma este Tribunal conhecimento do presente pedido, por inutilidade superveniente. Lisboa, 5 de Junho de 2002- Bravo Serra Luís Nunes de Almeida Artur Maurício Guilherme da Fonseca Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Paulo Mota Pinto Maria Helena Brito José Manuel Cardoso da Costa