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Proc. nº 798/2001
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, em que figura como recorrente J... e como recorridos o Ministério Público e A..., a Relatora proferiu Decisão Sumária, ao abrigo do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional, no sentido do não conhecimento do objecto recurso, por não ter sido suscitada durante o processo qualquer questão de constitucionalidade normativa.
O recorrente vem agora reclamar para a Conferência, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da Lei do Tribunal Constitucional, sustentando que suscitou uma questão de constitucionalidade, antes da prolação da decisão recorrida, quando afirmou que 'nada, nem nenhum motivo, quer do sistema constitucional, quer da lei processual, proíbe ou limita o recurso, antes cabendo no inciso dos artigos 399º, 400º, a contrario, e 410º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, segundo o princípio e garantia fundamental da recorribilidade'.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da manifesta improcedência da reclamação.
Cumpre apreciar e decidir.
2. O reclamante sustenta que suscitou uma questão de constitucionalidade normativa nas alegações do recurso interposto perante o Supremo Tribunal de Justiça (momento que seria processualmente adequado, o que nunca foi questionado na Decisão Sumária sob reclamação), quando afirmou que nada na Constituição impede a admissibilidade do recurso e que a lei infraconstitucional o admite.
Tal questão foi expressamente apreciada e decidida na Decisão Sumária reclamada (o que, de resto, o reclamante admite).
Deverá, porém, ainda assim realçar-se que o reclamante, no recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, se limitou a afirmar que a Constituição não impede a admissibilidade do recurso e que os preceitos do Código de Processo Penal invocados, de acordo com a sua interpretação, consagram a admissão do recurso. Ora, tais afirmações de modo algum consubstanciam a suscitação durante o processo de uma questão de constitucionalidade normativa. Na verdade, como se explicitou na Decisão Sumária impugnada, para que se possa considerar suscitada uma questão de constitucionalidade normativa é necessário que o recorrente identifique uma dada dimensão normativa, que a confronte com um preceito ou princípio constitucional e que apresenta um fundamento ainda que sucinto da inconstitucionalidade suscitada.
Nada disso, porém, aconteceu nos presentes autos, como se sublinhou na Decisão Sumária impugnada. Com efeito, o reclamante apenas afirmou que a Constituição não impede a admissibilidade do recurso, o que não significa necessariamente que a imponha; concomitantemente, o reclamante sustentou que o Código de Processo Penal consagra a admissibilidade do recurso, o que também não implica necessariamente que a solução contrária viole a Constituição; por
último, nada foi dito quanto à conformidade à Constituição de qualquer interpretação que levasse à inadmissibilidade do recurso (interpretação que, como se mencionou, não chegou sequer a ser identificada, quando é inquestionável que o podia ter sido).
Não se afigura assim procedente sustentar que a questão de constitucionalidade normativa foi suscitada 'num plano de expressividade inverso' ou 'que interpretação contrária àquela que se reputava evidente e no sentido de o permitir [ao recurso], resultava num concebimento inconstitucional da Lei Processual Penal'. Como se demonstrou, a questão de constitucionalidade reportada às normas que o reclamante pretende que o Tribunal Constitucional aprecie não decorre de modo algum do que foi sustentado no recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça.
Não foi, portanto, suscitada qualquer questão de constitucionalidade normativa durante o processo, quando o podia ter sido (como se demonstrou na Decisão Sumária impugnada). Desse modo, o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido, não teve a possibilidade de apreciar a questão que o reclamante pretende submeter, no presente recurso de constitucionalidade, à apreciação do Tribunal Constitucional.
A reclamação é, assim, improcedente.
3. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando a Decisão Sumária reclamada, uma vez que não foi suscitada qualquer questão de constitucionalidade normativa durante o processo.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa,24 de Abril de 2002 Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa