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Processo nº 592/99
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I
1. - C..., Lda., recorreu contenciosamente, no Tribunal Judicial da comarca de Setúbal, nos termos do artigo 145º do Código de Registo Predial, do despacho do Conservador do Registo Predial dessa cidade que recusou a conversão em definitivo do registo da acção declarativa de nulidade de negócio jurídico sobre bem imóvel, julgada procedente, e indeferiu a reclamação hierárquica efectuada pela interessada.
O registo fora efectuado por dúvidas e respeitava à sentença proferida em 30 de Abril de 1992, confirmada por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de Julho de 1994, que declarou nulo o contrato de compra e venda celebrado entre a ora recorrente e A ..., por escritura de 31 de Agosto de 1987, lavrada no Cartório Notarial de Sesimbra.
A sentença proferida julgou improcedente o recurso e manteve integralmente a decisão recorrida.
Inconformada, a ora recorrente agravou para o Tribunal da Relação de Évora, alegando, além do mais, a inconstitucionalidade do nº 3 do artigo 92º e do artigo 145º do Código de Registo Predial (CRP), por violação da alínea b) do nº 1 do artigo 168º da Constituição.
O Tribunal da Relação de Évora, por acórdão de 21 de Janeiro de 1999, negou provimento ao agravo e confirmou a sentença recorrida.
No concernente à suscitada questão de inconstitucionalidade, o Tribunal não descortinou qualquer vício dessa natureza.
Escreveu-se no tocante a este ponto:
“É a própria recorrente que admite e defende – aliás com toda a justificação – a natureza eminentemente declarativa do sistema de registo predial em vigor, referindo o conhecido aforismo ‘o registo não dá nem tira direitos’, com o único afloramento do sistema constitutivo no caso da hipoteca que, se não for registada, não produz efeitos sequer em relação às próprias partes (artº 687º Cod. Civil). Porque é declarativo, instrumental e adjectivo, não é pela via do registo e nomeadamente através do regime de caducidade previsto no art. 92 nº 3 do Cod. Reg. Predial que pode ser afectado na sua substância ou exercício algum direito fundamental constitucionalmente garantido e em particular o direito à propriedade privada, ao ponto de, como lucidamente se refere na decisão recorrida, mesmo inscrita a título definitivo a aquisição, a presunção que resulta do registo é ilidível ou relativa, cedendo perante prova em contrário. Não pode por isso mesmo de modo algum considerar-se como faz a recorrente que a possibilidade aberta pelo art. 92 nº 3 do Cod. Reg. Predial de anotação oficiosa de caducidade do registo provisório das acções decorridos três anos (aliás renováveis a pedido dos interessados) tenha alguma influência ou ofenda o direito à propriedade; é este direito e o seu exercício que a Constituição garante, não as formas da sua declaração pública e ‘erga omnes’. Pretender-se que o art. 92 nº 3 do Cod. Reg. Predial implica violação dos Direitos Liberdades e Garantias dos cidadãos traduz-se, salvo o devido respeito, num manifesto exagero, o mesmo se devendo dizer quanto aos prazos e efeitos dos recursos previstos nos arts. 145 e 149 nº 3 do Cod. Reg. Predial, não sendo necessária nenhuma autorização para o Governo estatuir nessa matéria. Da conformidade constitucional das normas referidas resulta não haver razão nenhuma para que os Tribunais deixem de as aplicar, não existindo por isso necessidade de analisar a pretensão da recorrente quanto à repristinação das normas dos arts. 180, 249, 259 e 260 do Cod.- Reg. Predial de 1967.”
Inconformada, agravou de novo a recorrente, agora para o Supremo Tribunal de Justiça, além do mais, equacionando a mesma problemática de constitucionalidade .
O Supremo, por acórdão de 24 de Junho de 1999, negou provimento ao agravo.
Pronunciou-se deste modo, acerca da questão em referência:
“3ª Questão – a inconstitucionalidade do disposto nos artºs. 92º, nº 3
(manutenção das inscrições provisórias por natureza das inscrições em vigor pelo prazo de 3 anos, renováveis por períodos de igual duração, a pedido dos interessados, mediante comprovação documental da subsistência da razão da provisoriedade) e artº 145º (prazo de 20 dias para a interposição do recurso contencioso) e artº 149º, nº 3 – v. fls. 208 – (interposição do recurso contencioso suspende o prazo de caducidade do registo provisório) – por ofensa do disposto na al. b) do nº 1 do artº 168º da Constituição. A recorrente deduz essa ofensa da comparação daquelas disposições do CRPr com as correspondentes disposições do anterior CRPr de 1967: artº 180º, nº 1
(manutenção da inscrição provisória da acção até ser convertida em definitiva),
149º (prazo de 2 meses para interposição do recurso contencioso) 259º (a interposição do recurso contra a recusa de conversão em definitivo do registo provisório ou contra a realização do registo como provisório por dúvidas interrompe o prazo de caducidade do registo) e 260º (admissibilidade de reclamação hierárquica no prazo de dois meses). Confrontadas as disposições em causa com o disposto na al. b) do nº 1 do artº
168º da Constituição – que dispõe sobre a exclusiva competência da Assembleia da República para legislar, salvo autorização ao Governo, sobre direitos, liberdades e garantias – é manifesto não proceder a inconstitucionalidade com fundamento em reserva relativa da Assembleia. Na verdade aqueles preceitos do CRPr não versam sobre direitos, liberdades e garantias, isto é, não respeitam aos direitos fundamentais enunciados no Título II da parte I da Constituição ou direitos constitucionais de natureza análoga, versados nos artºs. 17º, 20º, 21º,
22º e 23º do mesmo diploma. Estão em causa prazos de recursos, efeitos destes e caducidade dos registos por falta de renovação pelos interessados. O diploma foi simplesmente aprovado pelo Governo no uso da sua competência legislativa corrente, nos termos do artº 201º, nº 1, a) da Constituição como nele se invoca. Daí que improcedam as consequências que a recorrente pretendia retirar da inconstitucionalidade: repristinação das aludidas disposições do anterior CRPr.”
2. - É do assim decidido que a interessada mais uma vez recorre, agora para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
Pretende ver apreciada a constitucionalidade das normas do nº 3 do artigo 92º, do artigo 145º e do nº 3 do artigo 149º, todos do Código do Registo Predial, aprovado pelo Decreto-Lei nº 224/84, de 8 de Julho, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis nºs. 355/85, de 2 de Setembro, e
60/90, de 14 de Fevereiro, que, em seu entender, violam o disposto nos artigos
62º e 168º, nº 1, alínea b), da Constituição da República.
Notificada para alegações, apresentou-as a recorrente oportunamente, assim concluindo:
“a) declarando-se a inconstitucionalidade – por violação do artº 62º e da alínea b) do nº 1 do artº 168º da Constituição – do nº 3 do artº 92º, do artº 145º do C.R. Predial de 1984 e nº 3 do artº 149º e mesmas disposições correspondentes do actual código, repristinando-se, em consequências as normas dos artºs. 180º,
249º, 259º e 260º do Código de Registo Predial anterior aprovado pelo DL 47 611 de 28.3.67; b) e, em consequência, da declaração das inconstitucionalidades atrás referidas, declarando o efeito interruptivo do recurso contencioso, tudo nos termos dos artigos repristinados do C.R. Predial de 1967 – artigos 180º, 249º, 259º e
260º.”
Com efeito, defende a recorrente que as apontadas normas do novo Código de Registo Predial – aprovado pelo Decreto-Lei nº 224/84, de 6 de Julho, sem prejuízo das posteriores alterações – são materialmente inconstitucionais, na medida em que promovem o cancelamento oficioso e injustificado, pelo conservador do registo predial, dos registos provisórios por natureza das decisões judiciais, mesmo na pendência dessas acções, ao alterarem tendencialmente a natureza declarativa do registo predial, “numa espécie de criação dissimulada e um sistema de registo constitutivo”, o que, em seu entender, perturba a coerência da defesa do próprio direito de propriedade e da sua transmissão e afecta, de forma injustificada, desproporcionada e não razoável a garantia constitucional desse direito, que o artigo 62º consagra.
Por outro lado, são as mesmas normas organicamente inconstitucionais, restritivas que são do exercício e garantia do direito de propriedade dos cidadãos, uma vez que, ao mandar eliminar do registo predial os registos das acções judiciais, anteriormente às decisões proferidas nestas, o Governo autorizou, sem para o efeito se encontrar parlamentarmente credenciado, o apagamento oficioso do registo predial de um importante elemento dissuasor de alienação fraudulenta de coisas ou direitos litigiosos.
O magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, por sua vez, concluiu assim:
“1º - Não constitui limitação ou restrição desproporcionada ao direito de propriedade o estabelecimento da regra segundo a qual cabe às partes em acção que verse sobre direitos sujeitos a registo predial, como condição da oponibilidade a terceiros da sentença que venha a ser proferida, o ónus de proceder ao registo da acção e de requerer a respectiva renovação, sempre que a mesma se não mostre definitivamente julgada no prazo de 3 anos.
2º - E sendo certo que é o incumprimento – por manifesta negligência do interessado – de tal ónus que determina a caducidade do registo provisório da acção, impedindo que a sentença nela proferida seja automaticamente oposta ao terceiro que, não sendo parte na causa, haja adquirido derivadamente, por acto entre vivos, direitos na pendência desta.
3º - Termos em que deverá improceder o presente recurso.”
Também o Conservador do Registo Predial em questão veio igualmente aos autos, defendendo a improcedência do recurso.
II
1. - A recorrente dimensionou oportunamente a questão de constitucionalidade, reportando-se às normas do nº 3 do artigo 92º e dos artigos
145º e 149º, nº 3, do Código de Registo Predial (CRP), na redacção então vigente.
O primeiro destes normativos, pertinente à provisoriedade por natureza do registo, preceitua – após enunciação das inscrições que devem ser registadas provisoriamente, constantes dos seus nºs. 1 e 2 –, no seu nº 3:
“3. –As inscrições referidas nas alíneas a) a e) e j) a o) do nº 1, bem como na alínea c) do nº 2, se não forem também provisórias com outro fundamento, mantêm-se em vigor pelo prazo de três anos, renovável por períodos de igual duração, a pedido dos interessados, mediante documento que comprove a subsistência da razão da provisoriedade.”
Na tese defendida pela recorrente, a legislação anterior, mantendo o registo provisório até ao trânsito em julgado da acção, podendo a sua conversão ser requerida no prazo de dois meses a contar dessa data
– cfr. artigo 180º do Código aprovado pelo Decreto-Lei nº 47.611, de 28 de Março de 1967 – garantia mais adequadamente os direitos dos interessados no registo das acções.
Por sua vez, avança a recorrente, quanto às normas do artigo 145º - na medida em que se fixa em 20 dias, a contar da notificação da decisão que julgar improcedente o recurso hierárquico, o prazo para a interposição de recurso contencioso – e do nº 3 do artigo 148º - nos termos do qual o prazo de caducidade do registo provisório, com a interposição do recurso, apenas suspende (e não interrompe) o prazo de caducidade do registo preventivo – concretizam elas, inconstitucionalmente também, uma diminuição de garantias, relativamente às normas paralelas do Código anterior, para mais não autorizadas parlamentarmente.
Ora, para além de uma certa imprecisão na delimitação objectiva do recurso – mormente, é evidente o lapso de menção de um nº 3 do artigo 149º, que inexiste, quando claramente se pretende referir o nº 3 do artigo 148º - a que acresce uma equacionação tardia de uma dada dimensão de inconstitucionalidade, qual seja a orgânica – não assiste razão à recorrente no tocante a qualquer das questões por si equacionadas – assente que não está em causa a decisão judicial em si mesma considerada e o modo como resolveu juridicamente a questão que lhe foi posta, subtraída que está à competência cognoscitiva deste Tribunal.
2. – Considerou-se, então, que o recurso de constitucionalidade se deve circunscrever à norma do nº 3 do artigo 92º do CRP, já que a decisão recorrida não aplicou efectivamente qualquer outra das convocadas.
Notificada para se pronunciar a este respeito, a recorrente veio aos autos manifestar a sua falta de acordo quanto à pretendida delimitação do objecto do recurso. Em seu modo de ver, o conjunto normativo por si impugnado representa o estabelecimento de alterações ao regime dos registos provisórios por natureza, relativamente ao texto do Código anterior, que, não obstante não ter sido esse o entendimento acolhido nos acórdãos recorridos, diminuem injustificadamente as garantias processuais de defesa, constitucionalmente garantidas, o que se levou a cabo sem credencial parlamentar.
Importa, por consequência, tomar posição sobre esta questão que previamente se perfila.
2.1. - É um facto que, no domínio do Código anterior – cujo texto inicial foi aprovado pelo Decreto-Lei nº 47 611, de 28 de Março de 1965 – o prazo de interposição do recurso contencioso fixou-se em dois meses, “a contar da data da apresentação do acto recusado ou do registo provisório [...]”, passando a ser, com o diploma de 1984, de “vinte dias a contar da data da notificação da decisão que tiver julgado improcedente o recurso hierárquico”
(cfr., respectivamente, o nº 1 do artigo 249º e o nº 2 do artigo 145º).
Por sua vez, nos termos do nº 3 do artigo 148º impugnado, fica suspenso o prazo de caducidade do registo provisório, até lhe serem anotados os factos a que o nº 2 do mesmo preceito se refere, enquanto que na vigência do Código anterior a interposição de recurso ou de reclamação contra a recusa de conversão em definitivo de um registo provisório ou contra a realização do registo provisório por dúvidas, interrompia o prazo de caducidade do registo, até lhe ser averbada a improcedência ou desistência da impugnação ou, no caso de recurso, a sua deserção ou paragem por mais de trinta dias, como observa, apoiada nos artigos 259º e 260º, nº 3, do texto de então (cfr. – Isabel Pereira Mendes in Código do Registo Predial Anotado, 7ª ed., Coimbra,
1995, pág. 303), sublinhando que “hoje [ou seja, no domínio do Código de 1984] a interposição do recurso ou reclamação já não interrompe, mas suspende o prazo de caducidade do registo provisório (v. o artº 11º, nºs. 2 e 3), até lhe serem anotados (e não averbados) os factos atrás referidos [...]”.
2.2. - Insiste a recorrente na apreciação do objecto do recurso, tal como delimitado foi na sua primitiva amplitude.
Isto porque, em síntese, não foi parlamentarmente credenciada a opção do legislador do novo Código (de 1984) ao encurtar prazos, como o de recurso, e ao diminuir outras garantias processuais, não justificadamente, destinadas à defesa de direitos e garantias constitucionalmente protegidos, como ainda ao atribuir efeito apenas suspensivo ao prazo de caducidade do registo provisório (quando no regime anterior o mesmo recurso e a reclamação tinham efeito interruptivo do mesmo prazo).
No entanto, em bom rigor, a decisão recorrida – repete-se – não aplicou verdadeiramente as normas em questão.
Por um lado, tendo o recurso contencioso sido interposto no prazo legal, não se suscitava obviamente qualquer questão que tornasse necessárias a invocação e aplicação da norma que rege sobre o prazo de interposição do recurso, pelo que não foi, nem podia ter sido – como observa o Ministério Público – aplicada a norma do artigo 145º do Código.
Por sua vez, e como observa o mesmo magistrado, no caso dos autos não se levantou qualquer questão que pudesse conduzir à aplicação do disposto no nº 3 do artigo 148º, atribuindo ao recurso a reclamação dos actos do Conservador efeito suspensivo, e não interruptivo, do prazo de caducidade do registo provisório. É que, no caso vertente, não foi interposto qualquer recurso na pendência do registo provisório da acção, que pudesse tornar pertinente a determinação do respectivo efeito – o único recurso foi interposto quando aquele registo provisório já há muito havia caducado, por omissão do pedido da respectiva renovação.
3. - Entende-se, por conseguinte, que o recurso deve ser delimitado à norma do nº 3 do artigo 92º.
3.1. - Dispõe este preceito, transcrito supra, sobre a manutenção das inscrições provisórias por natureza das inscrições em vigor pelo prazo de 3 anos, renováveis por períodos de igual duração, a pedido dos interessados, mediante comprovação documental da subsistência da razão da provisoriedade.
Sendo certo que, no Código anterior, o registo provisório podia ser mantido até ao trânsito em julgado da acção e a sua conversão ser requerida no prazo de dois meses a contar dessa data, como também já se assinalou, poderá surpreender-se, na iniciativa do legislador governamental, no exercício da sua competência legislativa própria, uma iniciativa legislativa constitucionalmente censurável dado se estar no domínio dos direitos, liberdades e garantias, contendo a medida em causa uma projecção gravosa de garantia do direito de propriedade privada consagrado no artigo 62º da Lei Fundamental?
3.2. - Desde já se responde negativamente.
Com efeito, a norma do nº 3 do artigo 92º, ao impor às partes, em acção pendente, o ónus de renovar o registo provisório da acção sempre que esta perdure para além de três anos, de modo a, assim, se evitar a caducidade do registo e, do mesmo passo, a garantir a oponibilidade a terceiros da decisão que vier a ser proferida, não é inconstitucional, seja na perspectiva orgânica, seja na material.
Na verdade, e como observa o Ministério Público nas suas contra-alegações, no nosso ordenamento jurídico tem vigorado tradicionalmente a regra segundo a qual as partes em acção que versa sobre direitos sujeitos a registo têm o ónus de registar provisoriamente a sua pretensão (e a pendência da causa que a mesma origina), de modo a permitir que a decisão judicial que venha a ser proferida possa retroagir à data do início da acção.
A inovação introduzida consiste, tão só, na imposição do
ónus de renovar o pedido de manutenção da inscrição provisória da acção, se esta não tiver alcançado o seu termo no prazo de três anos.
Ora, torna-se evidente que o estabelecimento deste ónus não constitui uma limitação ou restrição desproporcionada ao direito de propriedade e, de resto, é de fácil observação, assim se acautelando a plena e automática oponibilidade da sentença final a eventuais terceiros que, na pendência da causa, possam ter adquirido derivadamente direitos sobre o bem em litígio.
De resto – e consoante a jurisprudência uniforme deste Tribunal – o direito de propriedade privada não é constitucionalmente protegido em termos absolutos, acautelando o nº 2 do artigo 62º, apenas, o direito de não se ser arbitrariamente privado da propriedade e, bem assim, o direito a uma indemnização em caso de requisição e de expropriação opor utilidade pública
(neste sentido, entre tantos outros, citem-se os acórdãos nºs. 257/92, 267/95 e
4/96, publicados no Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 1993, 20 de Junho de 1995 e 30 de Abril de 1996, respectivamente).
Por outro lado, e no tocante a uma hipotética inconstitucionalidade orgânica, a matéria em causa tem natureza estritamente procedimental e registral – como se salientou no aresto recorrido – recortando-se em parâmetros que não conflituam com a demonstração substancial da existência e titularidade dos direitos reais sobre o bem em causa. Como observa o Ministério Público, na peça processual já aludida, os efeitos alcançados, em termos de direito civil, com a sentença que julga nulo negócio translativo da propriedade de certo imóvel, não ficam obviamente precludidos com a realização do registo da sentença como meramente provisório, pelo facto de entretanto – e como decorrência de caducidade do registo provisório da acção – ter sido registada a aquisição de um direito por parte de terceiro (que não figurou como parte em tal acção de declaração de validade), apenas resultando para a recorrente o ónus de impugnar o acto translativo de propriedade (doação) em nova acção proposta contra o adquirente, aí alegando e demonstrando a invalidade substancial de tal negócio jurídico.
De qualquer modo, se é certo que o direito de propriedade privada tem sido considerado um direito de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias – como tal beneficiando do regime previsto no artigo 18º da Constituição – não menos exacto é que a garantia desse direito, e da sua transmissão, há-de processar-se “nos termos da Constituição”, como decorre do nº 1 do próprio artigo 62º, o que significa que a sua mensuração será feita no âmbito dos limites e dos termos definidos no próprio texto constitucional. E, como vimos, este não o concebe em termos absolutizantes.
III
Em face do exposto, nega-se provimento ao recurso.
Custas pela recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 15 unidades de conta.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 2002- Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida