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Proc. nº 440/2001
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I Relatório
1. M... instaurou, junto do Tribunal do Trabalho do Porto, acção declarativa comum contra I..., Lda., pedindo a sua reintegração no posto de trabalho, o pagamento da remuneração e prestações laborais, o pagamento de juros e o pagamento de custos e encargos legais.
O Tribunal do Trabalho do Porto, por decisão de 23 de Junho de 2000, julgou a acção procedente, condenando a ré a pagar à autora o montante de
777.985$00, acrescido de juros.
2. I..., Lda., interpôs recurso da decisão de 23 de Junho de 2000, para o Tribunal da Relação do Porto.
Nas contra-alegações apresentadas por M..., afirma-se o seguinte: IV O entendimento da recorrente de que em caso como o dos autos, em que, por não ter sido cumprido, ab initio, a forma escrita em contrato temporário, este se transforma em contrato sem termo, podendo neste aplicar-se e invocar-se o prazo do período experimental previsto para este tipo de contrato, como forma válida da sua rescisão, ofende o princípio constitucional consagrado no Artº 53° da Constituição da República Portuguesa, que assegura a segurança no emprego e a perenidade do contrato de trabalho. A norma no n° 2 do Artº 19º do D.L. 358/89 de 17.10, na redacão da Lei n° 146/99 de 1.9. interpretada da forma pretendida pela R. seria manifestamente inconstitucional, inconstitucionalidade esta que aqui se invoca para todos os efeitos legais.
O Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 15 de Maio de 2001, considerou o seguinte:
3. O direito O objecto do recurso restringe-se à questão de saber se a cessação do contrato de trabalho ocorreu ou não no decurso do período experimental. Na sentença recorrida, entendeu-se que as partes quiseram celebrar um contrato de trabalho temporário, mas que tal contrato tinha de ser considerado sem termo, por não ter sido reduzido a escrito e por não se ter provado a tese da recorrente de que a não redução a escrito era imputável à recorrida. Decidiu-se bem, dado que a solução não podia ser outra, face ao disposto nos artºs 18°, n° 2 e 19°, n° 2, do DL n° 358/89, de 17/10, na redacção que lhe foi dada pela Lei n° 146/99, de 1/9 e no artº 42°, nº 3, do regime aprovado pelo DL n° 64A/89, de 27/2. Perante a factualidade provada, não há dúvida de que as partes quiseram celebrar um contrato de trabalho temporário, mas tal contrato, nos termos das disposições citadas, tem de revestir a forma escrita (artº 18°, n° 2), considerando-se contrato sem termo se tal formalidade não for observada (artº 19°, n° 2 e artº
42°, n° 3). Na contestação, a recorrente imputou à recorrida a falta de redução a escrito do contrato, alegando que ela teria levado o contrato para casa para assinar , não o tendo devolvido com o propósito de fazer com o que o mesmo se transforma-se em contrato sem termo. Todavia, como bem salienta o Mmo Juiz, a recorrente não logrou provar a sua tese. Não provou que a recorrida tivesse agido com o alegado intuito doloso. Apenas se provou que a recorrida não assinou o contrato, por não estar de acordo com as condições que tinham sido acordadas. Estamos, por isso, perante um contrato sem termo. A recorrente não contesta a decisão nessa parte e aceita expressamente que o contrato se converteu, ope legis e desde o momento inicial da prestação, em contrato de trabalho sem termo
(n° 4.1 das alegações). A discordância da recorrente restringe-se à questão da cessação do contrato, que ela considera lícita, por ter ocorrido dentro do período experimental. O Mmo Juiz não entendeu assim. Apesar de ter considerado o contrato como um contrato sem termo, o Mmo Juiz considera que o regime do período experimental dos contratos sem termo não era aplicável ao caso. Tal regime só seria aplicável se, na intenção das partes, o contrato fosse ab initio um contrato de trabalho sem termo. Quando muito, o contrato estaria sujeito ao período experimental de
15 dias que seria aplicável se o contrato tivesse sido reduzido a escrito, período que já teria decorrido quando a recorrente o fez cessar, em 20 de Outubro. Segundo o Mmo Juiz a quo:
'... O contrato considera-se sem termo para os efeitos em que puder como tal ser considerado - e um desse efeitos não é permitir subverter e tornar inoperante a própria Lei. E seguramente que não se considera como sem termo para o efeito de admitir um período experimental de duração duas vezes maior do que a duração que as próprias partes tinham previsto para todo o contrato - esta seria uma remissão absolutamente incoerente. No máximo dos máximos o que se poderia admitir era subsistir o período experimental inicialmente aplicável ao contrato e que no caso, visto a Ré ter comunicado uma cessação do contrato para 20 de Outubro e o contrato ter começado a produzir efeitos em 29 de Setembro, teria já decorrido.' Salvo o devido respeito, o entendimento perfilhado não tem o mínimo apoio na lei aplicável. Por não ter sido reduzido a escrito, o contrato realmente querido pelas partes (o contrato de trabalho temporário) passou a ser ab initio e por força da lei um contrato sem termo. Por isso, é-lhe aplicável, ab initio, o regime dos contratos sem termo, incluindo as disposições relativas ao período experimental. Não lhe podem ser aplicados dois regimes: o regime dos contratos a termo para o período experimental e o regime dos contratos sem termo para o resto, nomeadamente para efeitos da sua cessação. Ora, sendo assim, como entendemos que é, a procedência do recurso é inevitável, pelas seguintes razões. Nos contratos de trabalho sem termo, o período experimental para a generalidade dos trabalhadores é de 60 dias (artº 55°, n° 2, a) do regime aprovado pelo DL nº
64-A/89). A recorrida iniciou a prestação da sua actividade em 29.9.99 e a recorrente fez cessar o contrato em 20.10.99, ou seja, antes de os 60 dias terem ocorrido. Durante o período experimental, salvo acordo escrito em contrário, qualquer das partes pode rescindir o contrato sem aviso prévio e sem necessidade de invocação de justa causa, não havendo direito a qualquer indemnização (n° 1 do citado artº 55°). Não estando provada existência de qualquer acordo das partes relativamente ao período experimental, era lícito à recorrente rescindir, como rescindiu, o contrato sem aviso prévio e sem invocação de justa causa, no dia 20.10.99, sem que tal rescisão confira à recorrida o direito a qualquer indemnização.
Consequentemente, o tribunal julgou o recurso procedente, revogando a sentença recorrida.
3. M... interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição da norma do nº 2 do artigo 19º do Decreto-Lei nº
358/99, de 17 de Outubro, na redacção da Lei nº 146/99, de 1 de Setembro.
Junto do Tribunal Constitucional a recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo: EM CONCLUSÃO:
1ª - O Douto Acórdão recorrido interpretou o disposto no n° 2 do Artº 19 do D.L.
358/89, entendendo que, com a transformação de um contrato temporário em contrato sem termo, por não ter sido cumprida a exigência inicial da forma escrita, se pode aplicar e invocar o prazo do período experimental previsto para este tipo de contratos como forma válida da sua rescisão.
2ª - Esta interpretação e aplicação do disposto no referido n° 2 do Artº 19° do D.L. 358/89, efectuada desta forma lata e meramente automática, permite a efectivação de despedimentos sem justa causa, pondo-se em causa a Segurança no Emprego. Na verdade,
3ª - Resulta claramente do preâmbulo do Decreto-Lei n° 358/89 que este diploma tendo visado responder a preocupações de flexibilidade do regime para satisfazer necessidades de gestão, visa igualmente criar penalizações efectivas em ordem a prevenir tendências de marginalidade que este tipo de relação de trabalho facilita e convida.
4ª - Neste enquadramento, a remissão constante no referido n° 2 do Artº 19 do D.L. 358/89 para a consequência prevista no n° 3 do Artº 42 do D.L. 64-A/89 - transformação do contrato temporário em contrato sem termo - , funciona como remissão sancionatória, pelo que aplicar aqui os normativos legais sobre o período experimental dos contratos sem termo, significaria anular totalmente os mecanismos previstos colocados na lei com vista à prevenção das tendências de marginalidade da relação de trabalho temporário.
5ª - Ou, como se refere na douta sentença da 1ª instância, considerando-se o contrato em causa nos autos sem termo por imposição legal, é óbvio que a lei não permite que a consequência que ela própria estabelece seja afastada, sob pena de admitir a sua própria inutilidade e falta de sentido. 'O contrato considera-se sem termo para os efeitos em que pode como tal ser considerado - e um desses efeitos não é o permitir subverter e tornar inoperante a própria lei'. Isto é,
6ª - Para a lei poder ser operante, a transformação do contrato em contrato sem termo, tem que operar 'ex nunc'.
7ª - A facilista, linear e automática tese do Douto Acórdão recorrido esvasiaria o conteúdo da lei e as cominações que a mesma impõe. Mais e fundamentalmente,
8ª - Permitiria a efectivação de verdadeiros despedimentos sem justa causa, pondo em absoluta crise o 'direito à vida do próprio trabalhador' - (Gomes Canotilho e Vitor Moreira, Fundamentos da Constituição, 112), que é a garantia da observância da proibição constitucional dos despedimentos sem justa causa. Efectivamente,
9ª - A passar a tese do Douto Acórdão recorrido, meio fácil, para se furtarem ao princípio constitucional da Segurança no Emprego, seria dado às empresas de trabalho temporário quando necessitassem de efectuar contratações por prazos idênticos aos dos autos - 30 dias - limitar-se-iam a não cumprir a exigência da forma escrita inicial do trabalho temporário, e veriam premiada esta sua infracção, pois poderiam afinal dispôr a seu bel prazer de trabalhadores e da manutenção ou não do seu contrato, então já sem termo, por um período bem maior que podia ir aos 60 ou até aos 90 dias!!!
10ª - O entendimento seguido no Douto Acórdão recorrido relativo ao disposto no n° 2 do Artº 19 do D.L. 358/89 é inconstitucional, manifesta e flagrantemente violador que é do disposto no Artº 53 da C.R.P..
Por seu turno, a recorrida contra-alegou, concluindo o seguinte: CONCLUSÕES: a) A consequência para a falta de redução a escrito do contrato temporário é a conversão deste num contrato sem termo, nos termos do disposto nos arts. 18º, n° 2 e 19°, n° 2, do DL n° 358/89, de 17/10, na redacção que lhe foi dada pela Lei n° 146/99, de 01/09, e no art º 42°, n° 3, do regime aprovado pelo DL n° 64-A/89, de 27/02; b) Por não ter sido reduzido a escrito, o contrato realmente querido pelas partes passou a ser ab initio e por força da lei um contrato sem termo; c) Sendo-lhe aplicável ab initio o regime dos contratos sem termo, incluindo as disposições relativas ao período experimental; d) Não lhe podem ser aplicados os dois regimes (do contrato sem termo e do contrato a termo, a belo prazer e consoante os interesses da Recorrente); e) A interpretação efectuada pelo Digno Tribunal da Relação do Porto não merece qualquer censura; f) A ora Recorrida rescindiu licitamente o contrato durante o período experimental, sem aviso prévio e sem invocação de justa causa, sem que tal rescisão confira à Recorrente o direito a qualquer indemnização; g) Porquanto, ao contrário do alegado pela Recorrente a interpretação da norma do n° 2 do artº 19° do DL nº 358/89, de 17/10, na redacção da Lei nº
146/99, de 01/09; não põe em causa a segurança no emprego, nem permite despedimentos sem justa causa; h) Obviamente que ao converter-se o contrato de trabalho temporário num contrato sem termo, há que lhe aplicar in toto o regime do contrato sem termo, nomeadamente para efeitos da sua cessação; i) Não tendo por consequência havido qualquer violação ao preceituado no artigo 53° da CRP; j) A Recorrente interpreta como melhor lhe convém o preâmbulo do DL
358/99; k) Ao contrário do que alega a Recorrente o preâmbulo do citado diploma legal não prossegue objectivos de repressão nem de condenação nesta modalidade de contratação; l) De facto, esta modalidade de contratação veio permitir safisfazer necessidades de mão-de-obra pontuais, imprevistas, ou de curta duração; m) Assumindo uma relevante resposta de regularização no mercado do emprego por permitir a absorção de mão-de-obra para serviços ou actividades que, de outra forma, ficariam por realizar, n) Permitindo também dar experiência profissional aos trabalhadores, que na maior parte das vezes não a teriam se não tivessem oportunidade de recorrer ao trabalho temporário; o) A ora Recorrente olvidou-se que o direito à segurança no emprego não garante apenas a permanência da relação do trabalho, mas também o exercício do emprego; p) Tanto que as empresas de trabalho temporário afectam à formação profissional dos trabalhadores temporários, pelo menos, 1% do seu volume anual de negócios nesta actividade (cfr. n° 3 do artº 9° do já citado diploma legal); q) Uma das formas de flexibilização laboral no nosso ordenamento jurídico
é precisamente o regime do contrato de trabalho temporário; r) Este diploma prossegue os referidos objectivos como possíveis de permitir restrições ao direito e segurança no emprego; s) Uma das formas de flexibilização laboral no nosso ordenamento jurídico
é precisamente o regime do contrato de trabalho temporário; t) Este diploma prossegue os referidos objectivos como possíveis de permitir restrições ao direito e segurança no emprego; u) Por conseguinte, não enferma de inconstitucionalidade o entendimento seguido no Douto Acórdão recorrido quanto ao disposto no n° 2 do artº 19° do DL
358/89, não violando o preceituado no artº 53° da CRP.
Cumpre decidir.
II Fundamentação
4. A norma impugnada tem a seguinte redacção: Artigo 19º Menções obrigatórias
1. O contrato de trabalho temporário deve conter as seguintes menções: a) Nome ou denominação e residência ou sede dos contraentes e número e data do alvará de autorização para o exercício da actividade de empresa de trabalho temporário; b) Indicação dos motivos que justificam a celebração do contrato, com menção concreta dos factos e circunstâncias que integram esses motivos; c) Categoria profissional ou descrição genérica das funções a exercer; d) Local e período normal de trabalho; e) Remuneração; f) Início da vigência do contrato; g) Termo do contrato, de acordo com o disposto no artigo 9º; h) Data da celebração.
2. A falta da menção exigida na alínea b) do número anterior ou a inobservância de forma escrita têm a consequência prevista no nº 3 do artigo 42º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro.
(...)
O artigo 42º do Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro, tem a seguinte redacção: Artigo 42º Forma
1. O contrato de trabalho a termo, certo ou incerto, está sujeito a forma escrita, devendo ser assinado por ambas as partes e conter as seguintes indicações: a) Nome ou denominação e residência ou sede dos contraentes; b) Categoria profissional ou funções ajustadas e retribuição do trabalhador; c) Local e horário de trabalho; d) Data de início do trabalho; e) Prazo estipulado com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respectiva celebração ou o nome do trabalhador substituído; f) Data da celebração.
2. Na falta da referência exigida pela alínea d) do nº 1, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração.
3. Considera-se contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) do nº 1 ou, simultaneamente, nas alíneas d) e f) do mesmo número.
O Tribunal da Relação do Porto, no acórdão impugnado, considerou que o contrato celebrado entre a recorrente e a recorrida é um contrato de trabalho sem termo, uma vez que não foi observada a forma escrita. O tribunal considerou, também, que ao contrato celebrado é 'aplicável, ab initio, o regime dos contratos sem termo, incluindo as disposições relativas ao período experimental'. Sendo tal período de 60 dias, o Tribunal da Relação do Porto concluiu que a rescisão ocorrida foi lícita.
A recorrente sustenta, porém, que a norma impugnada, interpretada no sentido de ser aplicável o regime global do contrato sem termo quando o contrato a termo não observa a forma escrita, viola o disposto no artigo 53º da Constituição, na dimensão que garante a segurança no emprego e que proíbe os despedimentos sem justa causa.
5. Preliminarmente sublinhar-se-á que a recorrente não impugna, nos presentes autos, o regime legal do período experimental do contrato sem termo. O que a recorrente impugna nos presentes autos é a dimensão normativa, segundo a qual a norma remissiva do preceito impugnado abrange, nos casos de contrato a termo sem observância da forma escrita, todo o regime do contrato sem termo, incluindo o período experimental, ou dito de outro modo, a recorrente considera inconstitucional a norma que determina a aplicação ab initio ao contrato de trabalho a termo do regime do contrato de trabalho sem termo, incluindo as regras relativas ao período experimental.
Violará, então, tal norma o disposto no artigo 53º da Constituição, precisamente por, na remissão operada, ser abrangido também o regime do período experimental do contrato sem termo?
A resposta, como se demonstrará, é negativa.
6. A norma que determina a aplicação do regime do contrato sem termo aos casos em que o contrato a termo não observou a forma escrita consubstancia uma concretização da garantia de segurança no trabalho. Na verdade, essa norma visa evitar situações de precaridade, de indefinição e de indefesa do trabalhador relativamente a comportamentos arbitrários da entidade patronal. Respeitada a forma escrita, o contrato vigorará nos termos acordados e constantes do respectivo documento; não tendo sido respeitada tal forma, o contrato terá o regime do contrato sem termo.
A garantia da segurança no trabalho não impõe, porém, que nesta específica constelação de situações se proceda a uma selecção dos aspectos do regime do contrato sem termo aplicáveis. Na verdade, aplicando-se o regime do contrato sem termo, não viola a Constituição o entendimento segundo o qual o contrato em causa cessará pelo modo legal em que essa categoria de contratos pode cessar, pois também esta configuração do regime legal exprime a ponderação conjuntamente com a segurança no trabalho do trabalhador de outros interesses, nomeadamente da entidade patronal, que se visam acautelar. Não se divisa qualquer princípio ou norma constitucional segundo a qual se imporia a não aplicação do respectivo regime do período experimental, quando seja aplicável o regime do contrato sem termo a um certo caso específico, desconsiderando-se nestas situações a composição de interesses constante do regime legal do contrato sem termo. Segundo a perspectiva do acórdão recorrido, não se trata da aplicação do período experimental legalmente previsto para o contrato sem termo a um contrato de trabalho temporário. O que acontece, será antes, por força da aplicação da norma impugnada, a transformação de um contrato que as partes configuraram inicialmente como temporário num contrato por tempo indeterminado, ao qual será naturalmente aplicável o respectivo regime.
Nessa medida, a circunstância de o contrato celebrado ter, à partida, uma duração inferior ao período experimental, não tem de afectar a conclusão alcançada. E essa circunstância (a duração prevista), na lógica da decisão recorrida, resultando de um acordo inicial das partes, não chega a efectivar-se, uma vez que o contrato celebrado passa a ser um contrato de trabalho por tempo indeterminado, em virtude da inobservância da forma escrita.
Assim, dentro da mesma lógica, os 60 dias do período experimental reportam-se, não a um contrato de trabalho a termo, mas sim a um contrato de trabalho sem termo. Na verdade, a aplicação do período de 20 dias (como pretende a recorrente, ao citar a decisão da 1ª instância) implicaria a existência de um contrato de trabalho a termo, o que, segundo a decisão recorrida, por força da norma impugnada, não existe. A argumentação da recorrente pressupõe, todavia, que os princípios constitucionais invocados permitem, ou melhor, impõem, no caso dos autos, a escolha dos aspectos de regime concretamente mais favoráveis do contrato sem termo e do contrato a termo, originando, assim, um terceiro regime contratual atípico. Não tendo o Tribunal Constitucional que apreciar a validade da interpretação do tribunal recorrido ou da recorrente (o entendimento da recorrente implicaria a colocação do trabalhador que celebra um contrato de trabalho temporário sem observância da forma escrita numa situação mais vantajosa relativamente ao trabalhador que celebra um contrato de trabalho por tempo indeterminado), já no plano da constitucionalidade não existem razões que imponham uma tal composição de regimes com a desconsideração dos outros interesses assinalados, de modo a que, em casos deste tipo, o trabalhador venha a beneficiar de um contrato de trabalho por tempo indeterminado sem período experimental (ou com o período experimental mais curto do contrato de trabalho temporário). Aliás, não estando em causa, como se sublinhou já, a impugnação, na perspectiva de constitucionalidade, do regime legal do período experimental do contrato sem termo, há que concluir que a sua aplicação a um contrato que, por força da inobservância da forma escrita exigida para um contrato a termo, se passou a considerar sem termo não viola qualquer princípio constitucional. Improcede, portanto, o presente recurso.
III Decisão
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide negar provimento ao presente recurso, confirmando, consequentemente, a decisão recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa, 6 de Maio de 2002 Maria Fernanda Palma Paulo Mota Pinto Bravo Serra Guilherme da Fonseca José Manuel Cardoso da Costa