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Processo n.º 716/12
2.ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
Relatório
Por sentença do Tribunal Judicial de Condeixa-a-Nova foi o arguido A. condenado pela prática, em concurso efetivo, de dois crimes de importunação sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º do Código Penal, na pena de 85 dias de multa, por um deles, e na pena de 105 dias de multa pelo outro e, em cúmulo jurídico, na pena única de 170 dias de multa, à taxa diária de € 10,00, perfazendo a quantia total de € 1.700,00.
Inconformado, o arguido recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 20 de dezembro de 2010, concedeu parcial provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida no que respeita ao quantitativo diário da multa, e condenou o arguido na pena única de 170 dias de multa, à taxa diária de €. 7,00, perfazendo a quantia total de € 1.190,00, mantendo, no mais, a sentença recorrida.
O arguido invocou a nulidade deste acórdão, por omissão de pronúncia, em relação a diversas questões e o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 27 de junho de 2012, deferiu parcialmente o pedido, suprindo o vício em causa, mantendo, no entanto, inalterada a condenação.
O arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, não tendo tal recurso sido admitido.
O arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), nos seguintes termos:
“Dando cumprimento ao plasmado nos n.ºs 1 e 2 do art. 75º-A da LTC, refere-se que o presente recurso versa sobre seis questões concretas e objetivas: I) inconstitucionalidade da interpretação das normas legais em causa [arts. 358º e 379º nº 1 b) CPP] bem como II) do ónus sobre o arguido no sentido de aventar explicitação para a mentira das vítimas; III) direito ao conhecimento integral do recurso e sua não cindibilidade, IV) preenchimento do tipo de ilícito (art. 170º CP) e convocação do Direito Penal (a fundamentar a nulidade por omissão de pronúncia supra reclamada!), V) recorte do tipo legal de crime em causa (importunação sexual) bem como VI) o entendimento do julgamento da matéria de facto em sede de recurso (maxime a questão de plausibilidade da resposta como explicação da realidade em caso de variedade de soluções possíveis!) conjugado com preterição do princípio in dubio pro reo em nome da livre valoração da prova e quase santidade de tal princípio.
Tais questões foram validamente suscitadas no recurso apresentado por fax no dia 09 de junho de 2011 [maxime ponto III e conclusões D, E, G, DD, EE, KK.] e posteriormente remetido por correio ao Tribunal de 1ª instância, resposta ao douto parecer do Ministério Público (maxime fls. 2 a 8), apresentada a 29 de setembro de 2011, bem como, atenta a surpresa de tal decisão proferida, no requerimento de aclaração e invocação de nulidade apresentado, via fax, no passado dia 03 de janeiro de 2012.
Como fundamento do recurso aponta-se o entendimento sufragado quer na douta sentença de primeira instância quer nos doutos acórdãos do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra proferidos nos presentes autos e relativamente à legitimidade do Tribunal para, de per si e unilateralmente, proceder à alteração da douta acusação pública, nomeadamente ao nível do local de prática dos factos, com eliminação de factualidade que deixa de figurar nos factos provados ou não provados e sua substituição, sendo fonte de anulação do julgamento e nulidade da douta sentença, mas unicamente na parte respeitante aos factos que foram objeto de tal alteração, nos termos do art. 379º nº 1 b) CPP.
Sendo mesmo inconstitucional, por violação das garantias de defesa e dos princípios do acusatório e contraditório assegurados nos art. 32º n.ºs 1 e 5 CRP, o entendimento segundo o qual a consideração na douta sentença condenatória de factos atinentes à execução do pretenso crime não alegados na douta acusação pública, com eliminação e substituição do descrito nesta, com relevância para a condenação e determinação da pena, não constituir alteração não substancial dos factos, nos termos e para efeitos do art. 358º CPP, não estando em causa qualquer violação de direitos de defesa na diligência de deslocação ao local mas sim a final, com a proferição de douta sentença, bem como a qualificação de tal alteração que in casu clara e inequivocamente teve lugar como de “pormenor”, “pontual” e mera “redação de escrita!
Da mesma forma que se tem por inconstitucional a colocação de um eventual ónus sobre o arguido no sentido de que o mesmo ter de aventar uma justificação explicitante para a mentira das vítimas, por violação da presunção de inocência vertida no art. 32º nº 2 CRP bem como demais garantias de defesa plasmadas no nº 1, sempre e quando, como no presente caso, decorre e são manifestas as contradições e imprecisões, não só entre o depoimento das supostas vítimas como entre elas e a testemunha imparcial...
Tem-se por contrária à Lei fundamental e demais diplomas de Direito internacional, desde logo por violação do art. 32º nº 2 CRP, o entendimento segundo o qual sendo permitida, em razão das regras da experiência, mais que uma solução para a resposta à matéria de facto, será a decisão do julgador inatacável sempre que for uma das soluções plausíveis segundo tais regras sempre e quando seja a solução mais nefasta para o arguido.
Mais se tem por inconstitucional o segundo segmento de tal fundamento explanado no douto acórdão, agora por violação do nº. 1 do art. 32º CRP, quando entendido que a decisão do julgador em tal caso será inatacável por proferida em obediência à lei que impõe que julgue de acordo com a sua livre convicção uma vez que aquilo que a lei impõe é que o julgador julgue segundo o Direito e a Constituição da República Portuguesa e tendo por base o respeito aos princípios constitucionais e internacionais!
Na hipótese de existirem várias soluções plausíveis, mais do que atentar na livre convicção, está o Tribunal vinculado ao principio in dubio pro reo e ao Direito globalmente considerado, pelo que na dúvida, havendo várias soluções possíveis segundo a experiência comum não poderá optar pela menos favorável ao arguido ao arrepio dos princípios da presunção de inocência e in dubio pro reo!
Não se afira conforme à lei fundamental, por violação do art. 32º nº 2 CRP, o entendimento segundo o qual “sendo permitida, em razão das regras da experiência, mais que uma solução para a resposta à matéria de facto, será a decisão do julgador inatacável sempre que for uma das soluções plausíveis segundo tais regras sempre e quando seja a solução mais nefasta para o arguido”, à imagem do segundo segmento de tal fundamento explanado no douto acórdão, agora por violação do nº. 1 do art. 32º CRP, quando entendido que a decisão do julgador em tal caso será inatacável por “proferida em obediência à lei que impõe que julgue de acordo com a sua livre convicção” uma vez que aquilo que a lei impõe é que o julgador julgue segundo o Direito e a Constituição da República Portuguesa e tendo por base o respeito aos princípios constitucionais e internacionais!
Sob pena de se ter por disforme à lei fundamental tal entendimento, o direito ao recurso, que abarca tal vertente, teria pés de barro e sucumbiria na hierarquia e trajetos recursórios, não se questionando a ausência de fundamentação da sentença, antes se atacando os fundamentos (ou alicerces) da fundamentação”, coisas bastante diferentes...
Tem-se assim por inconstitucional, em violação do art. 32º nº. 1 CRP, o entendimento segundo o qual o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais na ótica do Tribunal ad quem, sem que se mostre justificada qual a razão da desconsideração de algumas passagens indicadas e relatório final da Polícia Judiciária indicado em sede de recurso e que, modestamente, teriam a virtualidade de alterar a decisão final, seja ela de condenação. vs absolvição ou simples alteração da medida da pena.
A interpretação da garantia de um segundo grau de recurso em matéria de facto se mostraria com “pés de barro” atenta a cindibilidade, ausência de análise integral do recurso e omissão de pronúncia operadas, sendo tal circunstância geradora de inconstitucionalidade por violação do nº. 1 do art. 32º CRP que consagra o direito a um recurso pleno e não sectável obrigando assim o Tribunal ad quem, a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas ou a, pelo menos, fundamentar (nos termos do arts. 374º nº. 2, 379º nº 1 a), aplicáveis por força do nº. 4 do art. 425º, todos do CPP, e exigência vertida no art. 205º CRP) tal exclusão ou omissão de pronúncia, maxime face ao teor do relatório final da Polícia Judiciária, sendo tal desconsideração e cindibilidade da prova produzida ilícita e violadora das mais elementares garantias de defesa, devendo ser aferida tendo por base a sua imagem globalmente considerada e a unicidade do recurso, não se mostrando legítima a interpretação do nº. 1 do art. 31º CRP que permita a cisão e desconsideração recursórias.
Tem-se por inconstitucional o entendimento segundo o qual poderá haverá condenação pelo crime de importunação sexual sempre e quando o ato típico se mostre unicamente ao nível da intenção sem produção de resultado ou dano em concreto, que seja comprovado, dado por provado ou assente.
A normal legal ora em causa (o art. 170º CP, qual caldeirão e albergue espanhol) foi criada ad hoc em resultado dos tumultos ocorridos no país e algumas lacunas de punibilidade, tendo um âmbito de aplicação geral, tendo-se por inconstitucional tal forma de legislar, por violação da exigência de lei certa e do princípio da legalidade, vertidos nos arts. 1º nº. 1 CP e 29º nº.1 CRP atenta a não determinação concretizante do facto ilícito típico, sendo, não uma norma legal mas um princípio jurídico que se mostra depois concretizado e subsumido nos diversos crimes.
Impor-se-á sempre aquilatar do preenchimento da chamada bagatela penal, como limite mínimo, que, por desmerecer a tutela de tal ramo do direito, violaria o princípio da intervenção mínima, tendo-se por pacífico que não se poderão criminalizar situações, embora desagradáveis, que não tenham o mínimo de dignidade penal, dada a não identidade perfeita entre ato social ou moralmente inaceitável e criminalmente punível, alegando-se a questão da inconstitucionalidade derivada da preocupação que parece radicar em tal preceito legal de confundir necessidade de intervenção do Direito Penal de ultima ratio com moral e bons costumes, entendendo-se que os factos descritos na douta acusação (e a fortiori os dados como provados!) não atingem o patamar mínimo de dignidade penal a justificar a entrada no terreno de jogo do Direito Penal.
Daí que, por violação dos princípios da igualdade, adequação, proibição do excesso e proporcionalidade, bem como ultima ratio do Direito penal, se tenha por inconstitucional o entendimento de que para efeitos de condenação pelo crime de importunação sexual se baste o facto ilícito típico com a colocação dos braços sobre os ombros da vítima, em cada um dos lados do pescoço e apalpação dos seios, conjuntamente com a proferição de uma declaração de amor, traduzindo-se num comportamento instantâneo, ocasional e por uma única vez, sob pena de, a assim se entender, se alargar o âmbito da reação penal de forma desmesurada e a fortiori quando se trate de levantar ou puxar de camisola para espreitar dos seios, mero agarrão ou sua tentativa!
Tais decisões não se pronunciaram pela inconstitucionalidade e continuaram a aplicar tal norma de forma literal, em violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade e interpretação das leis, em nome de obediência pensante, sendo violadoras, desde logo, dos arts. 9º CC e 13º, 18º, 26º, 32º nºs. 1, 2 e 5, 202º nº. 2, 203º a 205º e 219º nº. 1 da CRP, para além de diversas normas legais consagradas de tais direitos e princípios, sejam nacionais ou com consagração e assento em diversos textos de Direito internacional.”
O Recorrente apresentou as respetivas alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:
«A. Tem-se por inconstitucional, por violação das garantias de defesa e dos princípios do acusatório e contraditório assegurados nos art. 32º n.ºs 1 e 5 CRP, a dimensão normativa do art. 358º CPP e entendimento segundo o qual a consideração na douta sentença condenatória de factos atinentes à execução do pretenso crime não alegados na douta acusação pública, com eliminação e substituição do descrito nesta, com relevância para a condenação e determinação da pena, não constitui alteração não substancial dos factos nem exige comunicação e contraditório prévio do arguido, à imagem da qualificação de tal alteração, que in casu clara e inequivocamente teve lugar, como de “pormenor”, pontual e mera “redação de escrita”!
B. A interpretação da garantia de um segundo grau de recurso em matéria de facto, tal como foi feita pelo Tribunal a quo, mostra-se com “pés de barro” atenta a cindibilidade, ausência de análise integral do recurso e omissão de pronúncia operadas, sendo tal circunstância geradora de inconstitucionalidade por violação do nº. 1 do art. 32º CRP que consagra o direito a um recurso pleno e não sectável obrigando assim o Tribunal ad quem, a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas ou a, pelo menos fundamentar [nos termos do arts. 374º nº 2, 379º nº 1 a), aplicáveis por torça do nº 4 do art. 425º, todos do CPP, e exigência vertida no art. 205º CRP] tal exclusão ou omissão de pronúncia, uma vez que ver o seu recurso apreciado na integra e que verse o acórdão sobre todas as questões por si levantadas é direito que assiste ao recorrente tendo-se tal desconsideração e cindibilidade da prova produzida por ilícitas e violadoras das mais elementares garantias de defesa, a aferir tendo por base a imagem globalmente considerada e a unicidade do recurso, não se mostrando legitima a interpretação do nº. 1 do art. 31º CRP que permita a cisão e desconsideração recursórias;
C. Tem-se por inconstitucional, em violação do art. 32º nº. 1 CRP, o entendimento e dimensão normativa do art. 61 nº. 1 i) CPP, segundo o qual o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais na ótica do Tribunal ad quem, sem que se mostre justificada qual a razão da desconsideração de algumas passagens indicadas e relatório final da Policia Judiciária indicado em sede de recurso e que, modestamente, teriam a virtualidade de alterar a decisão final, seja ela de absolvição ou simples alteração da medida da pena;
D. Não se afigura conforme à lei fundamental, por violação do art. 32º nº. 2 CRP, a dimensão normativa e o entendimento do art. 127º CPP segundo o qual “sendo permitida, em razão das regras da experiência, mais que uma solução para a resposta à matéria de facto será a decisão do julgador inatacável sempre que for uma das soluções plausíveis segundo tais regras sempre e quando seja a solução mais nefasta para o arguido” à imagem do segundo segmento de tal fundamento explanado no douto acórdão, agora por violação do nº. 1 do art. 32º CRP, quando entendido que a decisão do julgador em tal caso será inatacável por “proferida em obediência à lei que impõe que julgue de acordo com a sua livre convicção” uma vez que aquilo que a lei impõe é que o julgador julgue segundo o Direito e a Constituição da República Portuguesa e tendo por base o respeito aos princípios constitucionais e internacionais, nada permitindo concluir que a convicção do julgador seja igual ou conforme!
E. Tem-se por inconstitucional a colocação de um eventual ónus sobre o arguido no sentido de que o mesmo ter de aventar uma justificação explicitante para a mentira das vítimas, por violação da presunção de inocência, estrutura acusatória do processo e direito ao silêncio por parte do arguido, vertidos respetivamente nos n.ºs 2 e 5 do art. 32º CRF) e alínea i) do nº. 1 do art. 61º CPP bem como demais garantias de defesa plasmadas no nº. 1, sempre e quando, como no presente caso, decorre e são manifestas as contradições e imprecisões, não só entre o depoimento das supostas vitimas como entre elas e a testemunha imparcial…
F. Tem-se por inconstitucional a dimensão normativa do art. 170º CP e o entendimento segundo o qual poderá haverá condenação pelo crime de importunação sexual sempre e quando o ato típico se mostre unicamente ao nível da intenção sem produção de resultado ou dano em concreto, que seja comprovado, dado por provado ou assente;
G. A normal legal ora em causa (o art. 170º CP, qual caldeirão e albergue espanhol foi criada ad hoc em resultado dos tumultos ocorridos no pais e algumas lacunas de punibilidade, tendo um âmbito de aplicação geral. tendo-se por inconstitucional tal forma de legislar, por violação da exigência de lei certa e do princípio da legalidade, vertidos nos arts. 1º nº. 1 CP e 29º nº. 1 CRP atenta a não determinação concretizante do facto ilícito típico, sendo, não uma norma legal mas um princípio jurídico que se mostra depois concretizado e subsumido nos diversos crimes;
H. Impor-se-á sempre aquilatar do preenchimento da chamada bagatela penal, como limite mínimo, que, por desmerecer a tutela de tal ramo do direito, violaria o princípio da intervenção mínima, tendo-se por pacifico que não se poderão criminalizar situações embora desagradáveis, que não tenham o mínimo de dignidade penal, dada a não identidade perfeita entre ato social ou moralmente inaceitável e criminalmente punível, alegando-se a questão da inconstitucionalidade derivada da preocupação que parece radicar em tal preceito legal de confundir necessidade de intervenção do Direito Penal do ultima ratio com moral e bons costumes, entendendo-se que os factos descritos na douta acusação (e a fortiori os dados como provados!) não atingem o patamar mínimo de dignidade penal a justificar a entrada no terreno de jogo do Direito Penal;
I. Daí que, por violação dos princípios da igualdade, adequação, proibição do excesso e proporcionalidade, bem como ultima ratio do Direito penal, se tenha por inconstitucional o entendimento de que para efeitos de condenação pelo crime de importunação sexual se baste o facto ilícito típico com a colocação dos braços sobre os ombros da vítima em cada um dos lados do pescoço e apalpação dos seios, conjuntamente com a proferição de uma declaração de amor, traduzindo-se num comportamento instantâneo, ocasional e uma única vez, sob pena de, a assim se entender, se alargar o âmbito da reação penal de forma desmesurada e a fortiori quando se trate de levantar ou puxar de camisola para espreitar dos seios, mero agarrão ou sua tentativa!
J. Mais que a própria liberdade de autodeterminação sexual aquilo que estará em causa é a liberdade de ação ou omissão das vítimas, traduzindo-se num crime de perigo concreto não se vislumbrando ameaça a tais bens jurídicos nem o constrangimento e a concretização inequivocamente especificante dos contactos de natureza sexual, uma vez que querendo abandonar o local o fizeram sem problema e esforço!
K. Alega-se a questão da inconstitucionalidade derivada da preocupação que parece radicar em tal preceito legal de confundir necessidade de intervenção do Direito Penal de ultima ratio com moral e bons costumes, entendendo-se que os factos descritos na douta acusação (e a fortiori os dados como provados!) não atingem o patamar mínimo de dignidade penal a justificar a entrada no terreno de jogo do Direito Penal;
L. Conjuntamente com tal crime foi criada a figura do contacto sexual, havendo que procurar desmistificar tal figura e conceito que não será sinónimo de ato sexual (presunção vertida no nº. 3 do art. 9º CC), significando aquele, “estado relativo, situação de dois ou mais corpos que se tocam”, indicando assim contiguidade e toque, só isso justificando que o art. 171º nº. 3 nas suas duas alíneas consagre na alínea a) a previsão do art. 170º e na b) a conversa, escrito, etc., a significar que o contacto sexual não engloba escritos e conversas de cariz sexual (elementos literal e sistemático) sendo perfeitamente inócua e sem qualquer importância a conversa tida com as menores do “fazer coisa e tal”;
M. Temos assim que a fórmula ato sexual será mais abrangente por não se restringir ao toque, pelo que, não havendo contacto não haverá crime de importunação sexual, o que in casu, nos termos do depoimento da testemunha João Pessoa apenas pudesse haver um único crime, sendo certo que ao não se especificar sobre quem e que parte do corpo recaiu não se possa dar por provado tal requisito e tenha o arguido de ser absolvido, conclusão idêntica à da não punibilidade da tentativa.
N. Como afirma Roxin, não sendo a conceção do bem jurídico estática, esta deve sempre conformar-se com os fins das normas constitucionais, as quais estão abertas às mutações sociais e aos progressos do conhecimento científico, indo os mesmos no sentido de uma maior abertura, tendo de presidir in casu um certo dolo especifico e toda uma multiplicidade de elementos objetivos (constrangimento e contacto de natureza sexual), não se podendo tomar como limite a questão da moralidade sexual mas sim averiguar se tais factos têm em si a relevância exigível do ponto de vista criminal a justificar a sua tipificação como crime ou consubstanciam unicamente atuação menos correta, cortês, delicada e moral;
O. Entende-se que os factos não atingem o minus de relevância penal a ponto de exigir a intervenção de tal ramo do Direito, sendo a douta sentença clara ao afirmar que não resultaram provadas quaisquer consequências para as ofendidas (confirmada no tocante à menor B. pelo depoimento da sua mãe C. na passagem 12:34 a 12:46), tendo assim de ficar de fora os atos bagatelares ou considerados insignificantes bem como todos aqueles que, ainda que de algum significado e impróprios, atenta a sua instantaneidade, ocasionalidade e reduzida ocorrência não sejam obstáculo de forma significativa à livre determinação sexual da vítima;
P. E todos os preceitos constitucionais integram normas que fornecem os parâmetros de interpretação reta do Direito que lhe está infra ordenado, devendo assim lançar-se mão do princípio da interpretação conforme a Constituição da República Portuguesa, não sendo a progressividade mais do que a densificação do conceito de justiça proveniente da igualdade material, principio base de todo o Direito, pressupondo uni conceito de democraticidade; a lei penal é igual para todos;
Q. E ternos assim por violados os princípios da igualdade (que consiste em tratar de forma igual o igual e de forma diferenciada o desigual), proporcionalidade bem como do caráter de ultima ratio do Direito Penal que assim se vê convocado quando a litigiosidade e danosidade material se mostra secundária e a justiça restauradora uma realidade ao alcance, dado que com o caráter subsidiário e fragmentário do Direito Penal importa conjugar um outro princípio fundamental - o da proporcionalidade - a significar a exigência de razoabilidade na proporção da necessidade de tutelar um bem fundamental, sendo certo que a intervenção do Direito Penal, por força das sanções jurídicas que lhe são características, colide com o direito de liberdade, direito fundamental do cidadão, só devendo intervir quando a sua tutela é necessária e útil tendo eficácia, o que in casu se não vislumbra atenta a ausência de consequências e reduzida expressão dos alegados factos.
Normas jurídicas violadas: nomeadamente arts. 61º nº. 1 d) e i), 127º, 358º CPP; arts. 1º n.º 1, 170º CP; 13º, 18º, 20º, 29º, 32º n.ºs 1, 2 e 5, 204º e 205º CRP. “
O Ministério Público apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
«1º - O legislador infraconstitucional goza de uma ampla margem de discricionariedade legislativa na formulação das opções consistentes em tipificar criminalmente determinados comportamentos.
2º - O recurso a meios penais para defesa do bem jurídico da liberdade sexual, não traduz solução legislativa manifestamente arbitrária ou excessiva.
3º - Assim, a norma da segunda parte do artigo 170.º do Código Penal, segundo a qual, quem importunar outra pessoa constrangendo-a a contacto de natureza sexual é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias, não viola o artigo 18.º, nº 2, da Constituição, não sendo, por isso, inconstitucional.
4º - Termos em que deve ser negado provimento ao recurso.»
Fundamentação
1. Delimitação do objeto do recurso
No seu requerimento de interposição de recurso, o arguido indicou, como objeto do mesmo, seis “questões”. Contudo, em relação à quase totalidade destas questões, não se mostram preenchidos os pressupostos de que depende o seu conhecimento pelo Tribunal.
Como é sabido, no sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Constitucional cinge-se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas diretamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas. Constitui jurisprudência uniforme do Tribunal Constitucional que o recurso de constitucionalidade, reportado a determinada interpretação normativa, tem de incidir sobre o critério normativo da decisão, sobre uma regra abstratamente enunciada e vocacionada para uma aplicação potencialmente genérica, não podendo destinar-se a pretender sindicar o puro ato de julgamento, enquanto ponderação casuística da singularidade própria e irrepetível do caso concreto, daquilo que representa já uma autónoma valoração ou subsunção do julgador – não existindo no nosso ordenamento jurídico-constitucional a figura do recurso de amparo de queixa constitucional para defesa de direitos fundamentais.
Por outro lado, tratando-se de recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC – como ocorre no presente caso –, a sua admissibilidade depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (n.º 2, do artigo 72.º, da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente.
Expostos, sumariamente, os pressupostos de que depende o conhecimento do recurso de constitucionalidade interposto nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, cumpre verificar o seu preenchimento, relativamente às questões colocadas pelo Recorrente neste processo.
No caso dos autos, conforme se referiu, foram enunciadas no requerimento de interposição de recurso, “seis questões concretas e obejctivas”, como objeto do presente recurso.
A primeira dessas questões diz respeito à interpretação dos artigos 358.º e 379.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal. Segundo o Recorrente, estas normas foram entendidas no sentido de o Tribunal ter legitimidade para «(…) de per si e unilateralmente, proceder à alteração da douta acusação pública, nomeadamente ao nível do local de prática dos factos, com eliminação de factualidade que deixa de figurar nos factos provados ou não provados e sua substituição, sendo fonte de anulação do julgamento e nulidade da douta sentença, mas unicamente na parte respeitante aos factos que foram objeto de tal alteração», sendo inconstitucional, segundo o recorrente, «(…) o entendimento segundo o qual a consideração na douta sentença condenatória de factos atinentes à execução do pretenso crime não alegados na douta acusação pública, com eliminação e substituição do descrito nesta, com relevância para a condenação e determinação da pena, não constituir alteração não substancial dos factos, nos termos e para efeitos do art. 358º CPP, não estando em causa qualquer violação de direitos de defesa na diligência de deslocação ao local mas sim a final, com a proferição de douta sentença, bem como a qualificação de tal alteração que in casu clara e inequivocamente teve lugar como de “pormenor”, “pontual” e mera “redação de escrita».
Relativamente a esta questão, resulta claro que não se está perante uma interpretação normativa, no sentido acima apontado, que possa constituir um objeto idóneo de fiscalização da constitucionalidade. Com efeito, o que o Recorrente pretende é sindicar o próprio juízo efetuado pelo tribunal a quo, de aplicação dos preceitos que regem a alteração dos factos constantes da acusação em sede de julgamento ao caso concreto, na sua singularidade, sem que haja, relativamente a estas questões um critério normativo de decisão, de aplicação potencialmente genérica, que tenha sido extraído das referidas normas.
Assim, nesta parte, o recurso não deverá ser conhecido.
A segunda questão foi identificada pelo Recorrente como relativa ao «ónus sobre o arguido no sentido de aventar explicitação para a mentira das vítimas». Entende o Recorrente que «se tem por inconstitucional a colocação de um eventual ónus sobre o arguido no sentido de que o mesmo tem de aventar uma justificação explicitante para a mentira das vítimas, por violação da presunção de inocência vertida no art. 32º nº 2 CRP bem como demais garantias de defesa plasmadas no nº 1, sempre e quando, como no presente caso, decorre e são manifestas as contradições e imprecisões, não só entre o depoimento das supostas vítimas como entre elas e a testemunha imparcial...»
Também quanto a esta questão não se pode considerar que se esteja perante a suscitação da inconstitucionalidade de uma norma, nos termos acima referidos, visto que, uma vez mais, o que o recorrente pretende é sindicar o juízo concreto de apreciação da prova efetuado pelo tribunal recorrido, designadamente, quanto à veracidade da versão dos factos apresentada pelas vítimas.
A isto acresce que, ainda que estivesse em causa uma verdadeira norma, o facto é que a mesma não integraria a ratio decidendi da decisão recorrida, uma vez que esta em momento algum entendeu que recaía sobre o arguido o ónus de apresentar uma justificação para a hipótese de as vítimas estarem a mentir relativamente aos factos que relataram. Aliás, é o que resulta expressamente do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 20-12-2011, ao referir que: «Basta ler a motivação do tribunal recorrido para se entender que não pretendeu exigir ao arguido que justificasse a hipótese das menores estarem a mentir. O que é nítido é que o tribunal teve o cuidado de averiguar algum motivo – ignorado – que pudesse justificar tal atitude processual”.
Tendo em conta o exposto, também nesta parte não deverá ser conhecido o recurso.
A terceira questão foi enunciada pelo Recorrente como respeitante ao «direito ao conhecimento integral do recurso e sua não cindibilidade», sustentando que é inconstitucional, «em violação do art. 32º nº. 1 CRP, o entendimento segundo o qual o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais na ótica do Tribunal ad quem, sem que se mostre justificada qual a razão da desconsideração de algumas passagens indicadas e relatório final da Polícia Judiciária indicado em sede de recurso e que, modestamente, teriam a virtualidade de alterar a decisão final, seja ela de condenação vs absolvição ou simples alteração da medida da pena»
Ainda segundo o Recorrente, «a interpretação da garantia de um segundo grau de recurso em matéria de facto se mostraria com “pés de barro” atenta a cindibilidade, ausência de análise integral do recurso e omissão de pronúncia operadas, sendo tal circunstância geradora de inconstitucionalidade por violação do nº. 1 do art. 32º CRP que consagra o direito a um recurso pleno e não sectável obrigando assim o Tribunal ad quem, a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas ou a, pelo menos, fundamentar (nos termos do arts. 374º nº. 2, 379º nº 1 a), aplicáveis por força do nº. 4 do art. 425º, todos do CPP, e exigência vertida no art. 205º CRP) tal exclusão ou omissão de pronúncia, maxime face ao teor do relatório final da Polícia Judiciária, sendo tal desconsideração e cindibilidade da prova produzida ilícita e violadora das mais elementares garantias de defesa, devendo ser aferida tendo por base a sua imagem globalmente considerada e a unicidade do recurso, não se mostrando legítima a interpretação do nº. 1 do art. 31º CRP que permita a cisão e desconsideração recursórias».
Em primeiro lugar, tal como em relação às questões anteriores, também quanto a esta questão não se está perante uma norma, no sentido acima apontado, que possa constituir um objeto idóneo de fiscalização da constitucionalidade. Com efeito, o que o recorrente pretende é sindicar a concreta apreciação efetuada pelo Tribunal da Relação de Coimbra no que respeita à forma como entendeu conhecer e delimitou as questões objeto do recurso interposto pelo arguido.
Contudo, ainda que assim não fosse, também quanto a esta questão, analisando o Acórdão da Relação de Coimbra, de 27 de junho de 2012, que se pronunciou sobre as nulidades arguidas pelo Recorrente em relação ao acórdão de 20 de dezembro de 2011, do referido Tribunal, constata-se que este não entendeu que «o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais na ótica do Tribunal ad quem» ou que possa deixar de conhecer outras questões que «teriam a virtualidade de alterar a decisão final, seja ela de condenação vs absolvição ou simples alteração da medida da pena».
Com efeito, se atentarmos na leitura do referido acórdão de 27 de junho de 2012, constata-se que o tribunal recorrido começou por realçar que a nulidade de sentença, por omissão de pronúncia, se refere a questões e não a razões ou argumentos invocados pela parte ou pelo sujeito processual em defesa do seu ponto de vista, referindo ainda ser pacífico que esta nulidade não resulta da omissão de conhecimento de razões, mas sim de questões. Mais se refere ainda que as questões suscitadas pelo arguido foram enunciadas e decididas no acórdão sob reclamação e que o Tribunal da Relação apreciou e valorou todos os meios de prova enunciados pelo Recorrente e teve em conta os argumentos apresentados, que no entender deste, deveriam levar a que a factualidade fosse dada como não provada, especificando, de modo claro, as concretas razões pelas quais improcede a pretensão do Recorrente e se considera que a decisão recorrida, relativamente a cada uma daqueles factos, não merece censura.
Em suma, para além de não se estar perante uma questão normativa, ainda que assim fosse, a mesma não integraria a ratio decidendi do acórdão recorrido, o que implica que, também quanto a esta questão, o recurso não possa ser conhecido.
A sexta questão objeto do recurso foi enunciada pelo recorrente da seguinte forma: «o entendimento do julgamento da matéria de facto em sede de recurso (maxime a questão de plausibilidade da resposta como explicação da realidade em caso de variedade de soluções possíveis!) conjugado com preterição do princípio in dubio pro reo em nome da livre valoração da prova e quase santidade de tal princípio».
Segundo o recorrente, é inconstitucional «(…) o entendimento segundo o qual sendo permitida, em razão das regras da experiência, mais que uma solução para a resposta à matéria de facto, será a decisão do julgador inatacável sempre que for uma das soluções plausíveis segundo tais regras sempre e quando seja a solução mais nefasta para o arguido.»
Também no que respeita a esta questão, não existe coincidência entre ela e o que consta da decisão recorrida. Na parte que ora releva, escreveu-se o seguinte nessa decisão:
«[…]
Dos factos objetivos resulta que o arguido pretendia, através das menores, satisfazer os seus instintos lascivos e libidinosos, apesar de saber que tinham na altura 14 e 16 anos de idade.
Contrariamente ao alegado pelo recorrente está provado que o arguido sabia a idade das meninas. E nem o facto de tal conhecimento resultar da respetiva admissão, contraria a conclusão do tribunal recorrido, não constituindo de forma alguma contradição entre admitir e saber. Sabia porque admitiu. Admitir significa “acreditar em”. De todo o modo, o arguido percebeu que se tratava de duas jovens adolescentes e a idade não é elemento normativo do tipo legal do crime em questão.
Como decorre do art. 127° do CPP, “(…) a prova é apreciada segundo as regras da experiência comum e a livre convicção da entidade competente”. Deste artigo resulta que fora dos casos em que a lei dispuser diferentemente, a convicção do julgador, formada de acordo com as regras da experiência comum, é válida e só pode ser posta em causa quando, nos termos do artigo 412°, 3, b) do CPP, as provas imponham decisão diversa da recorrida. Deste modo, para que o recurso da matéria de facto seja procedente, não basta que o arguido mostre a plausibilidade de uma outra versão dos factos, designadamente a sua. A lei exige que, perante a prova produzida em audiência de julgamento, o arguido destaque e especifique “as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida”, pois o que está em causa não é já o julgamento dos factos, mas a exatidão do juízo (feito pelo tribunal recorrido) sobre a matéria de facto. Trata-se de resto de um entendimento consolidado na doutrina e jurisprudência, como se pode ver, por exemplo, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-2-05, proferido no processo 04P4324: “(…) Note-se que a lei refere as provas que «impõem» e não as que «permitiriam» decisão diversa.
Casos há em que, face à prova produzida, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução. Se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção (…)”. Com efeito, “(…) a censura quanto à forma de formação da convicção do Tribunal não pode consequentemente assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objetivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar, pela convicção dos que esperam a decisão (…)” – cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 198/2004 de 24-3-2004, DR II Série, de 2/6/2004, transcrevendo parcialmente o Acórdão da Relação Coimbra, objeto do respetivo recurso.
[…]»
Ora, conforme resulta da leitura deste excerto da decisão recorrida, nada permite concluir que o tribunal a quo tenha entendido, como fundamento da sua pronúncia, que «sendo permitida, em razão das regras da experiência, mais que uma solução para a resposta à matéria de facto, será a decisão do julgador inatacável sempre que for uma das soluções plausíveis segundo tais regras sempre e quando seja a solução mais nefasta para o arguido».
Com efeito, o que resulta da decisão recorrida é que, fora dos casos em que a lei dispuser diferentemente, a convicção do legislador, formada de acordo com as regras da experiência comum, é válida e só pode ser posta em causa em sede de recurso quando, nos termos do artigo 412.º, 3, b) do Código de Processo Penal, as provas imponham decisão diversa da recorrida, não bastando para isso que o arguido mostre a plausibilidade de uma outra versão dos factos, designadamente a sua, uma vez que o que está em causa não é já o julgamento dos factos, mas a exatidão do juízo (feito pelo tribunal recorrido) sobre a matéria de facto.
Entendeu-se ainda, citando outra jurisprudência, que nos casos em que, face à prova produzida, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução, se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção. Ou seja, a decisão recorrida não entendeu, pura e simplesmente, como pretende o arguido, que sendo permitida, em razão das regras da experiência, mais que uma solução para a resposta à matéria de facto, será a decisão do julgador inatacável sempre que for uma das soluções plausíveis segundo tais regras sempre e quando seja a solução mais nefasta para o arguido.
Também neste caso se verifica, assim, não existir coincidência entre a questão cuja constitucionalidade o Recorrente pretende ver sindicada e a ratio decidendi em que se fundou a decisão recorrida, pelo que, também nesta parte, não deverá o recurso ser conhecido.
No que respeita à quarta e quinta questões, identificadas pelo Recorrente como respeitantes, respetivamente, ao «preenchimento do tipo de ilícito (art. 170º CP) e convocação do Direito Penal (a fundamentar a nulidade por omissão de pronúncia supra reclamada!)» e ao «recorte do tipo legal de crime em causa (importunação sexual)», não se descortina, nem tal resulta do requerimento de interposição de recurso, que se esteja perante duas questões diferentes, sendo que, nas alegações de recurso apresentadas no Tribunal Constitucional, o próprio Recorrente acaba por reconhecer que tais questões deverão ser unificadas, tendo por base o tipo legal previsto no artigo 170.º do Código Penal e o seu recorte jurídico.
Sendo certo que as referidas questões se traduzem apenas numa única questão, importa, no entanto, antes de proceder ao seu conhecimento, fazer a sua delimitação precisa.
No requerimento de interposição de recurso, a propósito da norma do artigo 170.º do Código Penal, o Recorrente refere que se tem por inconstitucional «o entendimento segundo o qual poderá haverá condenação pelo crime de importunação sexual sempre e quando o ato típico se mostre unicamente ao nível da intenção sem produção de resultado ou dano em concreto, que seja comprovado, dado por provado ou assente».
Refere ainda que a normal legal em causa «foi criada ad hoc em resultado dos tumultos ocorridos no país e algumas lacunas de punibilidade, tendo um âmbito de aplicação geral, tendo-se por inconstitucional tal forma de legislar, por violação da exigência de lei certa e do princípio da legalidade, vertidos nos arts. 1º nº. 1 CP e 29º nº.1 CRP atenta a não determinação concretizante do facto ilícito típico, sendo, não uma norma legal mas um princípio jurídico que se mostra depois concretizado e subsumido nos diversos crimes».
E acrescenta ainda que «impor-se-á sempre aquilatar do preenchimento da chamada bagatela penal, como limite mínimo, que, por desmerecer a tutela de tal ramo do direito, violaria o princípio da intervenção mínima, tendo-se por pacífico que não se poderão criminalizar situações, embora desagradáveis, que não tenham o mínimo de dignidade penal, dada a não identidade perfeita entre ato social ou moralmente inaceitável e criminalmente punível, alegando-se a questão da inconstitucionalidade derivada da preocupação que parece radicar em tal preceito legal de confundir necessidade de intervenção do Direito Penal de ultima ratio com moral e bons costumes, entendendo-se que os factos descritos na douta acusação (e a fortiori os dados como provados!) não atingem o patamar mínimo de dignidade penal a justificar a entrada no terreno de jogo do Direito Penal».
E acaba concluindo que «por violação dos princípios da igualdade, adequação, proibição do excesso e proporcionalidade, bem como ultima ratio do Direito penal, se tenha por inconstitucional o entendimento de que para efeitos de condenação pelo crime de importunação sexual se baste o facto ilícito típico com a colocação dos braços sobre os ombros da vítima, em cada um dos lados do pescoço e apalpação dos seios, conjuntamente com a proferição de uma declaração de amor, traduzindo-se num comportamento instantâneo, ocasional e por uma única vez, sob pena de, a assim se entender, se alargar o âmbito da reação penal de forma desmesurada e a fortiori quando se trate de levantar ou puxar de camisola para espreitar dos seios, mero agarrão ou sua tentativa!».
Pela forma como o Recorrente coloca a questão, depreende-se que este pretende, por um lado, sindicar a constitucionalidade do próprio tipo de ilícito, previsto no artigo 170.º do Código Penal, sustentando que este, atenta a não determinação concretizante do facto ilícito típico, violaria a exigência de lei certa e o princípio da legalidade e ainda que tal norma criminaliza situações que, embora desagradáveis, não têm o mínimo de dignidade penal, resultando a inconstitucionalidade de em tal preceito legal se confundir necessidade de intervenção do Direito Penal de ultima ratio com moral e bons costumes.
Por outro lado, o Recorrente não deixa também de pretender sindicar o próprio ato de julgamento, ao sustentar que é inconstitucional «o entendimento segundo o qual poderá haverá condenação pelo crime de importunação sexual sempre e quando o ato típico se mostre unicamente ao nível da intenção sem produção de resultado ou dano em concreto, que seja comprovado, dado por provado ou assente» e «o entendimento de que para efeitos de condenação pelo crime de importunação sexual se baste o facto ilícito típico com a colocação dos braços sobre os ombros da vítima, em cada um dos lados do pescoço e apalpação dos seios, conjuntamente com a proferição de uma declaração de amor, traduzindo-se num comportamento instantâneo, ocasional e por uma única vez, sob pena de, a assim se entender, se alargar o âmbito da reação penal de forma desmesurada e a fortiori quando se trate de levantar ou puxar de camisola para espreitar dos seios, mero agarrão ou sua tentativa!». Nesta parte, o Recorrente limita-se a imputar inconstitucionalidades à concreta decisão impugnada, na ótica do resultado do juízo subsuntivo ali efetuado, por referência aos factos dados como provados no caso concreto, situação que, naturalmente, transcende o âmbito do controlo normativo cometido ao Tribunal Constitucional.
Assim, o objeto do recurso restringir-se-á à aludida questão da constitucionalidade do tipo de ilícito previsto no artigo 170.º do Código Penal, mais especificamente à previsão da conduta prevista na segunda parte deste preceito, e não a qualquer das referidas interpretações indicadas pelo recorrente que, como se referiu, não se revestem de conteúdo normativo.
2. Do mérito do recurso
O Recorrente pretende ver sindicada a constitucionalidade da norma constante do artigo 170.º do Código Penal, na redação introduzida pela Lei nº 59/2007, de 4 de setembro, sustentando que a referida norma confunde a necessidade de intervenção do Direito Penal, de ultima ratio, com moral e bons costumes, permitindo a punição de factos, como sejam os que foram dados como provados nos autos, que não atingem o patamar mínimo de dignidade penal.
Acrescenta ainda o Recorrente que tal norma, tendo um âmbito de aplicação geral, é inconstitucional por violação da exigência de lei certa e do princípio da legalidade, consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da Constituição, atenta a não determinação concretizante do facto ilícito típico, sendo, não uma norma, mas um princípio jurídico que se mostra depois concretizado e subsumido nos diversos crimes.
Importa, pois, apreciar se lhe assiste razão, começando, antes de mais, por analisar o teor da norma em questão, bem como os antecedentes legislativos da mesma.
O artigo 170.º do Código Penal, na redação atualmente vigente, sob a epígrafe «Importunação sexual», dispõe o seguinte: «Quem importunar outra pessoa praticando perante ela atos de caráter exibicionista ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.»
No caso dos autos, está em causa a conduta prevista na segunda parte deste preceito, sendo por isso relativamente a este segmento da norma que deverão ser apreciadas as questões de constitucionalidade suscitadas.
Na sistemática do Código Penal, este crime encontra-se inserido nos “crimes contra a liberdade sexual”, dentro do título mais vasto dos crimes contra as pessoas.
A redação atual do artigo resulta da revisão do Código Penal levada a efeito pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, que veio substituir o anterior texto constante do artigo 171.º, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, e que, sob a epígrafe «atos exibicionistas», dispunha que «Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de caráter exibicionista, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.»
Trata-se de um tipo legal enquadrável na categoria comummente designada por «crimes sexuais». Estes crimes, na versão originária do Código Penal de 1982, estavam integrados na Secção II do Capítulo I ('Dos crimes contra os fundamentos ético-sociais'), do Título II ('Dos crimes contra valores e interesses da vida em sociedade'), do Livro II ('Parte especial'), deixando transparecer a ideia de que o bem jurídico tutelado se encontrava no domínio da moral social e não no domínio da liberdade pessoal (Sobre evolução, em Portugal, em matéria de criminalidade sexual, quer em termos legislativos, quer no que respeita ao bem jurídico protegido, veja-se, entre outros, Figueiredo Dias, 'Nótula antes do art. 163º', Comentário Conimbricense do Código Penal. Parte especial, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, pp. 441-443; Inês Ferreira Leite, A tutela penal da liberdade sexual, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 21, N.º 1, Janiero-Março 2011, pp. 26 e ss.; J. Mouraz Lopes, Os crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual no Código Penal, 4.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, pp. 13-17; Manuel Costa Andrade, Consentimento e acordo em Direito Penal, Contributo para a fundamentação de um paradigma dualista, Coimbra Editora, Coimbra, 1991, pp. 384 e ss; Maria do Carmo Silva Dias, “Repercussões da Lei n.º 59/2007, de 4/9 nos crimes contra a liberdade sexual, Revista do CEJ, 1.º Semestre de 2008, Número 8, pp. 219-224; Rui Pereira, Liberdade sexual: a sua tutela na reforma do Código Penal, Sub judice - Justiça e sociedade, n.º 11, novembro de 1996, pp. 43 e ss.; Teresa Beleza, “Sem sombra de pecado: o repensar dos crimes sexuais na revisão do Código Penal”, Jornadas de Direito Criminal – Revisão do Código Penal, CEJ, Lisboa, 1986, pp. 155 e ss.; e Vera Lúcia Raposo, Da moralidade à liberdade: o bem jurídico tutelado na criminalidade sexual, Liber Discipolorum para Jorge Figueiredo Dias, Coimbra Editora, 2003, pp. 935 e ss, e o Acórdão n.º 247/2005 do Tribunal Constitucional).
Na versão inicial do Código Penal de 1982 não havia qualquer disposição legal correspondente ao atual artigo 170.º. Apenas se previa, no artigo 212.º, o crime de “exibicionismo e ultraje público ao pudor” e, no artigo 213.º, o crime de “ultraje ao pudor de outrem”, comportamentos esses que vieram a ser descriminalizados com a Reforma do Código Penal de 1995, orientada no sentido de deixar de considerar os crimes sexuais como crimes ligados aos “sentimentos gerais de pudor e de moralidade sexual”.
Com efeito, a revisão do Código Penal de 1995 alterou profundamente o enquadramento legal da criminalidade sexual, tendo subjacente o pressuposto de que só se pode considerar legítima a incriminação de condutas do foro sexual se e na medida em que atentem contra um específico bem jurídico eminentemente pessoal, sob pena de, não o fazendo, se estar perante um crime sem vítima. Os crimes sexuais deixaram, assim, de ser tidos como crimes contra os fundamentos ético-sociais da vida em sociedade, como acontecia com os crimes previstos nos artigos 201.º a 218.º da redação originária do Código Penal de 1982, para passarem a ser crimes contra as pessoas e, mais concretamente, contra a liberdade e autodeterminação sexual da vítima.
Por outro lado, passou a distinguir-se, neste âmbito, entre crimes contra a liberdade sexual e crimes contra a autodeterminação sexual. Os primeiros são crimes cometidos contra adultos ou menores sem o consentimento destes, em que o que se pretende é garantir a proteção da liberdade sexual da vítima, ou seja, o poder de disposição do corpo pela pessoa, independentemente da idade. Já os segundos são crimes cometidos contra menores de modo consensual, com “consentimento” destes, em que o objeto de proteção é o livre desenvolvimento da personalidade do menor na esfera sexual.
É neste enquadramento, ou seja, enquanto crime contra a liberdade sexual, que deve ser perspetivado o tipo de ilícito previsto no artigo 170.º do Código Penal, com a redação resultante da revisão de 2007 do Código Penal que, no que agora nos interessa, entre outras alterações, introduziu o conceito de “contacto de natureza sexual”, visando punir o constrangimento a atos de natureza sexual que não tenham a dignidade de atos sexuais de relevo. É aliás, o que resulta da exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 98/X, que esteve na origem da Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, onde se refere que «Para garantir a defesa plena da liberdade sexual, é criado um crime de importunação sexual, que abrange, para além do exibicionismo, o constrangimento a contactos de natureza sexual que não constituam atos sexuais de relevo.»
O tipo legal em análise criminaliza, assim, a «importunação sexual» de outra pessoa através de duas condutas distintas: a prática, perante outra pessoa, de atos de caráter exibicionista; e o constrangimento de outra pessoa a contacto de natureza sexual.
Deste modo, após a revisão do Código Penal de 2007, em matéria de criminalidade sexual, e com esta nova criminalização, a lei penal passou a distinguir, atenta a gravidade que representam em relação ao bem jurídico protegido, três categorias de atos: num primeiro plano, e como atos menos graves, estão os “atos de caráter exibicionista” e “os contactos de natureza sexual”; num segundo plano, estão os atos que integram o conceito de “ato sexual de relevo”; num terceiro plano estão os atos sexuais mais graves ou, na designação de Figueiredo Dias, “especiais atos sexuais de relevo” (cópula, coito anal e oral e penetração vaginal e anal com objetos ou partes do corpo) (Cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, cit., pág. 441, e Maria do Carmo Silva Dias, “Repercussões da Lei n.º 59/2007, de 4/9 nos crimes contra a liberdade sexual, Revista do CEJ, 1.º Semestre de 2008, Número 8, pág. 259).
2.1. O princípio da legalidade
O Recorrente entende que a norma incriminadora, constante da segunda parte do artigo 170.º do Código Penal, viola o princípio constitucional da legalidade penal, mais concretamente, a exigência de determinabilidade do conteúdo da lei criminal, princípio esse que se encontra consagrado no artigo 29.º, n.º 1, da Constituição.
Num Estado de direito democrático a prevenção do crime deve ser levada a cabo com respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, estando sujeita a limites que impeçam intervenções arbitrárias ou excessivas, nomeadamente sujeitando-a a uma aplicação rigorosa do princípio da legalidade, cujo conteúdo essencial se traduz em que não pode haver crime, nem pena que não resultem de uma lei prévia, escrita e certa (nullum crimen, nulla poena sine lege). É neste sentido que o artigo 29.º, n.º 1, da Constituição, dispõe que «Ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a ação ou a omissão, nem sofrer medida de segurança cujos pressupostos não estejam fixados em lei anterior», consagrando um dos princípios constitucionais básicos em matéria de punição criminal.
Este princípio determina que a descrição da conduta proibida e de todos os requisitos de que dependa em concreto uma punição tem de ser efetuada de modo a que se tornem objetivamente determináveis os comportamentos proibidos e sancionados e, consequentemente, se torne objetivamente motivável e dirigível a conduta dos cidadãos (cfr. Figueiredo Dias, “Direito Penal. Parte Geral”, tomo I, pág. 186, da 2ª ed. da Coimbra Editora). Daí que, incindivelmente ligado ao princípio da legalidade se encontre o princípio da tipicidade, o qual implica que a lei deve especificar suficientemente os factos que constituem o tipo legal de crime (ou que constituem os pressupostos de medida de segurança), bem como tipificar as penas (ou as medidas de segurança). A tipicidade impede, assim, que o legislador utilize fórmulas vagas, incertas ou insuscetíveis de delimitação na descrição dos tipos legais de crime, ou preveja penas indefinidas ou com uma moldura penal de tal modo ampla que torne indeterminável a pena a aplicar em concreto. É um princípio que constitui, essencialmente, uma garantia de certeza e de segurança na determinação das condutas humanas que relevam do direito criminal (cfr. J. J. Gomes Canotilho / Vital Moreira, ob. cit., pág. 495, e Lopes Rocha, A função de garantia da lei penal e a técnica legislativa, in Legislação – Cadernos de Ciência e Legislação, n.º 6, Janeiro-Março de 1993, pág. 25).
O princípio da tipicidade tem que ver, assim, com a exigência da determinabilidade do conteúdo da lei criminal. Conforme escreve Taipa de Carvalho (Constituição Portuguesa Anotada, org. por Jorge Miranda e Rui Medeiros, Tomo I, 2.ª edição, revista, atualizada e ampliada, Wolters Kluwer Portugal - Coimbra Editora, 2010, pág. 672), «dada a necessidade de prevenir as condutas lesivas dos bens jurídico-penais e igualmente de garantir o cidadão contra a arbitrariedade ou mesmo contra a discricionariedade judicial, exige-se que a lei criminal descreva o mais pormenorizadamente possível a conduta que qualifica como crime. Só assim o cidadão poderá saber que ações e omissões deve evitar, sob pena de vir a ser qualificado criminoso, com a consequência de lhe vir a ser aplicada uma pena ou uma medida de segurança. Daqui resulta a proibição de o legislador utilizar cláusulas gerais na definição dos crimes, a necessidade de reduzir ao mínimo possível o recurso a conceitos indeterminados, e o imperativo de não recorrer às chamadas “normas penais em branco”, salvo quando tal recurso se apresente como manifestamente indispensável e a norma para que é feita a remissão seja clara na descrição da conduta punível. Esta exigência, decorrente da razão de garantia do princípio da legalidade penal, é denominada por princípio da tipicidade, traduzido pela conhecida formulação latina nullum crimen sine lege certa.»
Regressando ao caso dos autos, o que está em causa é saber se a segunda parte do artigo 170.º, n.º 1, do Código Penal, na parte em que prevê o crime de importunação sexual, traduzido no constrangimento de outra pessoa a contacto de natureza sexual, é desconforme à Constituição por não cumprir as exigências do princípio da tipicidade, mercê do conteúdo do tipo legal ser demasiado genérico.
No que respeita às condutas que poderão ser enquadráveis na previsão legal, podemos encontrar na doutrina entendimentos que, com pequenas diferenças, no essencial, são coincidentes.
Assim, José Mouraz Lopes (Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual no Código Penal, 4.ª Edição Revista e modificada de acordo com a Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, Coimbra Editora, 2008, pp. 108-109), delimita as condutas que podem integrar este tipo legal nos seguintes termos:
«No que respeita à importunação por constrição ao contacto de natureza sexual como elemento típico da segunda dimensão do crime, introduzida pela reforma de 2007, importa precisar a questão do que pode ser, por um lado o contacto de natureza sexual e por outro em que se traduz esse constrangimento.
Sobre a primeira questão há que começar por sublinhar que se trata de um contacto de natureza sexual sendo por isso de pressupor que só um ato sexual, que possa ser objetivamente entendido como tal, pode estar em causa. Estarão por isso fora do âmbito do tipo por um lado todos e quaisquer contactos físicos que não tenham a natureza de um ato sexual e, por outro lado, de uma forma inequívoca, todas as palavras ou gestos grosseiros de natureza sexual dirigidas à vítima.
Vale a pena apelar ao que vinha constituindo alguma discussão efetuada pela doutrina e jurisprudência sobre o que não é (ou não deve ser) um «ato sexual de relevo» e que não configurando essa figura essencial que está na origem da reforma de 1995, caberá hoje no domínio do contacto de natureza sexual para efeitos deste tipo de crime. É o caso do «apalpão» ou o «roçar» ou pressionar partes do corpo contra partes do corpo da vítima, por exemplo nos transportes públicos ou em espaços fechados, que podem consubstanciar uma situação «froteurismo» (de frotter).
Verificado o contacto de natureza sexual importa sublinhar que não basta a sua existência, só por si, para configurar o tipo de crime. O contacto tem que decorrer através de alguma forma de pressão, aperto, compressão ou coação que configure um ato que de uma forma inequívoca cerceia a liberdade sexual da vítima. Não existindo esse «mínimo» que identifique, objetivamente, esse constrangimento não se pode configurar, à luz do tipo de crime, uma ação típica.»
Inês Ferreira Leite (A tutela Penal da Liberdade Sexual, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 21, n.º 1, Janeiro-Março 2011, pp. 71-73), por seu turno, traça da seguinte forma os limites das condutas abrangidas pelo referido tipo legal:
«Assim, no crime de importunação sexual deverão caber os atos ou gestos que não envolvem contacto físico (pois é esta a esfera do exibicionismo) ou, quando envolvendo tal contacto, que fiquem aquém do relevo exigido para que seja praticado o crime de coação sexual. E podem ser “contactos sexuais” que não assumem tal relevo pois não integram um comportamento objetivamente identificável como sexual (toques em transportes públicos ou outros toques aparentemente cobertos pela adequação social, fetiches apenas subjetivamente aptos a provocar excitação sexual, como por exemplo, carícias em partes do corpo tradicionalmente não erógenas); ou porque não são aptos a lesar ou colocar em causa, de modo grave, a liberdade sexual, embora sejam de molde a importunar a vítima (simulação de ato sexual sobre uma vítima em plena rua, pequenos “apalpões” etc.). Importante é que a pessoa seja importunada com o ato exibicionista ou constrangida a um contacto de natureza sexual. Assim, no primeiro caso cabem apenas aqueles atos exibicionistas que limitem a liberdade de ação da vítima, impondo-lhe uma envolvência de caráter sexual, na qual esta é um participante involuntário, e nunca a mera exibição dos órgãos genitais. No segundo caso, cabe a imposição de um contacto de natureza sexual sobre a vítima, imposição esta que, por se tratar de constrangimento, terá que assentar na supressão do sentido da vontade da vítima. Não se tratando de um constrangimento obtido por meio de violência ou de ameaça grave, pode, contudo, tratar-se de um ato imposto pela surpresa, quando o agente conte com a impossibilidade de reação atempada da vítima para a constranger ao contacto sexual. Em qualquer dos casos, haverá sempre restrição da liberdade sexual, ou melhor, restrição da liberdade de não ser envolvido em contexto sexual imposto, sob pena de se perder o sentido da incriminação.»
Por sua vez, Paulo Pinto de Albuquerque (Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, págs. 468-469), entende que «o contacto de natureza sexual é a ação com conotação sexual realizada na vítima, que não tem a gravidade do ato sexual de relevo. O contacto de natureza sexual pode incluir o toque (com objetos ou partes do corpo) da nuca, do pescoço, dos ombros, dos braços, das mãos, do ventre, das costas, das pernas e dos pés da vítima (…)”.
Independentemente de, como é natural, poder não existir uma interpretação inteiramente coincidente, quer na doutrina, quer na jurisprudência, no que respeita a todas as condutas que poderão preencher a previsão do tipo legal em causa, este exige sempre a existência de um contacto do agente na pessoa da vítima, tal contacto terá de ser de natureza sexual (terá de ser um ato que afete de forma relevante a liberdade sexual da vítima, sem que assuma, contudo, a gravidade de um “ato sexual de relevo”), esse contacto terá de ser efetuado por meio de constrangimento da vítima a suportar tal ação (sem que, contudo tenha sido usada violência) e tal conduta terá de importunar a vítima.
Este conjunto de elementos do tipo define um quadro de comportamentos suficientemente definido, para que os cidadãos tenham a perceção de quais são as condutas que aí se sancionam como crime.
Há, contudo, quem questione se, devido à não especificação dos meios típicos que levam ao constrangimento e incómodo da vítima, esta modalidade de ação não terá sido construída de forma a afrontar o princípio da tipicidade, devido à sua configuração ser demasiado genérica e, portanto, não cumprir o dever de especificar suficientemente os factos merecedores de censura penal (cfr., neste sentido, Maria do Carmo Silva Dias, “Repercussões da Lei n.º 59/2007, de 4/9 nos crimes contra a liberdade sexual, Revista do CEJ, 1.º Semestre de 2008, Número 8, pág. 261).
Ora, o critério para aferir da existência de uma violação do princípio da tipicidade, neste âmbito, terá de ser o de saber se decorre da norma incriminatória qual o tipo de comportamento sancionado, sendo o mesmo objetivamente determinável, tornando-se claro o juízo de censura penal para os cidadãos que, deste modo, podem orientar a sua conduta de acordo com esse juízo normativo.
No caso concreto, embora possa existir um certo grau de indeterminação no que respeita aos meios pelos quais pode ser exercido o constrangimento e incómodo da vítima, a descrição dos comportamentos tipificados encontra-se formulada de maneira, tanto quanto é possível, precisa e clara, de modo a não existirem dúvidas quanto à definição dos elementos da infração.
Com efeito, apesar do uso de conceitos como “constrangimento”, “importunar”, ou “contacto de natureza sexual” sem especificação dos concretos meios utilizados nesse contacto, é possível extrair, quanto mais não seja, do conjunto da regulamentação típica da matéria dos crimes sexuais, a delimitação da área de proteção e dos comportamentos típicos abrangidos pela norma.
Em suma, a ação típica em questão encontra-se descrita de forma suficientemente precisa e inteligível no transcrito artigo 170.º do Código Penal, permitindo, com suficiente precisão, que os destinatários da norma orientem o seu comportamento.
Não se mostra, pois, violado, com esta incriminação, o princípio da legalidade criminal.
2.2. O princípio da necessidade da tutela penal
O Recorrente entende ainda que o segmento da norma penal contida na segunda parte do artigo 170.º do Código Penal, criminaliza condutas que não são merecedoras de tutela penal, o que violaria o princípio da intervenção mínima, uma vez que é pacífico que não se poderão criminalizar situações que, embora desagradáveis, não tenham o mínimo de dignidade penal, dada a não identidade perfeita entre ato social ou moralmente inaceitável e criminalmente punível, resultando a inconstitucionalidade da preocupação que parece radicar em tal preceito legal de confundir necessidade de intervenção do Direito Penal com moral e bons costumes. Sustenta, por isso, o Recorrente que o referido preceito viola os princípios constitucionais da proporcionalidade e da necessidade de incriminação.
Para análise desta questão, interessa saber que limites concretos a Constituição impõe ao conteúdo dos crimes, o que pressupõe uma abordagem da legitimidade jurídico-constitucional da incriminação.
Segundo a nossa lei criminal, constitui crime todo o facto descrito e declarado passível de pena por lei (artigo 1.º, n.º 1, do Código Penal). A Constituição, por seu turno, prevê expressamente que o legislador ordinário tem o direito de criar crimes (artigo 165.º, n.º 1, al. c), da Constituição). Todavia, traduzindo-se as penas criminais na restrição de direitos e liberdades consagrados na Constituição, tal restrição só é legítima, de acordo com o disposto no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, quando tiver por objetivo a proteção de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, isto é, quando a situação tipificada tiver dignidade penal.
Além disso, ainda de acordo com o referido preceito constitucional, é também necessário que a proteção de tais bens não possa realizar-se senão através da aplicação de penas ou medidas de segurança, o que faz do direito penal a ultima ratio da política social do Estado, exigindo-se uma situação de necessidade de tutela penal (vide CostaAandrade, em “Constituição e Direito Penal”, em “A justiça nos dois lados do Atlântico – Teoria e prática do processo criminal em Portugal e nos Estados Unidos da América”, pág. 200-205, da ed. de 1997, da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, Figueiredo Dias, em “O comportamento criminal e a sua definição: o conceito material de crime”, em “Temas básicos da doutrina penal”, pág. 33 e seg., da ed. de 2001, da Coimbra Editora, e Jorge Miranda e Rui Medeiros, em “Constituição Portuguesa anotada”, tomo I, pág. 326-327, da ed. de 2005, da Coimbra Editora).
O Tribunal Constitucional já teve ocasião de se pronunciar por diversas vezes a propósito do disposto no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição, enquanto parâmetro para aferir da legitimidade constitucional das incriminações, lendo-se, por exemplo no Acórdão n.º 109/99:
«O direito penal, enquanto direito de proteção, cumpre uma função de ultima ratio. Só se justifica, por isso, que intervenha para proteger bens jurídicos - e se não for possível o recurso a outras medidas de política social, igualmente eficazes, mas menos violentas do que as sanções criminais. É, assim, um direito enformado pelo princípio da fragmentariedade, pois que há de limitar-se à defesa das perturbações graves da ordem social e à proteção das condições sociais indispensáveis ao viver comunitário. E enformado, bem assim, pelo princípio da subsidariedade, já que, dentro da panóplia de medidas legislativas para proteção e defesa dos bens jurídicos, as sanções penais hão de constituir sempre o último recurso».
O princípio da necessidade de pena implica, assim, uma ponderação pelo legislador ordinário para decidir em definitivo da criminalização ou não de determinada conduta, da qualificação de determinado comportamento como crime, sendo que a intervenção do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, impedirá a tipificação de condutas que não tenham subjacente a tutela de bens jurídicos dotados de dignidade penal.
Assim, e sobre o que poderá considerar-se um bem jurídico com dignidade penal, escreveu-se o seguinte no Acórdão n.º 179/2012 deste Tribunal:
«Um bem com dignidade jurídico-penal é necessariamente uma concretização dos valores constitucionais. Nas palavras de Figueiredo Dias, “um bem jurídico político-criminalmente tutelável existe ali – e só ali – onde se encontre refletido num valor jurídico-constitucionalmente reconhecido”, isto é, um valor fundamental que pré-existe à incriminação e que permite apreciar criticamente o seu sentido (Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2007). Neste sentido, “a Constituição surge como o horizonte que há de inspirar e por onde há de pautar-se qualquer programa de política criminal” (v. Acórdão n.º 25/84), isto é, dela resulta uma ordenação axiológica que se afirma como “critério regulativo” da atividade punitiva do Estado (Figueiredo Dias, “Os novos rumos da política criminal e o direito penal português do futuro”, Revista da Ordem dos Advogados, ano 43, 1983, p. 16), assente nesse princípio da exclusiva proteção de bens jurídico-penais operacionalizado a partir do artigo 18.º, n.º 2: “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.
Apreciando a constitucionalidade do crime de tráfico de estupefacientes, este Tribunal assinalou, precisamente, que “o objetivo precípuo do direito penal é, com efeito, promover a subsistência de bens jurídicos da maior dignidade e, nessa medida, a liberdade da pessoa humana.” Esta incindível associação entre o direito penal e os bens jurídicos de eminente dignidade de tutela assume-se, desde logo, como um desdobramento do princípio constitucional da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2 da CRP (Costa Andrade, “A dignidade penal e a carência de tutela penal”, RPCC, n.º 2, 1992, p. 184).
Assim espartilhado, o instrumentarium penal “há de limitar-se à defesa das perturbações graves da ordem social e à proteção das condições existenciais indispensáveis ao viver comunitário” (cf. Acórdão n.º 83/95), sendo que estamos perante um bem jurídico com dignidade de tutela quando a conduta que o lese mereça, pela sua danosidade social, um “juízo qualificado de intolerabilidade social” (Costa Andrade, ob. cit., p. 184).
Daqui decorre que “toda a norma incriminatória na base da qual não seja suscetível de se divisar um bem jurídico-penal claramente definido é nula, porque materialmente inconstitucional” (Figueiredo Dias, ob. cit., p. 126 ).»
Deste modo, e sendo certo que a Constituição não contém, à partida, qualquer proibição de criminalização, desde que se mostrem observados os princípios acima referidos, o legislador goza de ampla liberdade na individualização dos bens jurídicos carecidos de tutela penal, bem como na delimitação das condutas consideradas lesivas de tais bens jurídicos. Neste mesmo sentido, no seu acórdão n.º 634/93, o Tribunal Constitucional afirmou o seguinte: «É evidente que o juízo sobre a necessidade do recurso aos meios penais cabe, em primeira linha, ao legislador, ao qual se há de reconhecer, também nesta matéria, um largo âmbito de discricionariedade. A limitação da liberdade de conformação legislativa, nestes casos, só pode, pois, ocorrer quando a punição criminal se apresente como manifestamente excessiva.»
No caso dos autos, importa, pois, apreciar se a norma em causa tem por fim assegurar a proteção de bens jurídicos e, na afirmativa, se para esse efeito se mantém ou não dentro dos limites impostos pelo princípio da necessidade.
Ora, como vimos, com a incriminação prevista na segunda parte do artigo 170.º do Código Penal, visa-se proteger a liberdade sexual, punindo a importunação de outra pessoa, mediante o constrangimento desta a contacto de natureza sexual.
Ou seja, o legislador entendeu que esse constrangimento a contacto de natureza sexual se traduzia numa ofensa ao bem jurídico da liberdade sexual, cujo relevo era merecedor de tutela penal, não obstante esse contacto não revestir uma gravidade idêntica ou equiparável à do “ato sexual de relevo”. Estamos, assim, perante uma opção de política criminal, por parte do legislador, que entendeu que os referidos comportamentos ainda eram dotados de dignidade punitiva, sendo que a criminalização da conduta em causa não teve na sua base razões ligadas ao domínio da moral social ou da moralidade sexual, mas sim apenas a proteção da liberdade pessoal, num dos domínios em que essa liberdade se projeta.
Assim, no caso concreto, o bem jurídico tutelado pelo tipo legal de crime em causa é inquestionavelmente dotado de dignidade bastante para ser merecedor de tutela penal. Por outro, lado, embora as condutas objeto de criminalização no referido tipo legal possam estar próximas do limiar mínimo no que respeita à carência de tutela penal, não se pode esquecer que essa “menor” dignidade penal ou menor danosidade de tais condutas encontra-se refletida na sanção prevista (pena de prisão até um ano ou pena de multa até 120 dias).
Não é, contudo, evidente que a diminuta gravidade dessas condutas seja de tal grau que se possa afirmar que a intervenção do direito penal nestes casos se revela excessiva.
Assim, e sendo certo que, nesta matéria, este Tribunal só deve censurar as soluções legislativas que forem manifestamente excessivas, há que concluir que a norma em questão não viola qualquer norma ou princípio constitucional, designadamente os princípios constitucionais da necessidade, adequação e proporcionalidade, a que devem obedecer as leis restritivas dos direitos, liberdades e garantias, nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição.
Deste modo, não se revelando que a tipificação como crime da conduta prevista no artigo 170.º, 2,ª parte, do Código Penal, ofenda qualquer parâmetro constitucional, deve ser julgado improcedente o recurso interposto.
Decisão
Nestes termos, decide-se:
a) não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 170.º do Código Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro, na parte em que tipifica como crime a conduta de quem importunar outra pessoa, constrangendo-a a contacto de natureza sexual;
b) não conhecer das demais questões de constitucionalidade colocadas pelo Recorrente;
e, em consequência,
c) julgar improcedente o recurso interposto para o Tribunal Constitucional por A..
Custas pelo Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 4 de outubro (artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma).
Lisboa, 20 de fevereiro de 2013. – João Cura Mariano – Fernando Vaz Ventura – Ana Guerra Martins – Pedro Machete – Joaquim de Sousa Ribeiro.