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Processo nº 782/01
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Por requerimento de 22 de Agosto de 2001, de fls. 32, L... Gmbh e T..., SA, recorreram para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 8 do mesmo mês de Agosto, de fls. 24, pretendendo, ao abrigo do disposto na al. b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, que fosse apreciada a inconstitucionalidade da norma constante do “nº 2 do art.º
3º do Decreto-Lei nº 134/98, de 15 de Maio”, por violação do disposto no nº 4 do artigo 268º da Constituição. Não tendo, porém, sido admitido o recurso, pelo despacho de fls. 34, L... Gmbh e T..., SA, vieram reclamar para o Tribunal Constitucional , nos termos do nº 4 do artigo 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Em seu entender, o motivo da não admissão – não ter sido aplicada a norma referida – não teria fundamento, já que “... o Acórdão do STA de 08.08.01 fez – e duplamente – aplicação da norma do nº 2 do artigo 3º do DL 134/98, pois, por um lado, confirmou o teor do Acórdão do TCA de 10.05.01 que já havia feito aplicação da norma em causa e, por outro, voltou a considerar, de forma expressa, como extemporâneo o recurso contencioso de anulação apresentado pelos recorrentes”. Notificado para se pronunciar, o Governo Regional da Madeira veio sustentar a não admissibilidade do recurso, e o indeferimento da reclamação (cfr. fls.41).
2. Subidos os autos ao Tribunal Constitucional, foi notificado o Ministério Público, que, conforme consta de fls. 48, vº, veio considerar “manifestamente improcedente” a reclamação, considerando igualmente não ter sido aplicada pelo acórdão recorrido a norma impugnada.
3. No que agora interessa, o acórdão recorrido foi proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo no recurso interposto também por L... Gmbh e T..., SA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo de 10 de Maio de 2001, de fls. 6, que indeferiu a reclamação para a conferência do despacho de 22 de Janeiro de
2001; este despacho indeferira o pedido (de 17 de Janeiro de 2001) de passagem das guias correspondentes ao preparo relativo ao recurso que interpuseram a 11 de Janeiro de 2001, para o Supremo Tribunal Administrativo, do acórdão do Tribunal Central Administrativo de 14 de Dezembro anterior, por extemporaneidade deste recurso; e este acórdão de 14 de Dezembro de 2000, por sua vez, julgara extemporâneo o recurso contencioso interposto sempre por L... Gmbh e T..., SA, da Resolução nº 705/98 do Governo Regional da Madeira, aprovada em 4 de Junho de
1998. O acórdão agora sob recurso, sempre apenas para o que agora releva, decidiu o seguinte:
“A decisão jurisdicional que é objecto do presente recurso é, na sua tipologia processual, um acórdão que indefere uma reclamação contra despacho do relator, nos termos do art. 700º, nº 3, do CPC. E que, portanto, tem como efeito manter na ordem jurídica a decisão reclamada. Essa decisão consistiu em indeferir o pedido das recorrentes (...) [de] que fossem mandadas passar guias (subentende-se, de preparo) do recurso jurisdicional (para o STA) do Acórdão do TCA, de fls. 219, que rejeitara, por extemporaneidade, o recurso contencioso. Ora, em boa verdade, não existe verdadeira autonomia da decisão que recusa a passagem dessas guias face à decisão de indeferir ou não admitir o recurso jurisdicional a que as guias se referem. Uma coisa é consequência e efeito automático da outra, pois não pode haver passagem de guias nem pagamento de preparo de um recurso ou de qualquer outro acto de processo que o tribunal decidiu que não ia ter seguimento. E, por outro lado, essa decisão foi tomada nos autos de modo definitivo, constituindo caso julgado formal que terá de respeitar-se (art. 672º do CPC). Na realidade, do despacho do relator que não admitiu o recurso jurisdicional, por ter sido interposto para além do prazo legal, reclamaram as recorrentes para o Presidente deste Supremo Tribunal, que p[or] despacho (...) indeferiu a reclamação. Tendo esta decisão transitado em julgado, ficou a valer o Acórdão de fls. 219 que rejeitou o recurso contencioso, retirando às recorrentes a possibilidade, que com o presente recurso pretendem utilizar, de discutir o acerto ou desacerto desse julgamento. Nem se insista que o presente recurso jurisdicional se circunscreve apenas à questão da emissão das guias, já que essa questão é indissolúvel da de saber se esse recurso pode ou não ter seguimento, e essa acha-se definitivamente resolvida, e no sentido negativo. Não é possível emitir um juízo acerca da existência dum hipotético direito a efectuar o preparo de determinado recurso sem imediatamente pôr em causa a bondade da decisão de o indeferir, por ele ter sido interposto fora de prazo.
(...) Nestes termos, acordam em negar provimento ao recurso”.
4. Da transcrição efectuada resulta claramente, pois, que o acórdão recorrido não aplicou a norma do “nº 2 do art.º 3º do Decreto-Lei nº 134/98, de 15 de Maio”, condição que seria indispensável ao conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade interposto e, portanto, ao deferimento da presente reclamação.
É o seguinte o texto deste nº 2, relativo ao recurso contencioso definido no nº 1 do mesmo artigo 3º:
“2 – O prazo para a interposição de recurso é de 15 dias a contar da notificação dos interessados ou, não havendo lugar à notificação, a partir da data do conhecimento do acto”. Ora o acórdão recorrido afirma, expressamente, que não conhece da questão de saber se o recurso contencioso do acto de adjudicação foi ou não interposto a tempo porque há caso julgado formal quanto à sua extemporaneidade.
5. Com efeito, o recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade interposto ao abrigo da citada alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 destina-se a conhecer da alegada inconstitucionalidade de uma norma efectivamente aplicada pela decisão recorrida, como expressamente ali se refere
(“Cabe recurso para o Tribunal Constitucional em secção, das decisões dos tribunais: b) Que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.”) e o Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado. Deste modo, não tendo a disposição impugnada sido aplicada pela decisão recorrida, não poderia o Tribunal Constitucional conhecer do objecto do recurso
(cfr., por exemplo, o acórdão nº 367/94, publicado no Diário da República, II Série, de 7 de Setembro de 1994), o que conduz à manifesta improcedência da presente reclamação, por faltar um pressuposto indispensável a esse conhecimento.
Nestes termos, indefere-se a reclamação. Custas pelas recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 15 ucs (por ambas as recorrentes).
Lisboa,31 de Janeiro de 2002 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida