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Proc. nº 420/99
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1. Por decisão do Tribunal Judicial do Trabalho de Almada foram julgados improcedentes os embargos que C..., C.R.L., (ora recorrente) veio deduzir à execução que lhe foi movida por M...(ora recorrida).
2. Inconformada com aquela decisão a embargante veio recorrer para o Tribunal da Relação de Lisboa. A concluir a sua alegação, disse, designadamente, o seguinte:
“(...) O artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, única norma que permitiria a aplicação da cláusula 105º do A.C.T. é inconstitucional, por violar o disposto nos artigos 13º e 59º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que a sua aplicação conduziria a uma situação de discriminação entre os trabalhadores com contrato de trabalho anterior a 29 de Dezembro de 1979, que beneficiariam do complemento de reforma e os trabalhadores com contrato de trabalho posterior a essa data, que não teriam direito a qualquer complemento, em total desrespeito pelo princípio da igualdade, pelo que o Tribunal a quo ao aplicar o artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, violou o disposto no art. 207º da Constituição da República Portuguesa, que proíbe a aplicação de normas que infrinjam o disposto na Constituição.
(...)”.
3. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 13 de Janeiro de 1999, decidiu negar provimento ao recurso. Escudou-se, para tanto, designadamente, na seguinte fundamentação:
“(...) Fundamentos de direito. A) A questão de omissão de pronúncia, sobre a alegada inconstitucionalidade da cláusula 105º do A.C.T: A apelante alega, que na sentença recorrida houve omissão de pronúncia, dado que foi considerada impertinente a questão da inconstitucionalidade da cláusula 105º do A.C.T., tendo em conta que as partes não invocaram quaisquer normas legais na transacção judicial que fizeram. Entende-se que o Mº Juiz recorrido não tinha que se pronunciar sobre a questão da inconstitucionalidade da cláusula do A.C.T. referida. Recorde-se que a acção que deu origem à execução e aos embargos de executado, terminou por transacção entre as partes, conseguida em tentativa de conciliação, presidida pelo Mº Juiz. As partes nada disseram sobre as razões porque se conciliavam e não tinham que o dizer, bastando apenas que revelassem a sua vontade de modo livre e os termos da respectiva transacção ou acordo.
(...)
É certo que a A. fundamentava a sua pretensão na cláusula 105º do A.C.T. Porém, como na tentativa de conciliação as partes nada disseram sobre as razões que as levava ao acordo, não sendo a conciliação subordinada a critérios de estrita legalidade, não sendo o resultado contrário à lei, parece que não havia qualquer obstáculo a que o acordo fosse assinado.
(...) Por outro lado, ao que sabemos, na altura da conciliação – 20/09/88 – não existia, nem sequer actualmente existe, qualquer decisão, nomeadamente acórdão do Tribunal Constitucional, que obrigatoriamente tenha declarado inconstitucional a cláusula 105º do referido A.C.T. nem o art. 6º, nº 1, al. e) do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, que a apelante agora vem também arguir de inconstitucional. O Juiz que presidir à tentativa de conciliação, nos termos do art. 51º do C. P. Trabalho, nem sequer homologa o acordo, devendo apenas certificar-se da capacidade das partes e da legalidade do resultado da conciliação, que expressamente mencionará nos autos. Por que motivo deveria o juiz que presidiu à conciliação inviabilizar o acordo, que as partes queriam, alegando inconstitucionalidade da cláusula do A.C.T., ou da alínea e) do nº 1 do art. 6º do Decreto-Lei nº 519-C1/79, que não tinha sido suscitada pelas partes, não havendo lei expressa que consigne tal inconstitucionalidade, sendo actualmente objecto de opinião e decisões contraditórias (a questão) e não existindo, sequer, decisão do Tribunal Constitucional que declare, com força obrigatória, tal inconstitucionalidade ? O Mº Juiz certificou a capacidade das partes e a legalidade do resultado da conciliação, que se verificavam, e daí, conjugado com o facto de que o auto de conciliação foi assinado pelos intervenientes, o acordo celebrado passou a produzir efeito de caso julgado, nos termos do art. 51º do C. P. Trabalho. A Apelante colocou a questão da inconstitucionalidade da cláusula 105º do A.C.T nos embargos de executado, porém já sem qualquer relevância. Na verdade, nos termos do art. 671º do C. P. Civil, o acordo ficou com força obrigatória dentro do processo e fora dele. Nos termos do art. 94º, nº 2 do C. P. Trabalho e 813º do C. P. Civil, a oposição
à execução não podia fundamentar-se na alegada inconstitucionalidade. Assim, o Mº Juiz a quo não tinha que conhecer na sentença relativa aos embargos quanto à aludida questão de inconstitucionalidade, que não foi suscitada no processo em que se formou o título executivo (a acção declarativa em que as partes efectuaram o acordo, que veio dar lugar à execução, por incumprimento da Ré, ora Apelante). Tendo em conta que se chegou à conclusão que o Mº Juiz não tinha que se pronunciar sobre tal questão, não tendo havido omissão de pronúncia, é óbvio que tal questão não é objecto do recurso. Aliás, como já se referiu, a questão colocada num sentido mais genérico, ou seja, referida à inconstitucionalidade da alínea e) (e não f) como se refere no recurso) do nº 1 do art. 6º do Decreto-Lei nº 519-C1/79, não está decidida com carácter de obrigatoriedade geral, pelo que continua a divergência, quanto à questão, na doutrina e na jurisprudência. Por outro lado, como se referiu na douta sentença recorrida, o art. 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 519-C1/79, salvaguardou o direito aos complementos de reforma que já constavam do anterior I.R.C. (direitos adquiridos). O complemento de reforma integrou-se no contrato de trabalho da embargada, como direito adquirido, muito antes da publicação do DL nº 519-C1/79, e dos I.R.C. mencionados pela embargante, ora apelante.
(...)”.
4. É desta decisão que vem interposto, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art.
70º da LTC, o presente recurso. Pretende a recorrente ver apreciada a constitucionalidade do artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei 519-C1/79, de 29 de Dezembro, por alegada violação do princípio da igualdade consagrado nos artigos
13º e 59º da Constituição da República Portuguesa.
5. Já neste Tribunal foi a recorrente notificada para alegar, o que fez, tendo concluído nos seguintes termos:
“1º. O artigo 6º, nº 2 do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro é inconstitucional, por violar o princípio da igualdade consagrado nos artigos 13º e 59º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que a sua aplicação conduziria a uma situação de discriminação entre os trabalhadores com contrato de trabalho anterior a 29 de Dezembro de 1979, que beneficiariam do complemento de reforma, e os trabalhadores com contrato de trabalho posterior a essa data, que não teriam direito a qualquer complemento;
2º. O artigo 6º, nº 2 do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, é igualmente inconstitucional, por violar o princípio da segurança social e solidariedade consagrado no artigo 63º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que a sua aplicação conduziria à aplicação de uma obrigação às entidades privadas, que é reservada por força da Constituição, ao Estado Português”.
6. Por parte da recorrida não foi apresentada, dentro do prazo legal, qualquer alegação.
7. Na sequência, elaborou o Relator um “parecer” em que suscitava, como questão prévia, a impossibilidade de conhecer do objecto do recurso, solução que fundamentou nos seguintes termos:
“Vem o presente recurso, interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, para apreciação da constitucionalidade da norma que se extrai do artigo
6, nº 2, do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, preceito que dispõe como segue: Artigo 6º
1. (...)
2. A restrição constante da alínea e) do número anterior não afecta a subsistência dos benefícios complementares anteriormente fixados por convenção colectiva, os quais se terão por reconhecidos, no mesmo âmbito, pelas convenções subsequentes, mas apenas em termos de contrato individual de trabalho.”
Por sua vez, a alínea e) do nº 1 daquele artigo 6º, para que remete aquele nº 2, dispõe que: “Os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho não podem
(....) estabelecer e regular benefícios complementares dos assegurados pelas instituições de previdência”. Pretende a recorrente que a norma que se extrai daquele art. 6º, nº 2 é inconstitucional, designadamente por “a sua aplicação conduzir a uma situação de discriminação entre os trabalhadores com contrato anterior a 29 de Dezembro de
1979, que beneficiariam do complemento de reforma, e os trabalhadores com contrato de trabalho posterior a essa data, que não teriam direito a qualquer complemento, em total desrespeito pelo princípio da igualdade...”. Pois bem: ainda antes de vermos se pode conhecer-se do objecto do recurso, esclareça-se que o argumento da recorrente parte e não pode prescindir de um pressuposto que é falso: o da validade constitucional do disposto no artigo 6º, nº 1, alínea e), do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro. Efectivamente, tendo o Tribunal Constitucional considerado formalmente inconstitucional a norma do artigo 6º, nº 1, alínea e), do Decreto-Lei nº
519-C1/79, de 29 de Dezembro, à qual se refere o artigo 6º, nº 2 do mesmo Decreto-Lei, ora objecto de recurso (cfr. acórdão nº 517/98, tirado em Plenário e publicado no Diário da República, II, de 10 de Novembro de 1998), deixa de fazer sentido o argumento da desigualdade substancial afirmada pela recorrente para sustentar a inconstitucionalidade material daquele artigo 6º, nº 2. Na realidade, sendo inconstitucional a proibição estabelecida por aquela alínea e) de os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, posteriores a 29 de Dezembro de 1979, estabelecerem e regularem benefícios complementares dos assegurados pelas instituições de previdência, desapareceria a referida desigualdade entre trabalhadores com contrato anterior e posterior àquela data.
9. Sucede, porém, que uma outra razão obsta a que possa sequer conhecer-se do objecto do recurso. Como o Tribunal Constitucional tem reiterada e uniformemente afirmado, por força da natureza instrumental do recurso de constitucionalidade, só deve conhecer de uma questão de constitucionalidade normativa se a resolução de tal questão se repercutir de alguma forma no julgamento da questão substantiva apreciada na decisão recorrida. Dessa forma, para decidir pode conhecer-se do objecto do recurso, decisivo é saber se, pronunciando-se agora o Tribunal Constitucional pela inconstitucionalidade daquele artigo 6º, nº 2, Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, tal implicaria uma alteração do decidido quanto à questão substantiva que foi objecto da decisão recorrida. Cremos que não, na medida em que do teor da decisão recorrida, que supra já transcrevemos na parte ora relevante, resulta claramente que a decisão, nesta parte, de negar provimento aos embargos da executada (a ora recorrente), assenta decisivamente e em termos só por si considerados suficientes na validade da transacção efectuada entre as partes na acção declarativa que antecedeu a presente acção executiva. Nessa medida parece resultar claro do texto da própria decisão recorrida que uma eventual declaração de inconstitucionalidade do art. 6º, nº 2, não teria consequências práticas na decisão a proferir em consequência pelo Tribunal recorrido, pelo que, de acordo com a jurisprudência antes expressa, não poderá conhecer-se do objecto do recurso”.
8. Notificadas as partes, em cumprimento do disposto no artigo 3º, nº 3 do Código de Processo Civil, para, querendo, se pronunciarem sobre a questão prévia suscitada, a recorrente veio aos autos para sustentar a sua improcedência. Alegou, em síntese, que:
i) quanto à “primeira parte da questão prévia”, ela não procede na medida em que o artigo 6º, nº 1, al. e) do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, não foi julgado inconstitucional com força obrigatória geral, na sequência de um processo de fiscalização abstracta, tendo apenas sido julgado inconstitucional na sequência de processos de fiscalização concreta da constitucionalidade, com eficácia no caso onde a questão é suscitada, mas que não impedem que a norma continue a vigorar no ordenamento jurídico;
ii) quanto à “segunda parte da questão prévia”, segundo a qual o Tribunal só pode conhecer de uma questão de constitucionalidade normativa se a resolução de tal questão se repercutir de alguma forma no julgamento da questão substantiva apreciada na decisão recorrida, entende a recorrente que ela não procede “atento o disposto no artigo 70º, nr. 1 alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional”.
9. Por parte da recorrida não foi apresentada, dentro do prazo legal, qualquer resposta.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação.
10. Em parecer notificado às partes, nos termos e para os efeitos do artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil, sustentou o Relator que não poderia conhecer-se do objecto do recurso por, dada a natureza instrumental do recurso de constitucionalidade, só dever conhecer-se de uma questão de constitucionalidade normativa se a resolução de tal questão for susceptível de se repercutir de alguma forma no julgamento da questão substantiva apreciada na decisão recorrida, o que não aconteceria no caso dos autos.
11. Na sua resposta a recorrente veio questionar este entendimento. Por um lado porque considera que a exigência de que a resolução da questão de constitucionalidade se tenha de repercutir de alguma forma no julgamento da questão substantiva apreciada na decisão recorrida é contrária ao que se dispõe no artigo 70º, nº 1 alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional, que não o exige. Por outro lado, porque entende que nem sequer é verdade, como se refere no “parecer” do Relator, que a decisão recorrida não seria alterada se fosse decretada a inconstitucionalidade do artigo 6º, nº 2 do Decreto-Lei nº
519-C1/79, de 29 de Dezembro.
A verdade, porém, é que não lhe assiste qualquer razão.
11.1. Desde logo não tem razão quando alega que o entendimento segundo o qual, dada a natureza instrumental do recurso de constitucionalidade, só deverá o Tribunal conhecer de uma questão de constitucionalidade normativa se a resolução de tal questão se repercutir de alguma forma no julgamento da questão substantiva apreciada na decisão recorrida, é contrário ao que se dispõe na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC.
Na realidade, a natureza instrumental, no sentido antes referido, do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade - que tem sido repetidamente afirmada pelo Tribunal Constitucional (cfr., entre inúmeros nesse sentido, os acórdãos nºs 505/98, 524/98, 114/99, 490/99, 692/99 (ainda inéditos) e, mais recentemente, os acórdãos nºs 457/01 e 464/01, publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 27 e 28 de Outubro de 2001) -, não só não é contrariada pelo disposto na alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC, como resulta igualmente do que nela se dispõe.
Efectivamente, como o Tribunal Constitucional tem repetidamente demonstrado, a alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC exige uma efectiva aplicação da norma cuja constitucionalidade o recorrente pretende ver apreciada o que, por sua vez, pressupõe que a norma em causa constitua a ratio decidendi da decisão, “o fundamento normativo do seu próprio conteúdo, ou do julgamento da causa”, como se escreveu, designadamente, no acórdão nºs 82/92 (Diário da República, II Série, de 18 de Agosto de 1992).
Dessa forma, evidente se torna que, ao contrário do que afirma a recorrente, é - também - da própria alínea b) do nº 1 do artigo 70º que resulta o entendimento de que a norma em causa - e, consequentemente, o problema da sua constitucionalidade - tem de ter sido relevante para o julgamento da questão substantiva apreciada na decisão recorrida (nesse sentido, entre outros, o Acórdão nº 124/88, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol., pp. 911-912).
11.2. Mas também não tem razão a recorrente quando alega que não é verdade, como se escreveu no “parecer” do Relator, que a decisão recorrida não seria alterada se fosse agora decidida a inconstitucionalidade do artigo 6º, nº 2 do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro.
Como ali se demonstrou, a decisão, nesta parte, de negar provimento aos embargos da executada (a ora recorrente), assentou decisivamente e em termos só por si considerados suficientes na validade da transacção efectuada entre as partes na acção declarativa que antecedeu a presente acção executiva. Nesse sentido pode ler-se na decisão recorrida:
“(...). A apelante alega, que na sentença recorrida houve omissão de pronúncia, dado que foi considerada impertinente a questão da inconstitucionalidade da cláusula 105º do A.C.T., tendo em conta que as partes não invocaram quaisquer normas legais na transacção judicial que fizeram. Entende-se que o Mº Juiz recorrido não tinha que se pronunciar sobre a questão da inconstitucionalidade da cláusula do A.C.T. referida. Recorde-se que a acção que deu origem à execução e aos embargos de executado, terminou por transacção entre as partes, conseguida em tentativa de conciliação, presidida pelo Mº Juiz. As partes nada disseram sobre as razões porque se conciliavam e não tinham que o dizer, bastando apenas que revelassem a sua vontade de modo livre e os termos da respectiva transacção ou acordo.
(...)
É certo que a A. fundamentava a sua pretensão na cláusula 105º do A.C.T. Porém, como na tentativa de conciliação as partes nada disseram sobre as razões que as levava ao acordo, não sendo a conciliação subordinada a critérios de estrita legalidade, não sendo o resultado contrário à lei, parece que não havia qualquer obstáculo a que o acordo fosse assinado.
(...) O Mº Juiz certificou a capacidade das partes e a legalidade do resultado da conciliação, que se verificavam, e daí, conjugado com o facto de que o auto de conciliação foi assinado pelos intervenientes, o acordo celebrado passou a produzir efeito de caso julgado, nos termos do art. 51º do C. P. Trabalho. A Apelante colocou a questão da inconstitucionalidade da cláusula 105º do A.C.T nos embargos de executado, porém já sem qualquer relevância. Na verdade, nos termos do art. 671º do C. P. Civil, o acordo ficou com força obrigatória dentro do processo e fora dele. Nos termos do art. 94º, nº 2 do C. P. Trabalho e 813º do C. P. Civil, a oposição
à execução não podia fundamentar-se na alegada inconstitucionalidade. Assim, o Mº Juiz a quo não tinha que conhecer na sentença relativa aos embargos quanto à aludida questão de inconstitucionalidade, que não foi suscitada no processo em que se formou o título executivo (a acção declarativa em que as partes efectuaram o acordo, que veio dar lugar à execução, por incumprimento da Ré, ora Apelante). Tendo em conta que se chegou à conclusão que o Mº Juiz não tinha que se pronunciar sobre tal questão, não tendo havido omissão de pronúncia, é óbvio que tal questão não é objecto do recurso”.
Do exposto resulta que para negar provimento aos embargos da executada (a ora recorrente), a decisão recorrida não considerou decisiva a existência do artigo
6º, nº 2 do DL nº 519-C1/79, mas a validade da transacção efectuada entre as partes na acção declarativa que antecedeu a presente acção executiva.
Ora, tanto basta para que o Tribunal Constitucional não conheça do respectivo objecto, por inutilidade de qualquer juízo que venha que emitir sobre a questão de inconstitucionalidade suscitada, conforme se explicou no parecer de fls. 252 a 258, notificado às partes.
12. Naquele “parecer” refere-se ainda que o argumento da recorrente para sustentar a inconstitucionalidade material do artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº
519-C1/79, de 29 de Dezembro, por alegada violação do princípio da igualdade quando confrontado com o estatuído na alínea e), do nº 1, do mesmo artigo 6º, partiria de um pressuposto errado: o da validade constitucional deste último preceito.
Sustentou a recorrente na sua resposta que não é assim, na medida em que o artigo 6º, nº 1, al. e), não foi julgado inconstitucional com força obrigatória geral, na sequência de um processo de fiscalização abstracta, tendo apenas sido julgado inconstitucional na sequência de processos de fiscalização concreta da constitucionalidade, com eficácia no caso onde a questão é suscitada, mas que não impedem que a norma continue a vigorar no ordenamento jurídico.
Sobre esta questão deve, apenas, esclarecer-se - porque ela surge ali (como agora) claramente como um obiter dictum, em função da impossibilidade de, por outros fundamentos já expostos, conhecer do objecto do recurso - que, manifestamente, não se pretendeu nunca dizer (nem se disse) que o artigo 6º, nº
1, alínea e) não existiria na ordem jurídica, mas apenas que, a ser de conhecer do objecto do recurso, o julgamento da questão de inconstitucionalidade material do artigo 6º, nº 2, do Decreto-Lei nº 519-C1/79, de 29 de Dezembro, por alegada violação do princípio da igualdade quando confrontado com o estatuído na alínea e), do nº 1, do mesmo artigo 6º, pressuporia sempre que se considerasse este
último preceito conforme à Constituição, o que o Tribunal Constitucional, em sucessivos processos de fiscalização concreta de constitucionalidade, tem sistematicamente rejeitado.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se não conhecer do objecto do recurso. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 8 (oito) unidades de conta.
Lisboa, 26 de Fevereiro de 2002 José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Luís Nunes de Almeida