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Processo n.º 251/01
2ª Secção Relator - Paulo Mota Pinto
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional: I. Relatório
1.Em 13 de Maio de 1996, A ... instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra F... invocando ser legítimo portador de um cheque emitido pela portadora no valor de 60.000$00. Em virtude de insuficiência dos bens nomeados pela executada, veio o exequente nomear à penhora, em 18 de Junho de
1998, “a parte legalmente possível do rendimento mínimo garantido do montante de
52.000$00 que a executada se encontra a receber”. Na sequência deste requerimento, o juiz do Tribunal Judicial de Olhão determinou a penhora de 1/6 do rendimento mínimo auferido, nos termos do disposto no artigo
824º, n.º 1, al. b) e n.º 2 do Código de Processo Civil. Em 8 de Março de 1999 veio a executada deduzir incidente de oposição à penhora, nos seguintes termos:
“(...) 4º Entende a executada que o Rendimento Mínimo Garantido criado pela Lei n.º 19-A/96 de 29 de Junho é totalmente intocável, logo, impenhorável.
5º Citando o Prof. Alberto dos Reis in ‘Processo de Execução’ 1º vol., 3ª Ed., pág. 352: ‘Razões de decência e de humanidade fazem que se subtraia à penhora, qualquer que seja a natureza ou origem da dívida, aquilo que é absolutamente indispensável à vida do executado e da sua família. Seria odioso e afrontoso de todos os sentimentos de respeito pela pessoa humana que a penhora se levasse até ao ponto de deixar o executado e os seus inteiramente despojados do que lhes é estritamente imprescindível para a satisfação das mais elementares necessidades da vida’.
6º À semelhança do salário mínimo nacional, criado pelo Dec. Lei n.º 217/74, de
25 de Maio, o Rendimento Mínimo Garantido, foi criado também por motivos de pura humanidade. Na realidade, não causa embaraço a afirmação de constituírem, quer um, quer outro, o mínimo dos mínimos para a sobrevivência de qualquer ser humano.
7º Por isso, é que, no que respeita ao salário mínimo nacional, estabelece o art. 59º, n.º 2 da Constituição da República: ‘Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente: a) o estabelecimento e actualização do salário mínimo nacional, tendo em conta, entre outros factores, as necessidades dos trabalhadores, o aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas, as exigências da estabilidade económica e financeira e a acumulação para o desenvolvimento’.
9º Por outro lado, o artº 63, n.º 3 da Constituição da República estabelece que:
‘O sistema de segurança social protege os cidadãos..., bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho’.
10º O Rendimento Mínimo Garantido é, pois, indispensável para o sustento do beneficiário.
11º Por isso, sob pena de se violar o citado texto constitucional, não pode o Rendimento Mínimo Garantido ser penhorado, total ou parcialmente.
12º Além do mais que o valor auferido pela executada a título de rendimento mínimo garantido mostra-se inferior ao salário mínimo nacional.
13º Numa situação idêntica em que foi chamado a intervir, decidiu o Tribunal da Relação de Évora que o Salário Mínimo Nacional é impenhorável (Ac. Da RE de
17/03/1988, in CJ tomo II, pág. 290).
14º A executada não aufere outros rendimentos, sobrevive apenas e só com o Rendimento Mínimo Garantido.
15º A ser-lhe retida a quantia de Esc. 8.750$00 mensais, equivalente a 1/6 da prestação do rendimento mínimo garantido, ficará numa situação aflitiva, pois que, com o que lhe resta, Esc. 43.750$00, terá de providenciar a sua alimentação e a dos 3 filhos menores que tem a seu cargo, não falando de outras necessidades essenciais.
16º Como se vê do despacho de fls., que ordenou a penhora de 1/6 do rendimento mínimo garantido, não apreciou nem decidiu a Mm. Juiz, titular do processo, das condições económicas da executada, mormente, das suas necessidades e das do seu agregado familiar.
17º Porque assim é, legitima-se o recurso à presente via incidental- al. a) do artº 863º-A do Cód. Proc. Civil”.
2.Por decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Olhão foi mantida a penhora de
1/6 do rendimento mínimo garantido da executada, nos seguintes termos:
“Invoca a executada para fundamentar o levantamento da penhora os arts. 59º, n.º
2 e 63º, n.º 3 da CRP. Relativamente ao primeiro dos artigos dir-se-á que o mesmo não tem aplicação nos presentes autos pois tal dispositivo reporta-se aos trabalhadores, o que não é seguramente o caso da executada que não exerce qualquer actividade profissional. No que concerne ao art. 63º, n.º 3 da CRP tal normativo dispõe que ‘o sistema de segurança social protege os cidadãos no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de subsistência ou capacidade para o trabalho’. No âmbito deste artigo foi publicada a Lei 19-A/96 de 29.6 que institui uma prestação, do regime não contributivo da segurança social, por forma a assegurar aos indivíduos e seus agregados familiares recursos que contribuíssem para a satisfação das suas necessidades mínimas e para o favorecimento de uma progressiva inserção social e profissional. Foi neste âmbito que foi concedido o rendimento mínimo à executada. A questão que se coloca é pois a de saber se o rendimento mínimo garantido é ou não penhorável. Dispõe o artigo 821º do CPC que estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda. O art. 45º da Lei 28/84, de 14.8 da Segurança Social prescreve que as prestações devidas pelas instituições de segurança social que exceda o mínimo adequado e necessário a uma sobrevivência condigna. Se é certo que o rendimento mínimo garantido tem como pressuposto assegurar a satisfação das necessidades mínimas do agregado familiar, certo é que a executada não recebe apenas a quantia de 55.250$00 da segurança social, sendo ajudada pelo seu ex-marido nas despesas relativas aos seus filhos. Além disso ficou apurado que a executada circula usualmente num veículo automóvel, o que pelas regras da experiência implica por parte dela uma série de encargos acrescidos (gasolina; seguro; revisão; prestações), que de forma alguma se coadunam com a situação de precariedade invocada, com vista ao levantamento da penhora, sob pena de ser violado o direito do credor à satisfação do seu crédito, que se extrai do n.º 1 do art.º 62º da CRP, conjugado com o princípio da proporcionalidade, que se extrai, entre outros, do artº 18º da CRP. Se é certo que em caso de colisão ou conflito entre o direito do credor em ver realizado o seu direito e o direito da executada em receber uma prestação que lhe garanta uma sobrevivência condigna, deverá ser sacrificado o direito do credor, para tutela do valor supremo da dignidade humana, o certo é que no caso concreto a executada não se coíbe de se fazer circular em viatura própria em detrimento do pagamento de uma dívida de 60.000$00, que contraiu em 30.10.95. Nem se diga, como invoca a executada, que o rendimento mínimo garantido é impenhorável por analogia com o facto de o STJ ter decidido ser o salário mínimo impenhorável, pois em sentido contrário também já se pronunciou o Ac. do STJ de
23.1.92, BMJ, 413º, 464 citado in Abílio Neto, ‘Código de Processo Civil Anotado’, 14ª ed., 1997, pág. 939 . Entendemos que face ao princípio constitucional da proporcionalidade o direito do credor só deverá ser sacrificado na medida do estritamente necessário, aliás opção já tomada quando se decidiu penhorar 1/6 do rendimento mínimo garantido e não 1/3, ¼ ou 1/5 como possibilita o art. 824º, n.ºs 1 e 2 do CPC”.
3.É desta decisão que vem interposto o presente recurso de constitucionalidade pela executada, nos termos do artigo 70º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação dos artigos 821º e 824º, n.ºs 1 e 2, na interpretação segundo a qual considera penhoráveis as quantias percebidas a título de rendimento mínimo garantido, invocando-se a sua inconstitucionalidade por violação do artigo 63º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa. Cumpre apreciar e decidir. II. Fundamentos
4.O presente recurso vem interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo
70º da Lei do Tribunal Constitucional, visando a apreciação da constitucionalidade dos artigos 821º e 824º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual admitem a penhora de quantias percebidas a título de rendimento mínimo garantido. Dispõe o referido artigo 821º (no seu n.º 1), que “estão sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora, que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda”. Por sua vez, o artigo artigo 824º prevê os casos de penhorabilidade parcial, dispondo:
«Artigo 824º (Bens parcialmente penhoráveis)
1 - Não podem ser penhorados: a) Dois terços dos vencimentos ou salários auferidos pelo executado; b) Dois terços das prestações periódicas pagas a título de aposentação ou de outra qualquer regalia social, seguro, indemnização por acidente ou renda vitalícia, ou de quaisquer outras pensões de natureza semelhante.
2 - A parte penhorável das quantias e pensões referidas no número anterior é fixada pelo juiz entre um terço e um sexto, segundo o seu prudente arbítrio, tendo em atenção a natureza da dívida exequenda e as condições económicas do executado.
3 - Pode, porém, o juiz isentar totalmente de penhora as prestações a que alude a alínea b) do n.º 1, tendo em conta a natureza da dívida exequenda e as necessidades do executado e seu agregado familiar.» Como é bom de ver, a dimensão normativa que possibilita a penhora das quantias percebidas a título de rendimento mínimo garantido (ou seja, de uma prestação de natureza social) refere-se apenas ao n.º 1, alínea b) e ao n.º 2 deste artigo
824º - tal como no referido artigo 821º apenas o n.º 1 é relevante, correspondendo ao princípio geral da responsabilidade patrimonial contido na lei substantiva (ou seja, ao artigo 601º do Código Civil). Por outro lado, o tribunal a quo apenas decidiu – e manteve – a penhora de um sexto das referidas quantias recebidas a título de rendimento mínimo garantido. Não está, pois, em questão a penhorabilidade total destas, mas apenas a sua penhorabilidade parcial, mais precisamente – nos termos do artigo 824º, n.º 2 -, até um terço da prestação recebida como rendimento mínimo. O objecto do presente recurso pode, assim, definir-se, mais rigorosamente, como a apreciação da constitucionalidade dos artigos 821º, n.º 1 e 824º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código de Processo Civil, interpretados no sentido de admitirem a penhora parcial, até um terço, de prestações recebidas a título de rendimento mínimo garantido.
5.Foi esta a dimensão normativa aplicada na decisão recorrida, e que lhe permitiu concluir pela improcedência da oposição à penhora deduzida pela recorrente. Tal decisão passou necessariamente, pela admissão da possibilidade de penhora de quantias recebidas a título de rendimento mínimo garantido. Isto, não obstante na decisão recorrida, a propósito da ponderação da situação da executada com o direito do credor à satisfação do seu crédito, conjugado com o princípio da proporcionalidade, se ter salientado que aquela não recebe apenas tal rendimento
(antes “sendo ajudada pelo seu ex-marido nas despesas relativas aos seus filhos”) e se ter concedido relevo à circunstância de que, como se afirmou, “a executada circula usualmente num veículo automóvel, o que pelas regras da experiência implica por parte dela uma série de encargos acrescidos (gasolina; seguro; revisão; prestações), que de forma alguma se coadunam com a situação de precariedade invocada, com vista ao levantamento da penhora”. Na verdade, mesmo dando por assentes tais factos, das duas uma: ou, nos termos da lei, eles não são (nem foram, no caso concreto, tidos como) incompatíveis com a percepção do rendimento mínimo (como é o caso da ajuda nas despesas relativas aos filhos), e a sua ponderação há-de ocorrer ao considerar-se a natureza e o montante da prestação social (rendimento mínimo garantido) em questão, para cuja atribuição e cômputo é relevante, nos termos do artigo 9º da Lei n.º 19-A/96, de
29 de Junho (que criou o rendimento mínimo garantido), “a totalidade dos rendimentos dos membros do agregado familiar, qualquer que seja a sua origem e natureza, com excepção do subsídio de renda de casa, dos valores correspondentes
às prestações familiares e bolsas de estudo e de 20% dos rendimentos auferidos no exercício de actividade profissional ou de bolsas de formação”; ou, diversamente são circunstâncias irrelevantes (por exemplo, a esporádica utilização de um automóvel, emprestado) ou que (como se afirma na decisão recorrida quanto à utilização de um veículo automóvel e concomitantes encargos), de acordo com as regras da experiência, “de forma alguma se coadunam com a situação de precariedade invocada”, e, no limite, eventualmente permitem suspeitar da existência de fraude na atribuição da prestação em causa, ou constituem “indícios objectivos e seguros de que o requerente dispõe de rendimentos suficientes para satisfazer as necessidades do seu agregado familiar”, que teriam possibilitado a recusa da atribuição da prestação de rendimento mínimo nos termos do artigo 10º, n.º 3 da citada Lei (onde se prevê, também, que “a decisão a proferir [...] deve valorar todos os elementos de prova”). Note-se, aliás, que, nos termos do artigo 14.º da referida Lei n.º 19-A/96, as prestações de rendimento mínimo que hajam sido indevidamente pagas são objecto de restituição, considerando-se como tal “as prestações cuja concessão tenha tido por base declarações falsas ou tenha resultado de omissão de declarações legalmente exigidas”, e sendo os comportamentos correspondentes que integrem tipos de crime ou de contra-ordenação punidos, nos termos da respectiva legislação. Seja como for, trata-se, mesmo nesta segunda hipótese, de circunstâncias de que não compete a este Tribunal curar no presente recurso, em sede de controlo de constitucionalidade da norma, e que, embora ponderadas na decisão recorrida, não impedem que esta se tenha fundamentado, como ratio decidendi, na interpretação dos dos artigos 821º, n.º 1 e 824º, n.ºs 1, alínea b) e 2 do Código de Processo Civil, no sentido considerar parcialmente penhoráveis, até um terço, as prestações recebidas a título de rendimento mínimo garantido.
É, pois, da conformidade constitucional desta norma (ou dimensão normativa, o que, para o efeito, é o mesmo) que importa tratar.
6.Antes ainda de nos referirmos ao enquadramento, à luz da jurisprudência deste Tribunal, da impenhorabilidade de prestações de segurança social que se encontrava prevista na lei, importa averiguar em que consiste a prestação cuja penhora se discute no presente processo. A criação do rendimento mínimo garantido foi uma medida de política social concretizada em 1996, pela Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, a qual veio instituir “uma prestação do regime não contributivo de segurança social e um programa de inserção social, por forma a assegurar aos indivíduos e seus agregados familiares recursos que contribuam para a satisfação das suas necessidades mínimas e para o favorecimento de uma progressiva inserção social e profissional” (artigo 1º). Tal prestação tem natureza pecuniária, montante variável e carácter temporário, e a sua atribuição (artigo 5º da citada Lei n.º 19-A/96) depende, entre outras condições (como a realização de um programa de inserção, com disponibilidade activa para o trabalho ou para se integrar em acções de formação ou de inserção profissional), da inexistência de rendimentos, próprios ou do conjunto dos membros do agregado familiar (definido no artigo 6º), superiores ao mínimo definido na lei. Este rendimento mínimo (artigo 8º) tem um valor indexado ao montante legalmente fixado para a pensão social do regime não contributivo de segurança social, variando de acordo com a composição do agregado familiar
(considerando-se, assim, por cada indivíduo maior, até ao segundo, 100% do montante da pensão social, por cada indivíduo maior, a partir do terceiro, 70% do montante da pensão social, e por cada indivíduo menor, 50% do montante da pensão social). A prestação de rendimento mínimo a receber tem como montante (artigo 7º) a diferença entre o valor de rendimento mínimo correspondente à composição do agregado familiar e a soma dos rendimentos daquele agregado, podendo ainda ser acrescido de um apoio especial destinado a compensar despesas de habitação ou alojamento. A Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, foi regulamentada pelo Decreto-Lei n.º
196/97, de 31 de Julho (alterado pelo Decreto-Lei n.º 84/2000, de 11 de Maio). Neste diploma define-se (artigo 3º) a titularidade do rendimento mínimo - para indivíduos “com idade igual ou superior a 18 anos, ou inferior, desde que estejam em situação de autonomia económica, satisfaçam as restantes condições de atribuição e se encontrem em alguma das seguintes situações: a) Tenham sido emancipados pelo casamento; b) Tenham outros menores na sua exclusiva dependência económica ou na do seu próprio agregado; c) Se encontrem grávidas”
-, a composição do agregado familiar a ter em conta, incluindo as pessoas que vivem em economia comum com o requerente e que estão em situação de exclusiva dependência económica dele (artigos 4º a 6º), a escolha do titular quando no mesmo agregado familiar mais do que um membro esteja em condições de requerer a prestação (artigo 7º), a possibilidade de exercício judicial de certos direitos do titular (artigo 8º), os rendimentos a considerar (artigos 9º e segs.), e o montante da prestação (incluindo a compensação das despesas de habitação ou alojamento – artigo 16º) e seu pagamento. E regulamenta-se, ainda, o processo e a competência (que cabe ao conselho directivo do centro regional de segurança social do domicílio do requerente) para atribuição da prestação – artigos 21º e segs.. -, o programa de inserção (elaborado com base nos dados constantes do relatório social em conjunto com o titular da prestação e com os restantes membros do agregado familiar que o devam subscrever), e as situações de revisão da prestação (artigos 44º e segs.) A prestação cuja penhorabilidade se discute no presente processo – a prestação de rendimento mínimo – é, pois, uma prestação do regime não contributivo de segurança social que, calculada em função das necessidades do agregado familiar, que visa assegurar a este meios mínimos de subsistência - como revela, por exemplo, a sua indexação ao montante legalmente fixado para a pensão social do regime não contributivo de segurança social, a variação da prestação de acordo com a composição do agregado familiar e as situações de revisão da prestação
(designadamente, a alteração da composição do agregado familiar ou dos respectivos rendimentos). O fundamento constitucional da consagração do rendimento mínimo garantido encontra-se, por sua vez, quer no artigo 63º, n.ºs 1 e 3 da Constituição da República – segundo os quais “todos têm direito à segurança social” e “o sistema de segurança social protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho” -, quer, também, no princípio da dignidade humana na qual se baseia da República Portuguesa (como se proclama logo no artigo 1º da Constituição) e que resulta também do princípio do Estado de Direito (artigo 2º). Numa certa perspectiva, poderá, é certo, entender-se que estes princípios não impunham a consagração de mecanismos destinados a assegurar um mínimo, para sobrevivência e reinserção profissional, do tipo do rendimento mínimo garantido
– ou, mesmo que tais mecanismos são, ou podem ser, contraproducentes e desincentivadores de tal reinserção (questão de que, obviamente, não cumpre nesta sede tratar). Mas mesmo o facto de, nesta perspectiva, a criação do rendimento mínimo garantido, nos termos em que foi previsto, não corresponder necessariamente a uma imposição constitucional decorrente dos citados princípios não tolhe, por certo, que se deva considerar fundada neles e visando a sua protecção. Ora, tal fundamentação é, sem dúvida, relevante para a questão da penhorabilidade das prestações recebidas a título de rendimento mínimo garantido
– quer para apurar se a possibilidade de penhora poderá ser imposta constitucionalmente (designadamente, para salvaguarda do princípio da igualdade e dos direitos do credor), quer para, como está em causa no presente processo, decidir sobre a própria possibilidade, em face dos princípios e regras constitucionais referidos, de tal penhora.
7.Como se sabe, com a substituição, já nos primórdios do direito romano da execução pessoal do devedor pela execução patrimonial, os bens do devedor passaram a constituir a garantia geral das obrigações. Num tal sistema, a previsão de impenhorabilidades pelo legislador redunda, na prática, quando não existem outros bens no património do devedor, na compressão (mesmo que apenas pelo necessario adiamento da sua satisfação) dos direitos dos credores, os quais são igualmente objecto de tutela constitucional, nos termos do artigo 62º da Constituição. Tal não significa, porém, que a lei não possa – ou mesmo deva – prever casos de impenhorabilidade, absoluta ou relativa, total ou parcial, e isto, quer em atenção a razões de interesse geral, quer em atenção ao próprio executado. Pode mesmo dizer-se que o movimento de humanização ou eticização do direito privado levou historicamente à criação de casos cada vez mais frequentes de impenhorabilidades, provenientes logo da lei substantiva ou previstas na lei processual, e em particular no que toca aos proventos do trabalho ou seus sucedâneos (para um apanhado geral pode ver-se já o Acórdão da Comissão Constitucional n.º 479, de 25 de Março de 1983, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 327, Junho de 1983, pp. 424-426). Assim, a impenhorabilidade do que “é estritamente indispensável para a satisfação das mais elementares necessidades da vida: a comida, a cama, o vestuário” do executado e sua família resulta de razões de decência de humanidade que se impõem “qualquer que seja a natureza ou origem da dívida”
(como referia já José Alberto dos Reis, Processo de execução, vol. 1º, 2ª ed., Coimbra, 1957, p. 352), e que justificam a cedência, nesta medida, do direito do credor.
8.A impenhorabilidade de prestações devidas pelas instituições de segurança social, em particular, foi já por várias vezes objecto de análise pela nossa jurisprudência constitucional. Assim, no referido Acórdão da Comissão Constitucional n.º 479 decidiu-se que as normas contidas na Base XXVI da Lei n.º 2115, de 18 de Junho de 1962,e no artigo
30º do Decreto n.º 45266,de 23 de Setembro de 1963, que estabeleciam a impenhorabilidade das prestações devidas aos beneficiários e seus familiares ou sócios das instituições de previdência social não eram inconstitucionais, não violando, designadamente, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição. Salientou-se, então, que “a exclusão da penhorabilidade das pensões pagas aos beneficiários do regime geral de previdência (...) não decorre de um puro capricho ou do arbítrio do legislador, reflectindo antes a preocupação de conferir uma garantia absoluta a percepção de um rendimento mínimo de subsistência”. Tal solução de impenhorabilidade (e intransmissibilidade) das prestações devidas pelas instituições de segurança social ficou, posteriormente, consagrada no artigo 45º da Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, Esta norma veio, porém, a ser julgada inconstitucional, por violação do preceituado nas disposições conjugadas dos artigos 13º, n.º 1, e 62º, n.º 1, da Constituição, “na medida em que isenta de penhora a parte das prestações devidas pelas instituições de segurança social que excede o mínimo adequado e necessário a uma sobrevivência condigna”, pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º
411/93 (Diário da República [DR], II série, de 19 de Janeiro de 1994), na sequência, aliás, da fundamentação do Acórdão n.º 349/91 (Diário da República, II série, de 2 de Dezembro de 1991). Reconheceu-se neste último aresto que
“a conclusão de não inconstitucionalidade a que chegou a Comissão Constitucional quanto às normas constantes da Base XXVI da Lei nº 2115 e do artigo 30º do Decreto n.º 45 266 é válida na sua ideia essencial para a norma do nº1 do artigo
45º da Lei n.º 28/84, desde que a pensão auferida pelo beneficiário da segurança social, tendo em conta o seu montante, reportado a um determinado momento histórico, cumpra efectivamente a função inilidível de garantia de uma sobrevivência minimamente condigna do pensionista.” Sendo este o caso dos autos (pois tendo em conta o montante da pensão e o período histórico em que estava a ser paga, ela cumpria efectivamente a função inilidível de garantia de uma sobrevivência minimamente digna do beneficiário), a impenhorabilidade não surgia como algo materialmente infundado, irrazoável ou arbitrário, nem desproporcionado, pelo que a norma em causa não foi julgada inconstitucional. Na fundamentação, afirmou-se, porém, a inconstitucionalidade do citado artigo 45º, n.º 1 da Lei n.º 24/84, ao considerar abrangidas pelo princípio da impenhorabilidade total prestações devidas por instituições de segurança social de montante superior ao mínimo de sobrevivência condigna, quer por encerrar um sacrifício excessivo e desproporcionado do direito do credor, quer por atribuir aos pensionistas da segurança social um privilégio ou um benefício materialmente injustificado, em comparação com os pensionistas de outras instituições - designadamente da Caixa Geral de Aposentações. Já no referido Acórdão n.º 411/93 a norma do artigo 45º, n.º 1, da Lei n.º
28/84, de 14 de Agosto foi julgada inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 13º, n.º 1, e 62º, n.º1 da Lei Fundamental, na medida em que isentava de penhora a parte das prestações devidas pelas instituições de segurança social que excede o mínimo adequado e necessário a uma sobrevivência condigna. Foi justamente para salvaguardar tais princípio constitucionais, que, invocando as citadas decisões, o legislador veio, no Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro – além de atribuir ao juiz amplos poderes para, em concreto, determinar a parte penhorável das quantias e pensões de índole social percebidas adequadas
à real situação económica do executado e seu agregado familiar, e para determinar a isenção total de penhora quando o considere justificado – prever
(artigo 12º) que “as disposições constantes de legislação especial que estabeleçam a impenhorabilidade absoluta de quaisquer rendimentos, independentemente do seu montante, em colisão com o disposto no artigo 824.º do Código de Processo Civil”, não são invocáveis em processo civil.
É, assim, por virtude de tal norma que a impenhorabilidade prevista no referido artigo 45º, n.º 1, da Lei n.º 24/84 não é invocável em processo civil. E, conforme resulta dos citados Acórdãos n.ºs 349/91 e 411/93, o que é relevante, no confronto com os artigos 13ºe 62º da Constituição, para concluir pela legitimidade constitucional da impenhorabilidade é a circunstância de a prestação de segurança social em causa não exceder o mínimo adequado e necessário a uma sobrevivência condigna. Ora, no caso do rendimento mínimo garantido, percebido pela recorrente, parece fora de dúvida, quer pelo montante da prestação (55 250$00), quer pelas suas finalidades, condições de atribuição e forma de cálculo, que ela visa justamente assegurar à recorrente o mínimo indispensável à sua sobrevivência condigna e do eu agregado familiar.
9.O problema suscitado no presente recurso não é, porém, o da eventual desconformidade constitucional da solução normativa consistente na impenhorabilidade de uma prestação de segurança social, mas antes o da possibilidade de se penhorar, ainda que parcialmente, quantias recebidas a título de tal prestação, mais precisamente, a título de rendimento mínimo garantido. Ora, justamente sobre tal questão – embora não especificamente para a prestação de rendimento mínimo garantido – proferiu recentemente este Tribunal, pela sua
1ª secção, o Acórdão n.º 318/99 (DR, II série, de 22 de Outubro de 1999). Estava em causa a penhora de um sexto de uma pensão de invalidez no montante de 38
750$00, e decidiu-se:
“julgar inconstitucional a norma do artigo 824º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, na medida em que permite a penhora até 1/3 das prestações periódicas pagas a título de aposentação ou de outra qualquer regalia social, seguro, indemnização por acidente ou renda vitalícia, ou de quaisquer outras pensões de natureza semelhante, cujo valor não seja superior ao do salário mínimo nacional então em vigor, por violação do princípio da dignidade humana contido no princípio do Estado de direito que resulta das disposições conjugadas dos artigos 1º, 59º, n.º2, alínea a e 63º, n.ºs 1 e 3, da Constituição. Salientou-se na fundamentação deste Acórdão n.º 318/99:
“O credor goza de um direito à satisfação do seu crédito, podendo chegar à realização executiva do crédito à custa do património do devedor, sendo tal direito, enquanto direito de conteúdo patrimonial, tutelado pelo artigo 62º, nº1 da Constituição (garantia da propriedade privada). O artigo 63º da Constituição reconhece a todos os cidadãos um direito à segurança social que, nos termos do nº3, ‘protege os cidadãos na doença, velhice, invalidez, viuvez e orfandade, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho’. Este preceito constitucional, como se escreveu no Acórdão n.º 349/91 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 19º vol., pág. 515) ‘poderá, desde logo, ser interpretado como garantindo a todo o cidadão a percepção de uma prestação proveniente do sistema de segurança social que lhe possibilite uma subsistência condigna em todas as situações de doença, velhice ou outras semelhantes. Mas ainda que não possa ver-se garantido no artigo 63º da Lei Fundamental um direito a um mínimo de sobrevivência, é seguro que este direito há-de extrair-se do princípio da dignidade da pessoa humana condensado no artigo 1º da Constituição’
(cf. Acórdão n.º 232/91, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 19º vol., pág.341). Pode, assim, configurar-se um conflito de direitos, entre o direito do credor à realização rápida do pagamento do seu crédito e o direito do devedor e pensionista da Segurança Social ou do Estado à percepção de uma pensão que lhe garanta o mínimo de subsistência condigna com a sua dignidade de pessoa. Existindo o referido conflito, o legislador não pode deixar de garantir a tutela do valor supremo da dignidade da pessoa humana - vector axiológico estrutural da própria Constituição - sacrificando o direito do credor na parte que for absolutamente necessária - e que pode ir até à totalidade desse direito - por forma a não deixar que o pagamento ao credor decorra o aniquilamento da mera subsistência do devedor e pensionista. Essencial se torna, pois, a realização de um balanceamento, da utilização de uma adequada proporção na repartição ‘dos custos do conflito’ (cf. J.C.Vieira de Andrade, Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, Almedina,
1987, pág. 233). Em consequência, será constitucionalmente aceitável o sacrifício do direito do credor, se o mesmo for necessário e adequado à garantia do direito à existência do devedor com um mínimo de dignidade. No caso em apreço, não estando em causa o sacrifício total do direito do credor, uma vez que a disposição questionada permite uma penhora parcial da pensão, a questão que se torna necessário resolver é a de saber se a mera apreensão da parte legalmente prevista da pensão (1/6) não torna, de per si, o montante da pensão de invalidez que o recorrente percebe (38.750$00) como incapaz de garantir aquele mínimo que se tem de considerar como absolutamente necessário para uma sobrevivência humanamente digna.
É certo que o legislador admite a penhora até 1/3 dos salários auferidos pelo executado, mesmo de salários não superiores ao salário mínimo nacional, tal como admite a penhora de idêntica parte das prestações periódicas recebidas a título de pensão de aposentação ou pensão social, sem qualquer limitação expressa decorrente do respectivo montante. Porém, assim como o salário mínimo nacional contém em si a ideia de que é a remuneração básica estritamente indispensável para satisfazer as necessidades impostas pela sobrevivência digna do trabalhador e que por ter sido concebido como o ‘mínimo dos mínimos’ não pode ser, de todo em todo, reduzido, qualquer que seja o motivo, assim também, uma pensão por invalidez, doença, velhice ou viuvez, cujo montante não seja superior ao salário mínimo nacional não pode deixar de conter em si a ideia de que a sua atribuição corresponde ao montante mínimo considerado necessário para uma subsistência digna do respectivo beneficiário. Em tais hipóteses, o encurtamento através da penhora, mesmo de uma parte dessas pensões - parte essa que em outras circunstâncias seria perfeitamente razoável, como no caso de pensões de valor bem acima do salário mínimo nacional -, constitui um sacrifício excessivo e desproporcionado do direito do devedor e pensionista, na medida em que este vê o seu nível de subsistência básico descer abaixo do mínimo considerado necessário para uma existência com a dignidade humana que a Constituição garante. Nestes termos, considera-se que a norma do artigo 824º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, na medida em que permite a penhora até 1/3 quer de vencimentos ou salários auferidos pelo executado, quando estes são de valor não superior ao salário mínimo nacional em vigor naquele momento, quer de pensões de aposentação ou de pensões sociais por doença, velhice, invalidez e viuvez, cujo valor não alcança aquele mínimo remuneratório, é inconstitucional por violação do princípio da dignidade humana, decorrente do princípio do Estado de direito, constante das disposições conjugadas dos artigos 1º, 59º, nº2, alínea a) e 63º, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa.”
10.Estas considerações são inteiramente aplicáveis – por igualdade ou mesmo maioria de razão – ao caso dos autos, em que está em causa uma prestação de rendimento mínimo garantido, inferior ao salário mínimo, que (embora de montante superior à que estava em questão no Acórdão 318/99) é calculada e atribuída precisamente em função das necessidades de subsistência da recorrente e seu agregado familiar, visando assegurar o mínimo indispensável a uma existência digna. Na verdade, a prestação de rendimento mínimo garantido tem como objectivo justamente assegurar o mínimo de subsistência ao titular e seu agregado familiar. Neste ponto, mesmo um paralelo entre a prestação do rendimento mínimo garantido, calculado em função das necessidades mínimas do titular e seu agregado familiar, e o salário mínimo se afigura improcedente, bem como eventuais argumentos que se procurasse extrair da possível situação económica, não já do devedor, mas do credor, porventura também beneficiário da prestação. E nem se diga que o titular pode auferir de rendimentos de outro tipo, uma vez que
- diversamente também do que acontece no caso do salário mínimo – tais rendimentos deverão levar logo à recusa de atribuição da prestação ou à sua cessação (e recorde-se que não é nesta sede que importa considerar outros proventos da recorrente, ou eventuais fraudes susceptíveis de influenciar a decisão de atribuição da prestação) A própria variação da prestação segundo a composição do agregado familiar dos titulares do direito à prestação mostra, aliás, que está em causa a garantia de um mínimo de subsistência, correspondente, por cada indivíduo maior componente do agregado familiar e até ao segundo, a 100% do montante da pensão social, a partir do terceiro, a 70% do montante da pensão social, e por cada indivíduo menor, a 50% do montante da pensão social. A possibilidade de o juiz, considerando o princípio da proporcionalidade e o direito do credor, graduar o montante da prestação de rendimento mínimo garantido a penhorar entre um sexto e um terço, garantida pelo artigo 824º, n.º
2, do Código de Processo Civil e referida na decisão recorrida, ou mesmo a possibilidade de, nos termos do n.º 3 deste artigo, isentar totalmente de penhora as prestações em questão, considerando a natureza da dívida exequenda e as necessidades do executado e seu agregado familiar, não se afiguram, pois, no caso da prestação de rendimento mínimo garantido, suficientes para garantir a compatibilização com as exigências constitucionais. Na verdade, em casos de agregados familiares numerosos, o encurtamento pela penhora, mesmo tão-só de uma parte do rendimento mínimo - que em prestações de outro tipo seria perfeitamente razoável -, constituiria logo um sacrifício excessivo e desproporcionado do direito do devedor, na medida em que este vê o seu nível de subsistência básico ou do seu agregado familiar descer abaixo do mínimo considerado necessário para a existência com a dignidade humana que a Constituição garante. E poderia mesmo equivaler à eliminação total do rendimento mínimo considerado indispensável para a subsistência um dos membros do seu agregado familiar, em função do qual a prestação foi calculada. No caso da prestação em análise – cujo montante equivale, nas suas finalidades e montante, ao mínimo indispensável para uma existência condigna do titular e seu agregado familiar –, só, pois, a salvaguarda da totalidade da prestação em face da penhora pode considerar-se bastante para garantir a dignidade humana do devedor e seu agregado (devendo considerar-se irrelevante também a consideração da natureza da dívida exequenda, designadamente, do título de aquisição do crédito). E pode, assim, concluir-se, pela inconstitucionalidade, por violação do princípio da Dignidade Humana contido no princípio do Estado de Direito, tal como resulta das disposições conjugadas dos artigos 1º e 63º, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República, dos artigos 821º, n.º 1 e 824º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual são penhoráveis as quantias percebidas a título de rendimento mínimo garantido. III. Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) Julgar inconstitucionais, por violação do princípio da Dignidade Humana contido no princípio do Estado de Direito, tal como resulta das disposições conjugadas dos artigos 1º e 63º, n.ºs 1 e 3, da Constituição da República, os artigos 821º, n.º 1 e 824º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual são penhoráveis as quantias percebidas a título de rendimento mínimo garantido; b) Em consequência, conceder provimento ao presente recurso, revogar a decisão recorrida, que deverá ser reformulada em conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade. Lisboa, 6 de Fevereiro de 2001 Paulo Mota Pinto Guilherme da Fonseca Bravo Serra (vencido, por entender que o nº 3 do artº 824º do Código de Processo Civil constitui suficiente garantia para se concluir pela não inconstitucionalidade das normas que no presente aresto foram julgadas como desconformes com a Lei Fundamental) José Manuel Cardoso da Costa (Pesam as dúvidas que, entretanto, me ocorreram quanto à problemática geral em que a questão tratada no presente acórdão se insere – e por as quais o circunstancialismo de facto da hipótese em apreço não deixou de contribuir – votei o aresto e a decisão, ainda na linha decorrente da orientação que o tribunal tem acolhido).