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Processo n.º 481/07
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos A.reclama, ao abrigo do n.º 1 do artigo 77º da LTC, do
despacho do Ex.mo Juiz-Relator da 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de
Coimbra que não admitiu a interposição de recurso para este Tribunal, com
registo de entrada de 15 de Janeiro de 2007, mas interposto em 12 de Janeiro de
2007, nos termos do qual se requeria “tendo sido notificado do Acórdão proferido
por esse Colendo Tribunal, bem assim do despacho que antecede, inconformado, vem
do mesmo interpor recurso” (fls. 25 dos presentes autos).
Em sede de despacho reclamado, o Ex.mo Juiz-Relator julgou intempestivo o
recurso, considerando-o como recurso interposto “para o Tribunal Constitucional
do aresto proferido em 29 de Novembro passado” (fls. 29 e 30 dos presentes
autos).
2. O Ex.mo Magistrado do Ministério Público, junto deste Tribunal, pronunciou-se
pela improcedência da reclamação, nos seguintes termos (fls. 39 verso e 40 dos
presentes autos):
«Admitindo que a decisão recorrida é o despacho, proferido
pelo Presidente da Secção Criminal da Relação de Coimbra, a fls. 546, em
21/12/06, é tempestiva a interposição do recurso de constitucionalidade.
A presente reclamação deverá, porém, improceder por manifesta
inverificação dos pressupostos do recurso, integralmente indicados neste
procedimento.
Assim:
- não se mostra identificada qualquer questão de ilegalidade
qualificada, susceptível de fundar o recurso tipificado na alínea f) do nº 1 do
art. 70º da Lei nº 28/82.
- fundando-se o despacho recorrido exclusivamente, como “ratio
decidendi”, na norma constante do art. 422º, nº 1, do CPP, não pode invocar-se
contradição com o decidido por este Tribunal no acórdão nº 602/04, que
interpretou preceito legal diverso – o art. 312º, nº 4, do CPP – não se
verificando, deste modo, os pressupostos do recurso tipificado na alínea g)
daquele preceito legal;
- o ora reclamante não suscitou, durante o processo e em
termos processualmente adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa, limitando-se a afirmar, no requerimento de fls. 541, que “a não
proceder tamanha interpretação, estando nós nos domínios dos Direitos
Fundamentais, resulta inevitavelmente a inconstitucionalidade de entendimento
diverso”; tal linha argumentativa – adoptada em requerimento que, sob a capa de
um pedido de “aclaração”, traduzia substancialmente uma pretensão de nulidade
processual – não contém uma especificação mínima e inteligível da questão
normativa que se pretendia suscitar, não podendo, consequentemente, servir de
base do recurso tipificado na alínea b) do nº1 do art. 70º da Lei do Tribunal
Constitucional.»
II – QUESTÃO PRÉVIA
3. Como bem notou o Ex.mo Magistrado do MP junto deste Tribunal, a redacção do
recurso de fls. 25 e seguintes presta-se a notórios equívocos, quando não
identifica, de modo evidente, qual a decisão que visa colocar em crise.
Precisamente por força da dificuldade em aferir de qual das decisões se
pretendeu recorrer, o Tribunal da Relação de Coimbra recusou a admissão do
recurso, considerando que aquele visava sindicar o teor do Acórdão proferido em
29 de Novembro de 2006. Foi, aliás, por referência a tal Acórdão que o tribunal
“a quo” recusou a admissão do recurso, quer por falta de suscitação prévia e
adequada da questão de inconstitucionalidade, quer por intempestividade do
mesmo.
Contudo, na medida em que o recurso de inconstitucionalidade consta de fls. 25 e
seguintes, fazendo o recorrente referência ao “despacho que antecede”,
conclui-se – acompanhando-se assim o entendimento do Ex.mo Magistrado do
Ministério Público junto deste Tribunal – que o recurso vem interposto do
despacho de fls. 23 que julgou improcedente a alegação de inconstitucionalidade
do n.º 1 do artigo 422º do CPP, aplicado pelo despacho de fls. 15.
Nestes termos, cumpre apreciar e decidir.
II – DA FUNDAMENTAÇÃO
4. Quanto à tempestividade do recurso, importa abandonar a tese do despacho
reclamado. Por se entender que o recorrente recorre do despacho de fls. 23, que
lhe foi notificado em 08 de Janeiro de 2007, pelo que, por força do n.º 3 do
artigo 254º do CPC, aplicável “ex vi” artigo 69º da LTC, impõe-se concluir que o
recurso, registado com carimbo do tribunal “a quo” de 15 de Janeiro de 2007, foi
interposto dentro do prazo fixado pelo n.º 1 do artigo 75º da LTC.
5. Contudo, em estrito cumprimento do n.º 2 do artigo 72º da LTC, há que
verificar se o recorrente suscitou previamente “a questão da
inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante
o tribunal que proferiu a decisão recorrida”.
Quanto à vertente do recurso interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do
artigo 70º da LTC, constata-se que – em sede de pedido de aclaração (fls. 19) –
o recorrente não invocou qualquer contradição entre a norma prevista no artigo
422º do CPP e uma norma contida em qualquer lei de valor reforçado que pudesse
constituir parâmetro de validade daquela, nos termos do n.º 3 do artigo 112º da
CRP. Tal é, aliás, expressamente admitido pelo próprio recorrente quando, ao dar
cumprimento ao n.º 2 do artigo 75º-A da LTC, no § 12 do requerimento de recurso,
apenas alega ter suscitado uma questão de inconstitucionalidade – e não de
ilegalidade.
Deste modo, é manifesto que o recorrente não pode vir interpor recurso ao abrigo
da alínea f) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, já que nunca suscitou, directa ou
indirectamente, expressa ou implicitamente, qualquer relação de desconformidade
entre o artigo 422º do CPP e uma norma constante de lei de valor reforçado.
6. Já quanto à alegação de que o despacho de fls. 23 aplicou norma já julgada
inconstitucional por decisão do Tribunal Constitucional [cfr. alínea g) do n.º 1
do artigo 70º da LTC], impõe-se frisar que o Acórdão n.º 602/2004, citado pelo
recorrente, apenas apreciou a inconstitucionalidade da norma vertida no n.º 4 do
artigo 312º do CPP, quando interpretada no sentido de excluir a possibilidade de
concertação de agendas para marcação de audiência de julgamento em que participe
defensor oficioso. Ora, na medida em que o recorrente se encontra representado
por mandatário constituído, não se vislumbra em que medida aquele Acórdão
poderia ser útil aos presentes autos.
Acresce ainda que a “ratio decidendi” do despacho recorrido repousa
exclusivamente no n.º 1 do artigo 422º do CPP e não no n.º 4 do artigo 312º,
pelo que o Acórdão n.º 602/2004 jamais poderia ser invocado para abalar o juízo
formulado pelo “tribunal a quo”, dado que não aplicou qualquer norma
anteriormente julgada inconstitucional ou ilegal pelo próprio Tribunal
Constitucional.
7. Por fim, nem sequer ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC
seria possível concluir pela procedência da reclamação apresentada. Isto porque,
em sede do pedido de aclaração (fls. 19), o recorrente não suscita qualquer
questão específica relacionada com a interpretação normativa do n.º 1 do artigo
422º do CPP, limitando-se a formular um juízo genérico de impugnação da opção
interpretativa adoptada pelo “tribunal a quo” quanto ao direito
infra-constitucional aplicável.
A circunstância de o recorrente invocar que os autos recorridos se movem “no
domínio dos Direitos Fundamentais” (fls. 26) não se afigura como alegação
suficientemente consubstanciada de qualquer inconstitucionalidade da
interpretação normativa aplicada pela decisão recorrida.
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, e ao abrigo do disposto no do n.º 3 do artigo
77º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei
n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, indefere-se a presente reclamação, não se
admitindo o recurso interposto a fls. 25 e seguintes.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos
termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 29 de Maio de 2007
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Gil Galvão