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Processo n° 376/07
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos
do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram como recorrentes A. e B. e como
recorrido INSTITUTO POLITÉCNICO DO CÁVADO E DO AVE, a Exma Conselheira Relatora
proferiu a seguinte Decisão Sumária [Cfr. fls. 599 e ss]:
«1. Por sentença do 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos de 4 de Maio
de 2005, de fls. 396, foi decidido fixar o montante da indemnização a pagar pelo
expropriante INSTITUTO POLITÉCNICO DO CÁVADO E DO AVE a A. e B., em virtude da
expropriação de um prédio rústico situado no lugar …, freguesia de Vila
Frescaínha de S. Martinho, concelho de Barcelos, em 364.224,00, acrescidos da
quantia que resultar da aplicação dos índices de preços ao consumidor, com
exclusão da habitação, publicados pelo INE, a partir da data da publicação da
utilidade pública e até à data da decisão final do presente processo, nos termos
do artigo 24º, nº 1, do Código das Expropriações.
Na parte que agora releva, afirmou-se na mencionada sentença o seguinte:
«No caso em análise, não pode deixar de se atender à circunstância de a
expropriação visar a construção, na parcela expropriada, das novas instalações
do Instituto Politécnico do Cavado e do Ave. Ora, se o terreno foi expropriado
para nele se proceder a uma construção urbana, obrigatoriamente terá de adquirir
as características descritas na alínea a) do art. 25º do C. das Expropriações.
Independentemente de a construção estar ou não prevista em plano municipal
plenamente eficaz, cremos que em tal situação o solo deve classificar-se como
apto para construção, desde logo porque a edificação visada com a expropriação
acarreta, necessariamente, a desafectação da R.A.N. e da R.E.N., a que acresce o
facto de a elaboração, aprovação e ratificação dos planos competir à
Administração Pública, não podendo a sua inércia prejudicar os particulares.
Assim sendo, no caso concreto, entendemos que a parcela de terreno expropriada
deve ser classificada como solo apto para construção nos termos do art. 25º°, nº
2, alínea c), do Código das Expropriações.
(...)
Posto isto, importa apurar o valor da indemnização devida pela expropriação do
terreno em causa, de acordo com as regras estabelecidas no artigo 26º do Código
das Expropriações.
(...)
Do anteriormente exposto a propósito da classificação do solo como apto para
construção, resulta desde logo que a avaliação realizada pelo perito nomeado
pela expropriante “em função do seu rendimento agrícola” não obedece aos
critérios legalmente definidos, pelo que não será atendida.
Assim, ponderaremos apenas as avaliações efectuadas pelos restantes peritos.
Na sua avaliação, foi adoptado o critério estabelecido no artigo 26º°, nº 12, do
Código das Expropriações, o que consideramos correcto.
Efectivamente, entendemos ser de aplicar analogicamente tal critério à situação
dos autos, por força do princípio da igualdade dos cidadãos perante os encargos
públicos.
No que tange aos cálculos efectuados pelos peritos subscritores do laudo
maioritário com vista à determinação do valor da justa indemnização, cumpre, no
entanto, proceder a uma rectificação. Efectivamente, não existindo acordo entre
as partes quanto à área da parcela expropriada, entendemos dever considerar o
valor encontrado pelo levantamento topográfico efectuado no âmbito do presente
processo (13.008,00 m2), na medida em que foi efectuado por perito nomeado pelo
próprio tribunal e que oferece por isso maiores garantias de imparcialidade.
Assim sendo, seguindo o cálculo efectuado pelos peritos mas considerando a área
de 13.008 m2, encontramos o valor de 364.224,00 Euros como sendo o da justa
indemnização. »
Inconformados, expropriante e expropriados recorreram para o Tribunal da Relação
de Guimarães.
Por acórdão de 8 de Fevereiro de 2006, de fls. 420, a Relação, concedeu
provimento ao agravo interposto pelos expropriados e, parcialmente, a apelação
de ambas as partes, e, “consequentemente, classificou o solo da parcela
expropriada como apto para outros fins” anulou “a sentença recorrida na parte em
que fixou a indemnização e ordenou que” fosse “avaliada a parcela em causa
segundo os critérios do artigo 27º do CE/99 e” que fosse “apurada matéria para a
fixação da indemnização da cessação da actividade alegada pelos expropriados, na
parcela expropriada, através da prova pericial ou testemunhal indicada pelos
expropriados, nas alegações de recurso de arbitragem”.
Apenas para o que agora releva, o Tribunal da Relação de Guimarães afirmou o
seguinte:
«O artigo 25º n.º 2 als. a) a d) do CE/99 enumera os critérios objectivos de
potencialidade edificativa. Se se verificarem, o solo terá de ser classificado
como apto para construção, e valorizado nesse sentido, aplicando-se os factores
enunciados no artigo 26º do mesmo diploma.
(...)
Confrontando a matéria fáctica assente com os critérios objectivos de
potencialidade edificativa enunciados, teremos de concluir que nenhum deles se
verifica. Na verdade, a parcela de terreno expropriada apenas confronta com a
via pública, mas não se integra em núcleo urbano. As edificações mais próximas
situam-se a sul e a poente a cerca de 100 metros e são do tipo unifamiliar, e as
mais distantes estão a mais de 300 metros — respostas dos peritos aos quesitos
dos expropriados a fls. 307 a 310. a rede eléctrica encontra-se a mais de 50
metros. E, para efeitos de qualificação de núcleo urbano, consignadas no artigo
62º n.°, do decreto-lei 794/76 de 5 de Novembro — Lei dos Solos — que reza o
seguinte: “o núcleo de edificações autorizadas e respectiva área envolvente,
possuindo vias públicas pavimentadas e que seja servido por rede de
abastecimento domiciliário de água e de drenagem de esgotos, estando o seu
perímetro definido pelos pontos distanciados 50 metros das vias públicas onde
terminam aquelas infra-estruturas urbanísticas “. Como se depreende deste
conceito de núcleo urbano, as edificações existentes nas proximidades da parcela
de terreno, encontram-se a mais de 50 metros de distância, com as
infra-estruturas urbanísticas exigíveis.
Por sua vez, do PDM da cidade de Barcelos, não consta que a parcela em causa
esteja em situação de vir a adquirir as infra- estruturas urbanísticas previstas
na al. a) do artigo 25º do CE/99. Pelo contrário, este instrumento de gestão do
território enquadra a respectiva parcela num espaço agrícola, inserido na RAN e
REN, que nos termos dos artigos 8º nº 1 al. a), do decreto-lei nº 196/89 de 14
de Junho, e artigo 4º nº 1 do decreto-lei nº 93/90 de 19/03, proíbe a construção
de edifícios, obras de urbanização, loteamentos, etc. Só em casos excepcionais,
e depois de parecer favorável das entidades responsáveis pela fiscalização e
gestão destas reservas, é que é possível realizar alguma construção para fins de
interesse público, ou para o próprio, no caso de não possuir habitação própria.
Não se enquadrando nos critérios objectivos de potencialidade edificativa,
teremos de a classificar, por exclusão de partes, como solo apto para outros
fins, nos termos do artigo 25º nº 3 do CE/99.
Interpretação contrária levaria a um juízo de inconstitucionalidade do artigo
23º nº 1 conjugado com o artigo 26º nº 1 do CE/99, por violação do princípio da
justa indemnização, da igualdade e da proporcionalidade. (...)
Por outro lado, a sentença recorrida refere que o cálculo do valor do solo
deverá ser feito de acordo com os critérios consignados no artigo 26º nº 12 do
CE/99. Para tal invoca a analogia com os terrenos classificados como zona verde
e lazer, por plano municipal eficaz. A sua classificação como solos para zonas
verdes e lazer no respectivo plano, visa acautelar o equilíbrio ecológico e
ambiental de uma zona urbanística, em que os solos, pela sua situação, gozavam
de potencialidade edificativa, porque estão infra-estruturados. Estes solos têm
por finalidade o gozo, pelas pessoas, que utilizam a zona urbanística da melhor
qualidade de vida. Estejam mais próximas da natureza, podendo usufruir dos seus
benefícios. Com o plano, o jus aedjficandi é limitado, por razões de interesse
público, conexo com a zona urbanística criada ou prevista no plano. E, para
compensar esta limitação ao jus aedificandi por razões de política de
desenvolvimento inserta no plano, foi encontrado o ponto de equilíbrio, onerando
a entidade expropriante com uma indemnização superior à que seria se o solo
fosse classificado como apto para outros fins. É que o valor sendo superior ao
encontrado para solos aptos outros fins, é inferior ao calculado segundo as
regras do artigo 26º n.º2 a 10 do CE/99, isto é apto para construção. Tem como
critério o valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar
nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a
300 m do limite da parcela expropriada.
Porém, a teleologia patente para a inserção do solo em RAN e ou REN é diferente.
Na verdade, pretende-se reservar os melhores solos com características
agrícolas, com vista a uma maior produtividade e produção agrícola e manter
determinados ecossistemas, com relevo ambiental nacional, regional e local,
evitando a pressão urbanística, que acabaria por destruí-los. Assim, não há
identidade normativa nas situações de classificação de solos para zonas verdes e
lazer e RAN e REN, pelo que não se verf1ca a analogia invocada. Além disso, como
é jurisprudência dominante no Tribunal Constitucional, o solo só poderia ser
valorado nos termos do artigo 26º nº 12 do CE/99, se se verificassem os
pressupostos do artigo 25º nº 2 do mesmo diploma, O que neste caso não acontece,
como já referimos.
Assim, a parcela de terreno em causa terá de ser valorada como solo apto para
outros fins e não como solo apto para construção.»
Após terem pedido a aclaração deste acórdão, o que foi indeferido pelo acórdão
de fls. 460, de 29 de Março de 2006, os expropriados interpuseram recurso de
revista para o Supremo Tribunal de Justiça, mas o recurso não foi admitido
(despacho de 14 de Fevereiro de 2007, de fls. 585).
2. Finalmente, A. e B. vieram recorrer para o Tribunal Constitucional, invocando
os seguintes fundamentos:
«1. O recurso é interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
de 8.02.2006, que decidiu a matéria de fundo.
2. Desta decisão foi interposto Recurso de Revista para o S.T.J., que após ter
sido admitido, foram produzidas alegações, que após serem juntas ao processo,
foi proferida decisão a considerar legalmente inadmissível o recurso de revista
interposto, com o fundamento do nº 5 do artigo 66º do Código das
Expropriações/99.
3. É, pois, lícito processualmente o presente recurso para o Tribunal
Constitucional, assim se cumprindo o pressuposto do artigo 70º, nº 2 e 3, da Lei
nº28/82.
4. O recurso é interposto ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82 — com esta indicação se cumprindo o primeiro pressuposto do artigo 75º-A,
nº 1, da mesma Lei.
5. As normas cuja inconstitucionalidade se pretende que o Venerando Tribunal
Constitucional aprecie são:
a) uma interpretação do artigo 25º nº 3, do Código Exp. 99, manifestamente
inconstitucional, ao atribuir-se-lhe o equivalente à manutenção da revogada
norma do artigo 24º, nº 5, do Código Exp. 91•
b) uma interpretação restritiva do artigo 26º, nº 12, do Cód. Exp. 99, ao não
considerar equivalente, ou equiparado a “zona verde e lazer” a que provém da sua
classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN quando a razão de ser é
exactamente a mesma, assim sendo feita uma interpretação também inconstitucional
daquela norma;
c) uma interpretação restritiva do mesmo artigo 26º, nº 12, do Cód. Exp. 99, ao
não admitir que nele se contém a referência a solos (ora expropriados), que,
estando incluídos por PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser
retirados, por natureza e para o fim da expropriação, para a construção das
instalações do IPCA, assim sendo também feita uma interpretação inconstitucional
daquela norma;
d) ocorrendo no douto acórdão a violação dos princípios do direito de e à
propriedade, da justa indemnização, da igualdade, da proporcionalidade, da
justiça e da imparcialidade, em violação dos artigos 13º, 62º°, n.º 1 e 2, e
266º, nº 1 e 2, da C.R.P.,
e) e a violação dos artigos 25º e 26º do Cód. Exp. 99 e ainda, designadamente
face a interpretações inconstitucionais dos artigos 25º., nº 3, e 26º°, nº 12,
do mesmo Código, os artigos 13º, 62º, nº 1 e 2, e 266º°, n.º 1 e 2, do CRP.
6. Os princípios constitucionais e as normas consideradas violadas foram os
princípios constitucionais do direito de e à propriedade, da justa indemnização,
da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade — com esta
indicação se cumprindo o primeiro pressuposto do artigo 75º -A, nº 2, da Lei nº
28/82.
7. As peças processuais em que os recorrentes oportunamente suscitaram as ditas
questões da inconstitucionalidade foram as das suas alegações de 1ª instância
(nos termos do artigo 64º do Cód. Exp.), das suas alegações de apelação da
sentença da 1ª instância (21º conclusão) e das suas alegações para o Supremo
Tribunal de Justiça (12º e 13º conclusões).»
O recurso foi admitido, por decisão que não vincula este Tribunal (nº 3 do
artigo 76º da Lei nº 28/82).
3. No requerimento de interposição de recurso, os ora recorrentes invocam os
recorrentes (sic) as questões de inconstitucionalidade relativas:
— à interpretação do artigo 25º, nº 3, do Código das Expropriações de 1999, em
termos de se lhe atribuir «o equivalente à manutenção da revogada norma do
artigo 24º, n.º 5, do Cód. Exp. 991»:
— à interpretação do artigo 26º, nº.12, do Código das Expropriações de 1999, em
termos de «não considerar equivalente, ou equiparado a “zona verde e lazer” a
que provém da sua classificação em PDM na área como restrita de RAN/REN quando a
razão de ser é exactamente a mesma»,
— à interpretação do mesmo artigo 26º, nº 12, em termos de «não admitir que nele
se contém a referência a solos (ora expropriados), que, estando incluídos por
PDM em zona restrita de RAN/REN, dela tiveram de ser retirados, por natureza e
para o fim da expropriação, para a construção das instalações do IPCA ».
4. Admite-se (nomeadamente tendo em conta o que dizem no ponto 7. do
requerimento de interposição de recurso), que se deveu a lapso a referência à
alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, e não à respectiva alínea b).
Ora, mesmo aceitando que os recorrentes suscitaram «durante o processo» as
questões de constitucionalidade invocadas no requerimento de interposição de
recurso, ou que ocorreria motivo que os dispensasse de cumprir o correspondente
ónus (sendo certo que nunca relevariam as alegações apresentadas no recurso de
revista, já que o mesmo não foi admitido), nos termos exigidos pela citada
alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, sempre sobejam razões que
conduzem à negação de provimento ao presente recurso.
Com efeito, as questões suscitadas no âmbito deste recurso foram já, repetidas
vezes (como resulta, aliás, da decisão recorrida), objecto de apreciação por
este Tribunal.
Assim, por exemplo, no acórdão nº 275/2004 Diário da República, II série, de 8
de Junho de 2004) o Tribunal Constitucional decidiu “julgar inconstitucional,
por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da
Constituição, as normas contidas no nº 1 do artigo 23º e no nº 1 do artigo 26º
do Código das Expropriações (1999), quando interpretadas no sentido de incluir
na classificação de “solo apto para a construção” e, consequentemente, de como
tal indemnizar, o solo, integrado na Reserva Agrícola Nacional, expropriado para
implantação de vias de comunicação”.
No acórdão nº 398/2005 (Diário da República, II série, de 4 de Novembro de
2005), decidiu “Não julgar inconstitucional a norma do nº 3 do artigo 25º do
Código das Expropriações, aprovado pela Lei nº 168/99, de 18 de Setembro,
interpretada com o sentido de excluir da classificação de “solo apto para a
construção” solos integrados na Reserva Agrícola Nacional ou na Reserva
Ecológica Nacional expropriados para implantação de vias de comunicação “.
E no acórdão nº 417/2006 (Diário da República, II série, de 13 de Dezembro de
2006), decidiu a) Julgar inconstitucional, por violação do princípio da
igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, o
artigo 26º, nº 12, do Código das Expropriações, aprovado pela Lei nº 168/99, de
18 de Setembro, quando interpretado no sentido de ser indemnizável como solo
apto para construção terreno integrado na RAN com aptidão edificativa segundo os
elementos objectivos definidos no nº2 do artigo 25º do mesmo Código.”
Esta jurisprudência, inteiramente transponível para o presente recurso, conduz,
em qualquer caso, a que lhe seja negado provimento.
5. Estão, portanto, reunidas as condições para que se proceda à emissão da
decisão sumária prevista no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro.
Assim, pelos fundamentos constantes dos acórdãos nºs 275/04, 398/05 e 417/06,
decide-se negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida no que
toca às questões de constitucionalidade.»
2. Inconformados com a decisão proferida, os recorrentes vêm agora reclamar para
a Conferência, ao abrigo do artigo 78º-A, nº 3, da LTC, com os seguintes
fundamentos [Cfr. fls. 615 e ss]:
1. A decisão sumária proferida negou provimento ao recurso, por entender que as
questões suscitadas no âmbito do recurso, já foram objecto de apreciação pelo
Tribunal Constitucional, designadamente, nos acórdãos nºs 275/04; 398/05 e
417/06.
2. No acórdão nº 275/2004, o Tribunal Constitucional decidiu julgar
inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo
13º da Constituição, as normas contidas no nº 1 do artigo 23º e no nº 1 do
artigo 26º do Cód. das Expropriações (1999), quando interpretadas no sentido de
incluir na classificação de solo apto para a construção” e, consequentemente, de
como tal indemnizar, o solo, integrado na Reserva Agrícola Nacional, expropriado
para implantação de vias de comunicação.”
3. No acórdão n.° 398/2005, decidiu “Não julgar inconstitucional a norma do nº 3
do artigo 25º do Cód. das Expropriações, aprovado pela Lei nº 168/99, de 18 de
Setembro, interpretada com o sentido de excluir da classificação de “solo apto
para a construção” solos integrados na Reserva Agrícola Nacional ou na Reserva
Ecológica Nacional expropriados para implantação de vias de comunicação.”
4. No acórdão n.° 417/2006, decidiu a) julgar inconstitucional, por violação do
princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição da República
Portuguesa, o artigo 26º, nº 12, do Cód. das Expropriações, aprovado pela Lei nº
168/99, de 18 de Setembro, quando interpretado no sentido de ser indemnizável
como solo apto para construção terreno integrado no RAN com aptidão edificativa
segundo os elementos objectivos definidos no nº 2 do artigo 25º do mesmo
Código.”
ORA,
5. O caso dos presentes autos é uma questão completamente diferente da que é
apreciada nos três acórdãos citados na douta decisão sumária.
5.1. Efectivamente, nos três acórdãos citados, a questão em apreciação prende-se
com a expropriação de terrenos destinados à implantação de vias de comunicação.
5.2. A questão em apreço nos três acórdãos, tendo em vista a implantação de vias
de comunicação, está regulada na Lei da RAN, alínea d). nº 1, do artigo 9º
6. No caso dos autos, a parcela expropriada tem por finalidade a construção de
prédios urbanos.
6.1. O complexo do IPCA, ou “Campus do IPCA” é composto por uma diversidade de
edifícios, contíguos ou separados, que se destinam à instalação dos órgãos
sociais do Instituto, bibliotecas, cantinas, restaurantes, bares, salas de
estudo, residências habitacionais, etc. — v.d. na lnternet em www.ipca.pt - um
verdadeiro complexo urbano.
6.2. Em nada se assemelha aos casos focados nos três acórdãos citados na decisão
sumária, nem se integra no disposto no artigo 9º da Lei da RAN.
7. Na fundamentação de vários acórdãos proferidos pelo Tribunal Constitucional,
têm referido a distinção entre a implantação de vias de comunicação e a
construção de prédios urbanos.
7.1. No acórdão citados na decisão sumária, nº 398/2005 — Pº 914/2004, publicado
no D.R. II Série, em 4 de Novembro de 2005, diz-se expressamente e cit. “…
Quanto a nós, apenas em dois casos pode um terreno integrado na RAN ou na REN
ser considerado apto para construção:
1)…
2) Se a expropriação da parcela visa a construção de prédios urbanos.”
7.2. Para além deste, o caso dos autos é extremamente semelhante ao vertido no
Acórdão nº 267/97, proferido por este Tribunal no Processo nº 460/95.
8. Acresce ainda que, o prédio objecto de expropriação foi adquirido pelo
expropriado ora reclamante, no ano de 1970, data em que não existiam quaisquer
constrangimentos para a construção urbana, podendo o expropriado nessa data
construir aí um prédio urbano com 10, 12 ou mais andares, como muitos outros
fizeram,
8.1. exactamente por esta razão, nas partilhas onde o prédio foi adjudicado ao
reclamante, a respectiva avaliação teve em vista a potencialidade construtiva do
mesmo prédio,
8.2. o qual se situa na freguesia de Vila Frescainha S. Martinho, que está
integrada em parte na cidade de Barcelos, como se vislumbra das fotografias
aéreas juntas aos autos e que constitui um facto notório.”
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. Tendo o processo sido redistribuído por, entretanto, ter cessado funções
neste Tribunal a Ex.ma Juíza Relatora, cumpre apreciar e decidir.
A fundamentação da reclamação baseia-se, essencialmente, na divergência de
situações fácticas subjacentes aos acórdãos invocados na Decisão Sumária e a dos
presentes autos. Enquanto nos primeiros a expropriação visou a construção de
vias de comunicação, no caso em apreço ela teria em vista a construção das novas
instalações do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, ou seja, a construção
de prédios urbanos.
Vejamos se a divergência de fins a que se destina o terreno expropriado é, para
este Tribunal, fundamento bastante para não se aplicarem, ao caso em apreço, as
soluções da jurisprudência invocada na Decisão Sumária.
4. Com efeito, existe uma vasta jurisprudência deste Tribunal relativa à questão
de inconstitucionalidade ora suscitada, ou seja, a inconstitucionalidade dos
artigos 25º, nº 3, e 26º, nº 12, do Código de Expropriações de 1999 (ou de
normas equivalentes do anterior Código).
O facto é que, apesar de, numa fase inicial, este Tribunal não ter dado
particular relevância à finalidade a que se destinavam os terrenos expropriados
para aferir da inconstitucionalidade das normas invocadas (v. Acórdão nº
267/97), os desenvolvimentos posteriores conduziram a uma densificação
jurisprudencial, que passou a ter em devida conta a finalidade de cada uma das
concretas expropriações.
Assim, existe jurisprudência neste domínio, designadamente:
i) Quando aquelas se destinam a permitir a
construção de vias de comunicação (Acórdãos n.ºs 20/2000; 247/2000; 219/2001;
243/2001; 172/2002; 346/2003; 347/2003; 425/2003; 114/2005; 234/2007; 239/2007);
ii) Quando se destinam a permitir a construção de
acessos a uma central de incineração (Acórdão n.º 121/2002);
iii) Quando se destinam a permitir a construção de uma
central de incineração de resíduos urbanos e do respectivo aterro sanitário
(Acórdão n.º 155/2002);
iv) Quando se destinam a permitir a construção de uma
escola pública de ensino básico e obrigatório (Acórdão n.º 333/2003);
v) Quando se destinam a permitir a construção de uma
escola pública de ensino secundário (Acórdão n.º 557/2003);
vi) Quando se destinam a permitir a construção de uma área
de serviço de uma auto-estrada (Acórdão n.º 276/2007).
Note-se que, no caso concreto apreciado no acima referido Acórdão nº 267/97,
invocado pelos reclamantes como consubstanciando um caso idêntico ao dos
presentes autos, este Tribunal apreciou uma expropriação por declaração de
utilidade pública que visava permitir a construção de um quartel de bombeiros.
Isto é, uma situação de estrito paralelismo entre a possibilidade de construção
de edifícios privados e de construção de edifícios públicos, a qual pode,
efectivamente, ter alguns pontos de contacto com a situação dos presentes autos.
Porém, as circunstâncias que rodearam o caso subjacente ao Acórdão nº 267/97
apresentavam particularidades, que aqui se não verificam, designadamente, ter aí
havido actuação pré-ordenada da Administração, traduzida em «manipulação das
regras urbanísticas», com vista a desvalorizar artificiosamente o terreno,
reservado ao uso agrícola, para mais tarde o adquirir por um valor degradado,
destinando-o então à construção de edificações urbanas de interesse público.
Além disso, trata-se de uma jurisprudência isolada deste Tribunal, que, como já
se disse, foi depois desenvolvida e densificada nos acórdãos posteriores.
Acresce ainda que se estranha a invocação deste Acórdão por parte dos
reclamantes, uma vez que das alegações de recurso para este Tribunal parece
resultar a posição contrária: “uma interpretação do artigo 25º nº 3, do Código
Exp. 99, manifestamente inconstitucional, ao atribuir-se-lhe o equivalente à
manutenção da revogada norma do artigo 24º, nº 5, do Código Exp. 91.”. Ora, foi
precisamente este o preceito que o Tribunal apreciou naquele Acórdão.
5. Não vingando a tese aproximativa à jurisprudência do Acórdão nº 267/97,
defendida pelos reclamantes, importa apreciar se quanto ao mais têm razão.
O direito de propriedade, como, aliás, sucede com todos os direitos fundamentais
– sem excepção –, não é garantido pela Constituição em termos absolutos, mas
antes nos termos da [própria] Constituição (artigo 62º, nº 1). Daqui decorre que
são admissíveis limites e restrições previstos e definidos noutros lugares da
Constituição (e na lei, quando remete para ela a Constituição), por razões
ambientais, de ordenamento do território, urbanísticas, económicas, de
segurança, de defesa nacional (neste sentido, J. J. Gomes Canotilho / Vital
Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, Coimbra, Coimbra
Editora, 2006, p. 801).
Um desses limites pode, precisamente, consistir na expropriação por utilidade
pública (artigo 62º, nº 2, CRP), mas, nesse caso, o pagamento de justa
indemnização figura como um pressuposto constitucional da mesma.
6. A Constituição não estabelece, no entanto, qualquer critério indemnizatório,
mas, como afirmam J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira (op. cit, p. 808), “é
evidente que os critérios definidos em lei têm de respeitar os princípios
materiais da Constituição, não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou
manifestamente desproporcionadas em relação à perda do bem expropriado. Por
outro lado, a justa indemnização deve respeitar o princípio da equivalência de
valores, expulsando desta equivalência valores especulativos ou ficcionados,
decisivamente perturbadores da «justa medida» que deve existir entre as
consequências da expropriação e a sua indemnização”.
7. No caso em apreço, afirmando o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
que “[…] Confrontando a matéria fáctica assente com os critérios objectivos de
potencialidade edificativa enunciados [no artigo 25º, n.º 2, als. a) a d) do
CE/99], teremos de concluir que nenhum deles se verifica […]”, o critério de
atribuição da justa indemnização não pode deixar de ter em conta essa realidade,
a qual se encontra fora do alcance dos poderes de cognição deste Tribunal.
Considerando que, segundo o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, a
parcela em causa se encontra, no PDM da cidade de Barcelos, integrada num espaço
agrícola, inserido na RAN e na REN, a potencialidade construtiva – quer se
considere que jus aedificandi se integra no direito de propriedade quer não –
não pode deixar de sofrer restrições, especialmente no que toca à construção
para fins privados, pelo que o critério da justa indemnização não pode deixar de
considerar essas restrições.
E nem se diga que, sendo o destino do terreno, no caso sub judice, a construção
de um Instituto Politécnico, ou seja, a construção de prédio urbano, esta
situação se aproxima inexoravelmente da julgada no Acórdão nº 267/97, como alega
o reclamante, pois, como já se viu, as circunstâncias que rodearam o caso
subjacente a esse Acórdão apresentavam particularidades, que aqui se não
verificam.
Por isso, posteriormente, julgou este Tribunal não inconstitucional a mesma
norma – o artigo 24º, nº 5, do Código de Expropriações de 91 – quando a situação
subjacente ao caso era outra. Fê-lo, por exemplo, no Acórdão n.º 557/2003.
Aliás, se a questão de inconstitucionalidade suscitada, nos presentes autos,
tivesse dito respeito à norma supra referida do Código de Expropriações de 91, a
jurisprudência que maior similitude apresenta com o caso agora em apreço, não
seria certamente a do Acórdão nº 267/97, mas antes a do Acórdão nº 557/03, que
decidiu pela não inconstitucionalidade da norma.
Assim sendo, ainda que a jurisprudência invocada na Decisão Sumária reclamada
dissesse respeito à construção de vias de comunicação e não à construção de um
Instituto Politécnico, a fundamentação dos Acórdãos nela citados aplica-se de
pleno ao caso, pelo que a reclamação não conseguiu abalar a bondade da
fundamentação da Decisão Sumária reclamada.
III – DECISÃO
Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente
reclamação de fls. 615 e 616, confirmando-se, consequentemente, a Decisão
Sumária reclamada de fls. 599 a 610.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do
artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 31 de Maio de 2007
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Gil Galvão