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Processo nº 788/01 Plenário Relator : José de Sousa e Brito
Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional :
I
M ..., mandatária da lista independente denominada “Pela Ribeira”, candidata à Assembleia de Freguesia da Ribeira, Concelho de Ponte de Lima, interpôs recurso contencioso, nos termos do artigo 156º, nº 2 da Lei Orgânica nº
1/2001 por alegadas irregularidades ocorridas no decurso da votação da referida Assembleia de Freguesia na eleição do dia 16 de Dezembro de 2001 dos titulares dos órgãos das autarquias locais, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“ - O funcionamento da Assembleia eleitoral da freguesia da Ribeira - Ponte de Lima foi perturbado, tendo sido exercida pressão para o desdobramento da mesa de voto número um com o objectivo de criar uma terceira mesa de voto;
- A terceira mesa de voto foi criada, tendo ficado em funcionamento três mesas de voto que não tinham o número mínimo de elementos previstos na lei, nem representantes de todos os concorrentes nomeadamente dos recorrentes a quem não foi dada possibilidade de se fazerem representar;
- Esta terceira mesa de voto ficou a funcionar no gabinete particular do Presidente da Junta, sem confidencialidade de voto, nem afixação de editais que tornassem pública a alteração registada;
- A competência para o desdobramento de secções de voto pertence à Câmara Municipal e deve ser exercida até ao 35º dia anterior ao dia da eleição.
- Foi efectuado protesto relativamente a esta situação que viola, nomeadamente o disposto nos artigos 67º, 68º, 73º a 77º e 84º da Lei Orgânica
1/2001 de 14 de Agosto;
- Durante o acto eleitoral foi admitido a exercer o direito de voto cidadão, G... que não se encontrava inscrito no respectivo caderno eleitoral;
- Foi também apresentado protesto relativamente a este facto que consubstancia uma violação do disposto no art. 99º da referida lei;
- A diferença de votos entre a lista dos recorrentes e a lista vencedora foi de apenas um voto pelo que se entende que as situações descritas influíram no respectivo resultado eleitoral”.
A petição do recurso foi recebida por fax no dia 17 de Dezembro de 2001 às 17 horas e sete minutos, tendo-lhe sido dada entrada na secretaria, bem como ao original correspondente, no dia 18.
II
O artigo 158º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais
(aprovada pelo nº 1 do artigo 1º da Lei Orgânica nº 1/2001 de 14 de Agosto) dispõe que “o recurso contencioso é interposto perante o Tribunal Constitucional no dia seguinte ao da afixação do edital contendo os resultados do apuramento”. Há que entender que o artigo 158º se refere a “resultados do apuramento” geral. A mesma expressão é usada no artigo 150º, segundo o qual “os resultados do apuramento geral são proclamados pelo presidente da assembleia até ao 4º dia posterior ao da votação e, em seguida, publicados por meio de edital afixado à porta do edifício onde funciona a assembleia”.
Esta solução só pode ser duvidosa quanto às irregularidades ocorridas no decurso da votação ou do apuramento local, de que são exemplo as invocadas no presente recurso. A letra do artigo 158º é compatível com a fixação de um prazo peremptório de um dia depois do apuramento local para esses recursos. Só que não haveria justificação racional para tal fixação. A ser assim, a parte recorrente seria obrigada a recorrer antes de saber se teria interesse em recorrer, visto que poderia ainda sair vencedora do apuramento geral, seja quanto ao resultado das eleições, seja quanto à correcção das irregularidades que invocou, nos casos em que essa correcção pode ser feita pelo apuramento geral. Ora o nº 2 do artigo 156º, que é uma inovação da LEOAL, faculta à parte “a interposição de recurso gracioso perante a assembleia de apuramento geral no 2º dia posterior ao da eleição”. A parte seria assim obrigada a recorrer antes de conhecer a decisão de recurso gracioso que poderia ainda interpor depois da interposição do recurso contencioso, mesmo quando tal decisão a satisfizesse em face do resultado ou a convencesse pelos fundamentos. Assim, no caso presente, a assembleia de apuramento geral poderia ainda, por hipótese, concluir que a eleitora que, segundo a recorrente, não estaria inscrita nos cadernos eleitorais, afinal se encontrava neles. Mas, o que é mais grave, a parte seria obrigada a recorrer antes de saber se o recurso poderia ter provimento, a serem provados os factos que alega. Na verdade, o artigo 160º, nº
1, estabelece que a votação só será julgada nula quando se hajam verificado ilegalidades que possam influir no resultado geral da eleição do respectivo
órgão autárquico. Ora, só depois do apuramento geral se pode saber desta condição do provimento do recurso. Assim sendo, tal interpretação encurtaria ainda desnecessariamente o prazo de interposição, pois que o Tribunal sempre teria que esperar pela comunicação dos resultados do apuramento geral para julgar das condições de procedibilidade. Até porque pode estar em causa a eleição de três órgãos autárquicos distintos.
Por sua vez , o Tribunal, para cumprir os prazos que o artigo 159º de LEOAL lhe impõe, seria obrigado a notificar imediatamente os representantes dos partidos políticos, coligações e grupos de cidadãos intervenientes na eleição para responderem, querendo, no prazo de um dia, bem como a requisitar todos os elementos de prova solicitados na petição de recurso, incluindo a futura acta de apuramento geral e respectivos anexos – e, neste caso, antes da realização desta e quando tais elementos, por isso mesmo, não podem ser fornecidos sem impedir o apuramento geral -, tudo isto sem saber se a parte manteria interesse em recorrer, continuaria a sustentar todos os fundamentos ou se poderia tomar conhecimento do recurso. Estaria o Tribunal a notificar para ou a requisitar actos eventualmente inúteis dos representantes dos outros concorrentes às eleições, do juiz da comarca e do governador civil e estes solicitados ou obrigados a praticá-los.
Há, pois, que entender que se mantêm (e na hipótese do nº 2 do artigo 156º se reforçaram) as razões sistemáticas que faziam que a anterior lei eleitoral, o Decreto-Lei nº 701-B/76 de 29 de Setembro, explicitasse que o prazo para a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional se contava “a contar da afixação do edital a que se refere o artigo 99º”, que era o edital com os resultados do apuramento geral.
Mantém-se, assim, a doutrina do Acórdão nº 717/97 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 38, 443, 450, 451), que, numa hipótese semelhante, julgou que o recurso foi prematuramente apresentado e que não ficam os recorrentes impedidos da apreciação contenciosa das irregularidades invocadas uma vez que o poderão fazer após a afixação do edital do apuramento geral.
III
Em face do exposto, decide-se não tomar conhecimento do recurso, podendo este, por força do artigo 158º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais (aprovada pelo nº 1 do artigo 1º da Lei Orgânica nº 1/2001 de
14 de Agosto), vir a ser interposto no dia seguinte ao da afixação do edital contendo os resultados do apuramento geral.
Lisboa,20 de Dezembro de 2001 José de Sousa e Brito Maria Fernanda Palma Maria Helena Brito Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Bravo Serra Luís Nunes de Almeida Artur Maurício José Manuel Cardoso da Costa
(Tem voto de conformidade do Conselheiro Paulo Mota Pinto, que não assina por não estar presente. José de Sousa e Brito)