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Processo nº 705/01 Plenário Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
I
1. No processo eleitoral de candidaturas para os órgãos autárquicos do círculo eleitoral da Ponta do Sol, da Região Autónoma da Madeira, na qual a CDU - Coligação Democrática Unitária, PCP-PEV (doravante só CDU), a par de outras entidades proponentes, apresentou listas para a eleição da Câmara Municipal e da Assembleia Municipal da Ponta do Sol e para a eleição das Assembleias de Freguesia das Freguesias da Ponta do Sol e de Canhas (quatro listas, no total), a Mmª Juíza, já depois de ter sido dado cumprimento ao disposto nos artigos 25º, nº 1, e 30º, nº 1, da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto, doravante LEOAL, proferiu com a mesma data de 24 de Outubro de 2001 despachos (4) a mandar notificar 'o Il. Mandatário da candidatura da CDU para, no prazo de três dias, dar integral cumprimento ao disposto no artº 23º, nº 3 da Lei Orgânica nº
1/2001, de 14 de Agosto '(e apenas num desses despachos, no tocante à Assembleia Municipal, acrescentou que 'a declaração de candidatura da candidata M..., além de não se mostrar preenchido o órgão a que a mesma declara aceitar concorrer, não se mostra datada ou assinada'.
2. A CDU, apenas no que toca à Câmara Municipal e à Assembleia Municipal, e com referência a esses despachos, juntou dois documentos: uma certidão de eleitor do candidato J... (Câmara Municipal) e uma 'declaração de M... (candidata à Assembleia Municipal de Ponta do Sol), processo 364/A/01, devidamente preenchida e assinada'.
3. No seguimento processual proferiu então a Mmª Juíza e com a mesma data de 31 de Outubro de 2001 despachos (4) a rejeitar, 'ao abrigo do disposto no artº 27º, nºs 1 e 3 da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto', definitivamente as listas de candidatos da CDU aos mencionados órgãos autárquicos, sempre com o mesmo fundamento, à luz do artigo 23º, nº 3 da LEOAL, de que 'as declarações de candidatura juntas pela coligação da CDU (...) sejam as respeitantes aos candidatos efectivos, sejam as respeitantes aos candidatos suplentes, não preenchem os requisitos legalmente exigidos, mormente no que concerne à especificação do órgão para o qual os candidatos se candidatam' (apenas quanto à Assembleia Municipal acrescentou no despacho que 'que no que concerne ao candidato suplente A ... a mesma nem sequer se mostra assinada').
4. Desses despachos veio a CDU 'recorrer', pedindo nos respectivos requerimentos
(4) a sua revisão e a aceitação das listas de candidatura. Para o efeito invocou sempre o mesmo que se transcreve:
'1º Não é requisito necessário e indispensável a declaração de candidatura conter a indicação do órgão autárquico.
2º A verificação do órgão a que se refere a declaração de candidatura está suficientemente demonstrada e expressa na lista de apresentação de candidatura.
3º Apesar de considerar a inexistência de irregularidades, envidou-se todos os esforços para supri-las.
4º Nos termos indicados foram entregues os documentos solicitados como suficientes para suprir as irregularidades'.
5. Notificadas as demais entidades proponentes para, 'querendo, no prazo de quarenta e oito horas, responderem à reclamação', talqualmente consta do despacho da Mmª Juíza, nada foi dito em resposta.
6. Com a mesma data de 12 de Novembro, a Mmª Juíza proferiu despachos (4), 'ao abrigo do disposto no artº 29º, nº 4 da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto', mantendo, 'nos seus precisos termos o despacho recorrido', e mandando cumprir 'o disposto nos nºs 5 e 6 do aludido artº 29º' ('é nosso entendimento que o candidato tem que expressamente declarar qual o órgão autárquico a que se encontra a concorrer, assinando e datando a sua declaração de candidatura, o que não sucede nas declarações referentes à lista de candidatos da coligação CDU, juntas a fls. 102, 103, 105, 106, 109, 111 e 113 ' – é o que se lê nesses despachos).
7. Desses despachos veio a CDU, 'ao abrigo do artº 31º da Lei Orgânica nº
1/2001, de 14 de Agosto ', recorrer para este Tribunal Constitucional 'da decisão final da meretíssima juíza do Tribunal Judicial da Ponta do Sol, que rejeitou definitivamente a lista de candidatos da CDU', invocando nos respectivos requerimentos (4), todos entrados no tribunal a quo no dia 14 de Novembro de 2001, o que se segue:
'1º Não é requisito necessário e indispensável a declaração de candidatura conter a indicação do órgão autárquico.
2º Já que a verificação do órgão a que se refere a declaração de candidatura está suficientemente demonstrada e expressa na lista de apresentação de candidatura ao órgão.
3º Até porque a declaração é anexa à lista de candidatura do órgão autárquico .
4º A relação entre a candidatura e o candidato é do foro da força política concorrente.
5º Ora, não compete ao Tribunal avaliar dessa relação candidatura/candidato quando não foi para tal solicitado.
6º Acresce ainda que o candidato dispõe dos meios legais que permitem a sua desistência e mesmo a impugnação da candidatura. Em conclusão: No processo de candidatura existem os elementos suficientes que permitem identificar o órgão autárquico a que se refere a declaração de candidatura'.
8. Admitidos os recursos, no dia 15 de Novembro de 2001, conquanto não se mostre que tenha sido publicada 'à porta do edifício do tribunal uma relação completa de todas as listas admitidas', como determina o nº 5º do artigo 29º da LEOAL e foi mandado cumprir pela Mmª Juíza a quo, subiram os autos a este Tribunal na mesma data. II
9. Cumpre decidir. Inexistem - diga-se já – obstáculos a que se conheça do mérito dos recursos da CDU, porquanto: a. A legitimidade é patente (artigo 32º da LEOAL); b. A tempestividade tem de aceitar-se, embora o 'prazo de quarenta e oito horas' não se possa contar do momento fixado no nº 2 do artigo 31º da mesma Lei, face ao registado no ponto 8., mas esse prazo foi respeitado a contar da notificação à CDU dos despachos recorridos (cfr. pontos 6. e 7.); c. Os despachos a mandar notificar 'o Il. Mandatário da candidatura da CDU para, no prazo de três dias, dar integral cumprimento ao disposto no artº 23º, nº 3 da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto ' significam que a Mmª Juíza a quo deu como verificada 'a existência de irregularidades processuais' (nº 1 do artigo 26º da LEOAL) e a posição assumida pela CDU – nada dizendo ou apresentando documentação irrelevante para o suprimento daquelas irregularidades
(v. ponto 2.) – traduz implicitamente que quis 'sustentar que não existiram quaisquer irregularidades a suprir' (nº 2 do artigo 26º), daí desencadeando-se a rejeição das listas de candidatos da CDU e as subsequentes reclamações da CDU
(artigos 27º, nº 1, e 29º), sob a capa de 'recurso' dos despachos a rejeitar as listas (v. ponto 3.).
10. Quanto ao fundo, o tema está circunscrito no cumprimento dos requisitos gerais da apresentação das candidaturas, aqui a candidatura da CDU, no que toca apenas à declaração de candidatura assinada conjunta ou separadamente pelos candidatos, na qual, entre o mais, deve constar, 'sob compromisso de honra', que não 'figuram em mais de uma lista de candidatos para o mesmo órgão' (nº 2 do artigo 23º da LEOAL, que neste estrito aspecto é um preceito inovador).
É facto, como reconhece a Mmª Juíza a quo e a recorrente CDU aceita, que nas declarações dos candidatos falta a 'especificação do órgão para o qual os candidatos se candidatam', mostrando-se quase sempre não preenchido o espaço do impresso das declarações juntas para esse efeito (as únicas excepções respeitam ao candidato J..., para a Assembleia de Freguesia da Ponta do Sol, e à candidata, M..., para a Assembleia Municipal da Ponta do Sol, mas esta apresentada já na fase do pretenso suprimento de irregularidades). Ponto é saber, como sustenta a recorrente CDU, se é irrelevante 'a declaração de candidatura conter a indicação do órgão autárquico', pois talqualmente se expressa e no essencial, tal indicação está 'suficientemente demonstrada e expressa na lista de apresentação de candidatura ao órgão', sendo que a 'relação entre a candidatura e o candidato é do foro da força política concorrente'. Não é assim dispensável nem desnecessária a observação do requisito em causa, sendo certo que a jurisprudência constante e uniforme deste Tribunal vai no sentido de que 'os requisitos formais prescritos na lei da apresentação de candidaturas à eleição dos órgãos das autarquias locais têm todos idêntico valor e a sua violação origina irregularidades processuais de igual relevância jurídica'(cfr. por todos o acórdão nº 723/93, nos Acórdãos, 26º volume, pág.
467). Com ela tem-se em vista que o candidato, assinando solenemente a declaração,
'sob compromisso de honra', assuma pessoalmente certos compromissos, e, entre eles, que não figura em mais de uma lista de candidatos para o mesmo órgão (o que, a ser falso, constitui crime relativo à organização do processo eleitoral, previsto e punido no artigo 170º da LEOAL; cfr. o acórdão nº 576/89, nos Acórdãos, 14º vol., pág. 525, sobre as declarações de aceitação de candidatura). E não é só essa assunção pessoal de um compromisso que diz respeito ao candidato, é também o interesse da entidade proponente em saber que lida com candidatos que não vão figurar noutras listas para o mesmo órgão, o que nem sempre será fácil à entidade proponente estar a controlar (a relação de confiança entre a candidatura e o candidato vai, em princípio, só ao ponto de se conhecer o compromisso solene constante da declaração e nele confiar, mesmo para evitar que o nome do candidato seja usado pela entidade proponente a seu bel prazer, para este ou aquele órgão autárquico). Portanto, e contrariamente ao que sustenta a recorrente CDU, não basta a revelação que é feita por via da lista de candidatos à eleição para determinado
órgão autárquico, cuja organização é da responsabilidade e da autoria da entidade proponente, pois essa lista deve assentar exactamente nas declarações formalmente certas dos candidatos, que são assim, elementos essenciais do processo eleitoral e recaindo sobre a entidade proponente 'o ónus de cuidar da sua regularidade, da autenticidade dos documentos e da elegibilidade dos candidatos' (acórdão nº 731/93, nos Acórdãos, 26º vol., pág. 485). Com o que improcedem as razões invocadas pela recorrente CDU.
11. Termos em que, DECIDINDO, nega-se provimento ao recurso. Lisboa, 20 de Novembro de 2001- Guilherme da Fonseca Maria Fernanda Palma Maria Helena Brito Mareia dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa Bravo Serra Luís Nunes de Almeida Artur Maurício Paulo Mota Pinto José de Sousa e Brito José Manuel Cardoso da Costa