Imprimir acórdão
Processo n.º 117/2013
2ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 145/2013:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorridos B., C. e D., foi interposto recurso, em 14 de janeiro 2013 (fls. 167 a 169), ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da Constituição e da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, do acórdão proferido, em conferência, pela 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra, em 19 de dezembro de 2012 (fls. 152 a 162), para que seja apreciada a constitucionalidade da norma extraída do “artigo 1.842º, n.º 1, alínea a) do Código Civil, declarando que o direito a propor a presente ação não caducou pelo decurso dos prazos ali referidos, sendo o mesmo imprescritível” (fls. 172).
Tudo visto, importa apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
2. A lei processual constitucional determina que o Relator pode proferir decisão sumária sobre o mérito da questão de constitucionalidade normativa apresentada sempre que a mesma se revele “simples”, designadamente quando a mesma já tenha sido objeto de prévia jurisprudência do Tribunal Constitucional (cfr. artigo 78º-A, n.º 1, da LTC).
Ora, é jurisprudência firme e constante deste Tribunal que a fixação legal de um prazo de caducidade do direito de instauração de ação de impugnação da paternidade pelo marido da mãe, respetivamente de 2 (dois) anos ou de 3 (três) anos, consoante se trate da redação da alínea a) do n.º 1 do artigo 1842º do Código Civil (CC), anterior ou posterior àquela conferida pela Lei n.º 24/2009, de 01 de abril, não é inconstitucional. Quanto ao prazo de 2 (dois) anos, vejam-se os Acórdãos n.º 589/2007 e n.º 593/2009 e n.º 179/2010. Quanto ao prazo de 3 (três) anos, vejam-se os Acórdãos n.º 24/2009, n.º 446/2010, n.º 39/2011, n.º 449/2011 e n.º 634/2011 (todos disponíveis in www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/). A mero título exemplificativo, veja-se que o Acórdão n.º 587/2007 vincou uma separação entre o problema da fixação de um prazo de caducidade do direito de impugnação da paternidade pelo marido da mãe – por este depender do conhecimento subjetivo de circunstância evidenciadoras da sua não paternidade –, de um outro problema, resultante do prazo fixado a contar da data da aquisição da maioridade ou da emancipação, quando a impugnação seja deduzida pelo próprio filho. Dessa feita, esclareceu-se que:
«Ao contrário, o prazo definido no artigo 1842º, n.º 1, alínea a), para a impugnação da paternidade por parte do pai presumido – que está agora em causa -, sendo de duração idêntica à daquele, conta-se, todavia, a partir de um facto subjetivo, que se traduz no «conhecimento de circunstâncias de que possa concluir-se a sua não paternidade». Este parece ser um prazo razoável e adequado à ponderação do interesse acerca do exercício do direito de impugnar e que permitirá avaliar todos os fatores que podem condicionar a decisão. E o presumido pai não pode sequer invocar uma situação de impossibilidade de exercer o direito, já que, a partir do conhecimento pessoal de factos que indiciem a inexistência de um vínculo real de filiação, dispõe sempre de tempo útil para afastar a presunção de paternidade.
Neste contexto, não parece que a fixação de um prazo de caducidade para a impugnação de paternidade pelo pai presumido, nos termos em que se encontra previsto na referida norma do artigo 1842º, n.º 1, alínea a), do Código Civil, represente uma intolerável restrição ao direito de desenvolvimento da personalidade entendido com o alcance de um direito de conformar livremente a sua vida, quando é certo que a preclusão do exercício do direito de impugnar pode justamente ter correspondido a uma opção que o interessado considerou ser em dado momento mais consentâneo com o seu interesse concreto e o seu condicionalismo de vida.
Por tudo, não pode entender-se – contrariamente ao que se consignou no acórdão recorrido – que exista uma paridade de situação entre os prazos de caducidade dos artigos 1817º, n.º 1, e 1842º, n.º 1, alínea a), do Código Civil em termos de se poder aplicar neste último caso as razões que conduziram o Tribunal Constitucional a declarar a inconstitucionalidade daquele outro preceito.»
Além disso, o “direito ao conhecimento da paternidade”, quando invocado pelo marido da mãe – ou seja, pelo presumido progenitor – ou pelo próprio filho não goza de idêntica intensidade, desde logo, porque a origem biológica deste último se pode afigurar determinante, quer como fator de conformação da identidade própria, quer como meio de obtenção de informações sobre o seu próprio património genético (por todos, ver o Acórdão n.º 446/2010). Assim sendo, a fixação de um prazo de caducidade para o direito de impugnação da paternidade, pelo marido da mãe – seja ele de 2 (dois) ou de 3 (três) anos – não pode ser julgado como inconstitucional.
A questão a decidir, no âmbito dos presentes autos, apresenta-se como absolutamente idêntica àquela já apreciada na jurisprudência supra citada, a cuja fundamentação se adere e para a qual se remete.
III – DECISÃO
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, decide-se:
a) Negar provimento ao recurso interposto;
b) Não julgar inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1842º do Código Civil.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.»
2. Inconformada com a decisão proferida, a recorrente veio deduzir a seguinte reclamação:
«1/
Contrariamente, ao entendimento sufragado na douta decisão sumária entende o Recorrente, que a fixação de um prazo de caducidade do direito de instauração de ação de impugnação da paternidade pelo marido da mãe é inconstitucional, assim dá-se infra reproduzida toda a argumentação já exposta.
2/
Toda a problemática da fixação e procura da verdadeira paternidade biológica se prende com o direito constitucionalmente garantido que confere “o direito à identidade pessoal” – artigo 26º, nº 1 da CRP e do direito de constituir família em condições de plena igualdade – artigo 36º, nº 1 da CRP, os quais não podem ser restringidos, como resulta do artigo 18º, nº 2 da Lei Fundamental.
3/
O respeito pela verdade biológica sugere a imprescritibilidade não só do direito de investigar como do de impugnar e tratando-se, tanto num caso como no outro, de estabelecer a paternidade biológica, aderindo-se, para tal, em traços gerais, ã argumentação expendida no Acórdão 23/2006, do Tribunal Constitucional — neste sentido podem ver-se Acórdãos do STIJ, de 31/01/2007, Processo 06A4303 e de 25/03/2010, Processo 144/07.8TBFVN.C1S1, ambos disponíveis in http://www.dsi.pt/jstj e o de 07/07/2009, in CJ, STJ, Tomo II, 2009, a pág. 168 e seg..»
3. Notificado para o efeito, o recorrido deixou esgotar o prazo, sem que viesse aos autos deduzir qualquer resposta.
Posto isto, importa apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
4. O reclamante limita-se a reiterar os argumentos já esgrimidos perante o tribunal recorrido e esboçados no requerimento de interposição de recurso. Sucede, porém, que esta Secção, em conferência, adere à fundamentação sufragada nos acórdãos deste Tribunal, referidos na decisão sumária, no sentido da não inconstitucionalidade da norma que constitui objeto do presente recurso, pelo que se rejeita a reclamação ora deduzida.
III - DECISÃO
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.
Lisboa, 10 de maio de 2013. – Ana Guerra Martins – João Cura Mariano – Joaquim de Sousa Ribeiro.