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Processo n.º 297/07
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
A – Relatório
1 – A., melhor identificado nos autos, reclama, ao abrigo do
disposto no artigo 78.º-A, n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na versão
actual (LTC), da decisão sumária proferida pelo relator na qual se decidiu não
tomar conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade interposto pelo
ora reclamante.
2 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
“1 – A., com os demais sinais dos autos, recorre para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b),
da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do Acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de Janeiro de 2007, dizendo o seguinte, no
respectivo requerimento:
“As normas cuja inconstitucionalidade, na interpretação dada
pelo Supremo Tribunal de Justiça, que o recorrente pretende que o Tribunal
Constitucional aprecie são:
1.- os artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”, 13º, números 1 e 2 e 17º, nº1 do
Regulamento das Inspecções Judiciais (aprovado pelo Conselho Plenário do
Conselho Superior da Magistratura em 19 de Dezembro de 2002, publicado nas
páginas 666 a 670 do Diário da República de 15.1.2003, II série);
2.- os artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei nº
21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram feitas, designadamente, pela Lei
nº 143/99, de 31.8), 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i) do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos (aprovado pelo artigo 1º da Lei nº 15/2002, de 22.2 e
alterado pela Lei nº 4-A/2003, de 19.2), 158º, nº 1, do Código de Processo
Civil, estes aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo nos Tribunais
Administrativos, e os artigos 6º, nº 1 e 13º da Convenção Europeia dos Direitos
do Homem (aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10);
3.- os artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1,
2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais.
As normas constitucionais que o recorrente considera violadas são as constantes
nos artigos 2O3º, 2O2º, nº 2, 268º, nº 4 e 2O2º, nº 1 da Constituição da
República Portuguesa.
O recorrente suscitou parte das questões de inconstitucionalidade que vem
invocar, quer no requerimento de interposição do recurso para o Supremo Tribunal
de Justiça, quer nas alegações no mesmo processo nº 584/05, da 2ª Secção. Quanto
a outra parte desse vício, só agora a suscita porque está contida no acórdão de
que se recorre, designadamente por violação do princípio da tutela jurisdicional
efectiva, não podendo, segundo as regras processuais - artigos 666º, 667º, 668º,
669º e 677º do Código de Processo Civil, aplicáveis por força dos artigos 178º
do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de
Processo nos Tribunais Administrativos -, ter sido objecto de reclamação, com
arguição de nulidades e pedido de reforma.
Foram, salvo o devido respeito, especialmente violados os seguintes segmentos
das seguintes normas constitucionais:
- artigo 203º: “Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei”.
- artigo 268º, nº 4: “É garantido aos administrados tutela jurisdicional
efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo,
nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de
quaisquer actos administrativos que os lesem, [...], a determinação da prática
de actos administrativos legalmente devidos...”;
- artigo 202º, nº2: “Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar
a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, [...] e
dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.”;
- artigo 202º, nº 1: “Os tribunais são os órgãos de soberania com competência
para administrar a justiça em nome do povo”.
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I. Admissão de utilização de meio de prova ilícito, ainda para mais subtraído ao
contraditório, em conflito com o princípio da independência dos tribunais.
O Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido (folhas 28 e 29) admitiu
como lícita a conversa do Ex.mo Sr. Desembargador Inspector com o Ex.mo Sr.
Advogado delegado da Ordem dos Advogados em Sintra, no âmbito da Inspecção
ordinária nº 217/2004, como meio de prova, subtraído ao princípio do
contraditório, dizendo mesmo que “tudo indica que tal audição deva ter lugar”.
Expusemos nas partes I.1. do requerimento de interposição do recurso para o
Supremo Tribunal de Justiça e das respectivas alegações, os antecedentes que
agravam ainda mais, no caso concreto, a admissão de tal diligência. Como já
dissemos na resposta ao relatório da Inspecção, “a audição do delegado da Ordem
dos Advogados deve ocorrer no âmbito das inspecções aos tribunais – artigo 11º,
nº 1, g) do Regulamento das Inspecções Judiciais –, mas não, como se retira até
“a contrario” dessa norma e do artigo 17º, nº 1 do mesmo Regulamento, no âmbito
da inspecções aos juízes. Os perigos são evidentes”.
Não nos foi dada oportunidade de contrariar os resultados de tão inusitada
conversa, havendo meio de prova subtraído ao princípio do contraditório e que
receamos que tenha influenciado a Inspecção. E isso inquina todo o processo de
inspecção, não podendo ele ter efeito negativo para o recorrente.
Conclui o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (folha 28), acompanhando o
Conselho Superior da Magistratura, que o relatório da Inspecção nada reflecte
sobre quaisquer elementos avaliativos que tenham resultado da audição. Mas não
levou em conta que logo dissemos que justamente parte do que está em causa é,
como resulta do parágrafo anterior, a omissão, no relatório do Ex.mo Sr.
Desembargador Inspector, da menção dos elementos de avaliação obtidos através da
referida conversa.
A permissividade admitida e até aconselhada pelo Supremo Tribunal de Justiça
abala, como já o dissemos, no recurso, nas referidas partes 1.1, o princípio da
independência dos tribunais, consagrado no artigo 203° da Constituição da
República Portuguesa, pois através da influência exercida junto de Inspector
Judicial poderia um qualquer profissional forense, ainda que imbuído de uma
concepção puramente mercantilista da sua profissão, sem cuidar da Justiça,
conseguir, mediante a atribuição de classificação negativa, a suspensão de
funções de Juiz que lhe seja incómodo.
Por isto que dissemos neste nº I, a interpretação dada pelo Supremo Tribunal de
Justiça aos artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”: 13º, números 1 e 2 e 17º, nº 1
do Regulamento das Inspecções Judiciais, viola o artigo 203º da Constituição da
República Portuguesa.
II. Tutela jurisdicional efectiva, com exame da causa e defesa dos direitos do
recorrente.
O artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aprovada pela Lei
nº 65/78, de 13.10, sob a epígrafe “Direito a um processo equitativo”,
estabelece que qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada
equitativamente “por um tribunal independente e imparcial”, o qual decidirá
“sobre a determinação dos seus direitos e obrigações de carácter civil”. E o
artigo 13º da mesma Convenção, sob a epígrafe “Direito a um recurso efectivo”,
dispõe: “Qualquer pessoa cujos direitos e liberdades reconhecidos na presente
Convenção tiverem sido violados tem direito a recurso perante uma instância
nacional, mesmo quando a violação tiver sido cometida por pessoas que actuaram
no exercício das suas funções oficiais”.
As maiores inovações do Código de Processo nos Tribunais Administrativos,
ligadas aos referidos artigos 202º, nº 2 e 268º, nº 4 da Constituição da
República Portuguesa, vão também no sentido da tutela jurisdicional efectiva e
da protecção dos direitos dos cidadãos.
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As eleições relativas aos vogais eleitos do Conselho Superior da Magistratura –
artigo 137º, nº 1, c) do Estatuto dos Magistrados Judiciais –, estão marcadas
para o próximo dia 1 de Março de 2007 (Aviso nº 13 091/2006, de 15.11.2006,
publicado no Diário da República, 2ª série, nº 234, de 6.12.2006 – documento nº
1).
O Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro B. é candidato efectivo a essas eleições para o
Conselho Superior da Magistratura (documento nº 2), encabeçando uma das duas
listas, havendo, pois, probabilidade de, brevemente, vir a ser Vice-Presidente
do Conselho Superior da Magistratura – artigos 138º, nº 1, 141º, nºs 1 e 2 e
142º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
Foi ele o relator do acórdão recorrido, datado de 25.1.2007, 35 dias antes
daquelas eleições.
Atendendo ao disposto nos artigos 149º, a), 150º, nºs 1, 2 e 3, b), 151º, 152º,
154º e 158º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, parece-nos, salvo o
devido respeito, que o Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro B., o qual tão brevemente
deseja fazer parte do recorrido Conselho Superior da Magistratura, não podia nem
deveria intervir em processo de recurso contencioso de decisão do Conselho
Superior da Magistratura, ainda para mais como relator, que desempenha papel
fundamental. Lavrou o acórdão em período de plena campanha eleitoral (esteve em
Sintra nesse âmbito em 2,2.2007, tendo dito que já há um mês que andava a
percorrer o país em campanha).
Embora a relação de “grande intimidade” – artigo 127º, nº 1, g), 2ª parte do
Código de Processo Civil – ainda não exista (aliás, sendo eleito, passará a ser
parte; se bem que o Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro, segundo se diz no sítio
informático do Supremo Tribunal de Justiça, seja representante do Conselho
Superior da Magistratura no Conselho Pedagógico do Centro de Estudos Judiciários
– documento nº 3, retirado do sítio da sua candidatura), sempre se pode pensar,
salvo o devido respeito, que poderá ter agido já pensando no exercício das novas
funções.
Em anotação ao referido artigo 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do
Homem, escreve o Ex.mo Sr. Dr. Juiz Ireneu Cabral Barreto, “A Convenção Europeia
dos Direitos do Homem anotada”, 2005, 3ª edição, Coimbra, Coimbra Editora,
páginas 155 e 156: “No sentido de preservar a confiança que, numa sociedade
democrática, os tribunais devem oferecer aos cidadãos, deve ser recusado todo o
juiz impossibilitado de garantir uma total imparcialidade”. E nessa página 156
refere que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem “está a conceder a maior
importância à teoria das aparências, admitindo que o elemento determinante
consiste em saber se as apreensões do interessado possam passar por
objectivamente justificadas”. Na página 155 dissera também, citando em nota de
rodapé acórdãos daquele Tribunal: “E, enfim, preconiza-se a eliminação de certas
aparências quando elas podem dar a impressão, ainda que errada, de uma falta de
independência”.
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O acórdão recorrido tem 32 folhas. Nas folhas 1 e 2 reproduzem-se as conclusões
das nossas alegações. Mas o pedido é incorrectamente relatado, também na folha
2. Antes do meio desta folha começa a reprodução, até mecânica, do relatório do
Ex.mo Sr. Desembargador Inspector e do acórdão do Conselho Superior da
Magistratura, com frequentes erros materiais na reprodução, não corrigidos. E
essa reprodução alonga-se até quase ao final da folha 27! Mal se deixa a
reprodução, na última linha dessa folha, logo ocorre outro erro: o termo do
período abarcado pela Inspecção em causa (inspecção ordinária nº 217/2004) é 31
de Dezembro de 2003 e não 31 de Março desse ano.
Na última folha consta o dispositivo. Pelo que a discussão da causa se cinge a
quatro folhas e mais três linhas, e ainda assim com o recurso ao auxílio do
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3.10.2002, como se diz no 2º parágrafo
da folha 28. (Trata-se do Processo nº 790/2002, da 7ª Secção). Bem se vê que não
poderia o Supremo Tribunal de Justiça em tão pouco espaço tratar das questões,
das razões aduzidas pelo recorrente, como deveria ter feito. E logo
desculpabiliza os lapsos e omissões do Conselho Superior da Magistratura,
dizendo, sem os explicitar, que são “inevitáveis” e que os lapsos são “tão
naturais quanto inócuos”! Claro que isto não se pode aceitar, ainda para mais
numa Inspecção em que o resultado foi tão gravoso para o recorrente!
Lamentavelmente, o Supremo Tribunal de Justiça nem se terá dado conta que, na
referida reprodução mecânica acolheu os erros do Conselho Superior da
Magistratura!
Há desrespeito quase total pelas alegações do recorrente, como se bastasse ler
as respectivas conclusões! E mesmo estas, na parte relativa aos 2º, 3º e 4º
fundamentos do recurso, estão muito deficientemente reflectidas nas poucas
linhas (menos de uma folha) que lhe são dedicadas nas folhas 29 e 30.
Essa desatenção mesmo formal para com o que foi escrito e provado pelo
recorrente tem correspondência a nível substantivo, pois o Supremo Tribunal de
Justiça, assim como o Conselho Superior da Magistratura, decidiu com base em
factos errados, não os corrigindo. Nem se emendou (folha 14 do acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça e último parágrafo da página 16 do acórdão do
Conselho Superior da Magistratura, a folhas 40 destes autos) o lapso do Ex.mo
Sr. Desembargador, por ele reconhecido na parte final da 4ª folha da informação
final (folha 407 do 2º volume do processo de inspecção), em face da certidão que
juntámos – folhas 357 a 363 do 2º volume do processo de inspecção – relativo a
pretenso excesso do limite do número de testemunhas inquiridas sobre quesitos!
Houve, salvo o devido respeito, erro grosseiro do Ex.mo Sr. Desembargador, pois
da própria acta da audiência de julgamento (folha 361 do 2º volume do processo
de inspecção) se retirava que não houve o lapso que nos apontou. Houve, salvo o
devido respeito, erro grosseiro do Conselho Superior da Magistratura e do
Supremo Tribunal de Justiça, nos respectivos acórdãos, ao não corrigir aquele
erro, o que ainda mais se salienta atendendo a que a correcção foi mencionada
também na 6ª folha da informação final, em errata inserta logo a seguir ao
relatório, antes dos mapas – folhas 409 e 251-A, respectivamente, do processo de
inspecção – e ainda em despacho do Ex.mo Sr. Desembargador constante a folhas
413 do mesmo processo! E este erro foi expressamente invocado por nós no recurso
para o Supremo Tribunal de Justiça!
Também o Supremo Tribunal de Justiça não desempenhou as funções que lhe
competiam, compadecendo-se com a passividade do Conselho Superior da
Magistratura, que não enfrentou questões levantadas pelo recorrente na resposta
ao relatório da Inspecção, não considerando as pormenorizadas alegações feitas
pelo recorrente na mesma e os documentos juntos a ela, aceitando-se
acriticamente o que foi escrito no relatório pelo Ex.mo Sr. Desembargador,
também as referências desfavoráveis.
O recurso, assim como o direito de resposta, não é apenas um mero formalismo sem
implicações substanciais. O direito de resposta obriga o Conselho Superior da
Magistratura a analisar e estudar as alegações feitas pelo juiz inspeccionado;
não deve o mesmo Conselho aceitar passivamente, expressa ou tacitamente, as
críticas feitas ao trabalho do juiz sem se debruçar sobre as alegações feitas
por este. Essa inacção contraria o próprio sentido da deliberação, como acto
próprio e autónomo, o qual comporta também os respectivos fundamentos. A
deliberação não pode ser uma mera homologação da proposta do Ex.mo Sr.
Desembargador Inspector, como se não houvesse contraditório.
O desprezo dado à resposta do recorrente atingiu, na sua própria raiz,
substancialmente, o direito de resposta. E isto teria que ser censurado pelo
Supremo Tribunal de Justiça, sob pena de ficar esvaziado o direito de recurso –
artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 2º, nºs 1 e 2,
a), d) e i) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 158º, nº 1 do
Código de Processo Civil; mas houve condescendência, não tratando o Supremo
Tribunal de Justiça das questões de que teria que tratar.
*
O Supremo Tribunal de Justiça também não prestou atenção às graves omissões por
nós apontadas – partes I. 3. A) a D) do requerimento de interposição do recurso
e respectivas alegações – ao acórdão do Conselho Superior da Magistratura de
14.12.2004. Assim é quanto à escassez de referências à capacidade humana para o
exercício da profissão, apesar de isso consistir num dos três factores previstos
no artigo 13º, nºs 1 e 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais. E essa omissão
não é inócua, como se diz no acórdão (folha 28), em geral, sem referir esta
omissão.
Outra das omissões que apontámos foi a falta do reconhecimento devido da
qualidade do trabalho do recorrente.
A principal causa da falta de produtividade e dos atrasos do recorrente é,
conjugada com o grande volume de serviço a seu cargo, a boa qualidade
técnico-jurídica do trabalho por nós efectuado. Nada do que dissemos e
comprovámos com os nossos trabalhos, a esse respeito, mesmo o que foi
reconhecido pelo Conselho Superior da Magistratura, como salientámos na acção
administrativa especial, passou para o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça;
aí continuou o erro de que, como se escreveu na página 36 do acórdão do Conselho
Superior da Magistratura, não se possa aquilatar da nossa valia técnica e que o
nosso estudo apenas se manifesta “no plano da citação, dos juros de mora
(cálculo) e no aspecto tributário”. Aqui salientamos somente que no acórdão do
Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 15.1.2002 proferido no
processo de inspecção extraordinária n. 111/2000, no relatório do processo de
inquérito nº 36/2000, aprovado pelo Conselho Permanente do Conselho Superior da
Magistratura, e no relatório final do processo disciplinar nº 36/01, este
elaborado em Outubro de 2004, se diz (artigo 30º deste relatório, na sua folha
8, a folhas 160 destes autos), em contradição com a omissão que denunciámos, que
a nossa “preparação técnico-jurídica no âmbito do direito processual civil e das
custas é de excelente nível” e que a revelada no âmbito do direito substantivo
“parece, no mínimo, ser de bom nível”.
Não têm, pois, salvo o devido respeito, qualquer consistência – não há factos
que as suportem – as conclusões de falta de esforço para recuperar os atrasos
(esta acolhida pelo Supremo Tribunal de Justiça) ou de falta de brio (páginas 36
e 42 do acórdão do Conselho Superior da Magistratura), pois a qualidade do nosso
trabalho, que se teve relutância em reconhecer, desmentem-nas. O brio não
consiste apenas no despacho célere.
A resposta do Conselho Superior da Magistratura já nos reconhece “valia
técnico-jurídica”, “algum cuidado”, “bons conhecimentos jurídicos” e nível de
trabalho satisfatório – artigos 22º, 23º, 26º e 30º, nas folhas 321 a 323 –, mas
nem isso foi tido em conta pelo Supremo Tribunal de Justiça.
O Supremo Tribunal de Justiça também não tratou da omissão consistente na falta
de ponderação devida de todos os trabalhos efectuados pelo recorrente.
O objecto da Inspecção é, deve ser, todo o nosso trabalho prestado na comarca de
Sintra entre 21.3.2000 e 31.12.2003 (com suspensão de funções desde 25 de
Setembro de 2000 até 2 de Março de 2001 e desde 18 até 23 de Janeiro de 2002), e
não só o que foi prestado no 2º Juízo Cível da mesma comarca.
O artigo 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais manda expressamente
que se pondere o exercício de outras funções legalmente previstas.
Por fim, referimos, como consta nas partes I. 3. D) do requerimento inicial e
das alegações da acção administrativa especial (artigos 178º do Estatuto dos
Magistrados Judiciais e 191º do CPTA), a omissão de falta de fundamentação de
referências desfavoráveis ou a falta de consistência dessas referências, de que
o Supremo Tribunal de Justiça também não tratou, recolhendo indevidamente apenas
o que foi dito pelo Ex.mo Sr. Desembargador Inspector e pelo Conselho Superior
da Magistratura.
Salientamos, em síntese do que ali dissemos, os casos relativos ao trabalho de
outros Juízes no 2º Juízo Cível e a divisão desse trabalho connosco, ao processo
de embargos de executado nº 1930-C/90, às imputações de excesso de formalismo,
de falta de simplificação processual e de culto de formalismo, e à apontada
“deficiência de inscrição factual”, referida longamente nas páginas 17 a 19 do
acórdão do Conselho Superior da Magistratura (folhas 41 a 43 destes autos),
repetidas nas folhas 15 a 17 do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de que se
recorre.
Quanto a este último assunto, também o Supremo Tribunal de Justiça não
considerou minimamente, ao menos para o rebater fundadamente, se fosse caso
disso, o que dissemos nas páginas 12 e 13 da resposta – folhas 312 e 313 do 2º
volume dos autos apensos do processo de inspecção –, apesar de o termos repetido
expressamente no recurso.
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Há vários erros de facto, prejudiciais para o recorrente, que apesar de os
termos apontado na resposta e no recurso, passaram para o acórdão do Conselho
Superior da Magistratura e para o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, até em
contradição com a informação final, como atrás dissemos (o relativo a pretenso
excesso do limite do número de testemunhas inquiridas sobre quesitos, no
processo sumário nº 3250/94).
Salientamos, em síntese, os seguintes erros de facto, estando a maior parte
deles tratados com mais desenvolvimento nas partes I.4. do requerimento de
interposição do recurso e das alegações:
a) Número de diligências marcadas em 2003; e número de julgamentos feitos nesse
ano.
b) Número de processos do 2º Juízo Cível de Sintra, e em consequência, número de
processos que estiveram a nosso cargo no período objecto da Inspecção, O número
global de 4453, também recolhido pelo Supremo Tribunal de Justiça, reportado a
31.12.2003, é meramente estatístico, não correspondendo à realidade. Também o
Supremo Tribunal de Justiça não teve em conta a concessão feita na 4ª folha da
informação final (folha 407 do 2º volume do processo de inspecção) pelo Ex.mo
Sr. Desembargador Inspector, e que, conforme a folha 417, no 2º volume do
processo de inspecção, repetida no documento nº 39 por nós apresentado, a folhas
313 destes autos – cópia do mapa, assinado pelo Sr. Escrivão de Direito, da
pendência processual real reportada a 30.9.2004 –, nesta data o número global
era de 5943 processos. No entanto, deve atender-se neste processo a um número
aproximado aos 6000 processos como sendo a pendência real.
E isto já foi reconhecido pelo recorrido Conselho Superior da Magistratura. O
Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura, no inquérito nº
1/2005, instaurado em consequência do acórdão do Conselho Superior da
Magistratura de 14.12.2004, conforme os artigos 34º, nº 2 do Estatuto dos
Magistrados Judiciais e 16º, nº 5 do Regulamento das Inspecções Judiciais, em
28.2.2004, manifestou concordância com o relatório do Ex.mo Sr. Desembargador
Inspector Dr. Nuno Gomes da Silva, dando-o por reproduzido, conforme o extracto
de deliberação constante na última folha do documento n. 40, que juntámos às
alegações; na última frase do artigo 12º, na 5ª folha desse relatório (6ª folha
desse documento), afirma-se a pendência, em 31.12.2003, “de cerca de 6000
processos”! E refere-se que seria a pendência estatística (o que seria até mais
favorável ao recorrente, pois essa é inferior à real). Mas nisso há manifesto
lapso de escrita como se retira do cotejo com a frase anterior: é pendência
real, não estatística.
Portanto, o Conselho Superior da Magistratura, no acórdão de 14.12.2004, e o
Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido de 25.1.2007, decidiram
atendendo a uma pendência inferior à real de cerca de 1500 processos.
c) Nas acções não contestadas, embora geralmente não passe os factos para as
sentenças, muitas vezes refiro que não ficaram provados certos factos (por
exemplo, em acções de despejo, a propriedade invocada – por falta de junção da
certidão predial) e trato de questões jurídicas que não apenas relativas aos
juros de mora, não havendo mera adesão aos fundamentos alegados pelo autor
(certidão, com dez sentenças, que constitui o documento 8 junto ao requerimento
de interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, a folhas 167 a
207 destes autos); já com a resposta tínhamos juntado certidões comprovativas
disso – folhas 395 a 398 e 399 a 402 do 2º volume do processo de inspecção; mas
os erros persistiram nos acórdãos do Conselho Superior da Magistratura – página
11, a folhas 35 destes autos, início da página 22, a folhas 46 destes autos e na
página 40, a folhas 64 destes autos – e do Supremo Tribunal de Justiça –
designadamente na sua folha 9.
d) O trabalho de outros Juízes no 2º Juízo Cível e a divisão desse trabalho
connosco. O Supremo Tribunal de Justiça seguiu (folhas 3 e 4 do acórdão) o
Conselho Superior da Magistratura na insistência (folhas 27, 28 e 29 destes
autos) na versão dada, sem fundamento, salvo o devido respeito, pelo Ex.mo Sr.
Desembargador Inspector. A realidade é a constante na exposição inicial (folhas
68, 69 e 70 destes autos) e na resposta (306, 307 e 308 do 2 volume dos autos
apensos do processo de inspecção), quanto a esta com a precisão, que fizemos no
requerimento inicial e nas alegações, de que o Sr. Dr. C. efectuou audiência de
julgamento e proferiu sentença, em processo com réu revel.
Saliento que, embora os Ex.mos colegas também tenham efectuado despachos de
expediente, antes de 19 de Setembro de 2000 tínhamos a nosso cargo todos os
processos do Juízo e assim voltou a ser a partir de 8 de Janeiro de 2002,
inclusive (data em que a Sr.ª Dr.ª D. deixou de ser Juíza auxiliar no 2º Juízo
Cível de Sintra), até 18 de Setembro de 2003, data da tomada de posse da Sr.ª
Dr.ª E..
É falso, pois que o que se diz nas folhas 3 e 4 do acórdão do Supremo Tribunal
de Justiça de que coubessem aos Ex.mos Srs. Drs. Juízes F. e C. despachar os
processos com nº ímpar e com nº par, respectivamente. Juntam-se os documentos
nºs 4 e 5, subscritos por eles próprios para eliminar de uma vez por todas tais
falsidades.
Nas divisões de trabalho com as Ex.mas Sr.ªs Dr.ªs Juízas auxiliares D. e E.,
foram elas que escolheram os processos que ficavam a seu cargo.
É falsa, pois, a ideia que se recolheu na folha 27 do acórdão recorrido, de que
o recorrente tenha feito a alternância entre os processos pares e os processos
ímpares, o que não se coaduna com o seu carácter e dedicação ao trabalho (sempre
temos tentado aliviar e não sobrecarregar os Ex.mos colegas).
e) Quantidade de decisões finais.
A quantidade de decisões finais consideradas nos acórdãos do Conselho Superior
da Magistratura e do Supremo Tribunal de Justiça é inferior à real, sendo o
defeito importante.
Também neste ponto tão crucial, nada do que dissemos e comprovámos no recurso –
partes I. 4., e) do requerimento inicial e das alegações –, foi considerado.
Portanto, não se consideraram no acórdão todas as decisões finais por nós
proferidas, estando errados o número global de decisões finais e a média mensal
(páginas 9 a 11 do acórdão do Conselho Superior da Magistratura, a folhas 33 a
35 destes autos) em que o Conselho Superior da Magistratura e o Supremo Tribunal
de Justiça se basearam. Salvo o devido respeito, dada a importância que o número
de decisões finais assumiu no acórdão do Conselho Superior da Magistratura e no
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, estes erros não são inócuos, ao
contrário do defendido, sem sequer os explicitar, neste acórdão (folha 29).
f) Como já atrás salientamos, houve erro no acórdão recorrido relativo a
pretenso excesso do limite do número de testemunhas inquiridas sobre quesitos,
no processo sumário nº3250/94 (folha 14 do acórdão; e último parágrafo da página
16 do acórdão do Conselho Superior da Magistratura, a folhas 40 destes autos),
como já estava comprovado pela certidão que juntámos – folhas 357 a 363 do 2º
volume do processo de inspecção.
g) No processo de justificação judicial nº 383/96, não há a omissão apontada no
início da página 23 do acórdão do Conselho Superior da Magistratura (a folhas 47
destes autos), de que não proferimos decisão, como aí se diz, no sentido de que
estivesse pronto para ser decidido. Aguardava sim, impulso processual por parte
do requerente, como comprovámos através de documento junto com a resposta -
folhas 364 e 365 do 2º volume do processo de inspecção. No despacho de
17.2.2003, como se vê nessa folha 365, determinámos a notificação do requerente
para apresentar certidões, sem prejuízo do decurso do prazo para a interrupção
da instância.
Por isto que dissemos neste nº II, a interpretação dada pelo Supremo Tribunal de
Justiça aos artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei
nº 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram feitas, designadamente, pela
Lei nº 143/99, de 31.8), 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i) do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos (aprovado pelo artigo 1º da Lei nº 15/2002, de 22.2 e
alterado pela Lei nº 4-A/2003, de 19.2), 158º, nº 1, do Código de Processo
Civil, estes aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo nos Tribunais
Administrativos, e aos artigos 6º, nº 1 e 13º da Convenção Europeia dos Direitos
do Homem (aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10), viola os artigos 2O2º, nº 2, e
268º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa.
III Inexistência de ponderação global das apreciações, dando-se absoluta
prevalência aos factores da produtividade e celeridade na decisão, mormente
cingida aos despachos saneadores e sentenças em acções contestadas, sem ter em
conta todo o outro trabalho que os Juízes têm a seu cargo.
Todos os critérios de avaliação devem ser igualmente considerados, resultando a
classificação de uma “ponderação global” das várias apreciações – artigos 34º,
nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º e 14º, nº 2 do Regulamento das
Inspecções Judiciais.
O recorrente reconhece a falta de celeridade e de produtividade; mas isso é o
reverso, passe a imodéstia, da boa qualidade do nosso trabalho e de cumprirmos
rigorosamente o dever de nos pronunciarmos sobre todas as questões suscitadas –
artigo 156º, nº 1 do Código de Processo Civil. Temos enfrentado todas as
questões processuais colocadas, não cometendo a displicência de as ignorar para
despachar mais depressa. Não se trata, obviamente, de nos cingirmos “aos
aspectos burocráticos e instrumentais”, como se diz, citando o referido acórdão
de 3.10.2002, na parte final da folha 30 do acórdão de que agora recorremos.
O Direito é uma ciência humana, de qualidades, não de quantidades. Por isso, não
se lhe devem aplicar os modelos das ciências exactas. O que é próprio da ciência
jurídica é saber se as sentenças e despachos foram bem proferidos, podendo ter
mais valor, por exemplo, um despacho de aperfeiçoamento do que um despacho
saneador ou uma sentença, por ser aquele o devido. E este trabalho ficou, em
grande parte, por fazer, salvo o devido respeito, na Inspecção em causa.
Sempre tivemos a nosso cargo, no período objecto da Inspecção, um número
bastante superior àquele – 700 – que se tem entendido como sendo razoável que
estejam a cargo de um só juiz.
Também o acórdão objecto deste recurso considerou a produtividade, a celeridade
processual, na prática, como os decisivos critérios de avaliação, não ponderando
devidamente o volume de trabalho que estava a nosso cargo.
Mas em face daquela “ponderação global” não há fundamento, à luz do critério
hermenêutico previsto no nº 3 do artigo 9º do Código Civil, para que os factores
da “produtividade” e da “celeridade na decisão” – ainda para mais cingidos aos
despachos saneadores, sentenças e outras decisões finais, como se os outros
trabalhos não contassem em relação a esses factores – esbatam ou eliminem todos
os outros.
Em face dos outros factores que se devem considerar, com as correcções que
fizemos no requerimento de interposição do recurso e nas alegações – já vimos
que se verificou grave omissão quanto ao critério de avaliação das capacidades
humanas para o exercício da profissão –, atendendo designadamente às qualidades
pessoais e profissionais, à qualidade do nosso trabalho e à dedicação a ele, às
dificuldades causadas pela grande quantidade de trabalho, por erros de terceiros
e pelas frequentes alterações normativas (designadamente as relativas ao Código
de Processo Civil, ao Código das Custas Judiciais e ao apoio judiciário), não se
justifica que a falta de produtividade e de celeridade, deite tudo a perder,
subvalorizando-se os factores da qualidade do nosso trabalho e da excessiva
carga deste. Pelo contrário, a classificação de “medíocre” deveria ter sido
liminarmente afastada.
A Justiça deve ser pronta. O artigo 20º, nº 4 da Constituição da República
Portuguesa dispõe:
“Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em
prazo razoável e mediante processo equitativo”.
E o nº 1 do artigo 2º do Código de Processo Civil refere-se ao “direito de
obter, em prazo razoável, uma decisão judicial”.
Mas a celeridade não é da essência da Justiça. A qualidade, essa sim, é da
essência da Justiça.
A celeridade a todo o custo, a produtividade como fim único, independentemente
da qualidade das decisões, levará a que se desista da Justiça, que os Tribunais
devem administrar – artigo 202º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa –,
para se passar a aplicar um sucedâneo ou arremedo dela, sem Prudência. Isto o
recorrente não consegue fazer. Não conseguimos fazer da asneira, da
displicência, mesmo nos despachos “menores”, o nosso instrumento de trabalho.
Esse artigo 202º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa dispõe:
“Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a
justiça em nome do povo”.
Na medida em que nele se faz apelo ao valor substantivo da Justiça, não
condescendendo a Lei Fundamental com qualquer outra forma de composição social
dos litígios, uma interpretação dos artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos
Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do
Regulamento das Inspecções Judiciais, como a que foi feita pelo Conselho
Superior da Magistratura e confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça, que
atribua à produtividade e à celeridade uma preponderância absoluta, isto é, que
defenda a avaliação do trabalho dos Magistrados Judiciais tendo, na prática,
como principais critérios, a produtividade e a celeridade processual, e cingida
aos despachos saneadores e sentenças em acções contestadas, sem ter em conta
todo o outro trabalho que temos a nosso cargo, viola aquele artigo 202º, nº 1 da
Constituição da República Portuguesa.
Por isto que dissemos neste nº III, a interpretação dada pelo Supremo Tribunal
de Justiça aos artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais,
13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções
Judiciais, viola o artigo e 202º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
************
Pelo exposto, Excelentíssimos Senhores Juízes do Tribunal Constitucional, requer
o recorrente que, considerado procedente este recurso, por o Supremo Tribunal de
Justiça ter feito, salvo o devido respeito, interpretação inconstitucional de
normas, como atrás dissemos, no acórdão de 25 de Janeiro de 2007, seja mandado
reformar esse acórdão em conformidade com o julgamento de Vossas Excelências
sobre as questões de inconstitucionalidade.
2 – Junto do Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente
sintetizou a sua motivação nas seguintes conclusões:
“1. Utilização de meio de prova ilícito, ainda para mais subtraído ao
contraditório. Como explicámos em I.1.
Viola, pois, por isso, o acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos
artigos 11º, n.º 1, g), “a contrario”, 17º, nº 1 do Regulamento das Inspecções
Judiciais e o artigo 203º da Constituição da República Portuguesa.
2. Desrespeito substantivo do direito de resposta.
Viola, pois, por isso, o acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos
artigos 33º, 34º, nº 1, 151º, d) do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 18º, nº
6 do Regulamento das Inspecções Judiciais.
3. Graves omissões.
A) Escassez de referências à capacidade humana para o exercício da profissão.
B) A falta do reconhecimento devido da qualidade do trabalho do recorrente.
C) Falta de ponderação devida de todos os trabalhos efectuados pelo
recorrente.
D) Falta de fundamentação de referências desfavoráveis ou falta de consistência
dessas referências.
Viola, pois, por isso, o acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos
artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1, 2 e 4,
14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais.
4. Erros de facto.
Houve erros de facto, alguns muito importantes e graves como o número de
decisões finais que proferimos, o número de processo que tivemos a nosso cargo,
a coadjuvação de outros Juízes e a nossa divisão de trabalho com eles.
Viola, pois, por isso, o acórdão de que se recorre, salvo melhor
opinião, o disposto nos artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados
Judiciais e 14º, nºs 1 e 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais.
5. Inexistência de ponderação global das apreciações, dando--se absoluta
prevalência aos factores da produtividade e celeridade na decisão.
Viola, pois, por isso, o acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos artigos
33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º,
nºs 1 e 2, 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais e 202º, n.º 1 da
Constituição da República Portuguesa”.
3 – Por acórdão de 25 de Janeiro de 2007 – fls. 420 a 455 –, o
Supremo Tribunal de Justiça decidiu negar provimento ao recurso, confirmando o
acórdão do plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 14 de Dezembro de
2004, que atribuíra ao recorrente a classificação de “medíocre”.
4 – Inconformado com a decisão, o recorrente interpôs, nos
termos supra transcritos, o presente recurso de constitucionalidade.
Todavia, porque a decisão que admitiu o recurso não vincula o Tribunal
Constitucional, conforme se estabelece no art.º 76.º, n.º 3, da LTC, e se
configura uma situação que se integra na previsão normativa do artigo 78.º-A,
n.º 1, da LTC, passa decidir-se com base nos fundamentos seguintes.
5 – O objecto do recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade, previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280º da
Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, disposição esta que
se limita a reproduzir o comando constitucional, apenas se pode traduzir numa
questão de (in)constitucionalidade da(s) norma(s) de que a decisão recorrida
haja feito efectiva aplicação ou que tenha constituído o fundamento normativo do
aí decidido.
Trata-se de um pressuposto específico do recurso de
constitucionalidade cuja exigência resulta da natureza instrumental (e
incidental) do recurso de constitucionalidade, tal como o mesmo se encontra
recortado no nosso sistema constitucional, de controlo difuso da
constitucionalidade de normas jurídicas pelos vários tribunais, bem como da
natureza da própria função jurisdicional constitucional (cf. Cardoso da Costa,
«A jurisdição constitucional em Portugal», in Estudos em homenagem ao Professor
Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, I,
1984, pp. 210 e ss., e, entre outros, os Acórdãos n.º 352/94, publicado no
Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994, n.º 560/94, publicado no
mesmo jornal oficial, de 10 de Janeiro de 1995 e, ainda na mesma linha de
pensamento, o Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário da República II Série, de
20 de Junho de 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o
Acórdão n.º 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de
2000).
Por outro lado, importa acentuar que, neste domínio da
fiscalização concreta de constitucionalidade, a intervenção do Tribunal
Constitucional se limita ao reexame ou reapreciação da questão de
(in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou ou devesse ter apreciado.
Na verdade, a resolução da questão de constitucionalidade
há-de poder, efectivamente, reflectir-se na decisão recorrida, implicando a sua
reforma, no caso de o recurso obter provimento.
Tal só é possível quando a norma cuja constitucionalidade o
Tribunal Constitucional aprecie haja constituído a ratio decidendi da decisão
recorrida, ou seja, o fundamento normativo do aí decidido.
Concretizando, ainda, aspectos do seu regime, cumpre acentuar que, sendo o
objecto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade constituído
por normas jurídicas que violem preceitos ou princípios constitucionais, não
pode sindicar-se, no recurso de constitucionalidade, a decisão judicial em sim
própria, mesmo quando esta faça aplicação directa de preceitos ou princípios
constitucionais, quer no que importa à correcção, no plano do direito
infraconstitucional, da interpretação normativa a que a mesma chegou, quer no
que tange à forma como o critério normativo previamente determinado foi aplicado
às circunstâncias específicas do caso concreto (correcção do juízo subsuntivo).
Deste modo, é sempre forçoso que, no âmbito dos recursos
interpostos para o Tribunal Constitucional, se questione a
(in)constitucionalidade de normas, não sendo, assim, admissíveis os recursos
que, ao jeito da Verfassungsbeschwerde alemã ou do recurso de amparo espanhol,
sindiquem, sub species constitutionis, a concreta aplicação do direito efectuada
pelos demais tribunais, em termos de se assacar ao acto judicial de “aplicação”
a violação (directa) dos parâmetros jurídico-constitucionais. Ou seja, não cabe
a este Tribunal apurar e sindicar a bondade e o mérito do julgamento efectuado
in concreto pelo tribunal a quo. A intervenção do Tribunal Constitucional não
incide sobre a correcção jurídica do concreto julgamento, mas apenas sobre a
conformidade constitucional das normas aplicadas pela decisão recorrida, cabendo
ao recorrente, como se disse, nos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do
n.º 1 do artigo 70.º, o ónus de suscitar o problema de constitucionalidade
normativa num momento anterior ao da interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional [cf. Acórdão n.º 199/88, publicado no Diário da República II
Série, de 28 de Março de 1989; Acórdão n.º 618/98, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt, remetendo para jurisprudência anterior (por
exemplo, os Acórdãos nºs 178/95 - publicado no Diário da República II Série, de
21 de Junho de 1995 -, 521/95 e 1026/9, inéditos e o Acórdão n.º 269/94,
publicado no Diário da República II Série, de 18 de Junho de 1994)].
A este propósito escreve Carlos Lopes do Rego («O objecto
idóneo dos recursos de fiscalização concreta de constitucionalidade: as
interpretações normativas sindicáveis pelo Tribunal Constitucional», in
Jurisprudência Constitucional, 3, p. 8) que “É, aliás, perceptível que, em
numerosos casos – embora sob a capa formal da invocação da inconstitucionalidade
de certo preceito legal tal como foi aplicado pela decisão recorrida – o que
realmente se pretende controverter é a concreta e casuística valoração pelo
julgador das múltiplas e específicas circunstâncias do caso sub judicio […]; a
adequação e correcção do juízo de valoração das provas e de fixação da matéria
de facto provada na sentença (…) ou a estrita qualificação jurídica dos factos
relevantes para a aplicação do direito […]».
Finalmente, deve referir-se que decorre, ainda, dos referidos
preceitos que a questão de inconstitucionalidade tenha de ser suscitada em
termos adequados, claros e perceptíveis, durante o processo, de modo que o
tribunal a quo ainda possa conhecer dela antes de esgotado o poder jurisdicional
do juiz sobre tal matéria e que desse ónus de suscitar adequadamente a questão
de inconstitucionalidade em termos do tribunal a quo ficar obrigado ao seu
conhecimento decorre a exigência de se dever confrontar a norma sindicanda com
os parâmetros constitucionais que se têm por violados, só assim se
possibilitando uma razoável intervenção dos tribunais no domínio da fiscalização
da constitucionalidade dos actos normativos.
É evidente a razão de ser deste entendimento: o que se visa é
que o tribunal recorrido seja colocado perante a questão da validade da norma
que convoca como fundamento da decisão recorrida e que o Tribunal
Constitucional, que conhece da questão por via de recurso, não assuma uma
posição de substituição à instância recorrida, de conhecimento da questão de
constitucionalidade, fora da via de recurso.
É por isso que se entende que não constituem já momentos
processualmente idóneos aqueles que são abrangidos pelos incidentes de arguição
de nulidades, pedidos de aclaração e de reforma, dado terem por escopo não a
obtenção de decisão com aplicação da norma, mas a sua anulação, esclarecimento
ou modificação, com base em questão nova sobre a qual o tribunal não se poderia
ter pronunciado (cf., entre outros, os acórdãos n.º 496/99, publicado no Diário
da República II Série, de 17 de Julho de 1996, e Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 33º vol., pp. 663; n.º 374/00, publicado no Diário da República
II Série, de 13 de Julho de 2000, BMJ 499º, pp. 77, e Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 47º vol., pp.713; n.º 674/99, publicado no Diário da República
II Série, de 25 de Fevereiro de 2000, BMJ 492º, pp. 62, e Acórdãos do Tribunal
Constitucional, 45º vol., pp.559; n.º 155/00, publicado no Diário da República
II Série, de 9 de Outubro de 2000, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 46º
vol., pp. 821, e n.º 364/00, inédito).
Por outro lado, importa reconhecer que não basta que se
indique a norma que se tem por inconstitucional, sendo, antes, necessário que se
problematize a questão de validade constitucional da norma (dimensão normativa)
através da alegação de um juízo de antítese entre a norma/dimensão normativa e
o(s) parâmetro(s) constitucional(ais), indicando-se, pelo menos, as normas ou
princípios constitucionais que a norma sindicanda viola ou afronta.
Tais exigências têm sido deveras reiteradas pela nossa
jurisdição constitucional.
De forma contínua e sistemática, tem este Tribunal
estabelecido que «“Suscitar a inconstitucionalidade de uma norma jurídica é
fazê-lo de modo tal que o tribunal perante o qual a questão é colocada saiba que
tem uma questão de constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama,
obviamente, que (...) tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a
norma (ou um segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender
de quem suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se
aponte o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao
menos, a norma ou princípio constitucional infringido.” Impugnar a
constitucionalidade de uma norma implica, pois, imputar a desconformidade com a
Constituição não ao acto de aplicação do Direito – concretizado num acto de
administração ou numa decisão dos tribunais – mas à própria norma, ou, quando
muito, à norma numa determinada interpretação que enformou tal acto ou decisão
(cf. Acórdãos nºs 37/97, 680/96, 663/96 e 18/96, este publicado no Diário da
República, II Série, de 15-05-1996). [§] É certo que não existem fórmulas
sacramentais para formulação dos pedidos, nem sequer para suscitação da questão
de constitucionalidade. [§] Esta tem, porém, de ocorrer de forma que deixe claro
que se põe em causa a conformidade à Constituição de uma norma ou de uma sua
interpretação (...) – cf. o referido Acórdão n.º 618/98 e os acórdãos para os
quais remete.
6 – Projectando estes criteria no caso sub judicio constata-se
que o recorrente não suscitou durante o processo qualquer questão de
constitucionalidade normativa, tendo apenas controvertido a decisão judicial qua
tale, enquanto momento de aplicação do direito a uma dada factualidade, razão
pela qual não pode o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do objecto do
recurso.
Vejamos.
6.1 – De acordo com o pedido constante do requerimento de interposição de
recurso para este Tribunal, pretende o recorrente ver apreciada a
constitucionalidade das normas dos “artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”, 13º,
números 1 e 2 e 17º, nº1 do Regulamento das Inspecções Judiciais (aprovado pelo
Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura em 19 de Dezembro de
2002, publicado nas páginas 666 a 670 do Diário da República de 15.1.2003, II
série)”, matéria tratada sob a epígrafe de “Admissão de utilização de meio de
prova ilícito, ainda para mais subtraído ao contraditório, em conflito com o
princípio da independência dos tribunais”.
Perscrutando os autos, verifica-se, no entanto, que o
recorrente não suscitou junto do Supremo Tribunal de Justiça qualquer questão
relativa à constitucionalidade dos referidos artigos.
De facto e no que toca à presente matéria, o recorrente
limitou-se a controverter a concreta decisão recorrida imputando-lhe o vício de
violação desses preceitos e do disposto no artigo 203.º da Constituição.
Atente-se, quanto a este ponto, no teor das alegações
deduzidas junto do Supremo Tribunal de Justiça:
“1. Utilização de meio de prova ilícito, ainda para mais subtraído ao
contraditório.
Confirmamos que (já o escrevemos no início da resposta ao relatório da
Inspecção, com transcrição em nota de rodapé na 2ª folha do requerimento de
interposição deste recurso, mas faltaram palavras) o Ex.mo Sr. Dr. Juiz G., Juiz
nas Varas com Competência Mista de Sintra, nos deu conhecimento, poucos dias
depois da ocorrência, de que Srs. Advogados participantes em Assembleia de
comarca que teve lugar, parece-me, por volta de Fevereiro de 2004, lhe tinham
dito que o Advogado Sr. Dr. H. tomara a palavra, dizendo que tinha informação
segura de que o Ex.mo Sr. Desembargador Inspector me iria atribuir [sic]
“suficiente” nesta Inspecção e que tinham que se tomar medidas para que isso não
acontecesse, tendo outros Srs. Advogados manifestado a sua oposição.
E também confirmamos, como aí escrevemos, que na entrevista final, o Ex.mo Sr.
Desembargador Inspector “não me escondeu que iria falar com o Sr. Dr. I., colega
de escritório do Sr. Dr. H. e delegado da Ordem dos Advogados em Sintra. Aliás,
na folha 43 do relatório, há alusão à posição dos Srs. Advogados (serão só
alguns, acrescento eu)”.
O Ex.mo Sr. Desembargador Inspector confirmou, na informação final (6ª página, a
folhas 409 do 2º volume dos autos apensos do processo de inspecção) que
conversou com o advogado Sr. Dr. I., delegado da Ordem dos Advogados em Sintra;
embora pareça que pretendeu situar essa conversa no âmbito de inspecção ao
tribunal, citando relatório desta, dizendo que entendeu ouvir o Sr. Dr. I.
“apenas para auscultar a opinião dos Senhores Advogados relativamente à situação
do 2º Juízo”, que o contactou “com o objectivo de auscultar a visão dos Senhores
Advogados pela voz do seu representante”.
Mas na referida folha 43 do relatório (folha 250 do 1º volume dos autos apensos
do processo de inspecção), o Ex.mo Sr. Desembargador Inspector dissera que havia
por parte dos “Exmºs Advogados a ideia da necessidade de uma urgente remodelação
no 2º Juízo”; e não aludia a remodelação de mobiliário, mas sim do recorrente...
É claro, como consta na resposta ao relatório da Inspecção, que a conversa –
poderá ter havido mais do que uma, mas houve pelo menos uma – contra a qual nos
insurgimos, se deu no âmbito da inspecção que está aqui em causa, a inspecção
ordinária n.º 217/2004, relativa ao serviço por nós prestado. Justamente quando,
na sala onde o Ex.mo Sr. Desembargador Inspector estava instalado, decorria ou
estava para começar a entrevista final dessa inspecção, prevista no artigo 17º,
nº 1, i) do Regulamento das Inspecções Judiciais, ele disse, telefonicamente,
que não poderia nesse momento atender o Sr. Dr. I., ficando de o fazer mais
tarde. Acabada aquela entrevista, fomos buscar a agenda de 2003, como o Ex.mo
Sr. Desembargador Inspector nos pediu, levando--lha àquela sala. Na tarde desse
dia, o Ex.mo Sr. Desembargador Inspector veio à nossa sala devolver-nos a
agenda, mas nada referiu sobre a conversa com o Sr. Dr. I..
Essa conversa recaiu, pois, repetimos, sobre a inspecção ordinária n.º
217/2004.
Conforme o 6º parágrafo da referida 6ª página da informação final (folha 409 -
2º volume - do processo de inspecção) e o que nos disse em Novembro de 2004, o
Ex.mo Sr. Desembargador Inspector interpretou erradamente o que escrevemos no
início da resposta, pois não nos estávamos a referir a qualquer “fuga de
informação”, a que alguém “já soubesse mais do que o próprio inspector...”.
Como já dissemos naquela resposta, “a audição do delegado da Ordem dos Advogados
deve ocorrer no âmbito das inspecções aos tribunais – artigo 11º, n.º 1, g) do
Regulamento das Inspecções Judiciais -, mas não, como se retira até “a
contrario” dessa norma e do artigo 17º, n.º 1 do mesmo Regulamento, no âmbito da
inspecções aos juízes. Os perigos são evidentes”.
A maior parte das queixas feitas ao Conselho Superior da Magistratura
relativamente aos atrasos no andamento de processos a cargo do recorrente foram
feitas pelo Sr. Dr. I., apresentadas por ele próprio ou por seus constituintes.
Não nos foi dada oportunidade de contrariar os resultados de tão inusitada
conversa, havendo meio de prova subtraído ao princípio do contraditório e que
receamos que tenha influenciado a Inspecção, dados os erros de facto e as
omissões que adiante apontaremos. E isso inquina todo o processo de inspecção,
não podendo ele ter efeito negativo para o recorrente.
O Conselho Superior da Magistratura nem tratou do assunto no acórdão
recorrido. Sobre o constante, acerca deste assunto, na resposta apresentada
neste processo (folhas 316 a 318), subscrita pelo Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro seu
Vice-Presidente, importa sublinhar que justamente parte do que está em causa é,
como resulta do parágrafo anterior, a omissão, no relatório do Ex.mo Sr.
Desembargador Inspector, da menção dos elementos de avaliação obtidos através da
referida conversa (artigos 6º e 7º dessa resposta); e que é significativo que a
justificação apresentada – artigos 4º e 5º dessa resposta – para a existência
daquela conversa – apurar sobre as capacidades humanas para o exercício da
profissão, apontado como “requisito fundamental”, designadamente o
relacionamento com os advogados, conforme o artigo 13º, nºs 1 e 2, c) do
Regulamento das Inspecções Judiciais -, verse afinal sobre esse critério de
avaliação, sobre o qual, como já assinalámos na nossa resposta e no requerimento
de interposição deste recurso, o relatório do Ex.mo Sr. Desembargador Inspector
e o acórdão recorrido enfermam de quase total omissão. Acrescentamos ainda que,
como resultará em parte do que atrás dissemos, e salvo o devido respeito para
com o Sr. Dr. I., discordamos que ele fosse “a pessoa mais qualificada para
fornecer ao Inspector a necessária informação sobre esse relacionamento” (artigo
6º da resposta do Conselho Superior da Magistratura).
A admitir-se a conversa com o Sr. delegado da Ordem dos Advogados como meio de
prova, subtraído ao princípio do contraditório, tal permissividade abalaria o
princípio da independência dos tribunais, consagrado no artigo 203º da
Constituição da República Portuguesa, pois através da influência exercida junto
de Inspector Judicial poderia um qualquer profissional forense, ainda que
imbuído de uma concepção puramente mercantilista da sua profissão, sem cuidar da
Justiça, conseguir, mediante a atribuição de classificação negativa, a suspensão
de funções de Juiz que lhe seja incómodo.
Viola, pois, por isso que dissemos neste n.º 1, o acórdão, salvo melhor opinião,
o disposto nos artigos 11º, n.º 1, g), “a contrario”, 17º, nº 1 do Regulamento
das Inspecções Judiciais e o artigo 203º da Constituição da República
Portuguesa”.
Daqui resulta, com meridiana clareza, que o recorrente,
controvertendo apenas o juízo decisório recorrido, acabou por não suscitar, com
propriedade, qualquer problema de constitucionalidade normativa, em termos de
vincular o Tribunal “a quo” ao seu conhecimento, sendo que a “violação dos
preceitos constitucionais”, imputada directamente ao acto de concreta aplicação
do direito, e não aos preceitos legais aplicados pelas instâncias, não densifica
nem traduz um problema de constitucionalidade normativa susceptível de ser
apreciado por este Tribunal. De facto, uma coisa é reportar a
inconstitucionalidade à concreta decisão considerada como resultado de um
momento de aplicação dos preceitos legais, outra, bem diferente, é imputar à
norma esse vício, identificando e isolando o critério jurídico que aquela
aplicação projecta, como momento normativo, numa dada factualidade.
Por outro lado, urge também concluir que a não suscitação
adequada da questão de constitucionalidade não pode ser imputada a qualquer
circunstância excepcional ou anómala, traduzida na impossibilidade do
cumprimento daquele ónus.
Na verdade, atento o exposto, encontramo-nos perante um caso
em que o recorrente, encontrando-se a questionar uma decisão em que tal critério
foi aplicado, estava em condições para ter colocado a questão de
constitucionalidade junto do tribunal recorrido.
6.2 – O mesmo poderá dizer-se, mutatis mutandis, quanto à invocada
inconstitucionalidade dos artigos 33º, 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, 13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do Regulamento das
Inspecções Judiciais, em face da “inexistência de ponderação global das
apreciações, dando-se absoluta prevalência aos factores da produtividade e
celeridade na decisão, mormente cingida aos despachos saneadores e sentenças em
acções contestadas, sem ter em conta todo o outro trabalho que os Juízes têm a
seu cargo”.
Na verdade, também quanto a este ponto, o recorrente não suscitou perante o
tribunal recorrido, podendo fazê-lo, a inconstitucionalidade das referidas
normas, tendo apenas controvertido a sua concreta aplicação em termos de as
considerar violadas pelo acórdão do Conselho Superior da Magistratura.
6.3 – Por fim, o recorrente pretende ver também apreciada a constitucionalidade
dos artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85,
de 30.7, com as alterações que lhe foram feitas, designadamente, pela Lei nº
143/99, de 31.8), 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i), do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos (aprovado pelo artigo 1º da Lei nº 15/2002, de 22.2 e
alterado pela Lei nº 4-A/2003, de 19.2), 158º, nº 1, do Código de Processo
Civil, estes aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo nos Tribunais
Administrativos, e os artigos 6º, nº 1 e 13º da Convenção Europeia dos Direitos
do Homem (aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10).
Inconstitucionalidade(s) esta(s) arguidas em confronto com o alegado no “ponto
II” do requerimento de interposição de recurso sob o título “tutela
jurisdicional efectiva, com exame da causa e defesa dos direitos do recorrente”,
no qual o recorrente considera, sucessivamente: (a.) o facto do Juiz Conselheiro
relator do acórdão recorrido ser candidato nas eleições para o Conselho Superior
da Magistratura, considerando, a esse propósito, que “atendendo ao disposto nos
artigos 149º, a), 150º, nºs 1, 2 e 3, b), 151º, 152º, 154º e 158º, nº 1 do
Estatuto dos Magistrados Judiciais, parece-nos, salvo o devido respeito, que o
Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro B., o qual tão brevemente deseja fazer parte do
recorrido Conselho Superior da Magistratura, não podia nem deveria intervir em
processo de recurso contencioso de decisão do Conselho Superior da Magistratura,
ainda para mais como relator, que desempenha papel fundamental”; (b.) a não
correcção, por banda do acórdão recorrido, de erros constantes do acórdão do
Conselho Superior de Magistratura e o facto de ambas as decisões assentarem em
factos errados, não corrigidos; (c.) o desprezo dado à resposta do recorrente,
em termos de comprometer “na sua própria raiz, substancialmente, o direito de
resposta (...), esvazia[n]do o direito de recurso – artigos 168º, nºs 1 e 5 do
Estatuto dos Magistrados Judiciais e 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i) do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos e 158º, nº 1 do Código de Processo
Civil”; (d.) o facto do Supremo Tribunal de Justiça não ter “prestado atenção às
graves omissões” apontadas pelo recorrente, designadamente quanto “à escassez de
referências à capacidade humana para o exercício da profissão”, à “falta do
reconhecimento devido da qualidade do trabalho do recorrente”, à “falta de
ponderação devida de todos os trabalhos efectuados pelo recorrente” e a “omissão
de falta de fundamentação de referências favoráveis ou a falta de consistência
dessas referências, de que o Supremo Tribunal de Justiça também não tratou,
recolhendo indevidamente apenas o que foi dito pelo Ex.mo Sr. Desembargador
Inspector e pelo Conselho Superior da Magistratura”; (e.) existência de erros de
facto que, apesar de terem sido referidos no recurso, passaram para o acórdão do
Conselho Superior da Magistratura e para o acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça.
Vejamos.
No artigo 168.º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais, dispõe-se que
“das deliberações do Conselho Superior da Magistratura recorre-se para o Supremo
Tribunal de Justiça”, estando consagrado no n.º 5 desse preceito que “constituem
fundamentos de recurso os previstos na lei para os recursos a interpor dos actos
do Governo”.
Por sua vez, a norma do artigo 2.º do Código de Processo nos Tribunais
Administrativo dispõe que:
“1 – O princípio da tutela jurisdicional efectiva compreende o direito de obter,
em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado,
cada pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a
fazer executar e de obter as providências cautelares, antecipatórias ou
conservatórias, destinadas a assegurar o efeito útil da decisão.
2 – A todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela
adequada junto dos tribunais administrativos, designadamente para o efeito de
obter:
a) O reconhecimento de situações jurídicas subjectivas directamente decorrentes
de normas jurídico-administrativas ou de actos jurídicos praticados ao abrigo de
disposições de direito administrativo;
b)...
c)...
d) A anulação ou a declaração de nulidade ou inexistência de actos
administrativos;
e)...
f)...
g)...
h)...
i) A condenação da Administração à prática de actos administrativos legalmente
devidos.
(...)”.
Já no artigo 158.º, n.º 1, do Código de Processo Civil dispõe-se que “as
decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida
suscitada no processo são sempre fundamentadas”.
Finalmente, nas referidas normas da Convenção Europeia dos Direitos do Homem
dispõe-se que “qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada,
equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e
imparcial, estabelecido pela lei, o qual decidirá, quer sobre a determinação dos
seus direitos e obrigações de carácter civil, quer sobre o fundamento de
qualquer acusação em matéria penal dirigida contra ela. O julgamento deve ser
público, mas o acesso à sala de audiências pode ser proibido à imprensa ou ao
público durante a totalidade ou parte do processo, quando a bem da moralidade,
da ordem pública ou da segurança nacional numa sociedade democrática, quando os
interesses de menores ou a protecção da vida privada das partes no processo o
exigirem, ou, na medida julgada estritamente necessária pelo tribunal, quando,
em circunstâncias especiais, a publicidade pudesse ser prejudicial para os
interesses da justiça” (artigo 6.º, n.º 1) e “qualquer pessoa cujos direitos e
liberdades reconhecidos na presente Convenção tiverem sido violados tem direito
a recurso perante uma instância nacional, mesmo quando a violação tiver sido
cometida por pessoas que actuem no exercício das suas funções oficiais” (artigo
13.º).
São estas, pois, as normas que o recorrente considera inconstitucionais, “na
interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça”.
No entanto, por um lado, considerando o teor da argumentação desenvolvida pelo
recorrente, resulta claro que este se limita a controverter, embora sob a capa
formal da invocação da inconstitucionalidade dos referidos preceitos, como foram
aplicados pela decisão recorrida, – a concreta e casuística valoração do
tribunal recorrido em relação às múltiplas e específicas circunstâncias do caso
sub judicio, sendo disso sintomático que as normas cuja constitucionalidade vem
controvertida, são, no fundo, normas que o recorrente considera terem sido
violadas pela decisão do Conselho Superior da Magistratura e, sucessivamente,
pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, além de que, como é patente,
inexiste, fora da análise dos contornos do caso concreto, uma definição
normativa do objecto do recurso de constitucionalidade.
Independentemente desse aspecto fundamental, não se vislumbra também, a não ser
na óptica da violação dos preceitos supra transcritos, a existência de uma
relação normativa entre tais normas e a sua projecção no decidido, tal como o
recorrente delas faz decorrer o juízo decisório controvertido, sendo certo que,
apenas pode “apresentar-se como sendo interpretação de uma dada norma jurídica,
mesmo quando ela seja lida conjugadamente com outra ou outras norma jurídicas,
um sentido que seja referível ao seu teor verbal” (cf. Acórdão n.º 106/99, deste
Tribunal).
Por outro lado, as questões subjacentes à arguição da inconstitucionalidade das
referidas normas, com excepção do problema relativo à imparcialidade do tribunal
recorrido, agora alegado, já haviam sido colocadas junto do Supremo Tribunal de
Justiça (cf. alegações de recurso, sintetizadas nas conclusões 2.ª a 4.ª), não
tendo aí, porém, sido suscitada qualquer questão de constitucionalidade
normativa referida às normas de suporte do juízo contestado pelo recorrente.
Em terceiro lugar, no que toca ao alegado quanto às garantias de imparcialidade
que o recorrente faz decorrer do artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos
Direitos do Homem, cumpre realçar que o recorrente não impugna qualquer norma,
ou interpretação normativa, que, no plano do direito ordinário, afronte as
mencionadas garantias de imparcialidade, designadamente quanto à existência de
“impedimento” do relator (artigos 122.º e ss. do Código de Processo Civil) ou
causa de “suspeição” (artigos 126.º e ss. do mesmo diploma adjectivo), cujo
sentido haja sido determinado por referência a tal instrumento de direito
internacional pactício, sendo certo, ainda, por outro lado, que nem ele foi
directamente convocado como critério decisório ou ratio decidendi.
Além disso, também aqui, a invocação do disposto no artigo 6.º, n.º 1, da
Convenção Europeia dos Direitos do Homem, apenas denuncia que o recorrente
discorda da concreta intervenção do relator no processo e não de qualquer norma
que a suporte, ainda que, artificiosamente, impute a mencionada
inconstitucionalidade à própria norma que estabelece o direito a um processo
justo e equitativo com totais garantias de imparcialidade, sem contudo definir,
apartando os contornos fácticos do caso concreto, qualquer critério prescritivo,
não subsuntivo, isolado do momento da sua aplicação
7 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar
conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 (sete) UCs”.
3 – Discordando do decidido, argumenta o reclamante que:
“(...)
A., recorrente, não se podendo conformar com a decisão sumária
proferida em 8 de Março de 2007, que lhe negou o conhecimento do objecto do
recurso, vem muito respeitosamente, nos termos dos artigos 78º-A, nº 3, 70º, nº
3, 69º da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional (Lei nº 28/82, de 15.11) e 688º, nº 2 do Código de Processo
Civil, reclamar para a conferência.
Segundo aquela decisão sumária, o recorrente “não suscitou durante o processo
qualquer questão de constitucionalidade normativa” (folha 21).
Disse também o Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro autor dessa decisão que “não existem
fórmulas sacramentais para formulação dos pedidos, nem sequer para suscitação da
questão de inconstitucionalidade” (folha 20) e que esta “tem, porém, de ocorrer
de forma que deixe claro que se põe em causa a conformidade à Constituição de
uma norma ou de uma sua interpretação” (folha 21).
Nesta acção administrativa especial (artigo 191º do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos), em cujo requerimento de interposição, conforme o
artigo 172º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85, de 30.7,
com as alterações que lhe foram feitas, designadamente, pela Lei nº 143/99, de
31.8), devem constar “os fundamentos de facto ou de direito” do recurso. É
normal, pois, que, quer nesse requerimento, quer nas alegações e conclusões
destas – artigos 176º, 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 690º, nºs 1 e
2, a) e b) do Código de Processo Civil, 1º, 191º e 192º do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos –, em cumprimento das normas aplicáveis, o foco
seja posto nas normas jurídicas violadas pelo acto administrativo de que se
recorre, não resultando isso de uma opção do recorrente. Exigem mesmo esses nº 1
e a alínea a) do nº 2 desse artigo 690º do Código de Processo Civil que, nas
conclusões da alegação, o recorrente indique, respectivamente, os “fundamentos
por que pede a alteração ou anulação da decisão” e, “versando o recurso sobre
matéria de direito”, “as normas jurídicas violadas”.
Mas nada obsta a que se diga que um acto administrativo viola a Constituição,
mas também que a interpretação dada ou subentendida a normas jurídicas nele
feita, viole a Constituição.
O cumprimento do ónus de suscitação da questão de constitucionalidade – artigos
280º, nºs 1, a) e 4 da Constituição da República Portuguesa, 70º, nº 1, b) e
72º, nº 2 da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional –, basta-se “com a produção de afirmações das quais se
deduza que o recorrente imputa a inconstitucionalidade” “a certa norma” – Exma.
Srª Drª Isabel Alexandre, “A norma ou princípio constitucional ou legal violado
como elemento do objecto dos recursos de fiscalização concreta da
constitucionalidade ou da legalidade”, inserto em “Jurisprudência
Constitucional”, nº 6, página 40. Ou a certa interpretação de normas, ou, como
é, em rigor, em parte das que estão em causa, a desaplicação delas.
“O que interessa, na verdade, é que o tribunal recorrido se tenha podido
aperceber da necessidade de resolução de uma questão de inconstitucionalidade ou
de ilegalidade” (mesma página 40).
O Supremo Tribunal de Justiça soube que tinha questões de inconstitucionalidade
para decidir (imediatamente antes do dispositivo, na folha 31 do seu acórdão,
refere-se, embora muito sucintamente a duas normas da Constituição por nós
invocadas).
************
No que respeita ao 1º conjunto de normas cuja inconstitucionalidade, na
interpretação dada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente pretende que o
Tribunal Constitucional aprecie – os artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”, 13º,
números 1 e 2 e 17º, nº 1 do Regulamento das Inspecções Judiciais –, importa pôr
em relevo que, quer no requerimento de interposição de recurso, quer nas
alegações que apresentámos no Processo nº 584/05, da 2ª Secção do Supremo
Tribunal de Justiça, dissemos (como transcrito a folhas 23 e 24 da decisão
sumária de que se reclama) que “a audição do delegado da Ordem dos Advogados
deve ocorrer no âmbito das inspecções aos tribunais – artigo 11º, nº 1, g) do
Regulamento das Inspecções Judiciais –, mas não, como se retira até “a
contrario” dessa norma e do artigo 17º, nº 1 do mesmo Regulamento, no âmbito da
inspecções aos juízes”. E que “a admitir-se a conversa com o Sr. delegado da
Ordem dos Advogados como meio de prova, subtraído ao princípio do contraditório,
tal permissividade abalaria o princípio da independência dos tribunais,
consagrado no artigo 203º da Constituição da República Portuguesa, pois através
da influência exercida junto de Inspector Judicial poderia um qualquer
profissional forense, ainda que imbuído de uma concepção puramente mercantilista
da sua profissão, sem cuidar da Justiça, conseguir, mediante a atribuição de
classificação negativa, a suspensão de funções de Juiz que lhe seja incómodo”.
Então, salvo o devido respeito, resulta daqui que o recorrente colocou de forma
adequada um problema de inconstitucionalidade normativa ao Supremo Tribunal de
Justiça, que teve oportunidade de se pronunciar sobre ele. Embora não o tenha
feito, como não o fez sobre muitas outras questões que deveria ter tratado, não
pode ser o recorrente prejudicado por isso. O recorrente extraiu um critério
normativo, independente das circunstâncias do caso concreto, que isolou e levou
ao julgamento do Supremo Tribunal de Justiça, pondo‑lhe a questão de saber se
viola o princípio da independência dos tribunais, consagrado no artigo 203º da
Constituição da República Portuguesa, a audição, por iniciativa do Inspector
Judicial, do delegado da Ordem dos Advogados no âmbito da inspecções aos juízes,
como meio de prova, subtraído ao princípio do contraditório, sem elaboração de
qualquer acta que o Juiz possa consultar, para poder pronunciar-se sobre o que
foi dito.
E o recorrente também indicou o sentido da inconstitucionalidade invocada:
através da influência exercida junto de Inspector Judicial pode um qualquer
profissional forense (ainda que imbuído de uma concepção puramente mercantilista
da sua profissão, sem cuidar da Justiça), conseguir, mediante a atribuição de
classificação negativa, a suspensão de funções de Juiz que lhe seja incómodo
(artigos 34º, nº 2 do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 16º, nº 5 do
Regulamento das Inspecções Judiciais).
O recorrente acrescentou apenas, no requerimento de interposição deste recurso
de constitucionalidade, como objecto do mesmo recurso, o artigo 13º, nºs 1 e 2
do Regulamento das Inspecções Judiciais, dada a invocação dessas normas pelo
Supremo Tribunal de Justiça (1º parágrafo da folha 29 do seu acórdão de
25.1.2007) para fundamentar tal audição.
**********
Quanto ao 2º conjunto de normas, os artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos
Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram
feitas, designadamente, pela Lei nº 143/99, de 31.8), 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i)
do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aprovado pelo artigo 1º da
Lei nº 15/2002, de 22.2 e alterado pela Lei nº 4-A/2003, de 19.2), 158º, nº 1,
do Código de Processo Civil, estes aplicáveis por força dos artigos 178º do
Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo
nos Tribunais Administrativos, e os artigos 6º, nº 1 e 13º da Convenção Europeia
dos Direitos do Homem (aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10), devemos atender a
que o recurso das decisões do Conselho Superior da Magistratura para o Supremo
Tribunal de Justiça também pode incidir, como é o caso, sobre a matéria de
facto, como se retira do nº 1 do artigo 172º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, ao referir-se aos “fundamentos de facto”.
Ao contrário do que sustenta o Exmo. Sr. Juiz Conselheiro (folha 29, último
parágrafo), salvo o devido respeito, não nos limitámos a controverter o modo
como foram aplicados aqueles preceitos pela decisão recorrida. Salvo melhor
opinião, o que está mais precisamente em causa é o modo como não foram
aplicados.
Neste segundo conjunto de normas, ao contrário do que se diz na decisão sumária
(folha 29, último parágrafo), salvo o devido respeito não há nenhuma em relação
à qual o recorrente diga que foi violada pelo Conselho Superior da Magistratura,
pois são específicas da actividade jurisdicional.
Ligando isso à asserção feita no 2º parágrafo da folha 30 da decisão sumária,
sendo as normas em causa relativas à função jurisdicional, é claro que não foi,
não tinha e não deveria ser colocada questão de constitucionalidade normativa ao
Supremo Tribunal de Justiça, pois deve pressupor-se que os Tribunais vão cumprir
as suas funções, não havendo logo que dizer-lhes que uma interpretação das
normas aplicáveis que os levem a não enfrentar as questões colocadas, violará o
princípio da tutela jurisdicional efectiva e os artigos 202º, nº 2 e 268º, nº 4
da Constituição da República Portuguesa. Por isso logo dissemos no requerimento
de interposição deste recurso de constitucionalidade que o recorrente, quanto a
parte do vício da inconstitucionalidade, só então o suscitava “porque está
contida no acórdão de que se recorre, designadamente por violação do princípio
da tutela jurisdicional efectiva, não podendo, segundo as regras processuais –
artigos 666º, 667º, 668º, 669º e 677º do Código de Processo Civil, aplicáveis
por força dos artigos 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e
192º do mesmo Código de Processo nos Tribunais Administrativos –, ter sido
objecto de reclamação, com arguição de nulidades e pedido de reforma”.
No que respeita ao argumento expendido no 1º parágrafo da folha 30 da decisão
sumária de que se reclama, importa salientar que justamente o que está em causa
é que as normas não se tenham reflectido como deveriam e como reclamavam os
artigos 202º, nº 2 e 268º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa, no
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.1.2007. Mas não é isso que obsta à
apreciação da inconstitucionalidade de uma interpretação que se deve ter por
subentendida (ainda que se confunda com a não aplicação das normas), sob pena de
se deixarem desprotegidas as situações de maior gravidade.
Assim, em relação ao 2º conjunto de normas, a questão de inconstitucionalidade
objecto deste recurso só surgiu com a prolação do acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça de 25.1.2007, designadamente por ter havido, salvo o devido respeito,
intervenção indevida do Exmo. Sr. Juiz Conselheiro relator e omissão
injustificada de pronúncia sobre vícios que o recorrente atribuiu ao acto
administrativo recorrido.
Não teria o recorrente que, prevenindo aquelas intervenção e omissão,
inesperadas, assacar, antes (no requerimento de interposição do recurso e nas
alegações) a interpretação de normas que aí viesse a ser feita, o vício de
inconstitucionalidade.
Devemos salientar a especificidade da questão de inconstitucionalidade em causa,
na parte relativa aos erros e omissões constantes no acto administrativo
recorrido. Houve, salvo o devido respeito, falta de aplicação das normas dos
artigos 2º, nºs 1 e 2, a), d) e i) do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos, 158º, nº 1, do Código de Processo Civil, 6º, nº 1 e 13º da
Convenção Europeia dos Direitos do Homem e falta de fundamentação dessa omissão;
essas normas foram absolutamente inconsideradas pelo Supremo Tribunal de
Justiça.
Sucede é que a interpretação das normas, ou melhor, a falta de aplicação e a
desconsideração delas, integrada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça,
constitui a própria ofensa às normas e princípio constitucionais.
Só surgindo a questão de constitucionalidade, nessa parte, com a prolação do
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, a suscitação dela só teria que ter lugar
no requerimento de interposição deste recurso para o Tribunal Constitucional
(Exmo. Sr. Professor Jorge Miranda, “Manual de Direito Constitucional”, tomo II,
“Constituição e Inconstitucionalidade”, 3ª edição, 1991, Coimbra, Coimbra
Editora, página 449).
Assim, o recorrente colocou a questão de inconstitucionalidade “de modo
processualmente adequado” – artigo 72º, nº 2 da Lei Orgânica sobre Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional -, havendo que atender à
aludida especificidade de que está em causa a falta de aplicação e a
desconsideração de normas.
Ainda que não se entenda como acabamos de expor, considerando sempre a
especificidade da situação em causa – não aplicação e até desconsideração de
normas, não estando expressa qualquer interpretação delas por parte do Supremo
Tribunal de Justiça -‘ não devendo deixar-se desprotegidas as situações mais
graves, o recurso de inconstitucionalidade deverá ser admitido, nessa parte, ao
abrigo dos artigos 280º, nº 1, a) da Constituição da República Portuguesa e 70º,
nº 1, a) da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional. Tal modalidade de recurso não está sujeito ao requisito de
suscitação prévia perante o Tribunal recorrido (artigos 280º, nº 4 da
Constituição e 72º, nº 2 daquela Lei Orgânica, ambos “a contrario”).
Embora o Supremo Tribunal de Justiça não tenha expressamente declarado a recusa
da aplicação das normas em causa com fundamento na sua inconstitucionalidade (e
por isso não invocámos a alínea a) do nº 1 do artigo 70º daquela Lei Orgânica no
requerimento de interposição deste recurso) – não tratou sequer da questão da
sua aplicação –, conforme ensina o Exmo. Sr. Professor Jorge Miranda, na página
374 do “Manual de Direito Constitucional”, tomo II, “Introdução à Teoria da
Constituição”, 2ª edição, 1983, Coimbra, Coimbra Editora, “a recusa de aplicação
relevante não tem de ser apenas a expressa, pode ser a simples recusa implícita,
como se verifica quando a decisão do tribunal extrai consequências
correspondentes à declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade”. Na 3ª
edição (de 1991) do mesmo tomo II, com o subtítulo “Constituição e
Inconstitucionalidade”, diz na página 443 o mesmo Exmo. Sr. Professor que “a
recusa de aplicação relevante não tem de ser sempre expressa; pode ser a recusa
implícita, como ocorre quando a decisão do tribunal extrai consequências
correspondentes ao julgamento da norma como inconstitucional ou ilegal”. O mesmo
consta na página 217 do “Manual de Direito Constitucional”, tomo VI,
“Inconstitucionalidade e Garantia da Constituição”, 2 edição, 2005, Coimbra,
Coimbra Editora.
Em ambas as edições desse tomo II e na referida do tomo VI, em notas de rodapé
cita acórdãos nesse sentido da Comissão Constitucional (de 19.1.1982 e de
31.3.1982, publicados no Boletim do Ministério da Justiça nº 317, a páginas 98 e
103, respectivamente).
Sobre o constante no 3º parágrafo da folha 30 da decisão sumária, o que está em
causa é o artigo 6°, n° 1 (além do artigo 13º) da Convenção Europeia dos
Direitos do Homem, em si mesmo, na parte em que dispõe que a causa seja
examinada equitativamente por um tribunal independente e imparcial, não havendo,
salvo melhor opinião, que impugnar norma ou interpretação de norma de direito
ordinário que afronte essas garantias.
Sobre o constante no 1º parágrafo da folha 31, o que atacamos é a interpretação
subentendida (ou mesmo a não aplicação) desse artigo 6º, nº 1; não há qualquer
artifício e não atribuímos, claro, o vício de inconstitucionalidade à própria
norma.
E há claramente critérios normativos, definições normativas do objecto do
recurso de constitucionalidade, que identificámos, independentemente das
circunstâncias do caso concreto: não viola os artigos 202º, nº 2 e 268º, nº 4 da
Constituição da República Portuguesa a intervenção, ainda para mais como
relator, de Juiz Conselheiro candidato a Vice-Presidente do Conselho Superior da
Magistratura em julgamento, proferindo acórdão, em que o Conselho Superior da
Magistratura é parte, ainda para mais que incide sobre acórdão em que atribuiu
classificação de “medíocre”, efectuado pouco mais do que um mês antes dessas
eleições? Ou não viola os mesmos artigos da Constituição a falta de tratamento
pelo Supremo Tribunal de Justiça das questões de erros e omissões, como os que
são atribuídos pelo recorrente ao acto administrativo impugnado, decidindo com
base em erros de facto?
***********
O 3º conjunto de normas cuja inconstitucionalidade, na interpretação dada pelo
Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente pretende que o Tribunal Constitucional
aprecie os artigos 33º, 34º nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs
1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e 15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais.
Os nºs 5 das partes I., estas com o título “Fundamentos deste recurso” do
requerimento de interposição de recurso e das alegações da acção administrativa
especial, começam com o seguinte parágrafo:
“Todos os critérios de avaliação devem ser igualmente considerados, resultando a
classificação de uma “ponderação global” das várias apreciações – artigos 34º,
nº 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º e 14º, nº 2 do Regulamento das
Inspecções Judiciais”.
Desenvolvemos o fundamento do recurso, salientando que a produtividade e a
celeridade na decisão são apenas dois entre dezoito factores a ter em conta na
avaliação dos Juízes – artigo 13º, nºs 1 a 4 do Regulamento das Inspecções
Judiciais – e não se reportam apenas aos despachos saneadores e sentenças em
acções contestadas, havendo de se ter em conta todo o outro trabalho que os
Juízes têm a seu cargo.
Quer naquele requerimento de interposição de recurso, quer nas alegações, está
colocada a questão de inconstitucionalidade – artigo 71º, nº 1 da Lei Orgânica
sobre Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional –, também
nesse domínio. Depois de citarmos o artigo 202º, nº 1 da Constituição da
República Portuguesa, concluímos que, na medida em que nele se faz apelo ao
valor substantivo da Justiça, não condescendendo a Lei Fundamental com qualquer
outra forma de composição social dos litígios, uma interpretação daquelas normas
do Estatuto dos Magistrados Judiciais e do Regulamento das Inspecções Judiciais
(tínhamos aí referido os artigos 34º, nº 1 do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, 13º e 14º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais, como
dissemos, mas pode alargar-se a questão ao conjunto dos artigos 33º, 34°, nº 1
do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e
15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais), como a que foi feita pelo
Conselho Superior da Magistratura e confirmada pelo Supremo Tribunal de Justiça,
que atribua à produtividade e à celeridade uma preponderância absoluta, isto é,
que defenda a avaliação do trabalho dos Magistrados Judiciais tendo, na prática,
como principais critérios, a produtividade e a celeridade processual, e cingida
aos despachos saneadores e sentenças em acções contestadas, sem ter em conta
todo o outro trabalho que os Juízes têm a seu cargo, viola aquele artigo 202º,
nº 1 da Constituição da República Portuguesa.
Foi colocado, pois, também neste ponto, um critério normativo para apreciação do
Supremo Tribunal de Justiça.
O que nele está em causa é, se, sendo tão positivas ou muito positivas, em
geral, as outras apreciações feitas no processo de inspecção ao trabalho de um
Juiz, com reconhecimento de boas ou muito boas qualidades pessoais e
profissionais, o predomínio, patente, dado aos factores produtividade e
celeridade, e cingida aos despachos saneadores e sentenças em acções
contestadas, em detrimento desses muitos outros factores em que há apreciações
positivas, nas inspecções judiciais, viola o referido artigo 202º, nº 1 da
Constituição da República Portuguesa.
Ou dizendo de outra forma: não repugna ao artigo 202º, nº 1 da Constituição que
os Juízes estejam obrigados a despachar todos os processos que tenham a seu
cargo, seja qual for o seu número, ainda que isso implique que se despachem “de
qualquer maneira”, descurando a qualidade?
Também neste ponto, sabia o Supremo Tribunal de Justiça que tinha questão de
inconstitucionalidade para tratar.
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Devemos salientar que, embora isso não vincule o Tribunal Constitucional –
artigo 76º, nº 3 da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional –, o Supremo Tribunal de Justiça admitiu este recurso; e
isto, no caso, parece ser significativo.
Mas devemos, sobretudo, pôr em relevo que, conforme explicámos, deverá ser
conhecido integralmente o objecto deste recurso, por haver, além de
interpretação inconstitucional de normas, inconstitucional desaplicação e até
desconsideração de normas, em violação designadamente do princípio da tutela
jurisdicional efectiva – artigo 78º-A, nºs 3, 4 e 5 da mesma Lei.
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Pelo exposto, Excelentíssimos Senhores Juízes do Tribunal Constitucional, requer
o recorrente que se julgue procedente esta reclamação, se substitua a decisão
sumária de 8 de Março de 2007, se conheça do objecto deste recurso, que, como se
disse no requerimento de interposição, seja este recurso julgado procedente, por
o Supremo Tribunal de Justiça ter feito, salvo o devido respeito, interpretação
inconstitucional de normas, conducente mesmo, quanto a algumas, à não aplicação
e desconsideração delas no acórdão de 25 de Janeiro de 2007, e que seja mandado
reformar esse acórdão em conformidade com o julgamento de Vossas Excelências
sobre as questões de inconstitucionalidade.
(...)”.
Cumpre agora julgar.
B – Fundamentação
4 – Perscrutados os fundamentos invocados na reclamação supra
transcrita, constata-se que a argumentação desenvolvida pelo reclamante não
logra pôr em crise a procedência das razões que determinaram a prolação da
decisão ora reclamada.
Vejamos porquê.
4.1 – Quanto às normas dos “artigos 11º, nº 1, g), “a contrario”, 13º, números 1
e 2 e 17º, nº1 do Regulamento das Inspecções Judiciais (aprovado pelo Conselho
Plenário do Conselho Superior da Magistratura em 19 de Dezembro de 2002,
publicado nas páginas 666 a 670 do Diário da República de 15.1.2003, II série)”,
o reclamante sustenta ter efectivamente suscitado, em termos adequados, uma
questão de constitucionalidade normativa.
Porém, basta compulsar o teor das suas conclusões com que
delimitou o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – onde afirmou, tout
court, que “viola, pois, por isso, o acórdão, salvo melhor opinião, o disposto
nos artigos 11º, n.º 1, g), “a contrario”, 17º, nº 1 do Regulamento das
Inspecções Judiciais e o artigo 203º da Constituição da República Portuguesa” –
para poder concluir-se que o reclamante não suscitou aí qualquer questão de
constitucionalidade normativa, limitando-se, ao invés, a assacar à decisão
recorrida a violação do disposto no artigo 203.º da Constituição.
De facto, em passo algum das alegações e respectivas
conclusões desse recurso se invocou a inconstitucionalidade de qualquer norma de
direito ordinário em termos de, por referência directa a um preceito legal, se
ter definido, identificado ou isolado um critério normativo contrário à
Constituição de modo a que o Tribunal a quo ficasse vinculado ao conhecimento
dessa questão.
Pelo contrário, é bem patente que o reclamante, no recurso
interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, controverte o critério decisório
pelo qual se admitiu como lícita a audição do delegado da Ordem dos Advogados.
Ora, apesar desse critério decisório levar implícita a aplicação de critérios
legais, não pode daí deduzir-se, sem mais, que a violação da Constituição,
imputada ao juízo decisório qua tale, configure uma forma adequada de suscitar
uma inconstitucionalidade normativa, em termos do Tribunal ad quem, previamente,
à sindicância do juízo aplicativo, seja confrontado com a questão de saber se o
critério normativo no qual o Tribunal a quo se estribou viola ou não a
Constituição, razão pela qual a suscitação de um problema de
constitucionalidade, por antonomásia normativa, nunca poderá deduzir-se da
violação dos preceitos constitucionais por banda do concreto juízo decisório.
E não se diga, tão-pouco, que a lei processual, ao determinar que o recorrente
indique “as normas jurídicas violadas”, impede a adequada suscitação de
problemas de constitucionalidade normativa, quando, na verdade, não só nada
obsta na lei adjectiva a que seja assacada a uma norma a violação da
Constituição, como, de resto, esse é mesmo um requisito constitucionalmente
imposto aos recursos fundados no artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da lei
fundamental.
Por fim, diga-se ainda que mesmo a admitir-se raciocínio contrário, o
conhecimento da questão colocada no requerimento de interposição de recurso
ficaria também prejudicado pelo facto da decisão de tal questão de
constitucionalidade não ter a virtualidade de influir na decisão recorrida uma
vez que, como salientou o Supremo Tribunal de Justiça, “o relatório da inspecção
em causa nada reflecte sobre quaisquer elementos avaliativos que tenham
resultado da audição do delegado da Ordem dos Advogados em Sintra”.
4.2 – No que concerne às normas dos artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos
Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram
feitas, designadamente, pela Lei nº 143/99, de 31.8), 2º, nºs 1 e 2, a), d) e
i), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aprovado pelo artigo 1º
da Lei nº 15/2002, de 22.2 e alterado pela Lei nº 4-A/2003, de 19.2), 158º, nº
1, do Código de Processo Civil, estes aplicáveis por força dos artigos 178º do
Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo Código de Processo
nos Tribunais Administrativos, e os artigos 6º, nº 1 e 13º da Convenção Europeia
dos Direitos do Homem (aprovada pela Lei nº 65/78, de 13.10), importa reter que
o reclamante não apresenta qualquer argumento susceptível de abalar os
fundamentos da decisão sumária em crise.
Muito pelo contrário, a argumentação aduzida pelo reclamante, ao controverter a
aplicação – ou, como diz, a não aplicação – dos referidos critérios legais e a
valoração fáctico-jurídica realizada pelo Tribunal a quo, confirma uma das
rationes decidendi determinantes o não conhecimento do objecto do recurso nesta
parte.
Quanto ao cumprimento do ónus de suscitação prévia das questões de
constitucionalidade relacionadas com o que reclamante apelida de “omissão
injustificada de pronúncia sobre vícios que o recorrente atribuiu ao acto
administrativo”, o reclamante olvida que as questões implicadas nesse
circunspecto – a saber, as relativas à não correcção, por banda do acórdão
recorrido, de erros constantes do acórdão do Conselho Superior de Magistratura e
o facto de ambas as decisões assentarem em factos errados, não corrigidos; ao
desprezo dado à resposta do recorrente, em termos de comprometer “na sua própria
raiz, substancialmente, o direito de resposta (...), esvazia[n]do o direito de
recurso – artigos 168º, nºs 1 e 5 do Estatuto dos Magistrados Judiciais e 2º,
nºs 1 e 2, a), d) e i) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e
158º, nº 1 do Código de Processo Civil”; ao facto do Supremo Tribunal de Justiça
não ter “prestado atenção às graves omissões” apontadas pelo recorrente,
designadamente quanto “à escassez de referências à capacidade humana para o
exercício da profissão”, à “falta do reconhecimento devido da qualidade do
trabalho do recorrente”, à “falta de ponderação devida de todos os trabalhos
efectuados pelo recorrente” e a “omissão de falta de fundamentação de
referências favoráveis ou a falta de consistência dessas referências, de que o
Supremo Tribunal de Justiça também não tratou, recolhendo indevidamente apenas o
que foi dito pelo Ex.mo Sr. Desembargador Inspector e pelo Conselho Superior da
Magistratura”; e à existência de erros de facto que, apesar de terem sido
referidos no recurso, passaram para o acórdão do Conselho Superior da
Magistratura e para o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça – já haviam sido
hipotizadas no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, não tendo o
reclamante, nessa oportunidade processual, suscitado qualquer problema de
constitucionalidade, sendo certo que, como este Tribunal tem reiterado quanto ao
cumprimento do ónus de suscitação adequada das questões de constitucionalidade,
“ao encararem ou equacionarem na defesa das suas posições a aplicação das
normas, as partes não estão dispensadas de entrar em linha de conta com o facto
de estas poderem ser entendidas segundo sentidos divergentes e de os considerar
na defesa das suas posições, aí prevenindo a possibilidade da (in)validade da
norma em face da lei fundamental”, recaindo sobre elas “um dever de prudência
técnica na antevisão do direito plausível de ser aplicado e, nessa perspectiva,
quanto à sua conformidade constitucional”.
Por outro lado, é também manifestamente improcedente a pretensão do reclamante
quando agora entende que, quanto “à não aplicação e até desconsideração de
normas” por banda do Supremo Tribunal de Justiça, o recurso “deverá ser
admitido, nessa parte, ao abrigo dos artigos 280.º, n.º 1, alínea a) da
Constituição da República Portuguesa e 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei sobre
Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional”, pois em
momento algum da decisão recorrida é possível vislumbrar uma recusa de
aplicação, expressa ou sequer implícita, de qualquer preceito legal com
fundamento em inconstitucionalidade.
Também improcede a argumentação do recorrente quanto às razões invocadas para o
não conhecimento do objecto do recurso “na parte” em que se questionou a
imparcialidade do Tribunal e, mais concretamente, no que diz respeito à
intervenção do Juiz Conselheiro Relator.
Como é óbvio, assentando o recurso de constitucionalidade num contencioso de
normas, com as implicações daí decorrentes e já relatadas na decisão reclamada,
o dever de configurar o objecto desse recurso definindo a norma impugnanda ou
uma determinada interpretação de uma norma de direito ordinário que afronte a
Constituição é uma exigência intrínseca e incindível da sua admissibilidade,
sendo reclamada, de resto, pela própria natureza do recurso de fiscalização da
constitucionalidade.
Sem essa definição precisa e determinada, e ainda que se alegue a violação de
preceitos constitucionais na óptica destes terem sido ofendidos por uma decisão
judicial, não estão preenchidos os requisitos para que este Tribunal possa
sindicar uma inconstitucionalidade normativa.
4.3 – Por fim, quanto à invocada inconstitucionalidade dos artigos 33º, 34º, nº
1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 13º, nºs 1, 2, 3 e 4, 14º, nºs 1 e 2 e
15º, nº 2 do Regulamento das Inspecções Judiciais, em face da “inexistência de
ponderação global das apreciações, dando-se absoluta prevalência aos factores da
produtividade e celeridade na decisão, mormente cingida aos despachos saneadores
e sentenças em acções contestadas, sem ter em conta todo o outro trabalho que os
Juízes têm a seu cargo”, é bem patente, ao contrário do que se afirma na
reclamação e transpondo para esta sede a argumentação tecida no item “4.1”, que
o reclamante não suscitou perante o tribunal recorrido, podendo fazê-lo, a
inconstitucionalidade das referidas normas, tendo apenas controvertido a sua
concreta aplicação em termos de as considerar violadas pelo acórdão do Conselho
Superior da Magistratura.
C – Decisão
5 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional
decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UCs.
Lisboa, 29 de Maio de 2007
Benjamim Rodrigues
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos