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Processo n.º 725/12
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., melhor identificada nos autos, reclama para a conferência ao abrigo do disposto no n.º 3, do artigo 78.º-A, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (LTC), da decisão sumária proferida pelo Relator que decidiu não conhecer do objeto do recurso de constitucionalidade interposto.
2. A reclamação apresentada tem o seguinte teor:
«(...)
Questão Prévia
1) O Douto Despacho de 12 de novembro de 2012, proferido no Processo à margem supra referenciados, contém erro de escrita inserido no respetivo ponto 1., porquanto ali se refere que a Requerente recorre para esse Colendo Tribunal Constitucional “dos despachos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça”…
2) Todavia, como pode constatar-se, estão em causa no presente Processo, atos jurisdicionais praticados pelo Colendo Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal Administrativo
3) Pelo que aqui se requer, como questão a resolver previamente à RECLAMAÇÃO que ora se apresenta, seja aquele Douto Despacho de 12 de novembro de 2012 devidamente retificado, através de correção que, consequentemente, repare aquele erro, nos termos do artº 667.º do CPC.
Da Reclamação
I
A Reclamante aqui invoca, antes de mais, a NULIDADE de que padece a Decisão constante do Douto Despacho reclamado, porquanto a mesma constitui consequência de raciocínio cuja lógica não pode, por nenhuma forma, extrair-se da fundamentação em que assenta.
II
Com efeito, consta do Douto Despacho reclamado a Decisão que, do ponto 6. de respetivas fls. 5 se transcreve de seguida:
“Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objeto do recurso
III
Todavia, perpassada a Decisão, da mesma consta fundamentação que conduz, salvo o muito devido respeito, a conclusão ou a consequência lógica em sentido contrário ao ali decidido.
IV
Com efeito a Decisão constante do Douto Despacho reclamado sustenta a respetiva fundamentação nos argumentos, nas asserções e nos fundamentos do Requerimento de Recurso para o Tribunal Constitucional.
V
Argumentos, asserções e fundamentos do Requerimento de Recurso para o Tribunal Constitucional que, expressa e concretamente são transcritos a fls. 1 e 2 do Douto Despacho reclamado.
VI
Argumentos, asserções e fundamentos, dos quais só pode ser extraída consequência lógica em sentido da tomada de conhecimento, por esse Colendo Tribunal Constitucional, do presente Recurso.
VII
Como objetiva e especialmente se constata dos pontos II, III, IV, VI e XII do referido Requerimento de Recurso, sublinhando, as asserções e os fundamentos são, assim, consequentemente contraditórios com a conclusão e consequência de raciocínio interpretativo que conduziu à Decisão tomada no Douto Despacho reclamado.
VIII
O Douto Despacho reclamado enferma, assim, do vício previsto na norma do art.º 668º, n.º1 al. c) do Código de Processo Civil (CPC), porquanto a fundamentação aponta num sentido e a Decisão seguiu o caminho oposto, devendo os fundamentos indicados ter conduzido logicamente a um resultado contrário ao que na mesma se contém.
IX
O erro lógico assim ocorrido e verificado por contradição insanável entre os fundamentos constantes do texto da Decisão e o resultado que integra o respetivo segmento interpretativo decisório, deu, assim, lugar à NULIDADE que, invocada supra, aqui se argui, consequentemente, nos termos do art.º 668º, n.º 1, al. c) do cpc com todos os efeitos legais inerentes.
X
Por outro lado, e sem em absoluto conceder quanto à NULIDADE supra invocada, a ora Reclamante, notificada do Douto Despacho do Colendo Conselheiro Relator que, nos termos do art.º 78º-A, n.º 1 da LTC decidiu não admitir o Recurso para esse Colendo Tribunal Constitucional e, ainda que reconhecendo os doutos ensinamentos do mesmo constantes, os quais regista para aperfeiçoar futuras intervenções em sede de constitucionalidade, não pode, todavia, deixar de representar a sua não conformação quanto à Decisão ali tomada, em ordem a que seja aquele Despacho, consequentemente, revogado.
XI
Com efeito, ali se decide não dever esse Colendo Tribunal Constitucional conhecer do objeto do Recurso interposto, porquanto esse Tribunal “funciona como instância de fiscalização de normas jurídicas, e não de decisões jurisdicionais...”- cfr. fls. 5 do Douto Despacho reclamado.
XII
Mais se escrevendo no Douto Despacho reclamado a mesmas fls. 5 que; «Argumenta a recorrente, no requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, que não resulta de todo o conteúdo da Douta Decisão, qualquer argumento que fundamente, sustente ou suporte o indeferimento assim decidido”»
XIII
E na sequência do que se transcreve supra, consta ainda do Douto Despacho reclamado o que seguidamente se transcreve:
“Confirma-se, portanto, que o objeto da contestação não é com efeito, a (in)constitucionalidade do entendimento normativo extraído pelo STA a partir daquele preceito do CPC, mas, a própria suficiência ou insuficiência da motivação avançada in casu...”
XIV
Porém, salvo o muito devido respeito considera a Reclamante que não se verifica in casu o que se afirma na transcrição supra em XIII do Douto Despacho reclamado.
XV
Na verdade, e como pode ler-se a fls. 35 do Requerimento de interposição de Recurso a ora Reclamante ali expressamente refere no respetivo ponto CII que:
«a “falta absoluta de motivação” que assim dá lugar à referida violação do conceito normativo das normas do art.º 205º, n.º 1 e do art.° 20º, n.º 4 da CRP em interpretação do disposto no art.º 668º, n.º 1 al. b) do CPC que assim viola tais conceitos por absoluta falta de fundamentação do ato jurisdicional que assim deixa sem tutela adequada a questão submetida ajuízo por não ter sido decidida com correta Administração da Justiça que foi devidamente requerida.»
XVI
E, por outro lado, a Recorrente, ora Reclamante, havia concreta e expressamente referido nos pontos. X a XIX da Peça Processual sobre a qual decidiu o ato jurisdicional que serve de suporte ao presente Recurso de constitucionalidade o que, para mais fácil elucidação, se transcreve de seguida:
TRANSCRIÇÄO:
X
Por outro lado, no Pedido de Suspeição apresentado de que fazem parte integrante todos os motivos constantes do Requerimento e Documento Anexo que aqui se volta a juntar para mais fácil leitura (Doc. 1) foi feita expressa referência às normas constitucionais e aos conceitos normativos às mesmos ínsitos que se achariam violados pela aplicação ou desaplicação das normas que realizam os conceitos da independência e imparcialidade em sentido interpretativo que afastasse tais conceitos, bem como ali se referiram as normas de Direito Internacional que deveriam também ser observadas em matéria de independência e imparcialidade.
XI
Pois os Órgãos Jurisdicionais, em especial os Superiores estão obrigados a uma apreciação das questões que lhe são submetidas também, em sede de apreciação constitucional das normas de Direito Internacional que integram o Direito Português, como referido supra.
XIII
Pelo que, não constando qualquer referência a nenhuma apreciação feita sobre o Pedido de Suspeição que fundamente e se prenuncie no Douto Despacho prolatado e aqui em causa, nomeadamente a referência às normas constitucionais e internacionais como devidamente suscitado em tal pedido, carece aquele Douto Despacho de fundamentação bastante nessa sede sobre a qual deixou de se pronunciar como lhe competia.
XIV
O que fez incorrer também o Douto Despacho aqui em causa nas NULIDADES previstas nas alíneas b) e d) do nº 1 do art.º 668º do CPC por falta de fundamentação e omissão de pronúncia sobre as Questões de constitucionalidade que impõe também a sua aplicação em sede infraconstitucional e em observância das normas de direito internacional.
XVII
Com efeito, a fundamentação dos atos judiciários, só é bastante e suficiente quando através dela os seus destinatários e a comunidade em que tais atos se repercutem possam entender de forma clara e cabal e, consequentemente, compreender as Decisões constantes daqueles atos.
XVIII
Não tendo sido explicitada, por nenhuma forma, a razão da não aplicação de qualquer alínea do art.º 127º do CPC nos termos supra em XVI e XVII referidos carece ainda o Douto Despacho aqui em causa de fundamentação nessa parte o que o faz ferir também, por esse motivo de outra causa de NULIDADE prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 668º do CPC a qual aqui também se argui.
XIX
Com as NULIDADES invocadas viola ainda o Douto Despacho aqui em causa os conceitos normativos que subjazem às normas dos arts.º 205, nº 1 e 20º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa face ao dever de fundamentação e de pronúncia, que a interpretação ali levada a efeito, manifestamente não realizou e que tais conceitos impõem.
FIM de TRANSCRIÇÃO
XVII
Por outro lado, a Recorrente, ora Reclamante, de forma processualmente adequada invocou, quer no Requerimento de Suspeição, quer no Requerimento de Nulidades as normas constitucionais cujos conceitos normativos se achariam violados se, em resultado de interpretações que viessem a ser levadas a efeito pela Decisão do STA, não se mostrasse a correta aplicação daquelas normas — enquanto normas constitucionais de direta aplicação — ou se tal interpretação violasse os conceitos normativos daquelas normas, pela violação das normas legais aplicáveis e que os realizam.
XVIII
O que a Recorrente, ora Reclamante, fez em vários passos daquelas suas intervenções processuais, ali deixando claramente acentuado o dever imposto aos Tribunais, especialmente os Superiores de em sede, assim, infraconstitucional procederem à aplicação das normas à luz dos preceitos constitucionais e dos conceitos normativos que lhes subjazem e que são consequentemente violados por interpretação que, sustentando a sua aplicação ou a sua desaplicação contenda com tais conceitos.
XIX
Sabe a reclamante, compreende e aceita que o modelo de Justiça Constitucional não contempla o recurso de amparo.
XX
Todavia, crê a Reclamante que, face à representação que fez das questões de constitucionalidade e à respetiva suscitação feita de forma processualmente adequada com invocação das normas constitucionais com cujos conceitos normativos não podia contender, antes deveria ser conforme, a interpretação das normas aplicáveis em sustento do iter de raciocínio conducente à formação da decisão jurisdicional, não pode o Recurso em causa, por nenhuma forma, ser enquadrado entre os que se qualificam como de amparo.
XXI
E crê também a Reclamante ter suscitado junto do Órgão Jurisdicional que proferiu a Decisão integrada pelos atos jurisdicionais de suporte no presente Recurso a imperiosa necessidade, imposta aliás desde logo, pelos próprios princípios e valores constitucionais em cumprimento de dever de fundamentação, aquela interpretação ser obrigatoriamente cotejada pela especificação dos fundamentos de ordem constitucional que permitissem considerar a conformidade da aplicação feita das normas com os conceitos normativos — e os princípios a este ínsitos — que subjazem às normas da Constituição da República Portuguesa (CRP) que, para o efeito, expressamente ali invocou.
XXII
Não estando, pois, em causa no presente Recurso, a constitucionalidade da própria decisão jurisdicional, mas a inconstitucionalidade verificada e ocorrida, efetivamente, por violação operada pela interpretação que levou à consequência lógica que se veio a extrair em tal Decisão.
XXIII
Consequência lógica espelhada na Decisão Judicial que constitui o ato jurisdicional de suporte no presente Recurso, bem demonstrativa de que incorreta interpretação dos conceitos normativos que subjazem às normas aplicadas no percurso do respetivo raciocínio interpretativo desde logo às normas constitucionais que são de direta aplicação — como bem confirma o Douto Despacho reclamado no último parágrafo de fls. 4 — que consagra DIREITOS FUNDAMENTAIS assegurados e garantidos ao longo de todo o procedimento, levou å violação de tais conceitos e dos princípios a estes também ínsitos.
XXIV
Princípios e conceitos normativos que subjazem às normas constitucionais que a Decisão Judicial que constitui ato jurisdicional de suporte no presente Recurso expressamente afastou nos termos que seguidamente se transcrevem:
“... também não ocorre a invocada....omissão de pronúncia da decisão ora em crise, relativamente às normas constitucionais e internacionais referidas na medida em que o tribunal embora deva resolver todas as questões…não significa que o tribunal tenha de conhecer todos os argumentos ou razões invocados pelas partes…”
(sublinhado nosso)
xxv
Tendo a Reclamante, aliás, invocado mesmo a necessidade de os Tribunais — mormente os Tribunais Administrativos aos quais por via do controlo difuso, concreto e incidental cabe, especialmente, também como Órgão de Justiça fiscalizar a aplicação das normas, quando feita em sentido que infrinja a Constituição da República (CRP) — não podendo deixar de proceder à interpretação das normas que apliquem às questões que lhe estão submetidas a Juízo com a consideração das normas constitucionais e seus conceitos normativos, e bem assim das regras e leis do Direito internaciona1 que a própria Constituição impõe.
xxvI
Invocação que a ora Reclamante fez em intervenção processual sobre que incidiu a decisão judicial, aqui ato jurisdicional de suporte, onde se transcreveu o que sobre a vinculação dos juízes nacionais às normas de ordem superior — como é, desde logo a Ordem Jurídica Constitucional — e seguidamente se transcreve:
“Como ainda escreve Henriques GASPAR, in JUSTIÇA — Reflexões Fora do Lugar-Comum” (Wolters, Kluwer/Coimbra Editora),
“Os juízes nacionais estão, assim, vinculados à CEDH e em diálogo e cooperação com o TEDH. Vinculados porque, sobretudo em sistema monista, como é o português (artigo 8º da Constituição), a CEDH, ratificada e publicada, constitui direito interno que deve, como tal, ser interpretada e aplicada, primando, nos termos constitucionais, sobre a lei interna. E vinculados porque ao interpretarem e aplicarem a CEDH como primeiros juízes convencionais (ou juízes convencionais de primeira linha) devem considerar as referências metodológicas e interpretativas e a jurisprudência do TEDH, enquanto instância própria de regulação convencional.
……………………………………………………………………………………………………….…
Os tribunais nacionais e, de entre estes, em último grau de intervenção mas no primeiro de responsabilidade, os Supremos Tribunais, são os órgãos de ajustamento do direito nacional à CEDH, tal como interpretada pelo TEDH.
………………………………………………………………………………………………………….
A razão teleológica na proteção, «não teórica ou ilusória mas prática e efetiva», dos direitos garantidos na CEDH
XXVII
Está em causa, no presente Recurso de constitucionalidade de interpretação que foi levada a efeito por Órgão jurisdicional em sentido que conduziu á total desconsideração das normas constitucionais que postulam e consagram DIREITOS FUNDAMENTAIS e que regulam especialmente a questão que ali foi submetida a Juízo e bem assim a violação feita por tal interpretação, de preceitos legais de ordem processual que constituem pressuposto da adequada realização dos princípios que enformam a Lei Processual Civil, em realização de conceitos normativos que subjazem às normas constitucionais.
XXVIII
Normas de Direito Processual Civil que realizam o conceito normativo das normas dos art.ºs 205º, nº 1 e 20º, nº 4 da CRP com os quais a sua aplicação por nenhuma forma pode contender aos mesmos devendo, antes ser consequentemente conformes.
XxIx
Está assim especialmente também em causa no presente Recurso a inconstitucionalidade oportuna e devidamente suscitada, a qual foi operada pela interpretação feita pelo Órgão Jurisdicional Autor da Decisão Judicial, aqui ato de suporte em sentido que violou a norma que constitui o pressuposto da conformidade de qualquer Decisão Judicial com o conceito normativo subjacente às normas constitucionais supra referidas e ínsito à norma que prevê a arguição de Nulidades provocada por tal violação — art.º 668º do CPC.
xxx
Interpretação assim feita em tal sentido por aquele Órgão Jurisdicional que, interpelado pela ora Reclamante como meio de em sede infra constitucional poder ver resolvida a questão de constitucionalidade ora em causa no presente Recurso, mereceu a explicitação bem demonstrativa da verificação da violação das normas em causa, e com absoluta violação dos conceitos normativos que subjazem às normas constitucionais, e que seguidamente se transcreve:
“…nulidade é a falta absoluta de motivação e não a motivação deficiente, medíocre ou errada.”
xxxI
E, assim, por tudo o que ao longo do presente Requerimento vem expondo, a Reclamante aqui pugna, assim através da presente RECLAMAÇÃO pela apreciação em sede de Recurso de constitucionalidade as questões que julga integrarem, efetivamente, violações na Constituição da República das quais esse Colendo Tribunal Constitucional deve, consequentemente tomar conhecimento.
EM CONCLUSÃO:
1- A Reclamante invoca, antes de mais, a NULIDADE de que padece a Decisão constante do Douto Despacho reclamado, porquanto a mesma constitui consequência de raciocínio cuja lógica não pode, por nenhuma forma, extrair-se da fundamentação em que assenta.
2- Com efeito, consta do Douto Despacho reclamado a Decisão que, do ponto 6. de respetivas fls. 5 se transcreve de seguida:
“Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objeto do recurso”
3- Da Decisão consta fundamentação que conduz, salvo o muito devido respeito, a conclusão ou a consequência lógica em sentido contrário ao ali decidido.
4- A Decisão constante do Douto Despacho reclamado sustenta a respetiva fundamentação nos argumentos, nas asserções e nos fundamentos do Requerimento de Recurso para o Tribunal Constitucional.
5- Argumentos, asserções e fundamentos do Requerimento de Recusa para o Tribunal Constitucional que, expressa e concretamente são transcritos a fls. 1 c 2 do Douto Despacho reclamado.
6- Argumentos, asserções e fundamentos, dos quais só pode ser extraída consequência lógica em sentido da tomada de conhecimento, por esse Colendo Tribunal Constitucional, do presente Recurso.
7- Como objetiva e especialmente se constata dos pontos II, III, IV, VI e XII do referido Requerimento de Recurso as asserções e os fundamentos são, assim, consequentemente contraditórios com a conclusão e consequência de raciocínio interpretativo que conduziu à Decisão tomada no Douto Despacho reclamado.
8- O Douto Despacho reclamado enferma, assim, do vício previsto na norma do art.º 668º, n.º 1 al. c) do Código de Processo Civil (CPC), porquanto a fundamentação aponta num sentido e a Decisão seguiu o caminho oposto, devendo os fundamentos indicados ter conduzido logicamente a um resultado contrário ao que na mesma se compõe.
9- O erro lógico assim ocorrido e verificado por contradição insanável entre os fundamentos constantes do texto da Decisão e o resultado que integra o respetivo segmento interpretativo decisório, deu, assim, lugar à NULIDADE que, invocada supra, aqui se argui, consequentemente, nos termos do art.º 668º, n.º 1, al. c) do CPC com todos os efeitos legais inerentes.
10- Sem em absoluto conceder quanto à NULIDADE supra invocada, a ora Reclamante, notificada do Douto Despacho do Colendo Conselheiro Relator que, nos termos do art.º 78º-A, n.º 1 da LTC decidiu não admitir o Recurso para esse Colendo Tribunal Constitucional, não pode, todavia, deixar de representar a sua não conformação quanto ã Decisão ali tomada, em ordem a que seja aquele despacho, consequentemente, revogado.
11- Com efeito, ali se decide não dever esse Colendo Tribunal Constitucional conhecer do objeto do Recurso interposto, porquanto esse Tribunal “funciona como instância de fiscalização de normas jurídicas, e não de decisões jurisdicionais... - cfr. fls. 5 do Douto Despacho reclamado.
12- Mais se escrevendo no Douto Despacho reclamado a mesmas fls. 5 que «Argumenta a recorrente, no requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, que não resulta de todo o conteúdo da Douta Decisão, qualquer argumento que fundamente, sustente ou suporte o indeferimento assim decidido”»
13- E na sequência do que se transcreve supra, consta ainda do Douto Despacho reclamado o que seguidamente se transcreve:
“Confirma-se, portanto, que o objeto da contestação não é, com efeito, a (in)constitucionalidade do entendimento normativo extraído pelo STA a partir daquele preceito do CPC, mas, a própria suficiência ou insuficiência da motivação avançada in casu…”
14- Salvo o muito devido respeito considera a Reclamante que não se verifica in casu o que se afirma na transcrição supra em XIII do Douto Despacho reclamado.
15- Na verdade, e como pode ler-se a fls. 35 do Requerimento de interposição de Recurso ali a ora Reclamante ali expressamente refere no respetivo ponto CII que:
«a falta absoluta de motivação que assim dá lugar à referida violação do conceito normativo das normas do art.º 205º, n.º 1 e do art.º 20º, n.º 4 da CRP em interpretação do disposto no art.º 668º, n.º 1 al. b) do CPC que assim viola tais conceitos por absoluta falta de fundamentação do ato jurisdicional que assim deixa sem tutela adequada a questão submetida ajuízo por não ter sido decidida com correta Administração da Justiça que foi devidamente requerida.»
16- A Recorrente, ora Reclamante, havia concreta e expressamente referido nos pontos. X a XIX da Peça Processual sobre a qual decidiu o ato jurisdicional que serve de suporte ao presente Recurso de constitucionalidade (cfr. XVI).
17- A Recorrente, ora Reclamante, de forma processualmente adequada invocou, quer no Requerimento de Suspeição, quer no Requerimento de Nulidades as normas constitucionais cujos conceitos normativos se achariam violados se, em resultado de interpretações que viessem a ser levadas a efeito pela Decisão do STA, não se mostrasse a correta aplicação daquelas normas — enquanto normas constitucionais de direta aplicação— ou se tal interpretação violasse os conceitos normativos daquelas normas, pela violação das normas legais aplicáveis e que os realizam.
18- A Recorrente, ora Reclamante, fez em vários passos daquelas suas intervenções processuais, ali deixando claramente acentuado o dever imposto aos Tribunais, especialmente os Superiores de em sede, assim, infraconstitucional procederem à aplicação das normas à luz dos preceitos constitucionais e dos conceitos normativos que lhes subjazem e que são consequentemente violados por interpretação que, sustentando a sua ap1icaço ou a sua desaplicação contenda com tais conceitos.
19- A reclamante, compreende e aceita que o modelo de Justiça Constitucional não contempla o recurso de amparo.
20- A Reclamante crê que, face â representação que fez das questões de constitucionalidade e à respetiva suscitação feita de forma processualmente adequada com invocação das normas constitucionais com cujos conceitos normativos não podia contender, antes deveria ser conforme, a interpretação das normas aplicáveis em sustento do iter de raciocínio conducente à formação da decisão jurisdicional, não pode o Recurso em causa, por nenhuma forma, ser enquadrado entre os que se qualificam como de amparo.
21- A Reclamante crê também ter suscitado junto do Órgão Jurisdicional que proferiu a Decisão integrada pelos atos jurisdicionais de suporte no presente Recurso a imperiosa necessidade, imposta aliás desde logo, pelos próprios princípios e valores constitucionais em cumprimento de dever de fundamentação, aquela interpretação ser obrigatoriamente cotejada pela especificação dos fundamentos de ordem constitucional que permitissem considerar a conformidade da aplicação feita das normas com os conceitos normativos — e os princípios a este ínsitos — que subjazem às normas da Constituição da República Portuguesa (CRP) que, para o efeito, expressamente ali invocou.
22- Não está, pois, em causa no presente Recurso, a constitucionalidade da própria decisão jurisdicional, mas a inconstitucionalidade verificada e ocorrida, efetivamente, por violação operada pela interpretação que levou à consequência lógica que se veio a extrair em tal Decisão.
23- Consequência lógica espelhada na Decisão Judicial que constitui o ato jurisdicional de suporte no presente Recurso, bem demonstrativa de que incorreta interpretação dos conceitos normativos que subjazem às normas aplicadas no percurso do respetivo raciocínio interpretativo desde logo às normas constitucionais que são de direta aplicação — como bem confirma o Douto Despacho reclamado no último parágrafo de fls. 4 — que consagra DIREITOS FUNDAMÆNTAIS assegurados e garantidos ao longo de todo o procedimento, levou à violação de tais conceitos e dos princípios a estes também ínsitos.
24- Princípios e conceitos normativos que subjazem às normas constitucionais que a Decisão Judicial que constitui ato jurisdicional de suporte no presente Recurso expressamente afastou (cfr. XXIV).
25- A Reclamante invocou a necessidade de os Tribunais — mormente os Tribunais Administrativos aos quais por via do controlo difuso, concreto e incidental cabe, especialmente, também como Órgão de Justiça fiscalizar a aplicação das normas, quando feita em sentido que infrinja a Constituição da República (CRP) — não podendo deixar de proceder à interpretação das normas que apliquem às questões que lhe estão submetidas a Juízo com a consideração das normas constitucionais e seus conceitos normativos, e bem assim das regras e leis do Direito internacional que a própria Constituição impõe.
26- A Reclamante invocou em intervenção processual sobre que incidiu a decisão judicial aqui ato jurisdicional de suporte, o que sobre a vincu1aço dos juízes nacionais às normas de ordem superior como é a Ordem Jurídica Constitucional, e é comummente consagrado (cfr. XXVI).
27- Está em causa, no presente Recurso de constitucionalidade de interpretação que foi levada a efeito por Órgão jurisdicional em sentido conduziu á total desconsideração das normas constitucionais que postulam e consagram DIREITOS FUNDAMENTAIS e que regulam especialmente a questão que ali foi submetida a Juízo e bem assim a violação feita por tal interpretação, de preceitos leais de ordem processual que constituem pressuposto da adequada realização dos princípios que enformam a Lei Processual Civil, em realização de conceitos normativos que subjazem às normas constitucionais.
28- Normas de Direito Processual Civil que realizam o conceito normativo das normas dos art.ºs 205º, nº 1 r 20º, nº 4 da CRP com os quais a sua aplicação por nenhuma forma pode contender aos mesmos devendo, antes ser consequentemente conformes.
29- Está assim especialmente também em causa no presente Recurso a inconstitucionalidade oportuna e devidamente suscitada, a qual foi operada pela interpretação feita pelo Órgão Jurisdicional Autor da Decisão Judicial, aqui ato de suporte em sentido que violou a norma que constitui o pressuposto da conformidade de qualquer Decisão Judicial com o conceito normativo subjacente às normas constitucionais supra referidas e ínsito à norma que prevê a arguição de Nulidades provocada por tal violação — art.º 668º do cpc.
30- Interpretação assim feita em tal sentido por aquele Órgão Jurisdicional que, interpelado pela ora Reclamante como meio de em sede infra constitucional poder ver resolvida a questão de constitucionalidade ora em causa no presente Recurso, mereceu a explicitação bem demonstrativa da verificação da violação das normas em causa, e com absoluta violação dos conceitos normativos que subjazem às normas constitucionais.
31- Por tudo o que ao longo do presente Requerimento foi exposto, a Reclamante aqui pugna, assim através da presente RECLAMAÇÃO pela apreciação em sede de Recurso de constitucionalidade as questões que julga integrarem, efetivamente violações na Constituição da República das quais esse Colendo Tribunal Constitucional deve, consequentemente tomar conhecimento.
(...)»
3. Notificado, o Ministério Público pugnou pelo indeferimento da reclamação apresentada.
II. Fundamentação
4. A decisão sumária reclamada tem o seguinte teor:
«(...)
1. A., melhor identificada nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do preceituado na alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual redação (LTC), dos despachos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça com datas de 28 de maio de 2012 e de 22 de junho de 2012.
2. O requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional assume o seguinte teor:
«(...)
I
A ora Requerente apresentou Pedido de Suspeição de Colendo Juiz Conselheiro do Colendo Supremo Tribunal Administrativo para que seja impedido de intervir como Relator-Adjunto na Ação Administrativa Especial à margem supra referenciada, e notificada da decisão constante dos Doutos Despachos de 28 de maio e de 22 de junho de 2012 do Presidente do Supremo Tribunal Administrativo que deliberou indeferir tal Pedido, vem pela via de Recurso para o Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização concreta de interpretação normativa, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 280º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e dos art.ºs 70º nº1, alínea b) e 75º A, ambos da Lei nº 28/82, de 15 de novembro, requerer a apreciação da inconstitucionalidade da interpretação dos conceitos normativos em que assentou aquela decisão que aqui constitui ato jurisdicional de suporte do presente Requerimento.
II
Com efeito, o Douto Despacho em causa no presente Requerimento afasta a eficácia, no plano singular, como consequência de desaplicação e de inadequada aplicação de normas, em contradição dos conceitos e da dimensão normativa constitucional de que emanam e lhes subjaz.
III
Aqui se argui, assim, nos termos do art.º 277º nº1 e do art.º 280º da CRP, a inconstitucionalidade da interpretação levada a efeito pela Douta Decisão aqui ato jurisdicional de suporte em sentido de não considerar que a qualidade de Magistrado do Ministério Público que teve o Colendo Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo – por força da qual foi coevo naquela Magistratura dos factos objeto da Ação Administrativa Especial que irá agora julgar e, coevo da Autora, aqui Requerente, na Procuradoria-Geral da República, Órgão Máximo daquela Magistratura e Parte naquela Ação Administrativa, do qual foi tempestivamente requerida a respetiva Suspeição – em “nada condiciona ou põe em causa a sua independência, imparcialidade e isenção para o julgamento do Processo” viola os conceitos normativos ínsitos e que subjazem às normas constitucionais dos art.ºs 13º; 32º, nºs 1 e 5; 18º; 29º; 30º da CRP – cuja não aplicação é manifesta no ato jurisdicional de suporte, bem como das imposições constitucionais consagradas nos art.ºs 16º e 17º da mesma CRP.
IV
Bem como, tal Douta Decisão aqui ato jurisdicional de suporte especialmente através do Douto Despacho de 22 de junho de 2012 viola ainda o conceito normativo ínsito e que subjaz aos art.ºs 205º, nº1; 20º, nº 4 da CRP por absoluta falta de fundamentação que sustente a Douta Decisão em interpretação da norma do art.º 668º, nº1 al. b) do Código de Processo Civil (CPC) ali feita que assim viola tais conceitos.
V
De forma processualmente adequada – no Documento que integra o Requerimento de Suspeição e no Requerimento de Nulidades – a ora Requerente invocou as normas constitucionais cujos conceitos normativos se acham assim violados, em manifestas inconstitucionalidades que pela via de Recurso para esse Colendo Tribunal Constitucional se pretende ver reconhecidas.
VI
As normas constitucionais supra em III referidas e a consequente interpretação dos respetivos conceitos normativos são de aplicação direta, obrigatória e impositiva, nos termos dos art.ºs 17º e 18º, nº 1 da CRP, pois que, tratando-se de Direitos Fundamentais, inseridos no título II – Direitos, Liberdades e Garantias – e constituindo assim preceitos constitucionais respeitantes a estes (Direitos, Liberdades e Garantias) têm “força jurídica de direta aplicação e vinculam as entidades públicas”.
VII
E tais preceitos constitucionais têm aplicação direta, in casu pois que está em causa na Ação Administrativa Especial em que a Suspeição do Magistrado foi requerida, questão relacionada quer com Processo Disciplinar – ao qual é supletivamente aplicável o regime, os princípios e as regras do Direito Penal – bem como, e especialmente ato administrativo praticado por força e com invocadas e alegadas consequências decorrentes de um Processo-crime em que a aqui Requerente é arguida.
(...)”
Assim, no decurso de ação administrativa especial que opôs a agora recorrente à Procuradoria-Geral da República (Processo n.º 205/12), a primeira levantou o incidente de Suspeição relativamente ao Senhor Juiz Conselheiro Adérito da Conceição Salvador dos Santos, por o mesmo ter feito Carreira no Ministério Público e na Procuradoria-Geral da República ao tempo em que a recorrente exercia funções na mesma Instituição. Sublinhe-se, com efeito, que a recorrente foi funcionária da Procuradoria-Geral da República desde … até …, ali ocupando, sucessivamente, os cargos de Secretário do Procurador-Geral da República, de Secretário do Conselho Consultivo e de Secretário do Conselho Superior do Ministério Público.
Apercebendo-se de que o Juiz Conselheiro Adérito da Conceição Salvador Santos integrava o Coletivo que deveria julgar a ação administrativa especial supramencionada, levantou novamente a recorrente, em requerimento com data de 16 de maio de 2012, a suspeição relativamente àquele Juiz Conselheiro, no sentido de impedir a sua intervenção no processo. Em despacho de 28 de maio de 2012, o STA indeferiu o requerimento apresentado, argumentando do seguinte jeito:
«(...)
As partes só podem opor suspeição ao juiz nos casos previstos no art.º 127.º CPC.
A invocada suspeição pela autora não tem, porém, neste casos o mínimo fundamento legal. A alegada qualidade de Magistrado do MP do Senhor Juiz Conselheiro Adérito da Conceição Salvador Santos, atualmente Juiz Conselheiro do STA, a título definitivo (...), em nada condiciona ou põe em causa a sua independência, imparcialidade e isenção no julgamento do presente processo.
Daí que o incidente suscitado não tenha, por isso, qualquer fundamento.
(...)»
Inconformada, a recorrente apresentou, então, novo requerimento, com data de 19 de junho de 2012, desta feita arguindo a nulidade daquele despacho, ao abrigo do disposto no artigo 668.º, n.º 1, alíneas b), c) e d), do CPC. Tal requerimento seria, porém, indeferido pelo STA, em despacho de 22 de junho de 2012. Aí pode ser ler-se o seguinte:
«(...)
Alega, em síntese, haver desde logo, contradição entre a decisão constante de tal despacho e o fundamento da norma porquanto a decisão respeita a anos anteriores ao ano de 2004 e o DR invocado como fundamento a partir da data de 5/1/04.
Ora, a alegada contradição não se verifica.
De facto, no aludido despacho em momento algum se diz que o mesmo se fundamenta em tal DR.
Aliás, tendo a A., ora requerente, vindo opor suspeição do M.mo Juiz Conselheiro Adérito dos Santos, por ter sido Magistrado do MP e ser parte, no processo, o PGR, órgão máximo daquela Magistratura, o que segundo a A. poderia condicionar a intervenção daquele Senhor Juiz, limitando-lhe as necessárias condições de isenção e imparcialidade, o que o despacho de 28/5/12 que agora se contesta se limita a afirmar é que a alegada qualidade de Magistrado do MP daquele Senhor Juiz Conselheiro, qualidade essa que necessariamente é anterior à sua nomeação para juiz deste STA, a título definitivo, em nada condiciona ou põe em causa a sua independência, imparcialidade e isenção no julgamento do presente processo.
De resto, essa sua atividade anterior sempre se tem pautado com vinculação a critérios de legalidade e objetividade (art.º 2º/2 EMP) e, em nenhum caso, condicionaria o atual exercício funcional do suspeito enquanto juiz deste Supremo Tribunal.
Por outro lado, também não ocorre a invocada falta de fundamentação e omissão de pronúncia da decisão ora em crise relativamente às normas constitucionais referidas na medida em que o tribunal embora deva resolver todas as questões que lhe sejam colocadas (art.º 660º, nº 2 CPC) todavia o conhecimento de todas as questões não significa que o tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes e só a falta de conhecimento das questões constitui nulidade por omissão de pronúncia, como resulta do texto do art.º 688º, nº 1, alínea d) do CPC.
Acresce que o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação e não a motivação deficiente, medíocre ou errada.
Ora, a não explicitação de qualquer alínea do art.º 127º do CPC deve-se apenas e tão só ao facto de a A. também ela não ter concretizado ao abrigo de qual das alíneas do preceito citado é que formulava o pedido de suspeição, razão por que também no despacho se não concretizou nenhuma das alíneas.
(...)»
Seguiu-se, finalmente, o requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, já aqui referido.
3. O recurso foi admitido pelo tribunal recorrido. No entanto, em face do disposto no artigo 76.º, n.º 3, da LTC, e porque o presente caso se enquadra na hipótese normativa delimitada pelo artigo 78.º-A, n.º 1, do mesmo diploma, passa a decidir-se nos seguintes termos.
4. Ora, um dos requisitos comuns aos vários recursos de constitucionalidade admitidos pela Constituição e pela LTC é o seu objeto normativo, o que significa que o controlo efetuado pelo Tribunal Constitucional tem por objeto atos normativos do poder público. Daqui decorre a rejeição, pelo modelo de justiça constitucional português, das figuras da queixa constitucional ou do recurso de amparo, meios processuais que permitem controlar a conformidade de todas as atuações do poder público, sobretudo de decisões jurisdicionais, com os direitos fundamentais (Rui Medeiros, A decisão de inconstitucionalidade, Universidade Católica Portuguesa, 1999, p. 336).
Talqualmente decorre do recurso de constitucionalidade interposto, a recorrente assaca diretamente aos despachos assinalados a violação dos “conceitos normativos ínsitos (...) às normas constitucionais dos art.ºs 13º; 32º, nºs 1 e 5; 18º; 29º; 30º da CRP.” Não restam dúvidas, pois, de que em causa não está nenhuma questão de inconstitucionalidade normativa, entendida enquanto desconformidade entre uma norma jurídica de direito público (objeto do controlo) e as normas e princípios constitucionais (parâmetro de controlo), mas a (alegada) inconstitucionalidade da própria decisão judicial.
Não se pretende contestar, como é bom de ver, que os preceitos consagradores de direitos, liberdades e garantias são imediatamente operativos ou que vinculam a atuação das entidades públicas, sejam elas legislativas, administrativas e jurisdicionais (cfr. artigo 18.º, n.º 1, da CRP). Mas tais considerações não obstam a que o Tribunal Constitucional funcione como instância de fiscalização de normas jurídicas, e não de decisões jurisdicionais, leia-se, não machucam a bondade da opção quanto àquele que é o, afinal, o seu objeto de controlo.
Depois, a recorrente sustenta ainda que o despacho de 22 de junho de 2012 enferma de absoluta falta de fundamentação, tendo subjacente uma interpretação do artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do CPC contrária à Constituição, maxime, aos seus artigos 205.º, n.º 1 e 20.º, n.º 4. Também aqui não se vislumbra qualquer questão de inconstitucionalidade normativa. Argumenta a recorrente, no requerimento de recurso para o Tribunal Constitucional, que não resulta “de todo o conteúdo da Douta Decisão qualquer argumento que fundamente, sustente ou suporte o indeferimento assim decidido”. Confirma-se, portanto, que objeto de contestação não é, com efeito, a (in)constitucionalidade do entendimento normativo extraído pelo STA a partir daquele preceito do CPC, mas a própria suficiência ou insuficiência da motivação avançada in casu – questão que, bem entendido, não entra nos poderes de cognição do Tribunal Constitucional.
5. Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objeto do recurso.
(…)».
5. A reclamante suscita, em sede de questão prévia, a existência de erro de escrita no ‘ponto 1.’ da decisão sumária, ora, sob reclamação, porquanto aí se escreveu “… despachos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça…” em vez de “…despachos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo…”, por ser neste Supremo Tribunal que os mesmos foram efetivamente proferidos.
Trata-se, como do restante conteúdo da mencionada decisão se alcança, de manifesto lapso de escrita cuja correção se impõe e é legalmente admissível em face do disposto no artigo 667.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no artigo 69.º da LTC.
6. No entanto, quanto ao mais, nada na reclamação apresentada pela reclamante permite sustentar a pretendida alteração da decisão sumária proferida pelo relator.
Recorde-se, com efeito, que no requerimento de recurso de constitucionalidade interposto, a reclamante esclareceu querer ver analisada “a inconstitucionalidade que resulta da não aplicação dos conceitos normativos ínsitos às normas dos art.ºs 13º, 32º, nºs 1 e 5, 18º, 29º, 30º da CRP, cuja aplicação é obrigatoriamente direta por força dos artºs 17º e 18º nº 1 da CRP e do art.º 668º, nº 1 al. b) do CPC que deu lugar à inconstitucionalidade operada por interpretação desta norma em sentido que afastou os conceitos normativos que subjazem às normas dos artºs 205º, nº 1 e 20º, nº4 da CRP.” Tendo sido levantadas pela então recorrente duas questões de constitucionalidade, em ambas considerou a decisão sumária não se verificarem os pressupostos processuais de que está dependente a admissibilidade dos recursos de constitucionalidade interpostos nos termos da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, por lhes faltar o objeto normativo - pressuposto, aliás, comum a todos os recursos interpostos no âmbito do processo de fiscalização concreta da constitucionalidade.
Ora, relativamente à primeira das questões levantadas, crê a reclamante “que, face à representação que fez das questões de constitucionalidade e à respetiva suscitação feita de forma processualmente adequada com invocação das normas constitucionais com cujos conceitos normativos não podia contender, antes deveria ser conforme, a interpretação das normas aplicáveis em sustento do iter de raciocínio conducente à formação da decisão jurisprudencial, não pode o Recurso em causa, por nenhuma forma, ser enquadrado entre os que se qualificam como de amparo.”
Reiterando, neste ponto, o que foi dito na decisão sumária, é manifesto que a pretensão da reclamante carece de objeto normativo, dado que em momento algum da sua intervenção processual logrou identificar as normas jurídicas infraconstitucionais (objeto de controlo) cujo acerto com o parâmetro constitucional predica inquinado, bastando-se com uma referência genérica à inconstitucionalidade da não aplicação de “conceitos normativos” ínsitos a uma série de preceitos constitucionais. Pressuposto, portanto, do controlo normativo exercido pelo Tribunal Constitucional é que esteja em causa a (des)conformidade constitucional de normas ou de interpretações normativas delas extraídas – algo que, com toda a evidência, não acontece no caso vertente.
Quanto à segunda das questões mencionadas, contesta a reclamante o acerto da decisão sumária exarada, atento o facto de, no requerimento de interposição de recurso, ter invocado “a falta absoluta de motivação” da decisão recorrida, «que assim dá lugar à referida violação do conceito normativo das normas do art.º 205º, n.º 1 e do art.º 20º, n.º 4 da CRP em interpretação do disposto no art.º 668º, nº 1 al b) do CPC, que assim viola tais conceitos por absoluta falta de fundamentação do ato jurisdicional que assim deixa sem tutela adequada a questão submetida a juízo por não ter sido decidida com correta Administração da Justiça que foi devidamente requerida» - (os itálicos são nossos).
Porém, também aqui não logra a reclamante refutar a validade da argumentação expedida na decisão sumária. De facto, para que na questão apontada se vislumbrasse um objeto normativo, necessário seria que a reclamante houvesse destacado ou autonomizado, a partir do preceito em causa, uma norma ou segmento normativo desta cuja constitucionalidade, embora veiculada na decisão recorrida, estivesse em desacerto com a Constituição (cfr. o Acórdão n.º 551/01, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Não é isso que ocorre, dado que a reclamante se limita a afirmar que não houve fundamentação, sem cuidar de especificar em que medida tal ausência decorre do entendimento normativo partilhado pelo tribunal relativamente ao artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.
Do exposto resulta, ainda, que tampouco assiste razão à reclamante quando, relevando a contradição entre o raciocínio expendido na decisão sumária e a respetiva conclusão, invoca a nulidade daquela decisão, nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil. Com efeito, é manifestamente evidente que, não tendo o recurso de constitucionalidade interposto pela (ora) reclamante preenchido os requisitos processuais que se inferem dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC, não pode o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do respetivo objeto – algo que emerge de forma absolutamente clara da decisão sumária, e que aqui se reitera, atenta a reclamação apresentada.
III. Decisão
7. Assim, nos termos supra expostos, o Tribunal Constitucional decide:
a) – determinar a suscitada retificação do manifesto erro de escrita existente no ‘ponto 1.’ da decisão sumária, substituindo-se a expressão aí mencionada como ‘Supremo Tribunal de Justiça’ pela de ‘Supremo Tribunal Administrativo’;
b) – indeferir, quanto ao mais, a reclamação apresentada e, por conseguinte, confirmar a decisão sumária reclamada.
Custas pelo reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 20 (vinte) UCs., sem prejuízo da existência de apoio judiciário concedido nos autos.
Lisboa, 15 de janeiro de 2013.- José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Joaquim de Sousa Ribeiro.