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Processo nº 720/2000
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam,na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Pela sentença de fls. 51 do Tribunal do Trabalho da Comarca do Porto, foi julgada procedente a acção sumária que P... instaurou contra o Estado Português, na qual, invocando ter celebrado com o réu um contrato de trabalho a termo certo, em 6 de Setembro de 1994, que 'foi sendo sucessiva e automaticamente renovado sem a menor interrupção' (artigo 5 da petição inicial) até Janeiro de
1998, mas que, 'ope legis', era 'um vínculo jus-laboral por tempo indeterminado nº 2 do artº 41º' do 'Regime Jurídico anexo ao Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro' (artigos 19º e 20º), pediu, por ter sido despedido sem justa causa, a sua reintegração, bem como o pagamento de diversas quantias que considerava serem-lhe devidas. Julgando o recurso de apelação interposto pelo réu, o Tribunal da Relação do Porto confirmou 'inteiramente a sentença recorrida'. No que agora interessa, o Tribunal da Relação do Porto considerou que tinha sido celebrado entre as partes um contrato de trabalho a termo, regido pelas normas de direito privado, em particular pelo Decreto-Lei nº 64-A/89 citado; e que, não constando do contrato o motivo justificativo do termo, ocorre nulidade,
'passando o contrato dos autos a contrato sem termo' (nºs 1), e) e 3 do artigo
42º do regime aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A/89); logo, entendeu o Tribunal da Relação do Porto, o despedimento foi ilícito. Por último, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto julgou, ainda, que esta solução não vem 'defraudar o ingresso normal na função pública, através de concurso, violando, até, os arts. 13º e 47º, nº 2, da Constituição'; e que a conduta do 'R. é chocante e põe em causa os princípios da boa fé, da igualdade e da segurança no emprego, estes últimos com tutela constitucional (arts. 13º e
53º da Const.)'.
2. De novo recorreu o Estado, agora para o Tribunal Constitucional, pelo requerimento de fls. 95. Pela decisão sumária de fls. 106, foi decidido não conhecer do recurso. Esta decisão veio, porém, a ser parcialmente revogada pelo acórdão nº 160/2001, de fls. 122, que admitiu ' o recurso com fundamento na alínea a) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, de modo a prosseguirem os autos os seus termos, de acordo com o disposto no nº 5 do artigo 78º-A do mesmo diploma legal'.
3. Na sequência deste acórdão, foram as partes notificadas para apresentarem as suas alegações. Apenas alegou o Ministério Público, concluindo da seguinte forma:
'1º. A decisão recorrida recusou implicitamente aplicar as normas constantes dos Decretos-Leis nºs 184/89 e 427/89, especificadas no requerimento de interposição do recurso, que – de forma expressa, clara e inquestionável, prescrevem que:
- vigora um princípio de estrita taxatividade das formas de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública:
- apenas é consentida a celebração de contratos a termo certo, com carácter excepcional, transitório e residual;
- está postergada a constituição de relações laborais de duração indefinida, quer por originária estipulação das partes, quer como consequência de uma irregularidade 'congénita' de contratação, quer como decorrência de uma renovação ou prorrogação ilegal de contratos originariamente celebrados a termo certo;
- tais regras têm carácter imperativo, obstando à válida celebração e eficácia de outros contratos de trabalho, que não os legalmente tipificados.
2º. Tal recusa implícita de aplicação fundou-se, por outro lado, num juízo de inconstitucionalidade – a alegada colisão com o estipulado nos artigos 13º e 53º da Constituição da República Portuguesa – do regime legal que implica a imperativa proibição de celebração (ou renovação) de contratos que não sejam a termo certo, dentro dos parâmetros previstos no artigo 18º do Decreto-Lei n.º
427/89.
3º. Tal ‘bloco normativo’ não padece, porém, da invocada inconstitucionalidade, já que – como se reconheceu nos Acórdãos nºs 683/99 e 368/2000 – o regime nele consignado é plenamente compatível com o princípio constitucional da igualdade e visa, em última análise, efectivar o princípio constitucional da regra do concurso como forma de acesso à função pública.
4º. Termos em que deverá proceder o presente recurso, determinando-se a consequente reforma da decisão recorrida.
4. O presente recurso tem, assim, por objecto, o complexo constituído pelas
'normas constantes dos artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, e dos artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, enquanto prescrevem a taxatividade das formas de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública e o carácter estritamente taxativo, residual e excepcional dos contratos de trabalho a prazo, celebrados com o Estado (...) – e, consequentemente, estruturalmente inconvertíveis em relação laboral definitiva, nomeadamente por via da aplicação do regime geral da nulidade contida no artigo 42º, nº 1, alínea e) e nº 3, do Decreto-Lei nº 64-A70 e decorrente da omissão de indicação do motivo justificativo da contratação a termo – como decorrência do princípio do acesso à função pública mediante concurso', que o acórdão recorrido recusou aplicar por considerar 'colidente com
‘os princípios da boa fé, da igualdade e de segurança no emprego, estes últimos com tutela constitucional (artigos 13º e 53º da Constituição)' (resposta do Ministério Público de fls. 102).
As referidas normas têm o seguinte teor:
– Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho:
Artigo 5º.
(Constituição da relação jurídica de emprego) A relação jurídica de emprego na Administração constitui-se com base em nomeação ou contrato.
Artigo 7º.
(Contrato de pessoal)
1. O contrato de pessoal é um acto bilateral, nos termos do qual se constitui uma relação transitória de trabalho subordinado.
2. As formas de contrato de pessoal admitidas são: a). Contrato administrativo de provimento; b). Contrato de trabalho a termo certo.
Artigo 9º.
(Contrato de trabalho a termo certo)
1. O exercício transitório de funções de carácter subordinado de duração previsível que não possam ser desempenhadas por nomeados ou contratados em regime de direito administrativo pode excepcionalmente ser assegurado por pessoal a contratar segundo o regime do contrato de trabalho a termo certo.
2. O contrato referido no número anterior obedece ao disposto na lei geral do trabalho sobre contratos de trabalho a termo, salvo no que respeita à renovação, a qual deve ser expressa e não pode ultrapassar os prazos estabelecidos na lei geral quanto à duração máxima dos contratos a termo.
3. A contratação de pessoal nos termos do presente artigo obedece aos seguintes princípios: a). Publicidade da oferta de emprego; b). Selecção dos candidatos; c). Fundamentação da decisão; d). Publicação na 2ª série do Diário da República, por extracto, dos dados fundamentais da contratação efectuada.
– Decreto-Lei n.º Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro:
Artigo 3º.
(Constituição) A relação jurídica de emprego na Administração Pública constitui-se por nomeação e contrato de pessoal.
Artigo 14º.
(Modalidades e efeitos)
1. O contrato de pessoal só pode revestir as modalidades de: a). Contrasto administrativo de provimento; b). Contrato de trabalho a termo certo.
2. O contrato administrativo de provimento confere ao particular outorgante a qualidade de agente administrativo.
3. O contrato de trabalho a termo certo não confere a qualidade de agente administrativo e rege-se pela lei geral sobre contrato a termo certo, com as especialidades constantes do presente diploma.
Artigo 18º.
(Admissibilidade)
1. O contrato de trabalho a termo certo é o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, com carácter de subordinação, a satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada que não possam ser asseguradas nos termos do artigo 15º.
2. O contrato de trabalho a termo certo pode ainda ser celebrado nos seguintes casos: a). Substituição temporária de um funcionário ou agente; b). Actividades sazonais; c). Desenvolvimento de projectos não inseridos nas actividades normais dos serviços; d). Aumento excepcional e temporário da actividade do serviço.
3. Para efeitos do número anterior, entende-se por actividade sazonal aquela que, por ciclos da natureza, só se justifica em épocas determinadas ou determináveis de cada ano.
Artigo 43º.
(Prevalência)
1. A partir da data da entrada em vigor do presente diploma é vedada aos serviços e organismos referidos no artigo 2º a constituição de relações de emprego com carácter subordinado por forma diferente das previstas no presente diploma.
2. Os funcionários e agentes que autorizem, informem favoravelmente ou omitam informação relativamente à admissão ou permanência de pessoal em contravenção com o disposto no presente diploma são solidariamente responsáveis pela reposição das quantias pagas, para além da responsabilidade civil e disciplinar que ao caso couber.
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 218/98, de 17 de Julho, o artigo 18.º, transcrito atrás, passou a ter a seguinte redacção: Artigo 18º
(Admissibilidade)
1. O contrato de trabalho a termo certo é o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, com carácter de subordinação, a satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada.
2. O contrato de trabalho a termo certo só pode ser celebrado nos seguintes casos: a). Substituição temporária de um funcionário ou agente; b). Actividades sazonais; c). Execução de uma tarefa ocasional ou serviço determinado, precisamente definido e não duradouro; d). Aumento excepcional e temporário da actividade do serviço; e). Desenvolvimento de projectos não inseridos nas actividades normais dos serviços.
3. Para efeitos da alínea b) do número anterior, entende-se por actividade sazonal aquela que, por ciclos da natureza, só se justifica em épocas determinadas ou determináveis de cada ano.
4. O contrato de trabalho a termo certo a que se refere o presente diploma não se converte, em caso algum, em contrato sem termo.
5. A celebração do contrato de trabalho a termo certo com violação do disposto no presente diploma implica a sua nulidade e constitui os dirigentes em responsabilidade civil, disciplinar e financeira pela prática de actos ilícitos, sendo ainda fundamento para a cessação da comissão de serviço nos termos da lei.
6. A responsabilidade financeira dos dirigentes referidos no número anterior consiste na entrega, nos cofres do Estado, do quantitativo igual ao que tiver sido abonado ao pessoal ilegalmente contratado.
5. Sucede que, entretanto, foi aprovado o acórdão nº 172/2001 (Diário da República, II Série, de 7 de Junho de 2001), que apreciou exactamente o mesmo bloco normativo, à luz da eventual violação dos mesmos princípios constitucionais. Assim, procede-se à transcrição do que então foi decidido, na parte relevante para este recurso:
'4. A questão de constitucionalidade:
4.1. Já atrás se deixou referido que este Tribunal, no seu acórdão n.º 683/99
(publicado no Diário da República, II série, de 3 de Fevereiro de 2000), tirado em Plenário, embora com vozes discordantes (...), julgou inconstitucional a norma constante do artigo 14º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, ‘na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho sem termo’. E, posteriormente, no acórdão n.º 368/2000 ( publicado no Diário da República, I série-A, de 30 de Novembro de 2000), o Tribunal, igualmente com votos de vencido, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante desse artigo 14º, n.º 3, na apontada interpretação. Nesses arestos, o Tribunal entendeu que o ‘direito especial de igualdade’ no acesso à função pública – acesso que, em regra, se deve fazer mediante concurso
(cf. o artigo 47º, n.º 2, da Constituição) – torna inadmissível que, pela tão só circunstância de ter sido ultrapassado o limite máximo de duração fixado na lei geral para os contratos de trabalho a termo certo, um contrato deste tipo, celebrado pelo Estado, se possa converter em contrato de trabalho sem termo (é dizer: que se possa converter em contrato de trabalho por tempo indeterminado); e, por isso, concluiu que aquele artigo 14º, n.º 3, na interpretação apontada, violava o referido artigo 47º, n.º 2. O Tribunal ponderou também que uma tal conversão de um contrato de trabalho a termo certo num contrato de trabalho sem termo ‘não se apresenta como único meio, ou, sequer, como disciplina indispensável, para o cumprimento pelo Estado do seu dever de proteger a segurança no emprego’. Significa isto que, ao cabo e ao resto, o Tribunal considerou que na regra da igualdade no acesso à função pública (consagrada no artigo 47º, n.º 2, da Constituição) se contém a proibição de se constituírem relações jurídico-laborais de duração indefinida com o Estado; e que essa proibição impede, inclusive, que um contrato de trabalho celebrado a termo certo se possa converter em contrato de trabalho de duração indeterminada, designadamente, como era o caso, como consequência ou decorrência de se ter excedido o limite máximo da duração desse contrato. Posteriormente, o Tribunal, pela 2ª Secção, no acórdão n.º 434/2000 ( publicado no Diário da República, II série, de 20 de Novembro de 2000), embora com um voto de vencido, fez apelo à jurisprudência constante dos arestos atrás citados, para a aplicar num caso em que o tribunal recorrido tinha avalizado a conversão de um contrato de trabalho a termo certo, celebrado pela Administração Pública, em contrato de trabalho sem termo, por nele se verificar uma irregularidade, consistente na sua celebração e renovação fora das hipóteses em que elas são lícitas. Ponderou, a propósito, o Tribunal: Dir-se-á, aliás, que a argumentação expendida nos citados acórdãos nºs 683/99 e
368/2000, para demonstrar que a conversão dos contratos de trabalho a termo certo em contratos de trabalho por tempo indeterminado violaria esse princípio da igualdade no acesso à função pública – sendo pois vedada pelo artigo 47º, n.º
2, da Constituição da República – é transponível para a conversão resultante de uma irregularidade do contrato a termo certo, consistente na sua celebração e renovação fora das hipóteses em que estas são lícitas (designadamente, por não se destinar ao exercício transitório de funções, e sim à satisfação de necessidades permanentes dos serviços). Tal conversão, que também conduziria a uma forma de relação jurídica de emprego público – o contrato de trabalho por tempo indeterminado – não prevista na lei, seria de igual modo violadora daquele princípio, e deve por isso considerar-se inconstitucional.
4.2. Claro é que não existe perfeita identidade entre a situação de facto destes autos e a situação sobre que recaiu o acórdão n.º 683/99 ou aquela que esteve na origem do acórdão n.º 434/2000: no caso dos autos, o contrato foi celebrado a termo certo, mas não se indicou nele o motivo justificativo da sua celebração, e foi esta falta de indicação do motivo justificativo da celebração de um contrato a termo certo que serviu de fundamento para a sua conversão em contrato de trabalho sem termo; no caso do acórdão n.º 683/99, o fundamento da conversão do contrato de trabalho a termo certo em contrato de trabalho sem termo foi o ter sido ultrapassado o limite de duração máxima fixado na lei geral para os contratos de trabalho a termo certo; e no caso do acórdão n.º 434/2000, o que serviu de fundamento à conversão de um contrato de trabalho a termo certo num contrato de trabalho sem termo foi a circunstância de haver uma irregularidade no contrato, consistente em o mesmo ter sido celebrado e renovado fora dos casos em que a celebração e a renovação são lícitas. O facto, porém, de não existir inteira coincidência entre o caso dos autos e as situações que estiveram na origem dos arestos citados não implica que não valha aqui a ratio decidendi que conduziu o Tribunal a julgar inconstitucional, no acórdão n.º 683/99, o artigo 14º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, na interpretação atrás apontada; que, mais tarde, o levou, no acórdão n.º 368/2000, a declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade dessa mesma norma, na dita interpretação; e que, posteriormente, no acórdão n.º
434/2000, o conduziu a cassar o julgamento (implícito) de inconstitucionalidade do artigo 9º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e do artigo 18º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, feito no aresto então sob recurso para sustentar a solução a que chegou de converter um contrato de trabalho a termo certo num contrato de trabalho sem termo.
É que, dos preceitos legais, transcritos acima, a que o acórdão aqui recorrido recusou aplicação (implícita), com fundamento na sua inconstitucionalidade – preceitos legais que são os artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e os artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro – decorre que a celebração de contratos de trabalho a termo certo pelo Estado só é consentida ‘a título excepcional e residual’, com vista à satisfação de necessidades transitórias ou estritamente conjunturais dos serviços. Resulta ainda que esses contratos de trabalho não podem ser renovados ou prorrogados para além do prazo de duração máxima dos contratos a termo certo estabelecido na lei geral. E decorre, bem assim, que esses contratos de trabalho não podem ser convertidos em contratos de trabalho sem termo. E esta a impossibilidade de conversão dos contrato de trabalho a termo certo em contratos de trabalho sem termo é absoluta, pois existe quando, no texto do contrato, se não indica a razão que legitima a sua celebração a termo certo; quando nem sequer há motivo legitimador da celebração desse contrato; e, bem assim, quando se excede o limite máximo de duração do mesmo. Como escreve o Ministério Público na sua alegação: Está, deste modo, expressamente postergada, por normas claramente imperativas, a possibilidade de existência jurídica de relações laborais permanentes na Administração Pública, quer as mesmas decorram de uma originária indeterminação, quer a indeterminação temporal decorra de sucessivas (e ilegais) renovações ou prorrogações do prazo originariamente estipulado pelos contraentes, quer sejam consequência de celebração 'congenitamente' irregular do contrato a prazo, por inverificação – e consequentemente omissão no texto do contrato – das razões que legitimariam a sua celebração. Ora, de acordo com a mencionada jurisprudência do Plenário do Tribunal (firmada no acórdão n.º 683/99), a conversão dos contratos a termo certo, celebrados pela Administração Pública, em contratos sem termo, pelo facto de se ter ultrapassado o limite máximo de duração fixado na lei geral para aqueles contratos, nem é imposta pelo princípio constitucional da segurança no emprego (consagrado no artigo 53º da Constituição), nem tão-pouco é compatível com a regra da igualdade no acesso à função pública (consagrada no artigo 47º, n.º 2, da Constituição). Pois bem: fazendo aplicação desta ratio decidendi ao caso dos autos, impõe-se que se desautorize a recusa (implícita) de aplicação, feita pelo acórdão recorrido por razões de inconstitucionalidade, do bloco normativo constituído pelas normas constantes dos ditos artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e dos artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, para, com fundamento no facto de, no texto do contrato, se não ter indicado o motivo que autorizava a sua celebração, considerar convertido em contrato de trabalho sem termo o contrato que os contraentes (Estado e recorrida) tinham celebrado a termo certo. Escreve, a tal propósito, o Ministério Público na sua alegação: Ora, pelas razões expressas na fundamentação do acórdão 683/99, para que se remete, parece-nos evidente que – tal como não implica violação da regra constante daquele artigo 53º [da Constituição] a impossibilidade jurídica de conversão de uma relação a prazo em relação permanente, também não implicará violação da Lei Fundamental a impossibilidade de constituição de uma relação de trabalho de duração indefinida no âmbito da Administração Pública como mera decorrência da omissão do motivo justificativo da contratação a prazo: na verdade, as especificidades da função pública e a necessidade de salvaguardar o princípio constitucional do artigo 47º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa constituem título constitucionalmente bastante para a edição do
‘bloco normativo’ desaplicado na decisão recorrida.
4.3. Em conclusão: Independentemente de se subscrever ou não a argumentação do acórdão n.º 683/99, tirado em Plenário, no seguimento da jurisprudência aí firmada, tem aqui que se cassar o julgamento de inconstitucionalidade feito pelo acórdão ora sob recurso, tendo por objecto o bloco normativo constituído pelas normas constantes dos ditos artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e dos artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro.' Ora a questão de constitucionalidade apreciada no presente recurso é idêntica à que foi julgada neste acórdão nº 172/2001.
6. Nestes termos, decide-se: a) Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público; b) Em consequência, revogar o acórdão recorrido quanto ao julgamento (implícito) de inconstitucionalidade nele contido, a fim de ser reformado de acordo com o juízo de não inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 5º, 7º e 9º do Decreto-Lei nº 184/89, de 2 de Junho, e dos artigos 3º, 14º, 18º e 43º do Decreto-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro. Lisboa, 26 de Setembro de 2001 Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Alberto Tavares da Costa José de Sousa e Brito Luís Nunes de Almeida