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Processo n.º 59/13
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 141/2013:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que são recorrentes A. e B. e recorridos o Ministério Público, IAPMEI e C., foram interpostos recursos, respetivamente, em 29 de janeiro de 2008 (fls. 5790 e 5791, 23º volume) e em 31 de março de 2008 (fls. 5815 a 6173, 24º volume), ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão proferido, em conferência, pela 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em 16 de outubro de 2007 (fls. 5034 a 5094, 21º volume), posteriormente complementado pelo acórdão proferido, em conferência, pelo mesmo Tribunal e Secção, em 08 de janeiro de 2008 (fls. 5506 a 5508, 23º volume).
O recurso interposto pelo recorrente A. visa obter a fiscalização da constitucionalidade das seguintes interpretações normativas:
«124.1 Do art° do artigo 411.°, n.º 1, do Código de Processo Penal, por violação do art° 32°,1 da Constituição, interpretada essa disposição no sentido de que o prazo para a interposição de recurso em que se impugne a decisão da matéria de facto e as provas produzidas em audiência tenham sido gravadas, se conta sempre a partir da data do depósito da sentença na secretaria, e não da data da disponibilização das cópias dos suportes magnéticos, tempestivamente requeridas pelo arguido recorrente, por as considerar essenciais para o exercício do direito de recurso.
124.1.1 A inconstitucionalidade foi suscitada em recurso próprio, que não transitou ainda em julgado, porque foi apresentada reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que ainda não foi apreciada.
124.2 A inconstitucionalidade do art° 400º do CPP, por violação do art° 32,1 da Constituição, na interpretação segundo a qual não são suscetíveis de recurso para o STJ os acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que versem sobre questões de direito processual penal.
124.2.1 A inconstitucionalidade foi suscitada no recurso próprio, interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, que não foi admitido, na reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça sobre a qual não foi ainda proferida decisão, no recurso da decisão da primeira instância, no requerimento de arguição de nulidades e no pedido de aclaração.
124.3 A inconstitucionalidade dos art° 379°,2 e 380° do CPP interpretados no sentido de que o tribunal não tem que se pronunciar sobre as questões que perante ele são suscitadas, no quadro de arguição de nulidades da sentença ou que pode omitir pronuncia dizendo que já se pronunciou sobre tudo aquilo sobre que tinha que se pronunciar, por violação do art° 32°,1 da Constituição.
124.4 A inconstitucionalidade do art° 379°,1 al. c) do CPP interpretado no sentido de que o tribunal não tem que tomar posição especificada sobre todas as questões que lhe são suscitadas em sede de recurso, podendo limitar-se a dizer que já se pronunciou sobre o que tinha de se pronunciar, por violação do art° 32°,1 da Constituição.
124.4.1 A questão foi suscitada no requerimento de arguição de nulidades e no pedido de aclaração.
124.5 A inconstitucionalidade do art° 410°, 1, do CPP interpretado no sentido de que o tribunal não tem que se pronunciar sobre todas as questões que lhe sejam colocadas e que impliquem diferentes decisões de direito, por violação do art° 32°, 1 da Constituição.
124.5.1 A questão foi suscitada no requerimento de arguição de nulidades.
124.6 A inconstitucionalidade dos art°s 21° do DL no 28/84, de 20 de janeiro no sentido de que contém um conceito amplo de empresa, que no sentido objetivo — toda a conjugação de pessoas e meios materiais e/ ou imateriais que prossegue uma atividade económica (produção de bens e/ ou serviços para a troca) quer no subjetivo — toda a entidade que independentemente do seu estatuto jurídico e do facto de essa entidade não ser a única nem sequer a principal das atividades, explora um empresa em sentido objetivo», por manifesta violação do disposto no art° 29°,1 da Constituição.
124.7 Tal interpretação transforma o art° 21° desse diploma num autêntico saco de gatos, onde cabe tudo, com ofensa manifesta dos princípios gerais do direito criminal e dos normativos constitucionais.
124. 8 Uma tal interpretação ofende, também, o disposto no art° 2ª do DL n° 28/ 84, de 20 de janeiro, que restringe a responsabilidade pessoal aos membros dos Órgãos sociais, nos casos das empresas legalmente constituídas.
124.9 A inconstitucionalidade do art° 38°, 1 al. a) de b) do referido interpretado no sentido de punir, por comparticipação, pela prática de crime de fraude na obtenção de crédito os antigos administradores, que não participaram na deliberação do pedido de concessão de crédito nem na apresentação de proposta de concessão de crédito, faz uma interpretação inconstitucional dessa disposição, por ofensa manifesta do disposto no art° 29°, 1 da Constituição.
124.10 A inconstitucionalidade do art° 38°, nºs 1 al. a) e b), por violação do mesmo dispositivo, interpretado no sentido de que pode aplicar-se sem que se verifiquem as condições de punibilidade que integram o tipo legal de crime, pelo que considerar que cometeu o crime do art° 38°, n°s 1 al. a) e b) quem não apresentou qualquer proposta de concessão de crédito nem sequer participou em qualquer ato a ela conducente é manifestamente violador da Constituição.» (fls. 6168 a 6173)
Por sua vez, o recurso interposto B. pretende que se «aprecie da inconstitucionalidade do artigo 97º, nº 5 do CPP, nos termos referidos na alínea u) do requerimento de invocação de nulidade do Acórdão, por o mesmo (art. 97º, nº 4) não ter sido observado na sua adequada dimensão normativa pois, como aí ficou referido, se confinou a uma “mera afirmação destituída de fundamentação” (fls. 5791, 23º volume).
2. Por ser imprescindível à boa decisão das questões a resolver nos autos, importa registar que, por despacho proferido, em 11 de outubro de 2011 (fls. 7788 a 7790, 28 volume), foi declarado extinto o processo criminal, por prescrição, relativamente a ambos os recorrentes. O que, aliás, levou o Relator junto da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa a proferir despacho, em 03 de setembro de 2012 (fls. 7924, 29º volume), nos termos do qual considerou inexistir interesse processual na sua apreciação.
Porém, o recorrente B. viria a apresentar requerimento, em 24 de setembro de 2012 (fls. 7935, 29º volume), através do qual manifestou a manutenção de interesse processual no mesmo, por incidir sobre o pedido cível, que não teria sido afetado pela decisão de extinção do processo criminal, por prescrição, tendo o Relator junto da 9ª do Tribunal da Relação de Lisboa proferido novo despacho, em 01 de outubro de 2012 (fls. 7950), que determinou a subida de ambos os recursos ao Tribunal Constitucional, na medida em que, “pelo menos por parte do requerente B., também abrangerão matéria cível, pelo que a declarada inutilidade superveniente de tais recursos deverá entender-se como restringida à matéria crime” (fls. 7950, 29º volume).
Cumpre, então, apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
3. Mesmo tendo os recursos sido admitidos por despacho do Relator junto do tribunal “a quo”, proferido em 01 de outubro de 2012 (cfr. fls.7950, 29º volume), com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que sempre seria forçoso apreciar o preenchimento de todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, n.º 2, da LTC.
Sempre que o Relator verifique que não foram preenchidos os pressupostos de interposição de recurso, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
4. Quanto ao recurso interposto por A., verifica-se que todas as interpretações normativas escolhidas como objeto de recurso de constitucionalidade são extraídas de preceitos legais que regem, exclusiva e diretamente, a tramitação do processo tendente à decisão sobre a responsabilidade criminal do recorrente, não incidindo, portanto, sobre questões de digam respeito ao pedido cível igualmente deduzido nos autos recorridos. Como tal, encontrando-se extinto o procedimento criminal, por prescrição, conclui-se pela falta de subsistência de interesse processual no seu conhecimento, pelo que não se conhece do objeto do mesmo.
5. Quanto ao recurso interposto por B., segundo o qual se pretendia aferir da constitucionalidade “do artigo 97º, nº 5 do CPP, nos termos referidos na alínea u) do requerimento de invocação de nulidade do Acórdão, por o mesmo (art. 97º, nº 4) não ter sido observado na sua adequada dimensão normativa pois, como aí ficou referido, se confinou a uma “mera afirmação destituída de fundamentação”, importa apenas registar que a referida interpretação normativa não constituiu a verdadeira “ratio decidendi” do acórdão proferido em 16 de outubro de 2007 e, mais tarde, confirmado pelo acórdão proferido em 08 de janeiro de 2008.
Da leitura daqueles arestos resulta que em momento algum se afirma que fosse possível proferir uma decisão desfavorável ao recorrente, em matéria cível, sem que a mesma fosse acompanhada da devida fundamentação. Pelo contrário, o acórdão proferido, em 16 de outubro de 2007, sustenta e demonstra que o acórdão condenatório não incumpriu qualquer dever de fundamentação, seja quanto à determinação da suspensão da pena (cfr. artigo 50º do Código Penal – sem relevância nos presentes autos), seja quanto à fundamentação sobre os factos dados como provados, os quais tanto assumem relevância criminal como relevância cível:
«Como tal, não se vislumbra violação dos Art.ºs 374º. n.2 e 379º. nº 1 al. a) do CPP, quer neste aspeto em particular, da fundamentação do art. 50º do Código Penal.
Quer por falta de indicação e exame crítico das provas, já que, neste ponto, o Acórdão, fundamentando-se no relatório da B.D.O. – Fls. 9 a 98 – cujo rigor não se põe em causa e fundamentou bem a sua posição, em obediência ao citado Art.ª 374º n.2 C.P.P..» (fls. 5084)
Ao contrário do que o recorrente alegou, não é verdade que aquela decisão se tivesse limitado à afirmação segundo a qual “[n]ão se vislumbra que haja matéria fáctica, incorretamente, apreciada pelo Tribunal” (fls. 5082, 21º volume), e muito menos que aquele tribunal recorrido tivesse afirmado que estaria dispensado de fundamentar a sua decisão sobre matéria cível.
Além disso, quando conheceu da arguida nulidade, por alegada falta de pronúncia, o tribunal recorrido reiterou o seu afastamento face a uma interpretação da norma extraída do artigo 97º, n.º 5, do CPP, segundo a qual seria admissível dispensar a fundamentação de sentença que condenasse o recorrente em pedido cível. Pelo contrário, o acórdão proferido, em 08 de janeiro de 2008, expressamente afastou essa interpretação:
«Examinado o texto do Acórdão proferido por este TRL, ora objeto de arguição de nulidades, é manifesto, que neste se trataram de forma clara e fundamentada as questões aduzidas pelo recorrente nas suas motivações e que, de acordo com as “conclusões” apresentadas, constituíram o objeto dos recursos.» (fls. 5508)
Em suma, não corresponde à tramitação expressa nos autos que o tribunal recorrido tenha aplicado o n.º 5 do artigo 97º do CPP nos termos da interpretação que o recorrente elegeu como objeto do presente recurso. Ora, por força do artigo 79º-C da LTC, o Tribunal Constitucional apenas pode conhecer da constitucionalidade de interpretações normativas que tenham sido efetivamente aplicadas enquanto fundamento determinante das decisões recorridas. Não é, manifestamente, esse o caso dos presentes autos, quanto ao recurso interposto por B..
III – DECISÃO
Pelos fundamentos supra expostos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de fevereiro, decide-se não conhecer do objeto do recurso.
Custas devidas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.»
2. Inconformado com a decisão proferida, o recorrente B. veio deduzir a seguinte reclamação, que ora se sintetiza:
«(…)
E. Na verdade, o atual nº 5 do artigo 97º do Código de Processo Penal densifica, em termos inexoravelmente irrefutáveis, a necessidade de existência de um peculiar específico dever de fundamentação de todas as decisões exaradas no âmbito de um processo penal, quer do ponto de vista factual, quer de outro estritamente jurídico.
F. Ora, tal dever de fundamentação emerge, assim, legalmente plasmado e tem inequívoca dimensão constitucional, face à disposição contida no n.º 1, do artigo 205°, da Constituição da República Portuguesa.
G. De facto, de acordo com o referido comando constitucional, um momento impregnado da solenidade peculiar a uma decisão tirada em sede do direito punitivo por excelência tem de — obrigatória e necessariamente — se pronunciar sobre tudo o que é relevante, para assim se tornar inteligível e erigir-se dotado da imperiosa eficácia de (con)vencimento.
(…)
T. Efetivamente, visou-se sa1ientar enfaticamente que a questão suscitada no recurso liminarmente apreciado contende com um segmento verdadeiramente estrutural de um Estado de Direito: exatamente, o das decisões tiradas no processo penal — mais as mais as finais — deverem afirmar-se pela sua validade intrínseca, tudo dissecando e discutindo, assim adquirindo plena eficácia de convencimento.
U. Ao que se crê, o corolário supra extraído merecerá quase plena adesão, uma vez que emerge como uma clara apologia de uma aplicação da Justiça transparente, assertiva e indiscutível na assunção das decisões tomadas.
V. De resto, convém vincar, nada na Douta Decisão Sumária alvo da presente reclamação suscita qualquer dúvida de que será esse o entendimento preconizado pela Mma. Juíza Conselheira Relatora.
(…)
X. Na verdade, a primordial razão aventada na Douta Decisão reclamada prende-se ao facto de que a referida interpretação normativa não constituiu a verdadeira «ratio decidendi» do acórdão proferido em 8 de janeiro de 2008.
Y. E, subsequentemente, justifica-se a afirmação efetuada repristinando excertos do citado Acórdão, sublinhando que os mesmos comprovam o erro em que incorreu o recorrente — aqui reclamante — quando afirmou que a decisão apenas tivesse aduzido que “não se vislumbra que haja matéria fáctica incorretamente, apreciada pelo Tribunal”.
Z. Ora, deve dizer-se, que assiste plena razão formal à Ex.ma Conselheira Relatora.
AA. Com efeito, ressuma à evidência que, de um ponto de vista da verbalização efetuada pela decisão recorrida e do resumo que o recorrente dela fez, não há coincidência. Ou seja, para dizer de forma mais prosaica, o recorrente não transcreveu ipsis verbis a formulação eleita pelo Douto Colégio de Desembargadores.
BB. No entanto, salvo o devido respeito — que é, de facto, verdadeiramente nutrido — a questão é toda outra:
CC. Existe diferença de conteúdo significativo e essencial entre o resumo patrocinado pelo recorrente — ora reclamante — e a formulação semântica usada pelo Tribunal? Ou seja, as palavras eleitas pelo Douto Colégio de Desembargadores — maxime as transcritas a páginas 5 da Douta Decisão Sumária em reclamação têm um significado juridicamente relevante distinto daquilo que o recorrente, brevitatis causa, lhe atribuiu?
DD. O recorrente crê que não. Na verdade, a resposta às questões ensaiadas terá de ser tima veemente negativa.
EE. É que os trechos colhidos no Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa constituem meras asserções tabelares, já que se limitam a referir não vislumbrarem qualquer violação do artigo 374°, 2, do CP Penal, dado que a decisão que examinavam emergia bem fundamentada...
FF. Ora, é esta espécie de atuação que o recorrente julga discrepar da Constituição da República Portuguesa, designadamente propugnando por uma interpretação do artigo 97°, n.º 5 do CP Penal, em clara violação do disposto no artigo 205°, 1, da CRP.
GG. É certo, no entanto, que o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa não se pronuncia sobre o círculo hermenêutico da citada norma processual.
HH. Ou seja, para usar uma forma de dizer especialmente singela, não diz o direito concretamente sobre essa norma.
II. Todavia — permita-se ainda a continuação da formulação desimplicada — diz direito, omitindo a existência desse ditame.
JJ. Na verdade, decidindo em termos manifestamente conclusivos que não havia qualquer falta de exame crítico da prova demarcou-se de qualquer dever de fundamentação, dado que não discutiu, decidiu ou examinou realmente a questão.
KK. Efetivamente, ao contrário de se ponderar e refletir sobre a questão suscitada, legitimando intrinsecamente a bondade da decisão exarada, limitou-se a afirmar — sem argumentar minimamente qualquer alicerce para tal — o bom fundamento da decisão.
LL. Assim, tal espécie decisória — e a dimensão normativa do artigo 97/5 do CP Penal que lhe está subjacente — surge em abrupta e inexorável colisão com a teleologia imanente ao dever de fundamentação imanente ao artigo 205°, 1 da Constituição da República Portuguesa.
MM. Mutatis mutandis, a argumentação já tecida é passível de ser esgrimida ainda tendo como horizonte discursivo o trecho do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa recuperado na Douta Decisão Sumária, a páginas 6 desta.
NN. Na verdade, aqui o Colégio de Desembargadores limita-se a dizer que foi tratada de forma clara e fundamentada a questão aduzida pelo recorrente.
00. Isto é, por uma outra vez, extrai-se a conclusão sem que se entreteça qualquer fundamentação que a ancore! Isto é, propende-se por uma dimensão normativa do dever de fundamentação verdadeiramente nos antípodas da exigência constitucional,
PP. Não porque o Tribunal recorrido se debruce especificamente sobre tal dever,
QQ. Mas, inequivocamente, porque da atividade interpretativa que se desenvolve resulta, à saciedade, que o mesmo foi pura e simplesmente olvidado.
RR. Assim, resulta do exposto que, de facto, pese embora a ratio decidendi da decisão tomada não tenha passado por uma interpretação expressa do artigo 97º, nº 5 do Código de Processo Penal é manifesto que a decisão o desaplica,
SS. Uma vez que olvida, manifestamente, o dever de discutir, ponderar e problematizar as conclusões que tira, fazendo-as emergir absolutamente desprovidas de qualquer lastro discursivo que as sustente.
TT. Assim, se o reclamante logra descortinar em toda a abrangência significante, a tipologia da decisão sumária em análise, afigura-se-lhe que a mesma ancora num segmento marcadamente formal:
UU. na verdade, a rejeição determinada afigura-se radicar, tão só, na ideia de que a dimensão normativa inconstitucional só pode radicar no direito que se diz e já não na forma como se diz.» (fls. 8041 a 8052)
3. Notificado para o efeito, o Ministério Público veio responder nos seguintes termos.
«1º
Pela douta Decisão Sumária n.º 141/2013, não se conheceu do objeto do recurso porque o tribunal recorrido não tinha aplicado o n.º 5 do artigo 97.º do CPP, nos termos da interpretação que o recorrente elegera como objeto desse recurso.
2.º
Na douta Decisão Sumária demonstra-se de forma clara, inclusivamente recorrendo-se à transcrição de partes relevantes e esclarecedoras do acórdão recorrido, que efetivamente as duas interpretações, a aplicada e a suscitada, não são coincidentes.
3º
Se o recorrente entende que concretamente o grau da fundamentação é insuficiente face aos princípios constitucionais que invoca, esse é uma questão que já não assume natureza normativa, caindo, portanto, fora das competências que o Tribunal Constitucional tem em sede de fiscalização concreta de constitucionalidade.
4º
O Tribunal, em sede de verificação dos fundamentos de admissibilidade, não pode questionar a interpretação levada a cabo no acórdão recorrido e, aceitando-a, parece-nos claro que, não se verifica o requisito de admissibilidade do recurso, que levou ao não conhecimento do seu objeto.
5.º
Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.»
4. Para boa compreensão da tramitação dos presentes autos, importa apenas notar que o recorrente A. deduziu pedido de aclaração relativamente à decisão ora reclamada (fls. 8019 a 8021), que será decidido, pela Relatora, através de despacho autónomo.
Posto isto, importa apreciar e decidir.
II – Fundamentação
5. Conforme bem demonstrado pela decisão reclamada, a decisão recorrida nunca afirmou que seria admissível proferir um juízo acerca de pedido cível sem que tal fosse devidamente fundamentado. Assim, torna-se evidente que o tribunal recorrido nunca interpretou efetivamente a norma extraída do n.º 5 do artigo 97º do CPP, no sentido que o ora reclamante fixou como objeto do presente recurso.
Os argumentos agora aduzidos pelo reclamante apenas demonstram que este mantém uma discordância quanto ao concreto grau de fundamentação das decisões proferidas pelos tribunais recorridos, mas que, na verdade, não envolve uma questão de inconstitucionalidade normativa, em sentido próprio. Não cabe, como é evidente, a este Tribunal reapreciar a decisão de fundo quanto à concreta fundamentação da decisão proferida pelo tribunal de primeira instância, face à prova produzida, mas apenas verificar da constitucionalidade de uma específica interpretação normativa.
Quanto a esse propósito, reitera-se não haver coincidência entre a interpretação normativa efetivamente aplicada pela decisão recorrida e aquela interpretação normativa que foi fixada como objeto do presente recurso, pelo que mais não resta do que confirmar a decisão reclamada.
III - Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.
Lisboa, 29 de maio de 2013. – Ana Maria Guerra Martins – João Cura Mariano – Joaquim de Sousa Ribeiro.