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Processo nº 360/01
2ª Secção Relator: Cons. Guilherme da Fonseca
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A... e M..., com os sinais identificadores dos autos, vieram 'nos termos do artigo 76º nº 4, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, Lei nº 28/82 de 15 de Novembro e suas alterações, reclamar para a conferência, do douto despacho de indeferimento, proferido pela meritíssima Juíza do Tribunal Judicial de Torre de Moncorvo', datado de 7 de Março de 2001, que não admitiu o recurso por elas interposto para o Tribunal Constitucional. Aquele despacho é do seguinte teor:
'Compulsados os autos constata-se que, por despacho de fls. 54, foi adjudicado o imóvel dos autos à entidade expropriante, tendo sido interposto pelas expropriadas recurso de agravo desse despacho, o qual foi admitido em 22/02/97. Porém e uma vez proferida a sentença final neste processo em 30/11/98 foi a mesma também objecto de recurso interposto pela entidade expropriante. Ora o venerando Tribunal da Relação do Porto, conhecendo do mérito da causa, confirmou integralmente a decisão recorrida, a qual transitou em julgado. A fls. 371 as expropriadas interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional do despacho de adjudicação de fls. 54 com fundamento na inconstitucionalidade da norma nele aplicada, ao abrigo do disposto no art. 70° nº 1 als. b) e f) da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional. No entanto, e analisando todo o processo constata-se que, a fls. 189/198 foi proferida decisão final a qual foi, como já se disse, objecto de recurso de apelação apenas interposto pela entidade expropriante. Uma vez determinada a sua subida, o Venerando Tribunal da Relação do Porto confirmou, na íntegra, a decisão recorrida. Ora, o trânsito em julgado da decisão do Tribunal da Relação do Porto significa que a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória dentro do processo e fora dele, cfr. art. 671° do C.P.C. Na verdade, o próprio recurso de agravo interposto do despacho de adjudicação caducou devido ao facto das agravantes se terem conformado com o decidido por sentença final proferida de fls. 189 a 198 (porquanto da mesma não interpuseram recurso de apelação) nos termos do estatuído no art. 735°, nº 2 do C.P.C:
'Se não houver recurso da decisão que ponha termo ao processo. os agravos que deviam subir com esse recurso ficam sem efeito. salvo se tiverem interesse para o agravante independentemente daquela decisão. Neste caso, sobem depois da decisão transitar em julgado. caso o agravante o requeira no prazo de 10 dias.' Compulsados mais uma vez os autos verifica-se que, in casu, a última parte deste normativo também não se verificou porque mais uma vez as agravantes não requereram a sua subida. Pelo exposto e uma vez que o regime de recursos para o Tribunal Constitucional apenas pode ser admitido relativamente a decisões ainda não transitadas em julgado, ou seja, decisões susceptíveis de recurso ordinário, sob pena de, caso assim não se entendesse, se criar forte instabilidade no ordenamento jurídico, fim esse que o legislador não pretendeu, decido não admitir o recurso para esse Tribunal Superior'.
2. O Ministério Público, no seu Parecer, manifestou-se, de modo implícito, pelo indeferimento da reclamação, dizendo textualmente:
'1. A decisão recorrida limitou-se a adjudicar o prédio expropriado à entidade expropriante sem fazer da norma do artigo 50º, nºs 4 e 5 do Código das Expropriações a interpretação referida no requerimento de fls. 25.
2. A interpretação aí especificada não é sequer uma questão de inconstitucionalidade normativa, já que se limita a contestar a legalidade do dito despacho de adjudicação, matéria que não cabe nos poderes de cognição deste Tribunal'.
3. Cumpre decidir. As reclamantes, já depois – e muito depois – de transitada em julgado a sentença final proferida nos autos de expropriação por utilidade pública, de que foi extraída a certidão que instrui a reclamação, na qual lhes foi atribuída uma indemnização 'no quantitativo de 84 112 992$00', vieram 'interpor Recurso para o Tribunal Constitucional, com subida de imediato nos próprios autos e efeito suspensivo, nos termos do artigo 70º, nº 1, alíneas b) e f) sendo esta com referência ao fundamento constante da alínea c) e nºs 2 e 4, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, Lei nº 28/82 de 15 de Novembro e suas alterações, do douto despacho de adjudicação de propriedade, constante a folhas 54', datado de
30 de Setembro de 1997, completando a seguir o requerimento e 'indicando a norma que pretende que o Tribunal Constitucional aprecie é a contida no artigo 50º números 4 e 5 do Código das Expropriações, Decreto-Lei 438/91 de 09 de Novembro,
‘interpretada em termos de a aplicação da referida norma na presente adjudicação
é ilegal, uma vez que, não estão preenchidos os requisitos legais que permitam adjudicar a propriedade à entidade expropriante, não se mostrando por isso efectuado o depósito a que alude o artigo 19º nº 1 alínea a) do Decreto-Lei
438/91 de 09 de Novembro)’'('por violação do princípio constitucionalmente consagrado de direito à propriedade privada e ainda por violação das disposições legais dos artigos 50º, 19º nº 1 alínea a) e 2º do Código de Expropriações, Decreto-Lei 438/91 de 09 de Novembro' – é o entendimento expresso pelas reclamantes). Ora, independentemente de saber se ainda é oportuna a interposição de um tal recurso de constitucionalidade, decorridos mais de três anos sobre o despacho em causa e quando há caso julgado sobre o valor da indemnização – e é neste plano que se coloca a Mmª Juíza a quo, com o questionamento das reclamantes, entendendo, no essencial, que 'a adjudicação e a consequente ‘desapropriação’ não se consumaram' -, valem, de modo decisivo, as razões invocadas no parecer do Ministério Público, apontando para a não admissão do recurso de constitucionalidade. Por um lado, a norma em causa não foi aplicada no despacho recorrido com a pretensa interpretação indicada pelas reclamantes, limitando-se a Mmª Juíza a quo, cumprindo a lei, a adjudicar à Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta a propriedade rústica expropriada ('nos termos do artº 50º nºs 4 e 5 do Dec. Lei nº 438/91 de 9 de Novembro (Código das Expropriações) e porque se mostra efectuado o depósito a que alude o artº 19º nº 1 al. a) do referido diploma legal' – é o que se lê no despacho, sendo pura aplicação do preceituado nesses artigos). Não há nesse despacho nenhuma consideração quanto ao preenchimento dos
'requisitos legais que permitam adjudicar a propriedade à entidade expropriante' e, a haver inobservância desses requisitos, como pretendem as reclamantes, o vício seria a ilegalidade e nunca a inconstitucionalidade de qualquer norma do Código das Expropriações, mormente as indicadas no despacho. Por outro lado, a arguição da pretensa inconstitucionalidade que é feita pelas reclamantes não é uma verdadeira arguição de inconstitucionalidade normativa, com referência às normas indicadas do Código das Expropriações então em vigor, sendo antes, e só, uma mera invocação de ilegalidade do despacho, porque a adjudicação seria 'ilegal', uma vez que 'não estão preenchidos os requisitos legais que permitam adjudicar a propriedade à entidade expropriante, não se mostrando por isso efectuado o depósito a que alude o artigo 19º nº 1 alínea a) do Decreto-Lei 438/91 de 09 de Novembro', talqualmente se exprimem as reclamantes. Tanto basta para concluir que, face a estes fundamentos, nunca poderia ser admitido o presente recurso de constitucionalidade, como não foi admitido.
4. Termos em que, DECIDINDO, indefere-se a reclamação e condenam-se as reclamantes nas custas, com a taxa de justiça fixada em 15 unidades de conta. Lisboa, 26 de Setembro de 2001 Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto José Manuel Cardoso da Costa