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Processo n.º 32/13
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José da Cunha Barbosa
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. A., melhor identificado nos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), pretendendo ver apreciada “a inconstitucionalidade dos n.ºs 2 e 3 do art. 1º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas, introduzido pela Lei n.º 18/2007, de 17 de maio, na interpretação segundo a qual a quantificação da taxa de álcool no sangue possa ser feita, para efeitos de condenação em processo penal, com recurso a teste efetuado em analisador quantitativo do ar expirado”, por violação do “princípio da presunção de inocência, consagrado no art. 32.º da Constituição da República Portuguesa”.
2. O Juízo de Pequena Instância Criminal da Comarca da Grande Lisboa-Noroeste decidiu condenar o arguido – ora recorrente – num crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos termos dos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, e na pena de nove meses de prisão, os quais serão cumpridos, por dias livres, nos termos do artigo 45.º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal. Condenou ainda o arguido na pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de quinze meses. Inconformado, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, produzindo, para o efeito, as seguintes conclusões:
«(...)
I. Tendo a douta Sentença recorrida se decidido pela aplicação de pena de prisão por dias livres, sem fundamentar por que razão não é adequada a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, o Tribunal deixou de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, o que determina a nulidade da sentença (artigo 379.º, n.º 1, al. c), do CPP, neste sentido se decidiu no Acórdão de 01/03/2011, desse Venerando Tribunal da Relação de Lisboa).
II. Assim, a Sentença recorrida é nula, nulidade que para os devidos efeitos ora se invoca, não podendo esse Tribunal da Relação substituir-se ao Tribunal recorrido e suprir a nulidade, pois de outra forma seria violada a garantia constitucional do duplo grau de jurisdição prevista no art. 32.º da CRP (neste sentido se decidiu, entre outros, no Acórdão referido no ponto anterior).
III. Ainda que o ora recorrente tenha confessado os factos integralmente e sem reservas, tal confissão apenas se reporta a ter ingerido bebidas alcoólicas antes de conduzir e não à concreta taxa de álcool no sangue, a qual apenas pode ser apurada com recurso a aparelhos medidores (neste sentido, vide o Acórdão da Relação do Porto de 02-04-2008, tirado no Recurso n.º 0810479).
IV. Os aparelhos de mediação são sujeitos a erros, a diferenças entre o resultado da mediação e a realidade, devendo ser tido em conta, para efeitos de condenação o respetivo erro máximo admissível, o que não foi atendido na douta Sentença recorrida (neste sentido, vide o Acórdão referido no ponto anterior).
V. A tal obriga o princípio da presunção de inocência, mediante o qual, até prova em contrário, o arguido é inocente (art. 32º CRP).
VI. Os resultados obtidos com os aparelhos medidores da concentração de álcool no ar expirado são menos fiáveis do que os resultados obtidos mediante análise ao sangue, prevalecendo sempre o exame de sangue (n.º 5 do art. 6º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas).
VII. Sendo os resultados obtidos pelo teste do ar expirado, insuficientes para fundamentar uma condenação penal, de acordo com a jurisprudência alemã (neste sentido, vide Paulo Pinto de Albuquerque, em anotação do art. 292º do Código Penal (CP), cuja fonte é o § 316º (Trunkenheit im Verkehr) do StGB Alemão, in Comentário do Código Penal, à luz da Constituição da República...cit. p. 828.
VIII: Apenas o recurso a análise ao sangue (método mais fiável) se afigura suficiente, no respeito pelo princípio da presunção de inocência, consagrado no art. 32º da CRP, para fundamentar uma condenação penal, análise que não consta dos autos.
IX. Mais sendo inconstitucional, a interpretação dos nºs 2 e 3 do art. 1º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas, introduzido pela Lei n.º 18/2007, de 17 de maio, na interpretação segundo a qual a quantificação da taxa de álcool no sangue possa ser feita, para efeitos de condenação em processo penal, com recurso a teste efetuado em analisador quantitativo do ar expirado, por violação do art. 32º da CRP, inconstitucionalidade que ora se invoca.
X. Assim, não tendo sido tomado em conta na douta Sentença recorrida, o erro máximo admitido, não constando dos autos que foi efetuado o necessário controlo meteorológico ao aparelho que mediu a taxa de álcool do ora recorrente, bem como, não constando o resultado de análise ao sangue, a douta Sentença padece de erro notório na apreciação da prova, não podendo em consequência permanecer na ordem jurídica.
XI. Em consequência da condenação nos presentes autos, o ora arguido reconheceu que ingere bebidas alcoólicas com frequência, em demasia, e que tem um problema de alcoolismo, tendo procurado ajuda que passará por internamento e acompanhamento posterior.
XII. Não obstante o ora recorrente já ter sido condenado pela prática do mesmo crime, em apenas uma das condenações foi condenado em pena de prisão suspensa na sua execução, razão pela qual é ainda expectável que a ameaça da execução da pena de prisão seja suficiente para alcançar as finalidades da punição.
XIII. O Tribunal suspende a pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos, se atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (n.º 1 do art. 50º do CP.
(...)»
Em acórdão com data de 18 de outubro de 2012, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou o recurso improcedente, motivando, desse jeito, o recurso de constitucionalidade que agora se aprecia.
3. Vem o recorrente alegar o seguinte:
«(...)
I. O art. 32º da CRP consagra um dos princípios basilares do nosso ordenamento jurídico, o princípio da presunção de inocência, mediante o qual, até prova em contrário, o arguido é inocente, sendo-lhe asseguradas todas as garantias de defesa.
II. Os resultados obtidos com os aparelhos medidores da concentração de álcool no ar expirado, são menos fiáveis do que os resultados obtidos mediante análise ao sangue, tal se reconhece aliás, no nº 5 do art. 6º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas.
III. Disposição segundo a qual, o resultado do exame de sangue prevalece sempre sobre o resultado do teste do ar expirado.
IV. Da conjugação da letra das normas cuja conformidade com a constituição ora se pretende ver analisadas, a análise de sangue apenas é efetuada quando não for possível realizar o teste em analisar quantitativo de ar expirado.
V. Sendo possível a determinação da taxa de álcool no sangue mediante análise de ar expirado e mediante análise ao sangue, método este mais fiável, para efeitos de condenação em processo penal, apenas este deve ser suficiente, sob pena de violação do princípio da presunção de inocência.
VI. Sendo aliás, de igual forma, os resultados obtidos pelo teste do ar expirado, insuficientes para fundamentar uma condenação penal, de acordo com a jurisprudência Penal Alemã, neste sentido, vide, Paulo Pinto de Albuquerque, em anotação ao art. 292ºdo Código Penal (CP), cuja fonte é o § 316º, cit.
VII. Apenas o recurso a análise ao sangue (método mais fiável) se afigura suficiente, no respeito pelo princípio da presunção de inocência, consagrado no art. 32º da CRP, para fundamentar uma condenação penal.
VIII. Sendo inconstitucionais os nºs 2 e 3 do art. 1º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas, introduzido pela Lei nº 18/2007, de 17 de maio, na interpretação segundo a qual, a quantificação da taxa de álcool no sangue possa ser efetuada, para efeitos de condenação em processo penal, com recurso a teste realizado em analisador quantitativo do ar expirado, por violação do art. 32º da CRP, inconstitucionalidade que ora se invoca.
(...)»
Já o Ministério Público concluiu as suas contra-alegações do seguinte jeito:
«(...)
1.ª - Nos termos das disposições conjugadas do artigo 153º do Código da Estrada e artigo 1º do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei nº 18/2007, de 17 de maio, o exame-regra para deteção do estado de influenciado pelo álcool é o realizado por meio de teste no ar expirado, primeiro em analisador qualitativo e posteriormente, caso o primeiro dê positivo, em analisador quantitativo.
2.ª - Dispondo o nº 8 daquele artigo 153º que o examinando só deve ser submetido a colheita de sangue para análise se não for possível a realização por pesquisa de álcool no ar expirado, o artigo 4º, nº 1, do Regulamento veio estabelecer que impossibilidade ocorre quando após três tentativas sucessivas o examinando não consegue expelir ar suficiente para a realização do teste em analisador quantitativo, ou quando as condições físicas o não permitam.
3.ª - Face a este regime, não cabe, nesta fase, ao condutor/examinando optar pelo tipo de exame, devendo, pois, sujeitar-se ao exame por meio de teste no ar expirado em analisador quantitativo.
4.ª - Com a regulamentação precisa e objetiva desta matéria, nos termos em que foi feita, consegue-se uma fiscalização eficaz, garantindo-se a segurança rodoviária e impedem-se eventuais violações da igualdade.
5.ª - Por outro lado, como o condutor/examinando que realizar o exame em analisador quantitativo (sendo o resultado imediato), pode também imediatamente requerer a contraprova e optar pela análise de sangue, se entender que este é o método mais rigoroso, não se vislumbra qualquer violação da presunção de inocência e das garantias de defesa (artigo 32º, nºs 1 e 2, da Constituição).
6.ª - Termos em que deverá negar-se provimento ao recurso.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
4. Incide o presente recurso de constitucionalidade sobre a norma constante do artigo 1.º, n.ºs 2 e 3, do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas, introduzido pela Lei n.º 18/2007, de 17 de maio, na interpretação segundo a qual a quantificação da taxa de álcool no sangue pode ser feita, para efeitos de condenação em processo penal, com recurso a teste efetuado em analisador quantitativo do ar expirado. Considera o recorrente que tal interpretação normativa viola o princípio da presunção de inocência e as garantias de defesa do arguido, consagrados no artigo 32.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa.
Vale a pena recordar a redação das normas em crise:
«(...)
Artigo 1.º
Deteção e quantificação da taxa de álcool
1 - A presença de álcool no sangue é indiciada por meio de teste no ar expirado, efetuado em analisador qualitativo.
2 - A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por teste no ar expirado, efetuado em analisador quantitativo, ou por análise de sangue.
3 - A análise de sangue é efetuada quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo.
(...)»
O Tribunal Constitucional já teve, com diversos fundamentos, oportunidade de se debruçar sobre questões de constitucionalidade próximas daquela que subjaz ao presente recurso, relativas sobretudo ao artigo 152.º, n.º 3 do Código da Estrada, e ao artigo 4.º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas. No Acórdão n.º 159/12 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), o recorrente pretendia ver apreciada a constitucionalidade destas normas quando interpretadas no sentido de que a prova do estado de influenciado pelo álcool por análise ao sangue só pode ser feita quando o condutor não conseguir expelir ar suficiente após três tentativas sucessivas, não tendo o condutor direito de logo pedir a análise ao sangue sob pena de cometer um crime de desobediência. Considerou o Tribunal que tal norma não violava as garantias de defesa do arguido, talqualmente plasmadas no n.º 1, do artigo 32.º, da CRP, com fundamento nos seguintes argumentos:
«(...)
Resulta de todas estas disposições legais que a deteção de álcool no sangue do condutor começa por ser realizada através de exame no ar expirado, efetuado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de analisador qualitativo. Só quando for indiciada a presença de álcool no sangue por esse meio, é que se procede ao exame através de analisador quantitativo, ou, se não for possível, por via de análise de sangue.
O condutor pode requerer contraprova, que consistirá em novo teste em analisador quantitativo ou em exame ao sangue, conforme a sua preferência.
(...)
Prevendo a lei a possibilidade, no âmbito do procedimento normal de fiscalização da condução sob a influência do álcool, de realização de contraprova mediante colheita de sangue, não se vê em que termos é que a prévia sujeição a exame de pesquisa de álcool no ar expirado pode ter posto em causa as garantias de defesa do arguido (...).Ainda que o resultado desse teste revelasse uma taxa de álcool superior à legalmente permitida para o exercício da condução, nada impedia que o condutor contraditasse a prova assim obtida através de análise sanguínea, caso em que ficaria ilibado de responsabilidade penal ou contraordenacional. Bastando-lhe para isso requerer a contraprova, para que o que, aliás, deveria ser expressamente notificado pelo agente de autoridade, como determina a lei (artigo 153º, n.º 2).
(...)
Os procedimentos de fiscalização, abrangendo todos os condutores que circulam num dado intervalo de tempo em determinadas vias rodoviárias ou aqueles que sejam detetados em violação das regras estradais, não podem deixar de ser realizados através de meios expeditos que não se compadecem, sob pena de pôr em risco a própria operacionalidade da ação policial, com a obrigatoriedade de deslocação dos agentes de autoridade aos estabelecimentos de saúde sempre que interessados optem pela recolha de amostra de sangue.
(...)
Deste modo, a pretensão de efetuar, desde logo, uma análise sanguínea - com a necessária deslocação a um estabelecimento público de saúde -, antes mesmo de se encontrar indiciada uma taxa de álcool superior à legalmente prevista mostra-se ser desajustada da realidade no ponto em que suscita dificuldades operacionais que não têm um sentido útil, nem trazem qualquer vantagem processual para o interessado, que - como se deixou esclarecido -, sempre poderá requerer a contraprova através desse meio de pesquisa a seguir a um controlo positivo.
(...)»
Não se detetam boas razões para afastar a jurisprudência enunciada. Com efeito, não se vislumbra de que jeito pode a interpretação normativa contestada constituir uma violação dos “direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação” (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª ed. revista, Coimbra Editora, 2007, p. 516).
Mesmo admitindo que o resultado da análise de sangue tem um nível de certeza científica superior ao proporcionado por outros métodos (cfr., neste sentido, o Acórdão n.º 488/09, disponível em www.tribunalconstitucional.pt), certo é que esses outros métodos – designadamente, a medição da taxa de álcool no sangue por meio de teste no ar expirado, seja através de analisador qualitativo, seja através de analisador quantitativo – são adequados e necessários aos fins públicos subjacentes ao regime jurídico em análise, entre os quais se destaca o de impedir que os condutores em situação ilegal possam prosseguir a condução.
São adequados porque permitem, com considerável grau de segurança e precisão, o apuramento e quantificação da taxa de álcool no sangue; são necessários porque se trata de meios expeditos que viabilizam a operacionalidade da ação policial, que de outra forma ficaria inelutavelmente comprometida. Depois, talqualmente se dá conta no aresto transcrito, “o sistema legal não afasta a possibilidade de o condutor demonstrar através de análise ao sangue, se preferir, a ocorrência de um eventual erro na quantificação da taxa de álcool que tenha sido indiciada através de teste no ar expirado”, pelo que o regime assim gizado apresenta-se como um due process of law, não implicando um encurtamento inadmissível das garantias de defesa do arguido (cfr. o Acórdão n.º 365/92, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Finalmente, as garantias de defesa a que se refere o n.º 1 do artigo 32.º, da CRP dependem da possibilidade de discutir eficazmente os elementos de prova que integram a acusação, algo que também não deixa de suceder ao abrigo do regime jurídico supra considerado, visto que o condutor não se vê privado da possibilidade de recurso ou impugnação judicial do ato sancionatório nem da possibilidade efetiva de contradizer eficazmente os elementos trazidos pela acusação (cfr. o Acórdão n.º 365/92, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
5. Tampouco se deteta, por outro lado, qualquer violação do princípio da presunção de inocência. Trata-se, na verdade, de um princípio constitucional do qual se retiram diversos corolários. Entre eles constam, precisamente, a proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido e o princípio in dubio pro reo (cfr. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, cit., p. 518-519; e também os Acórdãos n.ºs 96/99 e 135/92, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt). Ou seja, não só o arguido não tem de fazer prova da sua inocência, como qualquer non liquet na questão da prova deve ser sempre valorado a seu favor (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal I – Noções gerais, elementos do processo penal, 6.ª ed., 2010, p. 99).
Operado este enquadramento, não se vislumbra que razões podem corroborar a argumentação do recorrente. De facto, pelas normas em causa “não se faz incidir sobre o arguido qualquer ónus probatório, nem tal procedimento revela que, nessa apreciação, o juiz tenha postergado o princípio que manda que se pronuncie de forma favorável ao arguido quando não tiver a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa” (cfr. o Acórdão n.º 110/11 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Finalmente, verifica-se que a menor fiabilidade dos alcoolímetros relativamente à análise ao sangue também não ascende a qualquer violação daqueles princípios. Para além dos argumentos expendidos supra quanto à necessidade da sua utilização, há que ter em conta que esta não preclude de forma alguma que o julgador, quando confrontado com uma incerteza irremovível e inultrapassável relativamente à fiabilidade do valor apurado por aqueles aparelhos, propenda, em razão dos princípios probatórios que regem o processo penal – maxime, do princípio do in dubio pro reo – pela não condenação do arguido com base nessa taxa de álcool, deduzindo-lhe o valor da margem de erro previsto na Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro.
Tem pois de concluir-se que as normas em apreciação não violam as exigências de que o processo penal assegure todas as garantias de defesa (cfr. artigo 32.º, n.º 1, da CRP) nem tampouco o princípio da presunção de inocência (cfr. artigo 32.º, n.º 2, da CRP).
III. Decisão
6. Atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide:
a) Não julgar inconstitucionais os n.ºs 1 e 2, do artigo 1.º do Regulamento de Fiscalização da Condução Sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas, introduzido pela Lei n.º 18/2007, de 17 de maio, na interpretação segundo a qual a quantificação da taxa de álcool no sangue pode ser feita, para efeitos de condenação em processo penal, com recurso a teste efetuado em analisador quantitativo do ar expirado;
b) Por conseguinte, negar provimento ao recurso interposto.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 25 (vinte e cinco) UCs., sem prejuízo da existência de apoio judiciário concedido nos autos.
Lisboa, 27 de junho de 2013. – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Joaquim de Sousa Ribeiro.