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Processo n.º 137/13
3.ª Secção
Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o MINISTÉRIO PÚBLICO, o primeiro vem reclamar para a conferência do despacho proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) em 7 de janeiro de 2013 que não admitiu o recurso por si interposto para o Tribunal Constitucional (cfr. fls 47-48) na sequência de decisão que, em sede de reclamação, não admitiu o recurso por si interposto para o STJ do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10/07/2012 (cfr. fls. 11-13) que julgara procedente o recurso interposto pelo Ministério Público revogando a suspensão da execução da pena de prisão em que fora condenado em primeira instância.
2. O requerimento de interposição de recurso para este Tribunal tem o seguinte teor (cfr. fls. 28 a 38):
«(…) A., tendo interposto e apresentado as adequadas motivações que o recurso impunham, foi notificado de despacho do Tribunal da Relação de Lisboa, em que foi entendido e decidido não admitir o recurso.
Não se conformando com tal decisão, apresentou RECLAMAÇÃO, nos termos do n°1 e seguintes do artigo 405° do Código Processo Penal, que foi indeferida pelo Ilustre Presidente do Venerando Supremo Tribunal de Justiça.
Considerado, que foi, que a decisão de que se recorria e reclamava era insuscetível de reapreciação na ordem jurisdicional de onde provinha, estão reunidas as condições para o presente recurso ser apresentado e apreciado.
1°
Por iniciativa do Meritíssimo Juiz a quo, e decorrido o prazo da suspensão, foi considerado, nos termos do n°1 do artigo 57° do CP, não haver motivos para a revogação da suspensão aplicada à pena a que o arguido ora Reclamante fora condenado tendo sido declarada extinta a respetiva pena.
2°
Não concordou o Digno Magistrado de Ministério Público com tal decisão, tendo interposto recurso para o Tribunal da Relação.
3°
Acolheu, o Venerando Tribunal da Relação, a douta argumentação apresentada, pelo Digno Magistrado, tendo revogado a suspensão e determinando o cumprimento da pena de prisão aplicada, pese embora os argumentos apresentados pelo arguido.
4º
Porque manifestamente tal decisão do Tribunal da Relação era altamente penalizante para o arguido, e para mais não se provando nenhum dos dados e factos apresentados pelo Magistrado do Ministério Público, bem pelo contrário, foi apresentado o recurso, que não seria admitido.
5°
Ora porque manifestamente tal decisão, é altamente penalizadora para o arguido, cabe, a contrario sensu nas previsões do artigo 400º do Código Processo penal, designadamente na alínea e) do n° 1, pelo que deveria o recurso ser admitido, seguindo-se os ulteriores termos.
6°
Após o decurso do período de suspensão da execução da pena cominada, por despacho de 1 de março de 2012, considerou-se não haver motivos para a revogação daquela suspensão, tendo sido declarada extinta a respetiva pena, ao abrigo do disposto no art° 57° n°1 do C.P.
7°
Efetivamente bem andou o Meritíssimo Juiz a quo, quando determinou a extinção da pena a que o arguido fora condenado.
8°
Fez-se a adequada e própria interpretação da Lei, designadamente do referido n°1 do art° 57° do CP.
9º
De facto não havia motivos que pudessem conduzir à sua revogação.
10º
No entanto, não foi essa a posição assumida pelo Ministério Público, que interpôs recurso a decisão de extinção da pena.
11º
Se baseado nos dados constante o relatório social e não noutros cuja origem se ignora, e que desde sempre se contrariou, uma vez que não correspondem à verdade, o certo é que fundamentalmente estes últimos serviram de base a que o Ministério Público entendesse opor-se à extinção da pena, uma vez que terá detetado ao arguido força de trabalho e poder económico que não se compraz com a situação que foi decorrendo nos últimos em temos processuais.
12°
Como se expressou nas Alegações, o arguido muito contrariamente, não tem capacidade de traba1ho, atendendo, como se referiu, à sua formação - pouco mais que a 4a classe completa do ensino primário, e idade- já ultrapassou os 50 anos.
13°
Por outro lado vive com a mãe muito limitada e com reforma que pouco ultrapassa os 200 euros, a mulher com ordenado penhorado não logra trazer para casa mais de 600 euros, a filha, infelizmente, sem qualquer curso, ao contrário do que se pretendeu fazer crer, trabalha num call.center de instituição bancária onde aufere o ordenado mínimo nacional. E o filho vendedor de automóveis... com a perspetiva de ficar desempregado no final do contrato, como é natural, face às condições do país.
14°
O arguido, ora Recorrente, como se afirmou pouco mais tem, em termos de formação académica completa, que a 4ª classe do ensino primário e com 53 anos tem muito poucas hipóteses no já de si difícil mercado do trabalho.
15°
Foi efetivamente diretor hoteleiro por um período de 1 mês e alguns dias, em Hotel do Grupo … , sendo certo que quando saiu não recebeu sequer o ordenado do mês que trabalhou-situação já referenciada, e que se poderá cotejar com a Segurança Social.
16°
Os carros e veículos, em que de tempos e a tempos circula, não são de sua propriedade têm-lhe sido emprestados por pessoas amigas para que possa fazer uma ou outra deslocação que careça-poderá conferir-se com os Registos Automóveis que veículos lhe pertenceram nos últimos 20 anos: nenhum!!
17º
Uma das sua últimas tentativas de promover atividade, que lhe permitisse custear a sua vida e dos seus familiares, criou a sociedade B., L.da, que terminou infelizmente com um pedido de Insolvência por parte dos seus credores, que foi decretada, como se poderá aferir, no Jornal Oficial, terminando dessa forma a sua atividade de meia dúzia de meses.
18°
O arguido, ora Recorrente fez todos os sacrifícios, pediu a todos os seus familiares dinheiros emprestados para ir pagando a indemnização em que foi condenado.
19°
Pelo próprio desenvolvimento dos pagamentos, se poderá aferir e aperceber das dificuldades que, o arguido ora Recorrente, teve ao longo deste período para poder entregar os valores estabelecidos, sempre sabendo e vivendo no drama dos riscos que corria ao não proceder aos pagamentos nos momentos adequados.
20°
Naturalmente que em nenhuma circunstância, não pagou a prestação a que se vinculara, por não querer pagar. Não pagou ou pagou parcialmente, porque não tinha dinheiro e não conseguia trabalho, nem consegue, para lograr pagar tais montantes, e os familiar a quem recorre, também, naturalmente têm as suas vidas e limitações.
21°
Nestas circunstâncias e nestes condicionalismos não se pode considerar que o arguido infringiu grosseiramente os deveres impostos, situação que poderia acarretar e determinar a revogação da suspensão, implicando o cumprimento da pena de prisão aplicadas, nos termos do n°1 al. a) do art° 56° do CP.
22°
Os factos que determinaram a condenação do arguido terão sido perpetrados entre fevereiro de 1979 e setembro de 1992- passaram-se entre 33 anos e 22 anos !!!
23°
O arguido foi condenado há 10 anos!!
24°
O arguido, em 2008 celebrou um acordo com o demandante para lhe pagar em prestações bimestrais de 1 000 euros o valor da indemnização em que foi condenado.
25°
Desde então, há mais de 4 anos que o arguido tem feito os possíveis e impossíveis para conseguir entregar ao demandante os valores determinados.
26°
O que nem sempre tem sido possível... mas sempre tem pago... os relatórios sociais demonstram as dificuldades que o arguido e seu agregado, por certo têm sofrido para poder fazer tais pagamentos.
27°
Agora 33 anos ou 22 anos, sobre a momento em que ocorreram as situações que determinaram a condenação do arguido, por circunstância que jamais se poderão considerar infrações grosseiras dos deveres impostos... pretende-se “meter” o arguido na cadeia, na prisão.
28°
O arguido nunca esteve preso, é primário, com irregularidade sempre vai conseguindo pagar as prestações a que se comprometeu e vai ajudando o seu agregado familiar a sobreviver.
29°
Que acontece a este agregado familiar com a prisão do chefe da família???
30°
Pioram e degradam-se as condições de vida:
- a mãe com mais de 80 anos e pensão a rondar os 200 euros, será que sobrevive??
- a filha a trabalhar no call center, com contrato a termo e com os problemas de epilepsia, de que padece, dificilmente aguentará a pressão...
- o filho a vender mercedes com contrato a termo está mesmo , mesmo a termo... num país em bancarrota...
- a mulher com salário penhorado, auferindo líquidos cerca de 600 euros... sobreviverá, mas com dificuldades acrescidas...
- o arguido na cadeia não irá aprender aquilo que decerto também não aprendeu nos curtos anos de escola, mas pouco irá fazer...
31°
Será que o arguido não espiou nos últimos 22 anos sofrimentos, tensões preocupações suficientes, para os pecados que terá cometido???
32°
Sem dúvida que sim, e sobretudo não houve infração grosseira dos deveres impostos.
33º
A decisão é absolutamente ilegítima e inconstitucional.
34
Os direitos e expectativas sobre o estado de direito e intervenção justa dos Tribunais, foram, para o Arguido, completamente goradas pela intervenção do Digno Magistrado do Ministério Público, que viu a sua tese ser consagrada pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
CONCLUSÃO:
A- Fez o Meritíssimo Juiz a quo, correta interpretação do n°1 do art° 57° do CP, determinando não haver motivo para a revogação da suspensão, e declarar a extinção da pena a que o arguido, fora condenado.
B- Aplicou bem, e fez Justiça.
C- Na verdade, os Relatório Sociais, juntos aos autos dão uma panorâmica da efetiva situação do arguido e seu agregado familiar.
D- Os restantes dados apresentados nos autos pelo Ministério Público não têm qualquer verosimilhança, não correspondendo à verdade, pelo que não poderão ser levados em linha de conta.
E- Efetivamente o arguido tem-se esforçado e muito, desde 2008 para cumprir o acordo que estabeleceu com o demandante.
F- A fraca escolaridade do arguido e a sua idade, 53 anos, e na situação económica em que o país se encontram tornam difícil, que o arguido consiga obter um emprego estável.
G- Nessa perspetiva, e considerando o rendimento do agregado familiar, tem feito, o arguido, um esforço imenso para pagar, é certo que nem sempre regularmente, as prestações a que se comprometeu.
H- Na verdade seu agregado familiar é composto pela mãe, com mais de 80 anos e pensão a rondar os 200 euros, a filha no call center com ordenado mínimo, a mulher auferindo depois de 1/3 penhorado cerca de 600 euros e o filho a tentar vender automóveis, com contrato a termo, num pais em bancarrota...
I- Com este panorama financeiro não será difícil imaginar que o arguido, fazendo pequenos biscates, na falta de melhor, não tenha a maior das dificuldades em juntar bimestralmente 1 000 euros para entregar ao demandante!!!
J- Ora nestas circunstâncias e que são reais estão demonstradas e podem-se sempre aferir nos respetivos serviços oficiais- o incumprimento parcialmente e atrasos do arguido na entrega da prestação bimestral, possa ser classificada como infração grosseira dos deveres impostos.
K- Num agregado familiar com esta dimensão, e com estes rendimentos, nos dias de crise que se vão passando, quem conseguirá apesar de inúmeros sacrifícios ter ao fim do mês 500,00 euros para no mês seguinte ter outros para poder entregar 1 000 euros, no caso ao demandante...
L- E se não conseguir não pode ser considerado uma infração grosseira dos deveres impostos!
M.- Avançar com a decisão de revogar a suspensão e determinar o cumprimento da pena de prisão aplicada, é contra a Lei e Justiça.
N- Nada beneficiará a sociedade, com tal prisão.
O- O agregado familiar que não é apenas composto pelo arguido sofrerá penalidade bem gravosa com tal situação, sendo certo que o arguido já teve a sua condenação e já espiou todos estes anos sempre com medo e receio de que se lhe pudesse vir a determinar o cumprimento da pena.
P- Faça-se Justiça, cumpra-se as determinação da Lei, considerando-se declarando-se extinta a respetiva pena, como determinou o Meritíssimo Juiz a quo.
Q- A decisão de que se recorre, é ilegítima e absolutamente inconstitucional, violando os mais básicos conceitos constitucionais de Justiça e de um Estado de direito.
R- JUSTIÇA.
3. Por despacho de 6/12/2012 o ora reclamante foi convidado a aperfeiçoar o seu requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos seguintes (cfr. fls. 41):
«(…) O disposto no art. 75°-A, n.º 1, da LTC exige que, no requerimento de interposição de recurso, se indique a alínea do n.º 1 do art. 70º ao abrigo do qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie.
E, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, deve também dele constar a peça processual onde a questão da inconstitucionalidade foi suscitada e a indicação da norma ou princípio constitucional que se considera violado.
Assim, nos termos dos arts. 75°-A, n.º 5 e 76.°, n.º 2, da LTC convida-se o recorrente a indicar, no prazo de 10 dias, os elementos acima referidos, sob pena de o requerimento de interposição de recurso ser indeferido. (…)».
4. O ora reclamante respondeu ao convite nos termos seguintes (cfr. fls. 43-44):
« A., interpôs recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, face ao indeferimento da Reclamação apresentada no Supremo Tribunal de Justiça, face à não admissão de recurso apresentado anteriormente para o mesmo Supremo Tribunal de Justiça.
Foi agora, o recorrente e alegante convidado a indicar a alínea do nº 1 do art. 70 ° da Lei do Tribunal Constitucional, ao abrigo do qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie.
Igualmente, nos termos do n°2 do mesmo artigo, deve também indicar-se a peça processual onde a questão da inconstitucionalidade foi suscitada e a indicação da norma ou princípio constitucional que se considera violado.
Conquanto não se indique explicitamente, no recurso, qual a alínea ao abrigo da qual o recurso é interposto, sempre se dirá e vinha efetivamente explicado no preâmbulo do articulado, sem indicação precisa da alínea, é certo, mas será a alínea b) do referido n°1 do art° 70° que determina a possibilidade e motivo do presente recurso.
A peça ou melhor as peças processuais onde a questão foi suscitada são exatamente o recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa e o recurso apresentado no Supremo Tribunal de Justiça.
As normas violadas ou melhor dizendo, no caso presente os princípios constitucionais que se consideram violados, são exatamente os artigos 202° e seguintes da Constituição da República Portuguesa.
Prestados os pertinentes esclarecimentos, requeridos no douto despacho, deverá o recurso subir ao Venerando Tribunal Constitucional, para adequada e própria apreciação, fazendo-se a final a sempre desejada Justiça.
5. Na sequência da resposta do ora reclamante o STJ proferiu, em 7/1/2013, despacho de não admissão do recurso interposto para este Tribunal com os fundamentos seguintes (cfr. fls. 46-47):
«A fls. 68 foi o recorrente A. convidado, ao abrigo do art. 75.°-A, nº 5, da LTC, a indicar, no prazo de 10 dias, a alínea do art. 70.° da LTC ao abrigo da qual pretendia recorrer para o Tribunal Constitucional, a norma cuja inconstitucionalidade pretendia ver apreciada, a peça processual onde tinha suscitado a questão da inconstitucionalidade e a norma ou princípio constitucional que considerava violado.
Em resposta, apresentou o recorrente o requerimento de fls. 70 e 71, onde refere que o recurso é interposto nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 70.° da LTC, e que os princípios constitucionais que considera violados são os arts. 202.° e seguintes da CRP. Acrescenta que suscitou a questão da inconstitucionalidade no recurso interposto para o Tribunal da Relação e no recurso apresentado no Supremo Tribunal de Justiça.
Mostra-se, assim, não satisfeito o convite na sua totalidade e, consequentemente, não cumprida a exigência da parte final do nº 1 do art. 75.°-A da Lei do Tribunal Constitucional, ou seja, a indicação da norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie.
Assim sendo, o requerimento de interposição de recurso tem, desde logo, de ser indeferido, nos termos do art. 76.°, nº 2, 1ª parte, da LTC.
De qualquer modo, face ao disposto no nº 2 do art. 72.° da LTC, o recurso previsto na alínea b) do nº 1 do art. 70.° da LTC só pode ser interposto pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer».
Se a questão da inconstitucionalidade foi suscitada pelo recorrente nas peças processuais que refere na resposta à notificação, e não na reclamação, como também dela resulta, não podia igualmente, por este motivo, o recurso ser admitido.
Nestes termos, não se admite o recurso interposto para o Tribunal Constitucional. (…)»
6. O ora recorrente apresentou pedido de esclarecimento sobre os fundamentos da não admissão, pelo STJ, do recurso para o TC (cfr. fls.49-50), nos termos seguintes:
«A., interpôs recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, face ao indeferimento da Reclamação apresentada no Supremo Tribunal de Justiça, face à não admissão de recurso apresentado anteriormente para o mesmo Supremo Tribunal de Justiça.
Foi, posteriormente, o recorrente e alegante convidado a indicar a alínea do n°1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional, ao abrigo do qual recurso era interposto e a norma cuja inconstitucionalidade se pretendia que o Tribunal aprecie.
Nos termos do n°2 do mesmo artigo, foi também, o recorrente, convidado a indicar a peça processual onde a as normas violadas, no caso presente os princípios constitucionais que se consideraram violados, e que são exatamente os artigos 202° e seguintes da Constituição da República Portuguesa. questão da inconstitucionalidade foi suscitada e a indicação da norma ou princípio constitucional que se considera violado.
No âmbito do referido convite, indicou o recorrente e alegante que era exatamente a alínea b) do referido n°1 do art° 70° que determinava a possibilidade e motivo do presente recurso.
Mais se indicaram as peças processuais onde a questão foi suscitada, sendo exatamente o recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa e o recurso apresentado no Supremo Tribunal de Justiça.
Também se indicaram as normas violadas, no caso presente os princípios constitucionais que se consideraram violados, e que são exatamente os artigos 202° e seguintes da Constituição da República Portuguesa.
Prestados os entendidos esclarecimentos, foi com surpresa que o recorrente recebeu o douto despacho, onde se decidia não admitir o recurso.
Porque manifestamente, cremos estarem preenchidos todos os requisitos legais, vem requerer-se esclarecimento sobre os fundamentos que determinaram tal decisão, uma vez que do teor do despacho não se alcança a falta que determina a não admissão do recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, para adequada e própria apreciação, fazendo-se a final a sempre desejada Justiça.».
7. O STJ proferiu o seguinte despacho (cfr. fls. 51):
«(…) 1. O arguido A., notificado do despacho de fls. 77 e 78, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, veio requerer o seu esclarecimento.
2. O despacho que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional não é suscetível de qualquer esclarecimento, considerando os poderes do tribunal recorrido, limitados à dicotomia (admissibilidade ou inadmissibilidade) art. 76.°, nº 1, da Lei 28/82, de 15 de novembro, atual redação.
Do despacho que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional apenas cabe reclamação para o TC, nos termos do art. 76.°, nº 4, da referida Lei.
Por não ser admissível, não se toma, assim, conhecimento de pedido de esclarecimento.
Não sendo o pedido de esclarecimento ato processualmente admissível no caso de decisão de não admissibilidade do recurso e como não foi no prazo devido apresentada reclamação para o TC (10 dias a contar da notificação do despacho que não admitiu o recurso - art. 405.°, nº 2, do CPP), baixem os autos.»
8. O ora recorrente reclamou do despacho anterior com os seguintes fundamentos (cfr. fls 53-54):
«A., Reclamante no processo acima identificado, tendo apresentado recurso para o Venerando Tribunal Constitucional, que não foi admitido por V. Excelências, mesmo na sequência do convite e explicitação da questão da inconstitucionalidade suscitada, apresentou, o Reclamante, um pedido de esclarecimento sobre a decisão da não admissibilidade.
Veio, esse também Venerando Tribunal, esclarecer que o despacho que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional não é suscetível de qualquer esclarecimento!
Reforçando, que tal entendimento dimana do teor do n°1 do art° 76° da Lei 28/82 de 15 de novembro, na sua atual redação...
Acontece que do teor de tal preceito não resulta, nem da letra, nem no espírito, que tal despacho, como qualquer outro despacho ou decisão judicia1, não seja suscetível de um pedido de esclarecimento se a parte não entender o que se pretende ou o que resulta de tal despacho, e o porquê.
Na verdade tendo sido indicado no âmbito do convite formulado, os exatos e legítimos contornos da reclamação, não se alcança e contínua sem se alcançar o motivo do indeferimento.
No entanto, e sendo entendido, por V. Excelências nada haver para esclarecer no despacho em causa, entende-se, que deverá a reclamação atempadamente apresentada seguir, como se requeria, para o Venerando Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no n°2 do art° 405° do CPP.
9. Finalmente, o STJ proferiu em 12/02/2013 despacho de admissão da reclamação para a conferência (cfr. fls. 57) nos termos seguintes:
«Embora com dúvidas, que decorrem dos termos do requerimento de fls. 90/91, em que se refere o artigo 405.°, nº 2 CPP (não aplicável no caso de reclamação para o Tribunal Constitucional, que está prevista no artigo 76.°, nº 4 da Lei nº 28/82, de 15 de novembro), e uma Reclamação atempadamente apresentada — que, como tal para o Tribunal Constitucional, não consta do processo,
- interpreto o requerimento de fls. 90/91 como reclamação para o Tribunal Constitucional.
Assim, instruída com a petição da reclamação (fls. 2); decisão sobre a reclamação e subsequentes (fls. 37 e segs; fls. 42 e segs; fls. 68; fls. 70/1; 77 e seg.; 80/81; 84 e 90/1 remeta ao Tribunal Constitucional.».
10. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal concluiu pelo indeferimento da reclamação, nos termos e com os fundamentos seguintes (cfr. fls. 61-62):
«1. A. interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão que, na Relação de Lisboa, julgando procedente o recurso interposto pelo Ministério Público revogou a suspensão da execução da pena de prisão que lhe havia sido aplicada, determinando o seu cumprimento.
2. Como o recurso não foi admitido, o arguido reclamou para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
3. O Senhor Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação.
4. Dessa decisão recorreu o arguido para o Tribunal Constitucional.
5. Não obedecendo o requerimento aos requisitos legalmente exigidos (artigo 75.º-A, n.ºs 1 e 2 da LTC), foi o recorrente notificado nos termos e para os efeitos do n.º 5 daquele artigo 75.º-A.
6. Porque a resposta apresentada pelo recorrente continuava a não satisfazer as exigências legais e não havia sido suscitada previamente qualquer questão de inconstitucionalidade, o recurso não foi admitido.
7. Após algumas vicissitudes processuais o Senhor Vice-Presidente ainda que “com dúvidas” aceitou que um pedido de aclaração do despacho que não admitiu o recurso, fosse considerado como reclamação para o Tribunal Constitucional, dessa mesma decisão.
8. Ora, independentemente das consequências processuais que se poderiam descortinar na tramitação dos autos após o despacho que não admitiu o recurso de constitucionalidade, parece-nos evidente que a reclamação deva ser indeferida.
9. Na verdade, mesmo após o convite, o recorrente não indica um elemento essencial e imprescindível: a norma cuja inconstitucionalidade pretende ver apreciada.
10. Por outro lado, residindo a inconstitucionalidade na inadmissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o momento processual adequado para suscitar qualquer questão de inconstitucionalidade sobre tal matéria, era a reclamação para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal.
11. Nessa peça não vem suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade, ali não se mencionando, sequer, qualquer princípio do preceito constitucional.
12. Por tudo o exposto, deve indeferir-se a reclamação.»
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
11. Após a resposta ao convite ao aperfeiçoamento, o STJ não admitiu o recurso interposto pelo ora reclamante para este Tribunal nos termos do artigo 76.º, n.º 2, 1.ª parte, da LTC, com base na falta de indicação da norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie, tal como exigido pelo artigo 75.º, n.º 1, parte final, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC); e, ainda, com base na falta de suscitação da questão de constitucionalidade «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida em termos de este estar obrigado a dela conhecer», tal como exige o n.º 2 do artigo 72.º da mesma Lei, por entender que «Se a questão da inconstitucionalidade foi suscitada pelo recorrente nas peças processuais que refere na resposta à notificação, e não na reclamação, como também dela resulta, não podia igualmente, por este motivo, o recurso ser admitido».
12. Tendo o STJ, por despacho de 12/02/2013, aceite que o pedido de aclaração do despacho que não admitiu o recurso para este Tribunal (cfr. fls. 49-50), fosse considerado como reclamação para o Tribunal Constitucional, dessa mesma decisão, há que apreciar o teor de tal reclamação.
12.1 O ora reclamante nela não invocou qualquer argumento que contrarie os fundamentos da decisão do STJ de não admissão de recurso para este Tribunal, limitando-se a afirmar: que indicou as normas e princípios constitucionais que considera violados, a alínea do artigo 70.º da LTC ao abrigo do qual o recurso é interporto, as peças processuais onde considera que a questão de constitucionalidade foi suscitada (recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa e recurso apresentado no STJ) e, ainda, em geral, que foram prestados os esclarecimentos solicitados e que estão preenchidos «todos os requisitos legais».
12.2 Sucede porém que, como sublinha o representante do Ministério Público na sua resposta (cfr. n.º 9), o ora reclamante, mesmo após o convite, não indicou um elemento essencial e imprescindível à admissão do recurso para este Tribunal: a norma cuja inconstitucionalidade pretende ver apreciada.
12.3. Acresce que, não tendo a questão de constitucionalidade sido suscitada, conforme resulta dos autos, na reclamação para o Senhor Presidente do STJ – que seria, como referem o STJ e o representante do Ministério Público junto deste Tribunal (cfr. n.º 10 e n.º 11) o momento processual adequado para suscitar uma questão de inconstitucionalidade – por dela não constar a suscitação de qualquer questão de constitucionalidade ou a menção de qualquer princípio ou preceito constitucional, tem de concluir-se que a questão de constitucionalidade não foi colocada de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida em termos de este estar obrigado a dela conhecer, pelo que o recurso para este Tribunal não pode, também por esta razão, ser admitido.
III – Decisão
13. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC, nos termos dos artigos 7.º e 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro.
Lisboa, 23 de maio de 2013. – Maria José Rangel de Mesquita – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.