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Processo n.º 171/13
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A., S.A. e reclamada B., Ld.ª, a primeira reclamou, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho de 18 de dezembro de 2012, que não admitiu recurso para o Tribunal Constitucional.
2. A reclamante recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa de despacho que julgou parcialmente procedente a reclamação por si deduzida contra uma conta de custas, tendo sido concedido provimento parcial ao agravo.
Interpôs, então, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento em oposição de julgados, que acordou em não conhecer do objeto do recurso, por o mesmo não ser admissível. Lê-se neste acórdão que «não se demonstrando a contradição de julgados, não há fundamento para o recurso, ficando, consequentemente, precludida a questão de mérito».
3. Notificada desta decisão, a reclamante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, através de requerimento onde se pode ler o seguinte:
«1. A ora recorrente, não se conformando com o decidido no douto Acórdão deste Venerando
Supremo Tribunal, de 2012.11.15, e no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.11.17, vem deles recorrer para o Venerando Tribunal Constitucional, nos termos dos arts. 69º e segs. da Lei do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei 28/82, de 15 de novembro.
2. O presente recurso tem como fundamento a questão da inconstitucionalidade do art. 13º/1 do Código das Custas Judiciais, na redação do DL 224-N/1996, de 26 de novembro, e da respetiva tabela anexa, face às normas e princípios constitucionais consagrados nos arts. 2º, 13º, 18º e 20º/1 da CRP, quando interpretado e aplicado com a dimensão e sentido normativos que permitem a aplicação de taxas de justiça elevadas à parte vencedora, tendo apenas como pressuposto o valor da causa para efeito de custas, sem qualquer limite máximo, nem qualquer adequação e proporcionalidade ao serviço judicial efetivamente prestado, não permitindo que o julgador limite esse valor, face à simplicidade da causa e ao caráter manifestamente desproporcionado do montante em questão (v. art. 70º/1/b) e g) da LTC; cfr. Acs. TC nº. 116/2008, de 2008.02.20, Proc. 141/06; nº. 471/2007, de 2007.09.25, Proc. 317/07; nº. 470/07, de 2007.05.29, Proc. 647/06; e 227/2007, de 2007.03.28, Proc. 946/05, todos in www.tribunalconstitucional.pt).
(…)
4. Registe-se desde já que, conforme resulta do art. 70º/2, 4 e 6 da LTC, no caso de recurso “destinado a uniformização de jurisprudência” (v. art. 70º/2 da LTC), que “não possam ter seguimento por razões da ordem processual” (v. art. 70º/4 da LTC), o recurso para o Venerando Tribunal Constitucional não tem que ser interposto de decisão que aplicou ou recusou a aplicação de norma reputada de inconstitucional, mas sim da “ulterior decisão que confirme a primeira” (v. art. 70º/6 da LTC), ou seja, do douto acórdão deste Venerando Supremo Tribunal, de 2012.11.15 (cfr. Ac. TC n.º 411/00, Proc. 501/2000; cfr. no mesmo sentido, Ac. TC nº. 345/05, Proc. 405/2000, n.º 331/2005, Proc. 396/05, ambos in www.tribunalconstitucional.pt).
Nesta conformidade, o presente recurso tem como objeto a decisão desfavorável do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, independentemente de esta constituir decisão de mérito – aplicando ou recusando a aplicação de qualquer norma inconstitucional – ou simples decisão que ponha termo ao recurso por oposição de julgados, não decidindo de mérito, nem conhecendo do recurso (v. art. 70º/6 da LTC)».
4. Foi então proferido o despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade, com a seguinte fundamentação:
«A recorrente vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão deste STJ de 15/11/2012 e do acórdão da Relação de Lisboa de 17/11/2011, nos termos dos artigos 69 e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional, tendo como fundamento a questão da inconstitucionalidade do artigo 13º, n.º 1 do Código das Custas Judiciais, na redação do DL 224-A/1996, de 26 de novembro e da respetiva tabela anexa, face às normas consagradas nos artigos 2,º 13º, 18º e 20º, n.º 1 da CRP, “quando interpretado e aplicado com a dimensão e sentido normativos que permitem a aplicação de taxas de justiça elevadas à parte vencedora, tendo apenas como pressuposto o valor da causa para efeito de custas, sem qualquer limite máximo, nem qualquer adequação e proporcionalidade ao serviço judicial efetivamente prestado, não permitindo que o julgador limite esse valor, face à simplicidade da causa e ao caráter manifestamente desproporcional do montante em questão” (artigo 70º, n.º 1, alínea b) da LTC.
Quid iuris?
Dispõe o artigo 70º, n.º 1, alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional que “cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo”.
Acrescenta o n.º 2 desse artigo 70º que os recursos previstos na alínea b) do n.º 2 anterior apenas cabem de decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam, salvo os destinados a uniformização de jurisprudência.
Esclarece, por sua vez, o n.º 4 do citado artigo que “se entende que se acham esgotados todos os recursos ordinários quando (...) os recursos interpostos não possam ter seguimento por razões de ordem processual”.
Finalmente, determina o n.º 6 que, “se a decisão admitir recurso ordinário, mesmo que para uniformização de jurisprudência, a não interposição do recurso para o Tribunal Constitucional não faz precludir o direito de interpô-lo de ulterior decisão que confirme a primeira”.
No caso não foi interposto recurso para uniformização de jurisprudência. O recurso que a recorrente interpôs assentou no disposto do n.º 2 do artigo 754º do CPC, 2ª parte, sendo seu fundamento a oposição de julgados.
Ora, como se referiu no acórdão recorrido (fls. 198/199), por princípio, não era admissível recurso do acórdão da Relação, a não ser que o mesmo estivesse em oposição com outro proferido, no domínio da mesma legislação, pelo Supremo ou por qualquer Relação (...) (vide artigo 754º, n.º 2 e 678, n.º 4, ambos do CPC).
Ao interpor recurso para o STJ com esse fundamento, a recorrente sabia de antemão que só seria apreciada a questão de mérito, se acaso se verificasse a alegada oposição de julgados.
Porque a mesma se não verificava, o STJ, não sendo admissível o recurso, não conheceu de mérito, não tomando, por isso, conhecimento da questão suscitada – a alegada inconstitucionalidade do artigo 13º, n.º 1 do Código das Custas Judiciais.
Assim sendo, não aplicou a norma cuja interpretação é considerada pela recorrente ferida de inconstitucionalidade nem confirmou ou deixou de confirmar a decisão recorrida.
Nestas circunstâncias, está vedado à recorrente o recurso para o Tribunal Constitucional, face ao disposto nos n.os 1, alínea b) e 6, ambos do artigo 70º da LTC».
5. A presente reclamação tem como objeto esta decisão de não admissão do recurso de constitucionalidade, tendo sido aduzidos os seguintes fundamentos:
«1. Em 2012.11.26, a ora reclamante interpôs recurso para este Venerando Tribunal Constitucional, dos doutos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 2012.11.15, e do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.11.17, ao abrigo do disposto no art. 70º/1/b) e g) da LTC, e com fundamento na inconstitucionalidade do art. 13º/1 do Código das Custas Judiciais, na redação do DL 224-A/1996, de 26 de novembro, e da respetiva tabela anexa, face às normas e princípios constitucionais consagrados nos arts. 2º, 13º, 18º e 20º/1 da CRP, interpretado e aplicado com a dimensão e sentido normativos que permitem a aplicação de taxas de justiça desproporcionadamente elevadas à parte vencedora, tendo apenas mo pressuposto o valor da causa para efeito de custas, sem qualquer limite máximo, nem qualquer adequação e proporcionalidade ao serviço judicial efetivamente prestado, não permitindo que o julgador limite esse valor, face à simplicidade da causa e ao caráter manifestamente desproporcionado do montante em questão (v. Acs. TC nº. 116/2008, de 2008.02.20, Proc. 141/06; nº. 471/2007, de 2007.09.25, Proc. 317/07; nº, 470/07, de 2007.05.29, Proc. 647/06; e nº. 227/2007, de 2007.03.28, Proc. 946/05, todos in www.tribunalconstitucional.pt).
(…)
O douto despacho em análise decidiu que “o STJ, não sendo admissível o recurso, não conheceu de mérito, não tomando, por isso, conhecimento da questão suscitada – a alegada inconstitucionalidade do artigo 13º, n.º 1 do Código das Custas Judiciais (e) não aplicou a norma cuja interpretação é considerada pela recorrente ferida de inconstitucionalidade, nem confirmou ou deixou de confirmar a decisão recorrida”, tendo concluído que “está vedado à recorrente o recurso para o Tribunal Constitucional, face ao disposto nos nºs l, alínea b) e 6, ambos do artigo 70º da LTC” (v. fls. 211 dos autos).
Salvo o devido respeito – e é verdadeiramente muito – cremos que, contrariamente ao decidido no douto despacho reclamado, o recurso em causa deverá ser admitido.
3. Conforme resulta da análise do art. 70º/2, 4 e 6 da LTC, no caso de recurso “destinado a uniformização de jurisprudência” (v. art. 70º/2), que “não possam ter seguimento por razões da ordem processual” (v. art. 70º/4), o recurso para este Venerando Tribunal Constitucional não deve ser interposto de decisão que aplicou ou recusou a aplicação de norma refutada de inconstitucionalidade – in casu do aresto do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.11.17 – mas sim da “ulterior decisão que confirme a primeira” (v. art. 70º/6), ou seja, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2012.11.15, que por razões processuais, rejeitou o recurso interposto por oposição de acórdãos.
Nesta linha, considerando a aplicação das normas transcritas, no douto Ac. TC n.º 411/00, de 2000.10.03, proferido no processo n.º 501/2000, decidiu-se o seguinte:
“De facto, quando determinada decisão de um tribunal (no caso, do Tribunal Central Administrativo) apenas admita o recurso fundado em oposição de julgados (ou seja, o recurso destinado a uniformização da jurisprudência), a parte que, durante o processo, acaso tenha suscitado a inconstitucionalidade de uma norma legal e tenha visto a sua pretensão desatendida, pode recorrer imediatamente dessa decisão para o Tribunal Constitucional (cf. artigos 70º, nos 1, alínea b) e 2, e 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional). Ou seja: mesmo que, na respetiva ordem jurisdicional, o recurso para uniformização de jurisprudência seja um recurso ordinário, o ónus da exaustão deste tipo de recursos não lhe impõe que, antes de recorrer para o Tribunal Constitucional, recorra para o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo.
A imediata interposição do recurso de constitucionalidade, num tal caso, não priva a parte do direito de, posteriormente, interpor recurso de uniformização de jurisprudência: é que, se o Tribunal Constitucional não conhecer do recurso para si interposto ou lhe negar provimento, só então começa a correr o prazo para a interposição do recurso ordinário de uniformização de jurisprudência para o Peno do Supremo Tribunal Administrativo (cf. artigo 80º, nº 4. in fine).
A parte pode, no entanto, optar por, em vez de recorrer logo para o Tribunal Constitucional, interpor recurso para o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, para uniformização de jurisprudência, da decisão do Tribunal Central Administrativo.
Se assim proceder, também a parte não verá precludida a possibilidade de impugnar perante o Tribunal Constitucional a decisão do Pleno que, acaso, lhe seja desfavorável. E isso, quer o Peno profira decisão de mérito, quer, por entender que se não verifica a invocada oposição de julgados, não conheça do recurso: de facto, a não interposição de recurso para o Tribunal Constitucional da decisão do Tribunal Central Administrativo não faz precludir o direito de o interpor da decisão do Pleno que a confirma (cf. o citado artigo 70º, nº 6)” (cfr., no mesmo sentido, Ac. TC n.º 331/2005, Proc. 396/05, in www.tribunalconstitucional.pt).
Como resulta claramente da douta decisão transcrita, entendeu-se que o recurso a interpor para este Venerando Tribunal Constitucional poderá ter como objeto a decisão desfavorável do Supremo Tribunal de Justiça, independentemente de esta constituir decisão de mérito – aplicando ou recusando a aplicação de qualquer norma inconstitucional –, ou simples decisão que ponha termo ao recurso por oposição de julgados, não decidindo de mérito, nem conhecendo do recurso, em conformidade com o disposto no art. 70º/6 da LTC, como se verificou no caso sub judice.
Além disso, registe-se que a ora reclamante recorreu não só do acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 2012.11.15, mas também do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.11.17.
Acontece que, no douto Ac. TC n.º 133/2005, de 2005.03.15, proferido no processo n.º 110/2005, considerando a aplicação dos mesmos incisos do art. 70º da LTC, decidiu-se, em situação absolutamente idêntica e paralela, o seguinte:
“O recurso de constitucionalidade não foi admitido por despacho de fls. 351. É o seguinte o teor do referido despacho:
O Acórdão deste STA de fls. 338/341 não se pronunciou sobre qualquer questão de constitucionalidade, não tendo tomado posição sobre o acerto ou desacerto do acórdão do tribunal “a quo”, na medida em que se limitam a emitir uma pronúncia em sede dos requisitos de admissibilidade do recurso de revista, previsto no art. 150º do CPTA, concluindo pela não admissão do recurso interposto pelo recorrente.
Temos, assim, que a única norma aplicada no dito Acórdão foi o já citado art. 150º, preceito cuja inconstitucionalidade o recorrente não suscitou.
Nestes termos, não se admite o recurso para o Tribunal Constitucional.
O despacho reclamado não admitiu o recurso de constitucionalidade interposto uma vez que considerou que tal recurso foi interposto do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de dezembro de 2004.
No entanto, é manifesto que o recurso de constitucionalidade foi interposto do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 22 de setembro de 2004, que efetivamente procedeu à desaplicação com fundamento em inconstitucionalidade das normas jurídicas submetidas à apreciação do Tribunal Constitucional. Com efeito, a circunstância de o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade ter sido endereçado ao Conselheiro Relator no Supremo Tribunal Administrativo e não ao Desembargador no Tribunal Central Administrativo Sul não se afigura relevante no caso dos autos, já que em face do teor de tal requerimento é inequívoca a pretensão de interposição de recurso da decisão do Tribunal Central Administrativo e não da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo: é suficientemente percetível que o recorrente pretende interpor recurso da decisão que procedeu à desaplicação de normas com fundamento em inconstitucionalidade e que essa decisão é a proferida pelo Tribunal Central Administrativo.
Assim, cabe apreciar se o recurso de constitucionalidade é admissível, após a prolação do acórdão de 9 de dezembro de 2004, que não admitiu o recurso interposto ao abrigo do artigo 150º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
De acordo com o artigo 70º, nº 4, da Lei do Tribunal Constitucional, entende-se que se acham esgotados todos os recursos ordinários quando os recursos interpostos não possam ter seguimento por razões de ordem processual.
Por outro lado, o nº 2 do artigo 75º da Lei do Tribunal Constitucional determina que o prazo para a interpretação do recurso de constitucionalidade se conta a partir do momento em que se torna definitiva a decisão que não admitiu o recurso ordinário entretanto interposto.
Por último e decisivamente, o artigo 70º, nº 6, da Lei do Tribunal Constitucional, determina que a não interposição de recurso para o Tribunal Constitucional por força da opção pela interposição de recurso ordinário, não preclude o direito de interpô-lo ulteriormente.
Ora, no presente caso foi interposto um recurso da decisão do Tribunal Central Administrativo para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do artigo 150º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, recurso esse que não foi admitido pelo tribunal ad quem. Após a prolação da decisão de rejeição do recurso interposto para o Supremo Tribunal Administrativo, ainda era legalmente possível interpor o recurso de constitucionalidade da decisão do Tribunal Central Administrativo. A própria lei do Tribunal Constitucional prevê, no preceito relativo ao prazo de interposição do recurso de constitucionalidade, a interposição de recurso ordinário não admitido, bem como, no referido artigo 70º, nº 6, a possibilidade de interposição de recurso de constitucionalidade depois da interposição do recurso ordinário.
Desse modo, a presente reclamação será deferida.” www.tribunalconstitucional.pt).
Conforme resulta da douta decisão transcrita, os arestos do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal da Relação de Lisboa sub judice podem e devem ser objeto do re4curso a interpor para este Venerando Tribunal Constitucional (v. art. 70º/6 da LTC, pois como se refere no douto acórdão transcrito, “ o recorrente pretende interpor recurso da decisão que procedeu à desaplicação de normas com fundamento em inconstitucionalidade e que essa decisão é a proferida pelo Tribunal Central Administrativo”.
Em abono deste entendimento, sublinhe-se ainda que nos termos dos artigos 70º/1/b) e 72º/2 da LTC, são pressupostos objetivos do recurso interposto para este Venerando Tribunal Constitucional:
(…)
É manifesto que a ora reclamante suscitou no decurso do processo a “questão de constitucionalidade normativa” como resulta claramente do seguinte:
(…)
Além disso, no douto acórdão Tribunal da Relação de Lisboa recorrido, de 2011.11.17, que julgou parcialmente improcedente o recurso interposto do despacho, de 2010.10.26, que tinha indeferido a reclamação de conta de custas deduzida pela ora recorrente, em 2010.09.14, considerando “não se(r) desproporcionado o (...) montante” de custas da responsabilidade da parte que obteve vencimento total da causa, decidiu-se expressamente que “não foram assim violados os (...) artigos 2º, 9º, 13º, l8º e 20º da Constituição da República Portuguesa (...) nem o artigo lº do Protocolo n.º l da Convenção Europeia dos Direitos do Homem”.
Nesta conformidade, o Venerando Supremo Tribunal de Justiça podia e devia conhecer das questões de constitucionalidade invocadas pela ora reclamante ao longo de todo o processo, já que as mesmas foram expressamente alegadas na reclamação da conta de custas apresentada, em 2010.09.14, nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.02.23 (v. conclusões 2ª, 3ª e 7ª; cfr. Texto nºs. 1 a 5), no requerimento de interposição de recurso por oposição de julgados apresentado, em 2011.11.30, e nas alegações de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, de 2012.01.24 (v. conclusões 3ª a 7ª; cfr. Texto nºs. 3 a 9), inscrevendo-se assim na sua esfera de “competência vinculada” (v. Ac. TC 162/92, de 6 de maio, Proc. 241/91, Cons. Messias Bento, www.tribunalconstitucional.pt).
5. Registe-se ainda que, a propósito do requisito da aplicação efetiva da norma julgada inconstitucional, este Venerando Tribunal Constitucional tem pacifica e uniformemente entendido que “há aplicação da norma para efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 não só nos casos de aplicação expressa, como também nos casos da aplicação implícita”(v. Ac. TC 406/87, de 7 de outubro, Proc. 82/87, www.dgsi.pt cfr. Acs. TC 9/06, de 5 de janeiro, Proc. 480/05; 454/03, de 14 de outubro, Proc. 458/03; 445/99, de 8 de julho, Proc. 37/99; 11/99, de 12 de janeiro, Proc. 271/97; 1081/96, de 23 de outubro, Proc. 438/96; 226/94, de 8 de março, Proc. 47/93; 160/91, de 4 de abril, Proc. 720/00; 47/90, de 21 de fevereiro, Proc. 87/89, todos in www.tribunalconstitucional.pt 721/97, de 23 de dezembro, Proc. 392/97; 637/96, de 7 de maio, Proc. 252/95; 234/96, de 29 de fevereiro, Proc. 178/95; 33/96, de 17 de janeiro, Proc. 789/92; 235)93, de 13 de março, Proc. 611/92; 69/92, de 24 de fevereiro, Proc. 219/91; 20/91, de 5 de fevereiro, Proc. 203/90; 207/86, de 12 de junho, Proc. 95/86; 158/86, de 14 de maio, Proc. 31/86; 88/86, de 19 de março, Proc. 171/89; 1 12/85, de 2 de julho, Proc. 179/84, todos in www.dgsi.pt).
Conforme tem decidido o Venerando Tribunal Constitucional, verifica-se aplicação normativa implícita sempre que:
(…)
5.1. Por um lado como se demonstrou anteriormente (v. supra n.º 3), o Venerando Supremo Tribunal de Justiça podia e devia conhecer da questão de constitucionalidade, já que a mesma foi expressamente suscitada no texto nºs. 3 a 9 e nas conclusões 3ª a 7ª das alegações de recurso do decidido no douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.11.17, apresentadas, em 2012.01.24, inscrevendo-se assim na sua esfera de “competência vinculada” (v. Ac. TC 162/92, de 6 de maio, Proc. 241/91, Cons. Messias Bento, www.tribunalconstitucional.pt).
5.2. Por outro lado, o douto acórdão do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 2012.11.15, ao não admitir recurso por oposição de julgados interposto, em 2011.11.30, manteve a aplicação de uma norma reputada de inconstitucional, na sequência do entendimento do douto Tribunal da Relação de Lisboa.
Nesta linha, no douto acórdão do Venerando Tribunal Constitucional, de 1996.05.07, decidiu-se o seguinte:
“Porque a questão de constitucionalidade se prende diretamente com o objeto do recurso interposto – o seu julgamento acha-se dependente do próprio âmbito de cognição daquele tribunal – tem de considerar-se que no acórdão recorrido se fez aplicação implícita das normas cuja constitucionalidade se havia anteriormente suscitado (v. Ac. TC 637/96, Proc. 252/95, Cons. Monteiro Diniz, in www.tribunalconstitucional.pt).
É pois manifesto que, contrariamente ao decidido no douto despacho reclamado, nunca poderia deixar de ser admitido o recurso para este Venerando Tribunal Constitucional, considerando que “o STJ (...) não aplicou a norma cuja interpretação é considerada pela recorrente ferida de inconstitucionalidade, nem confirmou ou deixou de confirmar a decisão recorrida” pois, para além de ter rejeitado o recurso por oposição de acórdãos, o Venerando Supremo Tribunal de Justiça confirmou a anterior decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 2011.11.17, que constitui igualmente objeto do presente recurso e apreciou expressamente a questão de inconstitucionalidade em causa».
6. Neste Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se pelo deferimento da reclamação, nos seguintes termos:
«3. É deste despacho que vem interposta a presente reclamação por não admissão de recurso (cfr. fls. 214-224 dos autos), em que a Ré invoca, novamente, com ampla citação de jurisprudência constitucional, a inconstitucionalidade do art. 13º, nº 1, do Código das Custas Judiciais, na redação do Decreto-Lei 224-A/96, de 26 de novembro e da respetiva tabela anexa, por violação dos arts. 2º, 13º, 18º e 20º, nº 1 da Constituição.
4. É um facto, que a decisão do Ilustre Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, de não admissão do recurso de inconstitucionalidade oportunamente interposto pela interessada, tem, subjacente, argumentação sedutoramente convincente.
5. No entanto, também não é menos verdade, que a Ré tem vindo a suscitar a inconstitucionalidade da disposição referida, persistentemente, desde a primeira instância, quer no recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa (cfr. fls. 50-70, maxime, 56-63 dos autos), quer no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (cfr. fls. 115-141, maxime 123-135 dos autos), não se vendo que outra argumentação poderia ter utilizado, com este objetivo.
Assim, a questão de constitucionalidade foi devidamente suscitada perante os tribunais de recurso, de modo a estes, sobre tal questão, se poderem pronunciar.
6. Acresce que, relativamente à oposição de julgados, a interessada identificou devidamente os dois Acórdãos em questão (acórdão recorrido e acórdão-fundamento), tendo dedicado algum espaço à questão da matéria de facto subjacente a cada um desses acórdãos, tendo mesmo citado, nas suas alegações de recurso, extratos de qualquer um dos dois acórdãos referidos (cfr. designadamente fls. 117-123 dos autos).
Sendo certo, por outro lado, que a matéria de facto de ambos os Acórdãos se encontra devidamente escalpelizada em cada um deles, logo, facilmente apreensível pelo tribunal ad quem.
7. Por todas estas razões, crê-se que assiste razão à interessada, pelo que se crê que o seu recurso de constitucionalidade deve ser admitido por este Tribunal Constitucional.
A aceitar-se a decisão de não admissão de recurso, por parte do Supremo Tribunal de Justiça, o processo regressará ao Tribunal da Relação de Lisboa, de onde poderá ser, então, interposto recurso de constitucionalidade pela Ré, quanto à questão jurídica em apreciação.
Nessa medida, até mesmo por uma questão de economia processual, crê-se fazer sentido que o Tribunal Constitucional aprecie, desde já, essa questão, invocada pela interessada desde a primeira instância.
8. Pelos motivos invocados, crê-se que a presente reclamação, por se encontrar devidamente fundamentada e com apoio em ampla jurisprudência deste Tribunal Constitucional, deverá merecer provimento por parte deste Tribunal».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Nos presentes autos foi proferido despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade interposto, por se ter entendido que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de novembro de 2012 não «aplicou a norma cuja interpretação é considerada pela recorrente ferida de inconstitucionalidade nem confirmou ou deixou de confirmar a decisão recorrida». A norma em causa é o artigo 13.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais, na redação do Decreto Lei n.º 224-N/1996, de 26 de novembro, e da respetiva tabela anexa, quando interpretado e aplicado com a dimensão e sentido normativos que permitem a aplicação de taxas de justiça elevadas à parte vencedora, tendo apenas como pressuposto o valor da causa para efeito de custas, sem qualquer limite máximo, nem qualquer adequação e proporcionalidade ao serviço judicial efetivamente prestado, não permitindo que o julgador limite esse valor, face à simplicidade da causa e ao caráter manifestamente desproporcionado do montante em questão.
Com efeito, no acórdão de 15 de novembro de 2012 não foi aplicada, como ratio decidendi, a norma cuja apreciação é requerida, não se podendo dar por verificado um dos requisitos do recurso de constitucionalidade interposto (artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC). Interposto recurso ao abrigo dos artigos 678.º, n.º 4, e 754.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, na redação anterior a 2003, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu apenas sobre a verificação dos requisitos de admissibilidade do recurso contemplado no n.º 4 do artigo 678.º no acórdão de 15 de novembro de 2012, já que decidiu não tomar conhecimento do objeto do mesmo, por não estar demonstrada a contradição de julgados. Ficando consequente, precludida a questão de mérito. Isto é, não foi aplicada, como razão de decidir, sequer implicitamente, norma reportada ao artigo 13.º, n.º 1, do Código das Custas Judiciais.
Face ao conteúdo da presente reclamação importa começar por afirmar que o recurso de constitucionalidade foi interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de novembro de 2012 e não também do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17 de novembro de 2011, o que torna irrelevante a argumentação aduzida no sentido de se poderem dar como verificados os requisitos do recurso que teria sido interposto desta última decisão. Com efeito, resulta do requerimento de interposição de recurso que a decisão recorrida é a primeira e não também a segunda. Louvando-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 411/2000 e no artigo 70.º, n.º 6, da LTC, a recorrente deixou claro naquela peça processual que o recurso de constitucionalidade «tem como objeto a decisão desfavorável do Venerando Supremo Tribunal de Justiça».
Esta especificação da recorrente assenta, porém, numa leitura do Acórdão n.º 411/2000 e do n.º 6 do artigo 70.º que ambos não permitem. Deste acórdão e desta disposição legal decorre apenas que a interposição de recurso ordinário para uniformização de jurisprudência, não faz precludir o direito de interpor recurso para o Tribunal Constitucional de ulterior decisão que confirme a decisão da qual foi interposto aquele recurso. Isto é: se for admitido o recurso para uniformização de jurisprudência e se for confirmada a decisão recorrida, a decisão que uniformiza jurisprudência e que, por isso conhece de mérito, é recorrível para o Tribunal Constitucional; se não for admitido o recurso para uniformização de jurisprudência, é recorrível para este Tribunal a decisão da qual foi interposto, contando-se o prazo a partir do momento em que se tornou definitiva a decisão que não o admite (artigo 75.º, n.º 2, da LTC), bem como a decisão de não admissão do recurso para uniformização de jurisprudência, caso em que o recurso de constitucionalidade tem como objeto, estritamente, as normas que sustentam a não admissibilidade daquele recurso (neste sentido, por referência ao Acórdão n.º 411/2000, cf. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 345/2005, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Em suma, como foi interposto recurso de constitucionalidade do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de novembro de 2012, que não conheceu do recurso interposto com fundamento em oposição de julgados, há que confirmar a decisão de não admissão daquele recurso.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e confirmar a decisão de não admissão do recurso de constitucionalidade interposto.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 9 de abril de 2013. – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria Lúcia Amaral.