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Processo n.º 691/12
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Fernando Ventura
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Notificado do Acórdão n.º 578/12, que indeferiu a reclamação apresentada da decisão sumária n.º 514/12, em que se decidiu não conhecer do recurso para o Tribunal Constitucional interposto pelo arguido A., veio o recorrente arguir a nulidade do mesmo, e bem assim requerer a sua aclaração e correção.
Argumentou, para o efeito, nos seguintes termos:
“(...)
Da nulidade por falta de fundamentação
Salvo o devido respeito que é muito e absolutamente merecido – e melhor opinião, a Colenda Conferência do Tribunal Constitucional não deu, no douto Acórdão aqui posto em crise, cabal cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 374º do Código Processo Penal, uma vez que, não fez uma exposição completa dos motivos de facto e direito que fundamentaram a decisão, e que serviram para formar a convicção no sentido de ser indeferida a reclamação.
Na douta decisão, salvo o devido respeito e melhor opinião, estão vertidas apenas algumas considerações genéricas e ainda algumas considerações conclusivas, limitando-se a fazer uma mera remissão para os argumentos expendidos aquando a decisão sumária que decidiu pelo não conhecimento do objeto do recurso.
Ora, salvo o devido respeito, no acórdão ora em crise, teria que se fazer uma exposição completa dos motivos de facto e direito que fundamentaram a decisão, o que não fez.
A douta Conferência cingiu-se a afirmar de forma genérica que “Assim sendo, temos que o recorrente procura apenas a reapreciação da sua pretensão, agora pela conferência, sem o menor acrescento ou esforço argumentativo capaz de postergar o duplo fundamento em que assentou a decisão singular: inverificação de suscitação, de modo processualmente adequado, perante o Tribunal recorrido, da questão de constitucionalidade; ausência de identidade entre o concreto fundamento decisório acolhido na decisão recorrida e o sentido normativo enunciado pelo recorrente.
Então por tudo o que referiu na decisão sumária, mantém-se a decisão de não conhecimento do recurso.”
Ora, ao não fundamentar devidamente a sua decisão, nem esclarecer devidamente todo o processo lógico mental de formação da convicção que lhes permitiu concluir que o Recorrente não suscitou de forma adequada a questão de constitucionalidade, o douto Acórdão é nulo, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 379º, n.º 1, alínea a) e 374º, n.º 2 do Código Processo Penal, o que aqui se invoca para os devidos e legais efeitos.
Pretende-se que o comum dos cidadãos possa compreender com clareza o porquê da decisão à luz das regras das regras da experiência comum pertinentes, bem como das normas lógicas e científicas, e não a explanação exaustiva do processo psicológico que conduz à convicção pois, em boa verdade, para além das dificuldades e limitações ao nível da sua expressão verbal, não pode sequer considerar-se sindicável o processo de formação da convicção em toda a sua extensão e profundidade, desde logo por falta de parâmetros lógicos e científicos que o permitam.
É, pois, neste quadro de fundo que deverá ser apreciada o cumprimento pelo Tribunal dessa exigência legal.
Assim e pelo exposto o Tribunal a quo ao não dar cabal cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 374º do Código Processo Penal, não permite aos sujeitos processuais proceder ao exame ou reexame do processo lógico ou racional que subjaz à convicção do julgador.
Face a natureza da motivação constante do douto Acórdão recorrido não é possível perceber-se a “ratio essendi” da decisão quanto à decisão de indeferimento da reclamação.
Logo, nos termos supra referidos, o douto Acórdão padece, deste modo, da nulidade prevista no artigo 379º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal, a qual aqui se suscita para os devidos e legais efeitos, sendo igualmente de conhecimento oficioso, face ao disposto no nº 2 do artigo 379º do Código de Processo Penal.
É neste contexto que os fundamentos invocados no douto Acórdão não são precisos nem suficientemente claros, devendo este Venerável Tribunal aclarar e corrigir a decisão.”
2. O Ministério Público tomou posição no sentido do indeferimento da arguição de nulidade, salientando que o regime subsidiariamente aplicável à tramitação dos recursos para o Tribunal Constitucional é o do Código de Processo Civil (artigo 69.º da LTC).
Cumpre decidir.
II. Fundamentação
3. Verifica-se, antes de mais, que embora o recorrente sustente a verificação do vício de nulidade, por falta de fundamentação, o pedido formulado dirige-se tão somente à aclaração e correção do Acórdão n.º 578/12.
Considera-se, porém, uma vez que o recorrente articula as duas questões – na sua ótica, os fundamentos da decisão são insuficientes e, nessa medida, imprecisos e desprovidos de clareza – que a pretensão de ver reconhecida a apontada nulidade encontra-se implícita no pedido formulado.
4. Começando pela arguição de nulidade, verifica-se que o recorrente estriba toda a sua argumentação na consideração de que Acórdão n.º 578/12 não deu cabal cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 374.º do Código de Processo Penal, uma vez que não fez uma exposição completa dos motivos de facto e de direito que fundamentaram a decisão, não esclareceu devidamente todo o processo lógico mental de formação da convicção e não explicitou a razão da decisão à luz das regras da experiência comum pertinentes.
Constata-se, assim, que o recorrente transpõe para a decisão do recurso de constitucionalidade as exigências de fundamentação que o legislador faz incidir sobre a motivação da sentença penal, conforme estabelecido no n.º 2 do artigo 374.º do Código de Processo Penal, e, nessa linha, conclui que o Acórdão n.º 578/12 padece de nulidade, por falta de fundamentação, com aplicação de outra regra do ordenamento processo penal: a alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º.
Não lhe assiste, porém, qualquer razão.
4.1. Em primeiro lugar, e como bem aponta o Ministério Público, o regime processual subsidiariamente aplicável aos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade (ou legalidade) encontra-se no processo civil, mesmo que o processo em que se inscreva tenha natureza penal, de acordo com o disposto no artigo 69.º da Lei 28/82, de 11 de novembro (LTC).
Assim, nem o n.º 2 do artigo 374.º, nem os n.ºs 1 e 2 do artigo 379.º, ambos do Código de Processo Penal, encontram aplicação na tramitação do recurso perante o Tribunal Constitucional. Regem, na apreciação da questão colocada, os termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º, do Código de Processo Civil (aplicável em sede de recurso, nos termos dos artigos 716.º e 732.º), onde se estipula a nulidade da sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão, feitas as devidas adaptações ao processo perante o Tribunal Constitucional.
4.2. Com efeito, e em substância, o recurso de fiscalização concreta para o Tribunal Constitucional conforma-se como recurso circunscrito ao controlo normativo da constitucionalidade (ou legalidade), sem qualquer ponderação valorativa da prova, ou aplicação subsuntiva do direito infraconstitucional ao acervo de factos provados.
Assim sendo, não encontra aqui cabimento qualquer queixa de falta de explicitação dos critérios de apreciação probatória, plano em que releva a alusão do recorrente às regras da experiência comum, ou ao processo psicológico que conduziu à convicção quanto aos factos, pelo simples motivo que essa atividade jurisdicional não foi exercida, nem podia sê-lo, pelo Tribunal Constitucional.
4.3. Por último, e tomando agora o objeto da apreciação constante do Acórdão n.º 578/12, delimitado pelos termos da reclamação da decisão sumária que considerou não estarem reunidos os pressupostos exigidos para o conhecimento do recurso interposto, cumpre dizer que a extensão e concretização da sua fundamentação encontra relação direta com a dimensão e profundidade dos argumentos aduzidos pelo reclamante.
Uma vez que a reclamação apresentada acrescentou apenas uma citação doutrinária ao que já constava do requerimento de interposição de recurso, citação essa alheia aos pressupostos do recurso que se considerou inverificados, deparou-se, como se disse, com vazio argumentativo e, nessa medida, considerou-se que nada mais havia a ponderar para além do que já constava da fundamentação exarada na decisão sumária, para a qual se remeteu. Note-se que a decisão sumária reclamada encontra-se integralmente transcrita no Acórdão n.º 578/12.
4.4. Em suma, é inexato que o Acórdão n.º 578/12 não revele devidamente as razões da confirmação da decisão sumária n.º 514/12 e do indeferimento da reclamação, pois a fundamentação oferecida coincide inteiramente com a motivação então exarada, exteriorizando plenamente as razões que justificaram a decisão de improcedência da reclamação.
Cumpre, então, afastar o vício de nulidade, por falta de fundamentação, apontado ao Acórdão n.º 578/12.
5. Como se disse, o recorrente termina pedindo a aclaração e correção do Acórdão n.º 578/12.
Porém, em nenhum momento, com autonomia relativamente à arguição de nulidade, que se vem de analisar, encontramos a invocação de ambiguidade ou obscuridade, que cumpra esclarecer.
E, percorrendo o Acórdão n.º 578/12, nenhuma imprecisão ou dificuldade de compreensão se denota, tanto mais que o recorrente percecionou devidamente o seu conteúdo.
Termos em que, sem necessidade de mais considerações, se conclui pela improcedência da pretensão formulada, também quanto ao pedido de aclaração.
III. Decisão
6. Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a arguição de nulidade e o pedido de aclaração.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Notifique.
Lisboa, 16 de Janeiro de 2013.- Fernando Vaz Ventura – Pedro Machete – Joaquim de Sousa Ribeiro.