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Proc.º n.º 325/2001.
2.ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
Em 4 de Junho de 2001 e nos presentes autos proferiu o relator a seguinte decisão sumária:-
'1. Não se conformando com a sentença proferida pela Juíza do 6º Juízo Criminal de Lisboa em 15 de Abril de 1999 e que condenou o demandado civil F... a pagar ao demandante civil, J..., a quantia de Esc. 55.283.370$00, recorreu aquele para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Tendo este Tribunal de 2ª Instância, por acórdão de 26 de Outubro de
2000, negado provimento ao recurso, apresentou o demandado civil requerimento onde disse:-
‘F...,
Recorrente nos autos à margem referenciados em que é
Recorrido
J...
Tendo sido notificado do douto acórdão que julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida,
Vem do mês interpôr recurso, com efeito suspensivo (arts. 399º, 400º, nº 2, 408º nº 1 alínea a) do C.P.P.), com as motivações que junta’.
Na motivação de recurso, o impugnante não suscitou qualquer questão de desconformidade com a Lei Fundamental reportadamente a norma ou normas constantes do ordenamento jurídico infra-constitucional e, na resposta à motivação, o recorrido demandante civil suscitou a questão prévia de não admissibilidade do recurso, resposta essa de que foi dado conhecimento ao recorrente (cfr. termo de «cota» a fls. 1159).
Por acórdão lavrado em 29 de Março de 2001 pelo Supremo Tribunal de Justiça não foi conhecido o objecto do recurso, por isso que foi entendido que, por força do disposto nos artigos 400º, números 1, alínea e), e 2, 414º, nº 2, primeira parte, e 420, nº 1, segunda parte, ‘complementado pelo que decorre dos artigos 427º e 432º, alínea b)’, todos do Código de Processo Penal, não era admissível recurso para aquele Alto Tribunal da parte civil das decisões proferidas em 1ª instância, se da parte criminal se não pudesse igualmente recorrer.
Notificado deste aresto, o demandado civil interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, por seu intermédio pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do nº 2 do artº 400º do diploma adjectivo penal, aduzindo que, reconhecendo embora que ‘podia - é certo - ter invocado a inconstitucionalidade do nº 2 do artigo 400º do C.P.P., no requerimento de interposição de recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa’, tal não lhe era ‘exigível que o fizesse, à cautela, como pressuposto de recorribilidade para o Tribunal Constitucional’, pois que, atentos o poder processual de reclamar, in casu para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, do despacho que eventualmente viesse a indeferir o recurso interposto, e a circunstância de o recurso ter efectivamente sido recebido, isso ‘contrariou as expectativas e a própria estratégia processual da parte, em termos tais, que é desrazoável impor-lhe o ónus de contar com a interpretação dada à norma em causa, antes de esgotado o poder jurisdicional deste Tribunal superior’.
O recurso veio a ser recebido por despacho lavrado em 14 de Maio de
2001 pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça.
2. Não obstante tal despacho, porque o mesmo não vincula este Tribunal (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro) e porque se entende que o recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a presente decisão sumária, por intermédio da qual se não toma conhecimento do objecto da vertente impugnação.
Anote-se, desde já, que o requerimento de interposição de recurso não obedece aos requisitos previstos nos números 1 e 2 do artº 75º-A da aludida Lei.
No entanto, porque, como se disse, se não deve tomar conhecimento do objecto do recurso, a formulação de um convite estribado no nº 6 do dito artº
75ºA constituiria, verdadeiramente, um acto inútil.
Na realidade, a jurisprudência, designadamente do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por entre muitos outros e para que aqui se não estejam a efectuar mais abundantes citações, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça indicados, aliás em número não parco, no acórdão ora intentado impugnar, nomeadamente os prolatados antes do acórdão tirado no Tribunal da Relação de Lisboa) tem defendido a postura de irrecorribilidade que foi seguida no aresto desejado recorrer.
E, sobre essa questão, também o próprio Tribunal Constitucional sustentou a não inconstitucionalidade dessa interpretação (cfr. Acórdãos números
201/94 e 138/98, o primeiro publicado na 2ª Série do Diário da República e o segundo ainda inédito).
Por isso, era exigível ao recorrente que, conhecendo uma tal jurisprudência e se, porventura, entendesse que a mesma decorria de uma interpretação normativa desconforme com o Diploma Básico, suscitar uma tal questão, desde logo no requerimento de interposição de recurso.
Mas para além disso, tendo tido, como teve, conhecimento da resposta
à motivação apresentada pelo demandante civil e na qual era suscitada a questão prévia do não conhecimento do recurso, impunha-se-lhe, também, que, por intermédio de «requerimento avulso», objectasse ao ponto de vista defendido pelo então recorrido, levantando então a questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa com base na qual aquele ponto de vista era sustentado.
Teve o ora recorrente, desta arte, oportunidade processual para suscitar a questão de inconstitucionalidade. Se o não fez, sibi imputat.
Não se pode, no contexto concreto, dizer que era inexigível ao recorrente suscitar tal questão, não tendo qualquer validade o que, a este propósito, disse no requerimento de interposição de recurso para este órgão de fiscalização concreta da constitucionalidade normativa.
Em face do exposto, não se toma conhecimento do objecto da presente impugnação, condenando-se o recorrente nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em cinco unidades de conta'.
É da transcrita decisão que vem, pelo recorrente F..., deduzida a presente reclamação.
Em síntese, nela alega que não era exigível ao ora reclamante que suscitasse a inconstitucionalidade da interpretação conferida ao nº 2 do artº
400º do Código de Processo Penal, pois que a jurisprudência deste Tribunal citada na decisão reclamada reporta-se a casos diferentes do vertente, já que ou se referiam à recorribilidade de um acórdão de um tribunal de relação que revogou a sentença condenatória do arguido, ou a uma causa em que nem sequer houve lugar a um julgamento crime.
Ouvidos sobre a reclamação, o Representante do Ministério Público junto deste órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa e o lesado J... defenderam que a mesma era manifestamente improcedente, por isso que o reclamante teve oportunidades processuais para, antes de ser proferido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, suscitar a questão da incompatibilidade com a Lei Fundamental da norma que veda o recurso para aquele Alto Tribunal da parte cível das decisões tomadas em processo penal e em que não é admitido para o mesmo Supremo recurso da parte criminal.
Cumpre decidir.
2. É, a todos os títulos, evidente a improcedência desta reclamação.
A interpretação sufragada tocantemente à acima citada norma tem, como se sublinhou na decisão sub iudicio, sido constantemente seguida pela jurisprudência dos tribunais pertencentes à ordem dos tribunais judiciais e, consequentemente, aquela interpretação não deveria representar algo de insólito ou imprevisto com o que o reclamante não poderia, razoavelmente, contar.
Assim sendo, impunha-se-lhe o ónus de, antecedentemente ao acórdão prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça, pôr em causa, confrontadamente com as normas ou princípios constitucionais, uma tal interpretação.
O que não fez.
Aliás, estando em causa saber se é ou não conforme ao Diploma Básico um normativo de onde decorra que em processo criminal se não pode recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça da parte civil das decisões proferidas em primeira instância, nos casos em que da parte criminal esteja vedada aquela impugnação para o referido Alto Tribunal, torna-se claro que não releva a circunstância de a parte criminal ser absolutória, determinativa da extinção do procedimento criminal ou, até, condenatória. O circunstancionalismo que interessa e é integrante desse normativo (alcançado por via interpretativa) é o de, por um lado, nos situarmos perante um processo de adesão em que o pedido de indemnização civil é formulado no processo criminal e, por outro, que da acima mencionada parte criminal está, por lei, vedado recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Acresce, por último, que o reclamante nem sequer carreia alguma razão para infirmar a asserção constante da decisão reclamada e segundo a qual, ao ter 'conhecimento da resposta à motivação apresentada pelo demandante civil e na qual era suscitada a questão prévia do não conhecimento do recurso, impunha-se-lhe, também, que, por intermédio de «requerimento avulso», objectasse ao ponto de vista defendido pelo então recorrido, levantando então a questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa com base na qual aquele ponto de vista era sustentado', sendo certo que, de todo, este não é um caso em que a decisão de não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça foi devida a despacho proferido em sede de reclamação pelo Presidente desse Alto Tribunal.
Termos em que se indefere a reclamação, assim se não tomando conhecimento do objecto do recurso, condenando-se o reclamante nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em quinze unidades de conta. Lisboa, 10 de Julho de 2001 Bravo Serra Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa