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Proc. nº 289/01
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Nos presentes autos de reclamação, vindos do Supremo Tribunal Militar, em que figuram como reclamante J... e como reclamado o Ministério Público, foi proferida decisão em que não se admitiu o requerimento de interposição do recurso que o ora reclamante pretendeu interpor para o Tribunal Constitucional. O Supremo Tribunal Militar, escudou-se, para tanto, na seguinte fundamentação:
“No início da audiência de julgamento do recurso, o réu suscitou a questão da incompetência deste Supremo Tribunal para apreciação do recurso a julgar tendo, para tanto, invocado a inconstitucionalidade do art. 197º da Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de Setembro – v. acta de fls. 193 e vº. O Tribunal desatendeu a pretensão do réu em decisão ditada para acta. De tal decisão, o réu veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, conforme requerimento de fls. 195 e 196 que, por padecer de vício formal, foi mandado aperfeiçoar, o que foi feito – fls. 197 e 201. No texto do aperfeiçoamento, o recorrente veio referir-se a inconstitucionalidade por omissão. Indevidamente o faz, quer por não Ter direito de requerer a apreciação e verificação de tal tipo de inconstitucionalidade, quer porque a decisão recorrida não admite recurso com tal fundamento – cfr. o art. 70º, nº 1 da Lei do Tribunal Constitucional. Vem, também agora, invocar «ilegalidade material». Ora, não se vislumbra que exista qualquer ilegalidade ou violação de lei referenciada no citado art. 70º, alíneas c) a e), que não é apontada pelo requerente, pelo que não cabe recurso para o Tribunal Constitucional – art. 70º, nº 1 citado; mas ainda que existisse, não poderia Ter-se como suscitada durante o processo – al. f) do nº 1 do mesmo artigo – pelo que também por esta razão não seria admissível tal recurso. Quanto à inconstitucionalidade material relativa à alínea b) do nº 1 do referido art. 70º, é manifesto que não se verifica. Com efeito, ou se considera que o aludido art. 197º e os preceitos que alteraram os artigos 209º e 211º da Constituição, como normas do mesmo diploma que são
(Lei nº 1/97) não podem, logicamente, estar em contradição entre si, não existindo, portanto, qualquer violação; ou considerando-se as partes inalteradas dos mesmos preceitos constitucionais, a registrar-se qualquer contradição, sempre prevaleceria o disposto na Lei nº 1/97 citada que, situando-se no mesmo plano hierárquico que a Constituição, é posterior a esta. Assim, o art. 197º da Lei Constitucional nº 1/97, de 20 de Setembro, contêm norma transitória que não pode ser apodada de sofrer de inconstitucionalidade material. Manifestamente. Pelo exposto, em virtude de ser, em parte, inadmissível, e em parte manifestamente infundado, não admito o recurso interposto a fls. 195, 196 e 201 pelo réu para o Tribunal Constitucional – art. 76º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional”.
2. É desta decisão que vem interposta a presente reclamação, que o reclamante fundamentou nos seguintes termos:
“01 – Quanto à referida inconstitucionalidade por omissão, o Reclamante entende que carece de legitimidade, atento o disposto no art. 70º, nº 1 da LTC, e que somente foi referido no seu requerimento de aperfeiçoamento por considerar que a mesma é evidente e por «mero ofício».
02 – No seu recurso e respectivos fundamentos, o Recorrente alegou que, na pendência do processo fora suscitada a inconstitucionalidade dos Tribunais Militares, com os fundamentos constantes da questão prévia deduzida no Supremo Tribunal Militar e os fundamentos do recurso interposto e do seu aperfeiçoamento, todos eles aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais.
03 – Consequentemente, o recurso deveria Ter sido admitido pois, ao decidir como decidiu, o douto despacho violou, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto no art. 70º nº 1, alíneas b) e f) e no art. 71º, todos da LTC”.
3. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que emitiu parecer no sentido da manifesta improcedência da reclamação apresentada, “por ser evidente e manifesto – numa análise meramente perfunctória e liminar da questão – que a disposição transitória constante da Lei de revisão constitucional nº 1/97 – art. 197º - se articula perfeitamente com o preceituado no nº 3 do art. 211º da Constituição, na redacção emergente daquela Lei”.
Corridos os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação.
4. Com o presente recurso, interposto ao abrigo das alíneas b) e f) do nº 1 do artigo 70º da LTC, pretendia o recorrente - nos termos do respectivo requerimento de interposição (fls. 9 e 10), já depois de aperfeiçoado (fls. 12)
– ver apreciada:
a) a inconstitucionalidade e a ilegalidade material do artigo 197º da Lei Constitucional nº 1/97, por alegada violação do disposto nos artigos 209º e 211º da Constituição,
b) a inconstitucionalidade por omissão do referido artigo 197º.
Como, bem, se decidiu na decisão recorrida, é efectivamente manifesto, como vai ver-se, que, no que se refere às alegadas inconstitucionalidade por omissão e ilegalidade material do artigo 197º da Lei Constitucional nº 1/97, não pode conhecer-se do objecto do recurso interposto pelo ora reclamante e, no que se refere à alegada inconstitucionalidade material daquela norma, que o mesmo é manifestamente infundado.
Assim, no que se refere à alegada inconstitucionalidade por omissão não pode conhecer-se do objecto do recurso porque o ora reclamante – como o próprio reconhece (cfr. fls. 1) – carece de legitimidade para requerer essa apreciação ao Tribunal Constitucional, conforme resulta claramente do disposto no artigo
283º, nº 1 da Constituição.
Igualmente não pode conhecer-se do objecto do recurso no que se refere à alegada ilegalidade material do artigo 197º porque, manifestamente, não se verificam os pressupostos de admissibilidade exigidos pela alínea f) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
Finalmente, no que se refere à alegada inconstitucionalidade material daquele artigo 197º, por violação 209º e 211º da Constituição, é manifesto, a uma primeira análise, que a mesma não se verifica, limitando-se aquele artigo 197º
(disposição transitória constante da Lei Constitucional nº 1/97, recorde-se) a preceituar que os tribunais militares se manteriam em funções até à entrada em vigor de legislação que regulamentasse o disposto no art. 211º, nº 3 – número aditado pela própria lei Constitucional 1/97.
Nenhuma censura merece, por isso, o despacho reclamado.
III – Decisão
Por tudo o exposto, indefere-se a reclamação. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze UCs.
Lisboa, 4 de Julho de 2001 José de Sousa e Brito Messias Bento Luís Nunes de Almeida