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Processo n.º 173/13
1.ª Secção
Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são reclamantes A. e B: e reclamado o Ministério Público, os primeiros reclamaram, ao abrigo do disposto no artigo 76.º, n.º 4, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante LTC, do despacho daquele Tribunal que, em 31 de janeiro de 2013, não admitiu recurso para o Tribunal Constitucional.
2. Resulta da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em 17 de janeiro de 2013, certificada nos autos, que os aqui reclamantes foram condenados, em primeira instância, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 24.º, n.os 1 e 4 e um crime de frustração de créditos fiscais, previsto e punido pelo artigo 25.º, n.º 1 do RJIFNA, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 394/93, de 24/11, em cúmulo jurídico das duas penas, cada um na pena única de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, sob condição de, no prazo de 1 ano, demonstrarem que aderiram ao “Plano Pina Moura” ou estabelecerem com o Estado outro acordo de pagamento da dívida fiscal em referência nos autos, nos demais termos consignados no acórdão condenatório.
Desta decisão do STJ decorre, ainda, que “O Acórdão condenatório, após decisão em conferência do Tribunal Constitucional e consequentemente esgotados os recursos, transitou em julgado no dia 26/09/2001.
Em junho de 2011 os Recorrentes formularam três requerimentos perante o Tribunal Judicial de Lamego, no qual suscitaram três questões, a saber:
a) O cumprimento da pena a que haviam sido condenados;
b) Definição da norma mais favorável e enquadramento, ou não, do comportamento dos recorrentes nessa norma;
c) Revogação das normas incriminatórias, pelo disposto no artigo 2º alínea b) do Decreto-lei 15/2001.
O requerido não obteve deferimento, por o tribunal de 1ª instância considerando que se encontrava esgotado o poder jurisdicional do juiz.
(…) Não se conformando com tal decisão, os reclamantes recorreram para o Tribunal da Relação do Porto, invocando a violação do disposto nos art. 470º e 475º do CPP.
O Tribunal da Relação do Porto, no entanto, invocando o caso julgado, veio a julgar improcedentes os recursos interpostos.
Não se conformando com tal decisão, recorreram para o Suprema Tribunal de Justiça.
O recurso não foi, porém, admitido pelo Tribunal da Relação do Porto, com o fundamento de que, nos termos do art. 400, nº 1, d) do CPP, o acórdão da relação não é recorrível pois “não conheceu a final do objeto do processo”.”
Apresentaram, então, reclamação desta decisão, nos termos do artigo 405.º do Código de Processo Penal, reclamação que viria a ser indeferida por despacho proferido no Supremo Tribunal de Justiça.
Apresentado recurso para o Tribunal Constitucional, como este não foi admitido, reclamam agora dessa decisão para este mesmo Tribunal.
3. É o seguinte o teor do despacho reclamado:
“Os arguidos A. e B. notificados da decisão que lhes indeferiu a reclamação vieram interpor recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 70.º da LTC para que seja apreciada a inconstitucionalidade dos arts. 672.º e sgs. do CPC, por violação dos arts. 18.º, n.º 2, 20.º, n.º 6 e 32.º, n.º 1, da CRP.
Pelos termos em que vem formulado o recurso para o Tribunal Constitucional não se refere à decisão da reclamação, mas sim às decisões da 1.ª instância e da Relação.
A questão de inconstitucionalidade e a norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada referem-se aos fundamentos do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça e não à Reclamação, não tendo sido, consequentemente, apreciada na decisão da Reclamação, limitada, como está, à pronúncia sobre a admissibilidade ou retenção do recurso, nos termos do art. 405.º, n.º 1, do CPP.
Nestes termos, não há que conhecer do requerimento de interposição de recurso, por não se referir à decisão da Reclamação proferida nos termos do art. 405.º do CPP.”
4. Os Reclamantes sustentam a Reclamação nos seguintes fundamentos:
“1. O recurso interposto para o Tribunal Constitucional, prende-se com a falta de apreciação do objeto do processo por se considera que o mesmo já foi apreciado na sentença proferida nos autos;
2. Contudo, tendo a mesma já transitado em julgado, o objeto passa a ser o cumprimento ou não da pena, sendo por isso, nos termos alegados nos presentes autos, objeto de recurso;
3. Nesta medida, a resposta à reclamação proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça pronuncia-se sobre esta questão, sendo por isso passível de recurso nos termos interpostos;
4. Por outro lado, mesmo que se considerasse que esta questão não era passível de recurso, nos termos do art. 75º, nº 5 da LTC deveria ter ordenada a retificação do requerimento de interposição de recurso ou deveria, nos termos do art. 111º, nº 2 e 114º do CPC, aplicável por força do art. 4º do CPP, ser o mesmo remetido o para o tribunal competente;
5. Atendendo o supra exposto, não pode o Tribunal Constitucional deixar de apreciar o recurso interposto, tendo por isso que se considerar violadas as normas supra invocadas.”
5. O Exmo. Representante do Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação.
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
6. Os aqui Reclamantes formulam o recurso para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
“(…) não se conformando com o despacho de indeferimento da reclamação da não admissão do recurso interposto perante o Tribunal da Relação, proferido pelo Juiz presidente do Supremo Tribunal de Justiça, vêm do mesmo interpor recurso para o Tribunal Constitucional (…)”
E concluem, enunciando o seguinte pedido:
“Assim, para os efeitos do art. 75º-A nº 2 da LTC; verifica-se que os Recorrentes alegaram a inconstitucionalidade do art. 672º e segs. do CPC (…), por violação do disposto nos artigos 18º n.º 2, 20º, 29º n.º 6 e 32º nº 1 da CRP, quando interpretado no sentido de que pode o Tribunal deixar de apreciar o cumprimento da pena suspensa após a sua revogação por se encontrar esgotado o seu poder jurisdicional.”
7. O despacho reclamado refere que, respeitando o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional à decisão do Tribunal da Relação, não deve o mesmo ser admitido uma vez que a decisão recorrida (a decisão do Supremo Tribunal de Justiça) não aplicou a norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada.
8. Na verdade, a decisão proferida no Supremo Tribunal de Justiça limitou-se ao conhecimento da reclamação do despacho de não admissão de recurso para este Tribunal, não tendo interpretado ou aplicado as normas cuja inconstitucionalidade é suscitada no recurso e se traduzem na interpretação dos artigos 672.º e segs. do CPC, «por violação do disposto nos artigos 18.º n.º 2, 20º, 29º n.º 6 e 32º nº 1 da CRP, quando interpretado no sentido de que pode o Tribunal deixar de apreciar o cumprimento da pena suspensa após a sua revogação por se encontrar esgotado o seu poder jurisdicional».
9. Dispõe o n.º 4 do referido artigo 76.º da LTC, que do despacho que indefira o requerimento de interposição de recurso ou retenha a sua subida cabe reclamação para o Tribunal Constitucional.
O despacho reclamado não admitiu o recurso de constitucionalidade por o mesmo se referir «aos fundamentos do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça e não à Reclamação, não tendo sido, consequentemente, apreciada na decisão da Reclamação, limitada, como está, à pronúncia sobre a admissibilidade ou retenção do recurso, nos termos do art. 405º, n.º 1 do CPP».
Quer isto dizer que se pretendeu recorrer para o Tribunal Constitucional da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, a qual, manifestamente, não aplicou a norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada. Sendo este o fundamento da não admissão do recurso há que reiterá-lo, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Termos em que se impõe indeferir a presente reclamação.
III - Decisão
10. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 9 de abril de 2013. - Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria João Antunes – Maria Lúcia Amaral.