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Processo n.º 766/12
3ª Secção
Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que são recorrentes A. e mulher B. e recorrida C., o relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso, com os seguintes fundamentos (cfr. Decisão Sumária n.º 449/2013, fls. 301-311):
«II – Fundamentação
4. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo” (cfr. fls. 294), com fundamento no artigo 76.º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito, pelo que se deve começar por apreciar se estão preenchidos todos os pressupostos, cumulativos, de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75.º-A e 76.º, n.º 2, da LTC.
Se o Relator verificar que algum, ou alguns deles, não se encontram preenchidos, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC.
5. Do teor do requerimento de interposição de recurso apresentado pelos recorrentes decorre que do mesmo constam, conforme previsto no artigo 75.º-A, n.ºs 1 e 2, da LTC: a indicação da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto – alínea b) do n.º 1 artigo 70.º; a indicação das normas cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie – «(…) normas dos art°s 670° n.º 3, 685° n° 1, 666°, e, 677° do C.P.C.» (cfr. requerimento, 2.º e, ainda, 23.º) e «preceitos normativos dos art°s 201° e 202°, 670° nºs 3 a 5, do Código de Processo Civil (cfr. requerimento, 16.º e, ainda, 23.º); a indicação da norma ou princípio constitucional que se considera violado – «violação dos princípios constitucionais consignados no art° 2° conjugado com o n° 2 do art° 18º, nos art°s 20° (n.ºs 2 e 5), 17°, e, nºs 1 e 2 do art° 202° todos da Constituição da República Portuguesa» (cfr. requerimento, 2.º e 23.º, in fine); e a indicação da peça processual em que a recorrente alega ter suscitado a questão da inconstitucionalidade – «reclamação sobre que foi proferida a decisão singular por esta Relação» (cfr. requerimento, 2.º).
6. Do teor do requerimento de interposição de recurso apresentado pelos recorrentes, em que delimitam o objeto do recurso, decorre que estes pretendem interpor recurso para este Tribunal da decisão singular proferida pelo Tribunal da Relação do Porto em 7/05/2012 (cfr. fls. 223-226) – a qual indeferiu a reclamação apresentada contra o despacho do Tribunal Judicial de Valpaços de 10/01/2012 que não admitiu o recurso interposto pelos ora recorrentes (cfr. fls. 214-215) – e foi depois confirmada por acórdão do mesmo Tribunal da Relação do Porto de 10/09/2012 (cfr. fls. 270-275).
Com efeito, os recorrentes afirmam, no seu requerimento, que «(…) reclamaram nos termos do art° 688° do C.P.C. do despacho que não admitiu, por extemporâneo, o recurso de apelação que interpuseram nos autos, reclamação que foi indeferida por decisão singular proferida nesta Relação em 07/05/2012 que foi confirmada pelo seu acórdão de 10/09/2012 (…). com a qual não se conformam, e, da mesma interpõem, ao abrigo da al. b) do n° 1 do art° 70° da Lei N° 28/82 de 15/11 (…) recurso para o Tribunal Constitucional (…)» (itálicos acrescentados).
7. Segundo jurisprudência constante do Tribunal Constitucional a admissibilidade do recurso apresentado nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC depende da verificação, cumulativa, dos seguintes requisitos: ter havido previamente lugar ao esgotamento dos recursos ordinários (artigo 70.º, n.º 2, da LTC), tratar-se de uma questão de inconstitucionalidade normativa, a questão de inconstitucionalidade normativa haver sido suscitada «durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer» (artigo 72.º, n.º 2, da LTC) e a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionalidade pelo recorrente (vide, entre outros, os Acórdãos deste Tribunal n.ºs 618/98 e 710/04, disponíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt).
Faltando um destes requisitos, o Tribunal não pode conhecer do recurso.
8. Não se encontra preenchido, no caso em apreço, relativamente a algumas das normas que os recorrentes ora pretendem ver apreciadas por este Tribunal, o pressuposto relativo à ratio decidendi.
8.1. Os recorrentes, no seu requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, pretendem ver apreciadas as «(…) normas dos art°s 670° n.º 3, 685° n° 1, 666°, e, 677° do C.P.C.» (cfr. requerimento, 2.º e, ainda, 23.º) e «preceitos normativos dos art°s 201° e 202°, 670° nºs 3 a 5, do Código de Processo Civil (cfr. requerimento, 16.º e, ainda, 23.º).
8.2 Decorre todavia do teor da decisão recorrida que esta não aplicou as normas dos artigos 201.º, 202.º, 670.º, n.ºs 3 a 5, e 666.º do Código de Processo Civil (cfr. o teor da decisão recorrida a fls. 224-225), pelo que estas não constituíram fundamento da decisão recorrida. E, conforme dispõe o artigo 79.º-C da LTC, este «(…) Tribunal só pode julgar inconstitucional ou ilegal a norma que a decisão recorrida (…) tenha aplicado (…)».
Pelo que, faltando um dos requisitos, cumulativos, de admissibilidade do recurso, não se pode conhecer do objeto do recurso nesta parte.
9. Pretendem ainda os recorrentes que sejam apreciadas por este Tribunal as normas dos artigos 685.º, n.º 1 e 677.º do Código de Processo Civil.
Não se encontram todavia preenchidos, no caso em apreço, relativamente a estas normas cuja constitucionalidade os recorrentes ora pretendem ver apreciadas, os pressupostos relativos à suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa e de modo processualmente adequado perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida.
9.1 Os recorrentes alegam, no seu requerimento de interposição de recurso, que suscitaram a pretensa questão de inconstitucionalidade normativa, relativa aquelas normas, «na reclamação sobre que foi proferida a decisão singular por esta Relação» (cfr. requerimento, 2.º).
Do teor da reclamação em causa apresentada pelos recorrentes (cfr. fls. 2 a 5 e 8 a 28) decorre todavia, ao contrário do que estes alegam, que não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa relativamente às normas que os recorrentes ora também pretendem ver apreciadas e mencionadas na decisão recorrida – artigos 685.º, n.º 1 e 677.º do Código de Processo Civil.
9.2 No texto daquela reclamação, a referência às normas ou princípios constitucionais que, nos termos do requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, se consideram violados – «(…) princípios constitucionais consignados no art° 2° conjugado com o n° 2 do art° 18º, nos art°s 20° (n.ºs 2 e 5), 17°, e, nºs 1 e 2 do art° 202° todos da Constituição da República Portuguesa» (cfr. requerimento, 2.º e 23.º, in fine) – consta da parte IV, artigos 36.º a 41.º.
Nestes artigos da sua reclamação afirmam os ora recorrentes:
«36º As normas, ou a sua interpretação, que foram citadas dispondo que o pedido de esclarecimento da sentença é feito, apenas, na alegação se dela couber recurso, e, que o prazo para a interposição de recurso que, aliás, é dirigido ao Tribunal Superior, não se conta desde o conhecimento do despacho que recaiu sobre o pedido de correção, mas, aliás, desde a data em que a decisão foi notificada aos RR. violam o princípios mais elementares da Constituição da República Portuguesa. Com efeito,
37º O artº 2º conjugado com o nº 2 do artº 18º da lei fundamental consagra o princípio da confiança que o cidadão deve ter para a defesa dos seus direitos. Pois,
38º O Estado deve garantir o respeito e as garantias de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais com a observância dos preceitos constitucionais.
39º E, um dos direitos é o do acesso aos tribunais para exercer a defesa dos seus direitos, e, interesses legalmente protegidos, e, com o correspondente direito de que uma causa em que intervenham seja objeto de uma decisão em prazo razoável e mediante um processo equitativo através dos meios legais que lhes assegurem procedimentos judiciais de modo a que possam obter a tutela efetiva desses direitos evitando que os mesmos direitos sejam violados, incluindo o direito das garantias a via judicial, incluindo o direito de recurso das decisões judiciais concretizado no direito ao duplo grau de jurisdição nos termos, e, para os efeitos dos artigos 20º e 17º da C.R.P.
40º E, como é aceite e defendido, o recurso das decisões judiciais quer afetem direitos fundamentais quer no âmbito penal quer no âmbito civil, constitui uma garantia imprescindível dos cidadãos, ora Reclamantes.
41º A não admissão dos recursos interpostos pelos RR. viola a interpretação que o Senhor Juiz a quo fez, e, aplicou das normas dos artºs 670º nºs 3 a 5, nº 1 do artº 685º, e, nº 1 do artº 666º todos do C.P.C. é inconstitucional, e, são inconstitucionais pelas razões que supra invocaram.».
9.2.1 No artigo 36.º os recorrentes alegam que «As normas, ou a sua interpretação, que foram citadas (…) violam o[s] princípios mais elementares da Constituição da República Portuguesa. (…)».
Ora sucede que as «normas (…) que foram citadas» pelos recorrentes são as que constam dos anteriores artigos da Parte IV da sua reclamação (artigos 1.º a 35.º). E, nestes artigos, apenas foram «citadas», em concreto, pelos recorrentes, as normas dos artigos 662.º, n.º 2 (art.º 5.º), 667.º, n.º 1 e 669.º, n.º 1 (art.º 6.º), 670.º, n.º 1 (art.º 7.º), 670.º, n.º 3 (art.º 9.º), 669.º, n.º 3, 670.º, n.º 5, e 667.º, n.º 2 (art.º 10.º), 669.º, n.º 3 (art.º 12.º), 201.º (art.º 24.º), 686.º, n.º 1 (art.º 26.º), 670.º, n.º 3 e 459.º (art.º 33.º).
Nestes artigos não foram sequer mencionados os artigos artigos 685.º, n.º 1 e 677.º do Código de Processo Civil que os recorrentes, conforme requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, ora pretendem ver apreciados.
Pelo que é de concluir que os recorrentes na peça processual que indicaram no seu requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, não suscitaram qualquer questão de constitucionalidade em relação às normas dos artigos artigos 685.º, n.º 1 e 677.º do C.P.C indicados naquele requerimento e mencionados na decisão recorrida, pelo que inexiste objeto normativo
9.2.2 Acresce que o alegado nos artigos 37.º a 40.º da parte IV da reclamação dos ora recorrentes, em que se referem, em concreto, a algumas das normas e princípios constitucionais que, no seu requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, alegam ter sido violados – artigos 2.º, 18.º, n.º 2, 20.º e 17 da Constituição – não configuram, em qualquer caso, qualquer suscitação de uma questão de constitucionalidade normativa de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão ora recorrida.
Naqueles artigos da sua reclamação os ora recorrentes não justificaram, nem sequer sumariamente, a inconstitucionalidade que ora pretendem ver apreciada por este tribunal, não cumprindo o ónus de suscitação processualmente adequada da questão, já que não enunciam de forma expressa, clara e percetível a questão de constitucionalidade e, assim, não procedem à clara e expressa delimitação do objeto do recurso, nem a uma fundamentação, em termos minimamente concludentes, das razões porque consideram inconstitucional as “normas” ou “critérios normativos” que ora pretendem submeter à apreciação do tribunal. Com efeito, os recorrentes não justificam, na peça processual em causa, em termos concludentes, a imputação de inconstitucionalidade, não apresentando um mínimo de suporte argumentativo que permita ao tribunal saber que tem uma questão jurídico-constitucional para decidir.
9.2.3 E o mesmo sucede em relação ao artigo 41.º, conclusivo – aliás o único em que os recorrentes se referem ao artigo 685.º, n.º 1, do CPC, que ora pretendem ver sindicado –, em que os recorrentes se limitam a afirmar que:
«41º A não admissão dos recursos interpostos pelos RR. viola a interpretação que o Senhor Juiz a quo fez, e, aplicou das normas dos artºs 670º nºs 3 a 5, nº 1 do artº 685º, e, nº 1 do artº 666º todos do C.P.C. é inconstitucional, e, são inconstitucionais pelas razões que supra invocaram.».
Tal enunciado não constitui, pelas razões expostas, a suscitação de qualquer questão de inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão ora recorrida.
9.2.4 E o mesmo se diga quanto à primeira Conclusão em que os recorrentes afirmam:
«1º O Tribunal ao julgar transitada a sentença por o recurso ter sido interposto fora de tempo fez errada interpretação das normas dos artºs 670º nºs 3 a 5, 685º nº 1, 666º, e, 677º do C.P.C. por violação dos princípios de confiança consagrados pelo artº 2º conjugado com o nº 2 do artº 18º da C.R.P., e, dos princípios constitucionais consagrados pelos artºs 20º, 17º e nºs 1 e 2 do artº 202º do mesmo diploma fundamental a que se aludiu supra;»
Tal enunciado não corresponde à suscitação adequada de uma questão de inconstitucionalidade normativa, não apresentando os recorrentes, naquela conclusão, qualquer suporte argumentativo mínimo que permita ao tribunal saber que, antes de esgotado o seu poder jurisdicional, tem uma questão jurídico-constitucional para decidir – antes denotando que os recorrentes não se conformam com o decidido. Ora o sistema português de fiscalização da constitucionalidade é um sistema de fiscalização de normas, não consagrando o recurso de amparo contra decisões judiciais.
9.3. Não estando preenchidos, relativamente às normas dos artigos 685.º, n.º 1, e 677.º do CPC, vários dos requisitos, cumulativos, relativos à admissibilidade do recurso para este Tribunal, não pode, assim, conhecer-se do objeto do mesmo também nesta parte.
III – Decisão
10. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decide-se não conhecer do objeto do presente recurso.»
2. Notificados da decisão, os recorrentes vieram reclamar para a conferência, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, alegando, quanto à admissibilidade do recurso, o seguinte (cfr. fls.):
«Os Recorrentes, A. e mulher B., são uns humildes agricultores de …, Valpaços, que, de boa fé, e, sem qualquer intuito de protelar o bom andamento do processo, interpuseram para este Venerando Tribunal recurso de uma decisão que lhes parece injusta e inadequada para o caso em concreto em discussão com toda a envolvência das circunstâncias reais que nela ocorrem.
Não lhes pareceu, como alegaram, que a decisão fosse acertada, pois pretendiam que fosse reapreciada no Tribunal da Relação do Porto.
Tal entendimento para que não o fosse, e, sem quebra de respeito por outra opinião, parece ser sufragado por este Tribunal que lhes não admitiu o recurso por eles interposto.
É desta decisão sumária que os Recorrentes, ao abrigo do n.º 3 do ano 78°-A da L.T.C. dela reclamam., requerendo que a mesma seja submetida à conferência.
A douta decisão é proferida neste Tribunal que se esforça pela harmonização da nossa Lei Fundamental com todo o ordenamento jurídico de modo que os princípios da segurança jurídica, e, dos efetivos direitos dos cidadãos e dos recursos tenham primazia sobre questões formais sem prejuízo, como o signatário defende, da segurança jurídica, e, celeridade processual.
Estão os Recorrentes convictos de que o seu comportamento, como resulta dos autos, e, aliás, de todos os seus passos, que não revelam qualquer intuito de atrasar o processo, agindo apenas no uso dos direitos que lhes são conferidos por lei, em consonância com os princípios da legalidade, da igualdade do Estado, da independência, e, da separação dos poderes, sendo certo que incumbe ao poder judicial proferir decisões em tempo oportuno, cumprindo a lei de modo que o cidadão não seja surpreendido com despachos tardios que o coloquem numa situação imprevista lesiva dos seus direitos, o que no caso em apreço ocorreu como mais uma vez o demonstrarão.
Constituem o Tribunal Constitucional ilustres Magistrados que fizeram a sua longa carreira na judicatura analisando, ponderando, e, decidindo variadíssimas situações que durante esse percurso lhes deu experiência, saber, e, sensatez a adotar em cada caso concreto.
Além dos Ex.mos Juízes de carreira, constituem-no, ainda, outros Senhores Juízes Conselheiros que são ilustres académicos ou juristas de mérito.
O saber, a experiência, essa sensatez, e, essa arte não a reclama para si o signatário que, mesmo que não tivesse suscitado de uma forma processualmente adequada a questão da inconstitucionalidade ou da legalidade, no que não concede, perante o Tribunal recorrido, quer este Alto Tribunal, quer o Tribunal recorrido deveriam, salvo o devido respeito, convidar os recorrentes a aperfeiçoar o por eles requerido, princípio que passou a ter um acolhimento relevante no atual C.P.C., como, igualmente, os prazos em que as decisões devem ser proferidas.
Todavia, e sem quebra do respeito pela decisão sumária de que reclamam, parece aos Recorrentes que esta padece de justeza, contrariando o que resulta dos autos.
Com efeito, na extensa reclamação que os Recorrentes deduziram no Tribunal da Relação do Porto alegam ter havido errada interpretação das normas dos art°s 670° n° 3, 685° nº 1, 666°, e, 677° do C.P.C por violação dos princípios de confiança consignados no art° 2° conjugado com o nº 2 do art° 18°, e, nos artigos 20°, 17°, e, nºs 1 e 2 do art° 202° todos da C.R.P.
De resto, se a falta de mestria do signatário não foi clara ou suficiente na sua prosa, de todo o contexto da reclamação conclui-se com clareza que:
1 ° Tendo sido proferida uma sentença em Ia instância os Recorrentes no prazo de dez dias, ao abrigo dos art°s 666° e 667°, e, 669° do C.P.C., pediram em 15/09/2011 se esclarecessem diversas dúvidas e inexatidões insertas na mesma o que fundamentaram profusamente, não sendo, pois, qualquer expediente dilatório;
2° Ora, apenas em 03/11/2011, decorridos 49 dias sobre aquele pedido de esclarecimento foi proferido despacho que lhes indeferiu esse pedido de aclaração.
Reproduzem os Recorrentes o que já alegaram sob os nºs 3° a 10° do requerimento da interposição do recurso para este Tribunal.
É óbvio que tal despacho foi uma decisão surpresa, pois que, perfilhando o Tribunal da 1ª instância o entendimento que os esclarecimentos, apenas, podiam ser suscitados nas alegações de recurso, o que a Relação do Porto sufragou, induziu em erro os Recorrentes.
É que, por um lado, o Tribunal, por isso, não podia conhecer do pedido do esclarecimento devendo pois abster-se de o fazer, e, por outro lado, ao conhecer do pedido de aclaração os Recorrentes surpreendentemente lavraram erro quanto à contagem do prazo de recurso, pois que o interpuseram no prazo contado desde a notificação do despacho que indeferiu o pedido de esclarecimento já aludido.
Foi, pois, por entenderem que o processo só desde aí, ou seja, desde a notificação do despacho que lhes indeferiu o pedido de aclaração, obscuridades ou ambiguidades, é que conteria todos os elementos para o efetivo direito de recurso dos Recorrentes.
Ora, tal direito foi frustrado não só pelo despacho de indeferimento proferido após longos 49 dias, como, posteriormente, pelo entendimento que as duas instâncias adotaram no caso em concreto sem a devida mediação judicial que ao caso cabia.
Efetivamente, sem que os Recorrentes deixem de reconhecer as razões de segurança e certeza jurídica que devem imperar no campo do direito ordinário, não podem também deixar de clamar que o direito ao recurso efetivo é uma das garantias de defesa reconhecidas aos Recorrentes.
E, sendo certo que vem sendo controvertida a questão de se saber qual é o momento desde que se conta o prazo para recorrer não deixará este Tribunal de considerar que no caso em concreto de que se vem falando de que o prazo para interposição do recurso pelas razões invocadas se conta desde a data em que lhe foi feita a notificação do despacho que foi proferido decorridos 49 (quarenta e nove) dias após ter sido pedida a aclaração da sentença, e, não nos 30 (trinta) dias acrescidos de mais 10 (dez) dias, por ter havido impugnação da matéria de facto, a que podem acrescer, ainda, mais 3 (três) dias com multa.
O entendimento seguido pelas duas instâncias segundo o qual o prazo, no caso em apreço, para a interposição do recurso se conta desde a data em que lhes foi notificada a sentença, e, não desde a data em que lhes foi notificada a decisão que lhes indeferiu o pedido da sua aclaração, é inconstitucional por violação das normas citadas no n° 23° do requerimento da interposição do recurso para este Tribunal aqui reproduzidas.
De resto, este Tribunal não deixará de perfilhar o mesmo ponto de vista em sede de processo civil quando é certo que o tem feito em processo penal.
É que naquele são os direitos de recurso em matéria tão nobre como no penal que devem ser garantidos da mesma forma até porque os Réus Recorrentes já foram acusados, pronunciados, e, absolvidos definitivamente dos factos constantes da justificação notarial a que se alude nos autos, e, cuja prova farão se para tanto lhes for solicitado.
Pelo exposto, e, pelo que doutamente Vªs Exªs suprirão, REQUEREM QUE EM CONFERÊNCIA se delibere receber o recurso, e, conhecendo o mesmo se aplique ao caso em apreço a lei, o direito, e, se faça JUSTIÇA quando é certo que do atual Código de Processo Civil emana o princípio, aliás justo, de que ninguém será injustiçado por uma questão formal.»
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
3. Em face do teor da reclamação, verifica-se que os recorrentes discordam da Decisão Sumária n.º 272/2013, em que se decidiu não conhecer do objeto do recurso, com fundamento na falta de aplicação efetiva pelo Tribunal a quo das normas dos artigos 201.º, 202.º, 670.º, n.ºs 3 a 5, e 666.º do Código de Processo Civil, nos termos do disposto no artigo 79.º-C da LTC e no não preenchimento, quanto às normas dos artigos 685.º, n.º 1 e 677.º do Código de Processo Civil, dos pressupostos relativos à suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa e de modo processualmente adequado perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Ora, analisada a presente reclamação, desde logo se verifica que a mesma não infirma as conclusões alcançadas na decisão sumária reclamada.
3.1. Depois, na parte em que a decisão sumária decidiu não conhecer das questões de constitucionalidade colocadas quanto às normas dos artigos 685.º, n.º 1 e 677.º do Código de Processo Civil, alegam primeiramente os reclamantes que «mesmo que não tivesse suscitado de uma forma processualmente adequada a questão de inconstitucionalidade ou da legalidade, o que não se concede, perante o Tribunal recorrido, quer este Alto Tribunal, quer o Tribunal recorrido deveriam, salvo o devido respeito, convidar os recorrentes a aperfeiçoar o por eles requerido».
Começam assim por discordar os ora reclamantes do não conhecimento do objeto do recurso com fundamento no facto de não terem sido convidados ao aperfeiçoamento da peça processual em que alegadamente suscitaram perante o tribunal recorrido a questão de inconstitucionalidade. Não lhes assiste razão.
Com efeito, no que respeita ao Tribunal Constitucional, os ora reclamantes não foram notificados para o aperfeiçoamento do requerido nos termos do artigo 75.º-A, números 5 e 6 da LTC, uma vez que este apenas se destina a permitir o suprimento de vícios formais do requerimento de interposição de recurso, pelo que o convite ao aperfeiçoamento do requerimento não se revestiria in casu de qualquer utilidade.
Assim, a razão agora aduzida não assume qualquer relevância na impugnação dos fundamentos da decisão sumária reclamada.
3.2. Em segundo lugar, os reclamantes, para ilustrar a alegada invocação de uma inconstitucionalidade normativa e de modo processualmente adequado perante o Tribunal recorrido, vêm ainda argumentar que:
«Com efeito, na extensa reclamação que os Recorrentes deduziram no Tribunal da Relação do Porto alegam ter havido errada interpretação das normas dos art°s 670° n° 3, 685° nº 1, 666°, e, 677° do C.P.C por violação dos princípios de confiança consignados no art° 2° conjugado com o nº 2 do art° 18°, e, nos artigos 20°, 17°, e, nºs 1 e 2 do art° 202° todos da C.R.P.
De resto, se a falta de mestria do signatário não foi clara ou suficiente na sua prosa, de todo o contexto da reclamação conclui-se com clareza que:
1 ° Tendo sido proferida uma sentença em 1a instância os Recorrentes no prazo de dez dias, ao abrigo dos art°s 666° e 667°, e, 669° do C.P.C., pediram em 15/09/2011 se esclarecessem diversas dúvidas e inexatidões insertas na mesma o que fundamentaram profusamente, não sendo, pois, qualquer expediente dilatório;
2° Ora, apenas em 03/11/2011, decorridos 49 dias sobre aquele pedido de esclarecimento foi proferido despacho que lhes indeferiu esse pedido de aclaração.
Reproduzem os Recorrentes o que já alegaram sob os nºs 3° a 10° do requerimento da interposição do recurso para este Tribunal.
É óbvio que tal despacho foi uma decisão surpresa, pois que, perfilhando o Tribunal da 1ª instância o entendimento que os esclarecimentos, apenas, podiam ser suscitados nas alegações de recurso, o que a Relação do Porto sufragou, induziu em erro os Recorrentes.
É que, por um lado, o Tribunal, por isso, não podia conhecer do pedido do esclarecimento devendo pois abster-se de o fazer, e, por outro lado, ao conhecer do pedido de aclaração os Recorrentes surpreendentemente lavraram erro quanto à contagem do prazo de recurso, pois que o interpuseram no prazo contado desde a notificação do despacho que indeferiu o pedido de esclarecimento já aludido.
Foi, pois, por entenderem que o processo só desde aí, ou seja, desde a notificação do despacho que lhes indeferiu o pedido de aclaração, obscuridades ou ambiguidades, é que conteria todos os elementos para o efetivo direito de recurso dos Recorrentes.
Ora, tal direito foi frustrado não só pelo despacho de indeferimento proferido após longos 49 dias, como, posteriormente, pelo entendimento que as duas instâncias adotaram no caso em concreto sem a devida mediação judicial que ao caso cabia.
Efetivamente, sem que os Recorrentes deixem de reconhecer as razões de segurança e certeza jurídica que devem imperar no campo do direito ordinário, não podem também deixar de clamar que o direito ao recurso efetivo é uma das garantias de defesa reconhecidas aos Recorrentes.
E, sendo certo que vem sendo controvertida a questão de se saber qual é o momento desde que se conta o prazo para recorrer não deixará este Tribunal de considerar que no caso em concreto de que se vem falando de que o prazo para interposição do recurso pelas razões invocadas se conta desde a data em que lhe foi feita a notificação do despacho que foi proferido decorridos 49 (quarenta e nove) dias após ter sido pedida a aclaração da sentença, e, não nos 30 (trinta) dias acrescidos de mais 10 (dez) dias, por ter havido impugnação da matéria de facto, a que podem acrescer, ainda, mais 3 (três) dias com multa.
O entendimento seguido pelas duas instâncias segundo o qual o prazo, no caso em apreço, para a interposição do recurso se conta desde a data em que lhes foi notificada a sentença, e, não desde a data em que lhes foi notificada a decisão que lhes indeferiu o pedido da sua aclaração, é inconstitucional por violação das normas citadas no n° 23° do requerimento da interposição do recurso para este Tribunal aqui reproduzidas.»
Ora, quanto à invocação de o despacho do Tribunal de 1ª instância que decidiu o pedido de aclaração formulado pelos ora reclamantes ter constituído uma decisão surpresa, verifica-se que este argumento não é procedente, já que, não apenas não é esta a decisão judicial recorrida no presente recurso de constitucionalidade, como, em qualquer caso, os recorrentes sempre teriam a oportunidade de ter suscitado a questão de constitucionalidade normativa de modo adequado na reclamação sobre a qual foi proferida a decisão judicial ora recorrida. Como resulta da decisão sumária impugnada, e contrariamente ao agora invocado, não foi nessa sede suscitada uma questão de inconstitucionalidade normativa em moldes processualmente adequados de modo a que assim pudesse ter sido decidida pelo tribunal “a quo”.
3.3. Em consequência, não se retirando da argumentação expendida razões que permitam infletir o juízo de inadmissibilidade do recurso de constitucionalidade por falta de objeto normativo e falta de suscitação adequada, conclui-se não assistir razão aos recorrentes na presente reclamação.
III. Decisão
4. Pelo exposto, o Tribunal decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta, nos termos do disposto nos artigos 7.º e 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro.
Lisboa, 20 de novembro de 2013. – Maria José Rangel de Mesquita – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.