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Processo n.º 31/13
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, em que é recorrente a Freguesia de Vila Fria do Município de Viana do Castelo e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
2. Pela Decisão Sumária n.º 73/2013, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:
«Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelo recorrente. Requisito que não se pode dar por verificado nos presentes autos.
Em requerimento dirigido ao Supremo Tribunal Administrativo, a recorrente pede a apreciação da constitucionalidade da «norma do nº 1, do artigo 10º, da Lei no 27/96, de 1 de agosto, interpretada no sentido de que “Só um circunstancialismo anómalo relevante, de intensidade adequada e proporcional ao desvalor jurídico detetado será passível de excluir a culpa dos agentes e, consequentemente, a aplicação da sanção”».
Sucede, porém, que o tribunal recorrido não aplicou, como ratio decidendi, norma reportada àquele preceito legal. No acórdão de 11 de outubro de 2012, o Supremo Tribunal Administrativo concluiu pela inadmissibilidade do recurso de revista, aplicando, como razão de decidir, o artigo 150.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos; e no acórdão de 22 de novembro de 2012, o tribunal recorrido concluiu pelo indeferimento da arguição de nulidade, aplicando, como razão de decidir, o artigo 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil. Aliás, foi por ter entendido que havia cingido anteriormente a sua pronúncia à admissibilidade da revista excecional que concluiu pelo indeferimento da nulidade por omissão de pronúncia.
A não verificação daquele requisito do recurso de constitucionalidade obsta ao conhecimento do seu objeto, justificando-se a prolação da presente decisão (artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC)».
3. Da decisão sumária vem agora a recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, com os seguintes fundamentos:
«1º - A reclamante interpôs recurso para este Tribunal do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, que não admitiu o recurso de revista para ele interposto:
2º - Nesse recurso, como muito bem frisa a Exmª Relatora, aquele Tribunal, aqui recorrido, concluiu pela inadmissibilidade do recurso de revista, numa primeira decisão e, no acórdão de 22 de novembro, de 2012, concluiu pelo indeferimento da arguição de nulidade:
3º - Ou seja, em nenhum dos casos se debruçou sobre o mérito da inconstitucionalidade suscitada:
4º - Pelo que deveria, sendo o caso, ser este Tribunal a fazê-lo;
5º - Todavia, a decisão sumária de que se reclama, estribou a não admissão do recurso por não se encontrar preenchido o requisito previsto na al. b), do nº l, do artº 70º, da LOTC, isto é, a aplicação, pelo Tribunal recorrido, da norma cuja constitucionalidade é questionada:
6º - O artigo 78º-A, nº l, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, com a redação da Lei nº 13-A/98, de 26/02, refere o seguinte: “Se entender que não pode conhecer-se do objeto do recurso ou que a questão a decidir é simples, designadamente por a mesma já ter sido objeto de decisão anterior do Tribunal ou por ser manifestamente infundada, o relator profere decisão sumária, que pode consistir em simples remissão paro a jurisprudência do tribunal”
7º - Ainda que deva levar-se em conta o advérbio “designadamente” o preceito em causa possui dois “bastiões” para não conhecer do recurso, que não são de menosprezar: ter sido objeto de decisão do Tribunal, o que não sucedeu; por (a questão) ser manifestamente infundada, do que também não se cuidou;
8º - Resta saber se o cariz exemplificativo do advérbio designadamente suporta a sumária de que se reclama, isto é, se os fundamentos plasmados na mesma o patamar daqueles dois “bastiões”;
9º - Com o devido respeito não nos parece, isto é, não ter-se chegado ao mérito em decisão de Tribunal anterior não pode constituir válvula de escape para o não exercício instrumental da atividade que o mérito pressupostamente exige;
10º - A partilhar-se a decisão sumária vertida, com todo o respeito, que é muitíssimo, não vê a reclamante como possa materializar-se o plasmado no artigo 204º, da nossa Lei Fundamental;
11º - V. Exªs, todavia, na senda da decisão em conformidade, melhor decidirão».
4. Notificado da reclamação, o Ministério Público veio dizer o seguinte:
«1º
O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 11 de outubro de 2012, complementado pelo proferido em 22 de novembro de 2012 – que indeferiu a arguição de nulidade do primeiro –, por não se verificarem os pressupostos exigidos pelo artigo 150.º, n.º 1, do CPTA, não admitiu o recurso de revista interposto pela Freguesia de Vila Fria do Município de Viana do Castelo.
2º
Como nos parece claro e é reforçado pelo acórdão que indefere a arguição de nulidade, o Supremo Tribunal Administrativo, ao não admitir o recurso, aplicou exclusivamente a norma que estabelece os requisitos de admissibilidade da revista excecional: o artigo 150.º do CPTA.
3º
Parece-nos, pois, evidente, tal como se entendeu na douta Decisão Sumária, ora reclamada, que a decisão recorrida não aplicou a norma cuja inconstitucionalidade o recorrente identifica como objeto do recurso: uma certa interpretação do artigo 10.º, n.º 1, da Lei n.º 27/96, de 1 de agosto.
4º
Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC o relator no Tribunal Constitucional profere decisão sumária quando: i) entender que não se pode conhecer do objeto do recurso; ii) a questão a decidir for simples.
5.º
No caso dos autos, foi proferida decisão sumária porque se entendeu que não devia conhecer-se do objeto do recurso.
6.º
Assim, as considerações que a recorrente faz na reclamação, sobre o que se deve entender por uma “questão simples” não têm, no caso, qualquer relevância.
7.º
Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Nos presentes autos foi proferida decisão de não conhecimento do objeto do recurso, por não se poder dar como verificado o requisito da aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja apreciação foi requerida a este Tribunal.
Para contrariar o decidido, a reclamante argumenta que a decisão reclamada foi proferida fora das hipóteses previstas no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, a disposição legal que permite ao relator a prolação de decisão sumária. Sem razão.
De acordo com o artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, o relator pode proferir decisão sumária em duas situações distintas: se entender que não pode conhecer-se do objeto do recurso; ou se entender que a questão a decidir é simples, caso em que conhece do objeto do recurso. Ora, a decisão reclamada foi proferida por a relatora ter entendido que não pode, no caso, conhecer-se do objeto do recurso, por não se poder dar como verificado um dos requisitos do recurso interposto, o que faz cair a argumentação da reclamante.
Reiterando que o tribunal recorrido não aplicou, como razão de decidir, norma reportada ao n.º 1 do artigo 10.º, da Lei n.º 27/96, de 1 de agosto, obstando tal ao conhecimento do objeto do recurso interposto, há que confirmar a decisão reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 20 de março de 2013. – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria Lúcia Amaral.