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Proc. nº 253/01
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Nos presentes autos vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente F... e recorrido o Banco B..., SA, foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no 70º, nº 1, alínea b) da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, mediante a apresentação do requerimento de fls. 1228 a
1232 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
2. Na sequência, foi o recorrente notificado, por despacho do Relator de 23 de Outubro de 2000, proferido ao abrigo do disposto no artigo 75º-A, nº 6 da LTC, para que desse cabal cumprimento ao disposto naquele art. 75º-A.
3. Em resposta à solicitação do Relator o recorrente apresentou um requerimento
(fls. 1274 a 1279 dos autos) que, no que se refere à identificação das normas cuja constitucionalidade pretende ver apreciada, tem o seguinte teor:
“Normas violadas: a) Violação do art. 25º do Código do Processo de Trabalho – (Decreto-Lei nº
272-A/81, de 30 de Dezembro) – interpretação segundo a qual no Tribunal do Trabalho, como foi interpretado no tribunal a quo, em que não notificou o recorrente da decisão final -, essa norma com esse entendimento é inconstitucional. b) Violação do art. 698º, nº 6 do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual no Tribunal do Trabalho (violando consequentemente o art. 2º, nº
2, alínea a) do D/Lei 272-A/81, de 30 de Dezembro – do antigo Código do Processo de Trabalho, e, art. 2º, nº 2 alínea a) do D/Lei nº 480/99, de 9 de Novembro – do novo Código do Processo de Trabalho), como foi interpretado no no tribunal a quo – em que o levou a não admitir o recurso recusando-lhe o acréscimo do prazo de 10 dias da reapreciação da prova gravada, expresso na lei -, essa norma com esse entendimento é inconstitucional. c) Violação do art. 145º, nº 6 do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual no processo de Trabalho (violando consequentemente o art. 2º, nº
2, alínea a) do D/Lei 272-A/81, de 30 de Dezembro – do antigo Código do Processo de Trabalho, e, art. 2º, nº 2 alínea a) do D/Lei nº 480/99, de 9 de Novembro – do novo Código do Processo de Trabalho), como foi interpretado no no tribunal a quo – em que ao recorrente não assistiu o direito de apresentar as alegações no
2º dia a seguir ao termo do prazo de recurso com o pagamento de multa - essa norma com esse entendimento é inconstitucional. d) Violação da Cláusula 116º do ACTV – Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário (publicado no BTE nº 31, 1ª Série, de 22 de Agosto de 1990), e violação do art. 27º, nº 3 da LCT (DL 49 408, de 24-11-69), segundo a qual a infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que teve lugar ou logo que cesse o contrato de trabalho, na interpretação pelo tribunal a quo – em que por a infracção ser do conhecimento oficioso e a mesma Ter prescrito, sonegando a aplicação deste comando normativo, essa norma com esse entendimento
é inconstitucional. e) Violação do favor laboratoris, princípio imperativo do direito do trabalho, consgrado no art. 13º, nº 1, da LCT (DL 49 408, de 24-11-69) e no art. 6º do DL
519-C1/79, de 29 de Dezembro, na interpretação feita pelo Tribunal a quo que ocultou e sonegou a aplicação das normas descritas em a), b), c), e d) ao processo de Trabalho do recorrente, esse entendimento é inconstitucional”.
4. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso (fls. 1321 a 1325).
É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
“(...) Ora, como vai ver-se, é manifesto que, por várias razões, não pode conhecer-se do objecto do recurso que o recorrente pretendeu interpor.
5. Nos termos do artigo 75º-A, nº 1, da Lei do Tribunal Constitucional, o recurso interpõe-se por meio de requerimento, no qual se indique, designadamente, a norma cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal aprecie. Sobre este requisito de admissibilidade do recurso de constitucionalidade tem o Tribunal Constitucional afirmado, repetidamente, que nada obsta a que seja questionada apenas uma certa interpretação ou dimensão normativa de um determinado preceito. Porém, nesses casos, tem o recorrente o ónus de enunciar, de forma clara e perceptível, o exacto sentido normativo do preceito que considera inconstitucional. Como se disse, por exemplo, no Acórdão nº 178/95 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 30º vol., p.1118.) “tendo a questão de constitucionalidade que ser suscitada de forma clara e perceptível (cfr., entre outros, o Acórdão nº
269/94, Diário da República, II Série, de 18 de Junho de 1994), impõe-se que, quando se questiona apenas uma certa interpretação de determinada norma legal, se indique esse sentido (essa interpretação) em termos de que, se este Tribunal o vier a julgar desconforme com a Constituição, o possa enunciar na decisão que proferir, por forma a que o tribunal recorrido que houver de reformar a sua decisão, os outros destinatários daquela e os operadores jurídicos em geral, saibam qual o sentido da norma em causa que não pode ser adoptado, por ser incompatível com a Lei Fundamental”. Pois bem, não tendo o recorrente identificado logo no requerimento de interposição do recurso - ao menos da forma clara e perceptível que vem sendo exigida por este Tribunal - a exacta interpretação normativa do artigos que identifica (os artigos 25º do Código do Processo do Trabalho, 145º, nº 6 e 698º, nº 6 do Código de processo Civil, a Cláusula 116º do ACTV, e o “princípio do favor laboratoris”) e cuja constitucionalidade pretendia ver apreciada por este Tribunal, foi o mesmo notificado, ao abrigo do disposto no nº 6 do artigo 75º-A da LTC, para suprir a irregularidade verificada. A verdade, porém, é que mais uma vez não foi o recorrente capaz de fazê-lo, como pode verificar-se pela simples leitura da resposta ao convite do Relator, que supra já transcrevemos nesta parte. Ora, a não identificação, de forma clara e perceptível, da exacta dimensão normativa dos preceitos cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada obsta, só por si, a que possa conhecer-se do objecto do recurso.
6. Acresce, no mesmo sentido, que ainda que se considerasse que o recorrente teria sido capaz de identificar claramente a interpretação normativa dos artigos
25º do Código do Processo do Trabalho, 145º, nº 6 e 698º, nº 6 do Código de Processo Civil, da Cláusula 116º do ACTV, e dos preceitos de onde se extrai o princípio do favor laboratoris, cuja constitucionalidade pretende ver apreciada, ainda assim sempre seria de não conhecer do objecto do recurso, na medida em que nenhum desse preceitos foi efectivamente aplicado, como ratio decidendi, pela decisão recorrida (o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de fls. 1218), que se limitou a confirmar a decisão do Relator do processo no Tribunal da Relação de Coimbra de fls. 1189 a 1190 que, em aplicação do preceituado nos artigo 76º, nº 1, do Código do Processo de Trabalho e 690º, nº 3 do Código de Processo Civil, decidiu julgar deserto o recurso, por falta de alegações (uma vez que estas não teriam sido apresentadas juntamente com o requerimento de interposição do recurso, como exige o primeiro daqueles preceitos) e, em consequência, decidiu não conhecer do seu objecto”.
5. Inconformado com esta decisão o recorrente apresentou, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, nº 3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência (fls. 1327 a 1360), alegando, em síntese e para o que agora interessa, que:
i) não é verdade que, como se decidiu na decisão reclamada, o recorrente não tenha suscitado de forma clara e perceptível as questões de constitucionalidade normativa que pretende ver apreciadas;
ii) houve uma confusão na decisão reclamada, porque o acórdão recorrido é o de fls. 1073, do Tribunal da Relação de Coimbra, que se reporta ao recurso de apelação e não o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de fls. 1218.
Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
III – Fundamentação
6. Alega o recorrente, em primeiro lugar, que, ao contrário do que se decidiu na decisão reclamada, teria suscitado de forma clara e perceptível as questões de constitucionalidade normativa que pretende ver apreciadas.
A verdade, porém, é que não o fez.
Aliás, sobre este ponto deve começar por referir-se que a argumentação utilizada na reclamação apresentada é mesmo incompatível com o objectivo a que o reclamante se propõe: demonstrar que no requerimento de interposição do recurso
(interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC, recorde-se) ou na resposta ao convite do Relator para completar esse requerimento teria identificado claramente a dimensão normativa com que os preceitos objecto de recurso teriam sido aplicados.
Na verdade, para contestar, nesta parte, a decisão do Relator, argumenta o recorrente que “esclareceu devidamente no seu requerimento que os preceitos normativos não foram aplicados....”. Ora, se no entender do recorrente os preceitos em causa não foram sequer aplicados pela decisão recorrida, é a própria invocação da alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC como fundamento do recurso que deixa de ter sentido, uma vez que o recurso interposto ao abrigo dessa alínea pressupõe a efectiva aplicação como ratio decidendi da norma cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada.
Em suma: como, bem, se disse já na decisão reclamada - e agora apenas há que reiterar – se o recorrente pretendia questionar apenas uma certa interpretação de determinadas normas legais, deveria ter indicado esse sentido (essa interpretação) em termos que, se este Tribunal o viesse a julgar desconforme com a Constituição, o pudesse enunciar na decisão que proferir, por forma a que o tribunal recorrido que houvesse de reformar a sua decisão, os outros destinatários daquela e os operadores jurídicos em geral, pudessem saber qual o sentido da norma em causa que não poderia ser adoptado, por ser incompatível com a Lei Fundamental.
Ora, como pode verificar-se pela simples leitura quer do requerimento de interposição do recurso quer da resposta ao convite do Relator, o recorrente não foi aí capaz de cumprir aquele ónus, pelo que andou bem a decisão reclamada ao, com esse fundamento, decidir não conhecer do objecto do recurso.
7. Quanto à alegada confusão na identificação da decisão recorrida diga-se apenas que se alguma confusão existe é por parte do recorrente e não da decisão reclamada. A decisão recorrida é efectivamente o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de fls. 1218. Não só porque é esta a decisão final (e, portanto, a única recorrível para o Tribunal Constitucional – cfr. art. 70º, nº 2 da LTC) mas porque foi esta a decisão que o recorrente expressamente identificou como decisão recorrida no seu requerimento de interposição do recurso (cfr. fls.
1228).
III - Decisão
Por tudo o exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta
Lisboa, 28 de Setembro de 2001- José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida