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Processo n.º 761/12
1.ª Secção
Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros
Acordam, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. A. intentou, junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, ação de investigação da paternidade contra B., pedindo que fosse declarado que é filha do réu.
Este contestou, invocando, além do mais, a caducidade da ação.
Em despacho saneador foi a exceção de caducidade julgada improcedente, por se ter entendido que seria inconstitucional que as ações de investigação de paternidade estivessem sujeitas a prazos de caducidade, quaisquer que eles fossem.
Inconformado, o réu apelou para a Relação, que confirmou a decisão da 1.ª instância. Do Acórdão da Relação interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça que, considerando inconstitucional o novo prazo de investigação estabelecido pela Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, negou a revista, confirmando o acórdão recorrido na parte em que confirmou a sentença de 1.ª instância, não se pronunciando quanto à recusa da aplicação, por inconstitucionalidade material, do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, por tal questão ter ficado prejudicada pela decisão dada à outra.
Desta decisão interpôs o réu recurso para o Tribunal Constitucional que, pelo Acórdão n.º 106/2012 em aplicação do Acórdão do Plenário n.º 401/2011 (ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt), não julgou inconstitucional a norma contida no n.º 1 do artigo 1817.º do Código Civil (CC), na parte em que admite a prescrição do direito a investigar a paternidade (objeto a que por despacho da relatora, foi circunscrito o conhecimento do recurso). Consequentemente foi concedido provimento ao recurso, determinando a reforma da decisão recorrida quanto à questão de constitucionalidade.
Por acórdão de 20 de setembro de 2012, o Supremo Tribunal de Justiça, reformando a decisão quanto à questão de constitucionalidade, e considerando por sua vez ferida de inconstitucionalidade material, por violação do artigo 18.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP), a norma do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, ao determinar que a nova redação do artigo 1817.º, n.º 1 do CC se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, julgou a ação tempestivamente interposta, determinando o prosseguimento dos seus termos, assim negando a revista.
Desta decisão interpôs o réu mais uma vez recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, LTC, dizendo:
«tendo em atenção que o acórdão recorrido recusou a aplicação das normas do artigo 3.º da Lei 14/2009 e do artigo 1817.º n.º 1 do Código Civil, quer na redação anterior à Lei 14/2009 de 01.04, quer na redação que esta Lei lhe deu, por entender que o direito à propositura da ação de investigação da paternidade é imprescritível ou insuscetível de caducidade, e que aquelas normas são inconstitucionais por violação dos artigos 18.º, n.º 3, e 26.º n.º 1.»
Em alegações, viria, porém, esclarecer que «a questão decidenda no presente recurso consiste em saber se aplicação do art. 3º da Lei 14/2009 aos processos pendentes à data da sua publicação e entrada em vigor está ou não ferida de inconstitucionalidade material» (conclusão n.º 1), Desta forma reduziu o objeto do recurso à recusa de aplicação daquela norma, formulando a pretensão de, por via do mesmo, ver «revogado o Acórdão recorrido do Supremo Tribunal de Justiça e declarado que a aplicação imediata da Lei 14/2009, designadamente o seu artigo 3.º, não padece de qualquer inconstitucionalidade.» (fls. 339)
Notificada para contra-alegar, a recorrida nada disse.
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
2. A decisão recorrida recusou a aplicação do artigo 3º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, «ao determinar que a nova redação dada ao art. 1817.º, n.º 1 do CC [aplicável à ação de investigação da paternidade ex vi art. 1873.º do mesmo Código Civil] se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, como aqui sucede, assim impondo a sua aplicação retroativa a esta demanda» por considerar a referida norma «ferida de inconstitucionalidade material, desde logo, por violação do art. 18.º, n.º 3 da Constituição da República (art. 204.º da CRP)».
O Tribunal Constitucional já apreciou a norma cuja aplicação foi recusada pelo tribunal recorrido.
Com efeito, o acórdão n.º 24/2012 do Plenário do Tribunal Constitucional (acessível no sítio supra citado) decidiu julgar inconstitucional a norma constante do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, na medida em que manda aplicar, aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, o prazo previsto na nova redação do artigo 1817.º, n.º 1 do CC, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código.
Em aplicação do entendimento que se extrai desta decisão, há que retomar a referida solução de inconstitucionalidade no presente caso.
III – Decisão
3. Termos em que se decide:
a) julgar inconstitucional a norma constante do artigo 3.º da Lei n.º 14/2009, de 1 de abril, na medida em que manda aplicar, aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, o prazo previsto na nova redação do artigo 1817.º, n.º 1 do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873.º do mesmo Código, e, em consequência
b) Negar provimento ao recurso.
Lisboa, 31 de maio de 2013. – Maria de Fátima Mata-Mouros – José da Cunha Barbosa – Maria Lúcia Amaral – Maria João Antunes – Joaquim de Sousa Ribeiro.