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Proc. nº 155/94
1ª Secção Rel.: Consº Tavares da Costa
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I
1. - J..., interpôs recurso contencioso de anulação da deliberação do Conselho dos Oficiais de Justiça (COJ), proferida em autos de processo disciplinar, aos 20 de Novembro de 1990, que lhe aplicou a pena disciplinar de inactividade pelo período de dezoito meses.
Alegou, para o efeito, existir não só vício de violação de lei, mas, também, serem inconstitucionais as normas atributivas do poder disciplinar do COJ.
Em sua tese, o Decreto-Lei nº 376/87, de 11 de Dezembro
- diploma que aprovou a chamada Lei Orgânica das Secretarias Judiciais e o Estatuto dos Funcionários de Justiça, diploma então em vigor, em toda a sua plenitude, pois só mais recentemente foi publicado o Decreto-Lei nº 343/99, de
26 de Agosto, que aprovou o novo Estatuto dos Funcionários de Justiça, não tem cobertura de autorização legislativa e as suas normas atributivas de competência para aplicar penas disciplinares contendem com a matéria dos direitos, liberdades e garantias, constitucionalmente reservada à competência legislativa da Assembleia da República - atendendo ao disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 168º da CR (hoje correspondendo ao artigo 165º) que nessa reserva inclui o 'regime geral de punição das infracções disciplinares'.
O Senhor Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, por sentença de 11 de Janeiro de 1994, tendo presente esse comando constitucional e considerando encontrarem-se naquele Decreto-Lei nº 376/87 normas que versam matéria incluída na reserva relativa da AR (regras gerais do procedimento disciplinar - Secção VI e várias disposições da Secção VIII - a definição de ilícito disciplinar - artigo 124º - tipos de sanções aplicáveis e respectivos limites - Secção VII), teve o citado diploma, nessa parte, por organicamente inconstitucional e, por conseguinte, recusou a sua aplicação ao caso sub judicio, uma vez que o acórdão do COJ aplicou os artigos 131º, 136º,
138º, 139º, 141º e 124º daquele texto legal.
2. - O Ministério Público recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto nos artigos 70º, nº 1, alínea a), e 72º, nº 1, alínea a), e nº 3, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, 'relativamente à parte [da sentença] que não aplicou as secções VI e VII do capítulo V do Decreto-Lei nº 376/87, de 11 de Dezembro, por o ter julgado organicamente inconstitucional'.
O Conselho dos Oficiais de Justiça, por seu turno, interpôs recurso jurisdicional para a Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo.
Só o primeiro recurso foi recebido, por ora, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.
Nas alegações oportunamente apresentadas neste Tribunal, defende o Ministério Público a procedência do recurso, de modo a determinar-se a reforma da decisão recorrida, concluindo do seguinte modo:
'1º- Apenas se situa no âmbito da competência legislativa reservada da Assembleia da República, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 168º da Constituição, a definição do regime geral de punição das infracções disciplinares e do respectivo processo;
2º- É, pois, lícito ao Governo, em diploma que não carece ser credenciado por autorização parlamentar, estabelecer regimes especiais, adequando - sem subverter - aquele regime geral do ilícito e do processo disciplinar (constante presentemente do Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro) às exigências específicas das funções exercidas por funcionários e agentes que gozem de estatuto especial.
3º- As normas das secções VI e VII do Capítulo V do Decreto-Lei nº 367/87, de 11 de Dezembro, efectivamente aplicadas na dirimição do caso 'sub judicio', não importam colisão com quaisquer pontos estruturais ou essenciais do regime geral do ilícito e do processo disciplinar - quer na sua vertente substantiva, de definição do ilícito disciplinar e tipificação da pena efectivamente cominada ao recorrente, quer na sua vertente procedimental, da tramitação do processo disciplinar - pelo que se não verifica a decretada inconstitucionalidade orgânica'.
O recorrido nada disse, tendo o COJ vindo aos autos oferecer o merecimento destes.
II
1. - Importa, antes de mais, delimitar o objecto do recurso, consignando-se, para o efeito, que o COJ, no processo disciplinar instaurado ao ora recorrido, o sancionou com a pena de inactividade prevista na alínea e) do nº 1 do artigo 127º do Decreto-Lei nº 376/87, após valoração e determinação da pena em função do circunstancialismo tido como provado e do concurso de infracções que teve por verificado, o que significa ter aplicado as normas consubstanciadas seja no artigo 124º do diploma (integrado na Secção VI – Procedimento disciplinar, do Capítulo V – Conselho dos Oficiais de Justiça), seja nos artigos 131º, 136º, 138º, 139º e 141º, todos da Secção VII (Das Penas) do mesmo capítulo, relativas à pena em si, à sua aplicação e medida, à atenuação especial da pena e ao concurso de infracções, respectivamente.
O magistrado a quo, confrontado com este quadro normativo que o COJ aplicara, pronunciou-se no sentido de que sobre estas matérias o Governo só poderia legislar se estivesse para tal parlamentarmente credenciado, no uso da competência legislativa prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 201º da CR (hoje no artigo 198º), o que não foi o caso, dado o Governo ter invocado a sua própria competência legislativa ao mencionar a alínea a) desse preceito, como norma habilitadora, na nota preambular do diploma.
De resto, acrescenta esse magistrado, impunha-se a expressa menção de autorização legislativa, nos termos do nº 3 do artigo 201º citado, sob pena de se considerar ter o Governo feito uso de competência legislativa própria.
A esta luz e por esta fundamentação, recusou a aplicação das Secções VI e VII do capítulo I do Decreto-Lei nº 376/87, globalmente considerados.
Sem prejuízo do assim decidido e uma vez que se está no domínio da fiscalização concreta de constitucionalidade, e à revelia do alcance a atribuir a eventual inconstitucionalidade orgânica do diploma, atente-se, na especificidade do concreto caso, à configuração das normas que efectivamente moldaram o acto impugnado e à própria decisão recorrida, ou seja, circunscrevamo-nos às normas concretamente desaplicadas que, aliás, foram nessa decisão individualizadas: as normas dos artigos 124º, 131º, 136º, 138º, 139º e
141º do Decreto-Lei nº 376/87.
E, tomando estas, considerem-se apenas os segmentos normativos em causa:
'Artigo 124º Infracção disciplinar Constituem infracção disciplinar os factos, ainda que meramente culposos, praticados pelos oficiais de justiça com violação dos deveres profissionais e os actos ou omissões da sua vida pública ou que nela se repercutam incompatíveis com a dignidade indispensável ao exercício das suas funções'.
'Artigo 131º Penas de suspensão de exercício e de inactividade
1.- As penas de suspensão de exercício e de inactividade consistem no afastamento completo do serviço durante o período da pena.
2.- (...)
3.- A pena de inactividade não pode ser inferior a um ano nem superior a dois'.
'Artigo 136º Penas de suspensão de exercício e de inactividade
1.- As penas de suspensão de exercício e de inactividade são aplicáveis nos casos de negligência grave ou de grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres profissionais ou quando o oficial de justiça for condenado em pena de prisão, salvo se a condenação implicar pena de demissão.
2.- (...)'
'Artigo 138º Medida da pena Na determinação da medida da pena atende-se à gravidade do facto, à culpa do agente, à sua personalidade e às circunstâncias que deponham a seu favor ou contra ele.'
'Artigo 139º Atenuação especial da pena A pena pode ser especialmente atenuada, aplicando-se pena de escalão inferior, quando existam circunstâncias anteriores ou posteriores à infracção, ou contemporâneas dela, que diminuam acentuadamente a gravidade do facto ou a culpa do agente.'
'Artigo 141º Concurso de infracções
1.- Verifica-se o concurso de infracções quando o oficial de justiça comete duas ou mais infracções antes de se tornar inimpugnável a condenação por qualquer delas.
2.- No concurso de infracções aplica-se uma única pena e, quando às infracções correspondem penas diferentes, aplica-se a de maior gravidade, agravada em função do concurso, se for variável.'
As normas sindicandas, concretamente desaplicadas pelo magistrado a quo, são normas que definem infracção disciplinar, que prevêm tipos de sanções, que cuidam da medida da pena e do concurso de infracções.
A Constituição da República, como já houve oportunidade de registar, prescreve ser da competência legislativa da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo, legislar sobre o regime geral de punição das infracções disciplinares.
Assim sendo e tendo presente que o Decreto-Lei nº
376/87, no qual se inserem as apontadas normas, foi editado pelo Governo ao abrigo do disposto da sua competência legislativa própria, o magistrado recorrido surpreendeu-lhe inconstitucionalidade orgânica: o diploma, em seu critério, contém matérias da exclusiva competência legislativa da Assembleia da República - como é o caso das normas em apreço - mas, não obstante, omite qualquer invocação de lei de autorização legislativa e, por outro lado, expressamente convoca a competência legislativa própria do Governo para fazer decretos-leis em matérias não reservadas ao Parlamento.
2. - Ao situar na área da exclusiva competência da Assembleia da República - reserva relativa – o regime geral de punição das infracções disciplinares, o texto constitucional não limitou a intervenção do legislador parlamentar à definição dos princípios, directivas ou standards fundamentais, estendendo-a ao nível das próprias normas integradoras do regime e modeladoras do seu perfil, em paralelismo com a formulação utilizada em outras alíneas do nº
1 do artigo 168º da CR – na versão então em vigor, a que hoje corresponde o artigo 165º -, como nas alíneas e), h) e p), diferentemente dos casos em que se alude a bases dos correspondentes regimes, como sucede, entre outras, nas alíneas f), g) e n).
Nesta linha de entendimento, perfilhada por Gomes Canotilho (cfr. Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, 1998, pág. 645) – que a jurisprudência do Tribunal Constitucional vem acolhendo, como o ilustra o acórdão nº 77/88, publicado no Diário da República, I Série, de 28 de Abril de 1988 – definir um regime comum ou normal significa estabelecer uma disciplina jurídica completa desse regime, sem prejuízo de regimes especiais a estabelecer pelo Governo, ou, se for caso disso, pelas assembleias legislativas regionais; estabelecer as bases gerais equivale à consagração das opções político-legislativas fundamentais, deixando-se (ou podendo deixar-se) ao Governo e às assembleias legislativas regionais a definição concreta dos regimes gerais.
Esta exigência de intervenção parlamentar, sem ir ao ponto de impor a reserva relativamente à regulamentação legislativa em toda a matéria, consubstanciando o que Gomes Canotilho e Vital Moreira designaram por nível de densificação intermédio (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 3ª ed., 1993, pág. 670), insere-se na verificação de diversos estratos de competência legislativa parlamentar. Como observa o primeiro destes autores na sua obra já citada, vários níveis de competência legislativa da Assembleia da República são possíveis de enunciar: um, de densificação legislativa total, nos casos de a disciplina legislativa de uma matéria ser reservada de uma forma completa à AR, como é o caso da generalidade das matérias previstas nos artigos 164º e 165º; outro, de densificação intermédia, nos casos em que a disciplina legislativa da AR incide sobre o regime comum ou normal, como ocorre no artigo 165º, nº 1, alíneas d), e) e h); um terceiro nível, finalmente, de densificação limitada às bases gerais dos regimes jurídicos, caso do artigo 165º, nº 1, alíneas f), g), n), t) e u) [as referências aos artigos da Constituição consideram o texto saído da IV Revisão Constitucional].
3. - À luz das considerações expostas, o caso presente recorta-se como revestido de densificação intermédia.
Aceite que assim é, atente-se ao modo como a decisão recorrida aborda a questão da conformidade das normas em que se baseou o acto recorrido, decisão essa aferida pelos parâmetros da chamada inconstitucionalidade orgânica.
Escreveu-se, então, a este respeito:
'O artigo 168º, nº 1, alínea d) da CRP, na redacção introduzida pela 1ª Revisão Constitucional de 1982 e que não foi alterado pelas revisões posteriores, dispõe que ‘é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: regime geral de punição das infracções disciplinares, bem como dos actos ilícitos de mera ordenação social e do respectivo processo’. Resulta deste preceito, que cabe à Assembleia da República definir a natureza do ilícito disciplinar, os tipos de sanções e seus limites e as regras gerais do processo disciplinar (cfr. Gomes Canotilho – Vital Moreira in ‘Constituição da República Portuguesa’, em anotação ao artigo 168º). Ora, no citado DL nº 376/87, encontram-se regras gerais do procedimento disciplinar (cfr. secção VI e várias disposições da secção VIII), a definição do ilícito disciplinar (cfr. artigo 124º) e os tipos de sanções aplicáveis e respectivos limites (cfr. secção VII), ou seja, matérias que se incluem na reserva relativa da Assembleia da República. Por isso, o Governo só podia legislar nessas matérias ao abrigo de uma autorização legislativa concedida pela Assembleia da República – cfr. artigo
201º, nº 1, alínea b) da CRP. E essa lei de autorização legislativa devia ser expressamente invocada pelo legislador do DL. nº 376/87 (cfr. artigo 201º, nº 3 da CRP), sob pena de se considerar que o Governo fez uso de competência legislativa própria (cfr. entre outros, acórdão do Tribunal Constitucional
(Plenário) nº 72/90 de 21/3/90 in BMJ nº 395º - 161 e acórdão do Tribunal Constitucional – 2ª secção – nº 182/90 de 6/6/90 in BMJ nº 398º - 67). Ora, conforme resulta do preâmbulo do DL. nº 376/87, pela referência à alínea a) do nº 1 do artigo 201º da Constituição, o Governo fez uso de competência legislativa própria, apesar de incluir nesse diploma matérias da exclusiva competência legislativa da Assembleia da República e de não dispor de autorização legislativa. Assim, nessa parte, o citado Decreto-Lei é organicamente inconstitucional, devendo este tribunal recusar a sua aplicação (cfr. artigo 207º da CRP). Desta conclusão, deriva a ilegalidade dos actos do processo disciplinar que se basearam nesse Decreto-Lei (cfr. Ac do STA de 19/6/86 in A.D. 306º - 773 e AC. do T.P. de 20/3/87 in A.D. 311º - 1458), como acontece no acórdão punitivo que fez apelo aos artºs. 131º, 136º, 138º, 139º, 141º e 124º que, por se incluírem nas referidas secções VI e VII deste diploma, são organicamente inconstitucionais. Refira-se ainda que, ao contrário do entendimento perfilhado pelo recorrente, cremos que as normas atributivas do poder de aplicar penas ao conselho dos oficiais de justiça - no caso a norma do artigo 95º do citado DL. nº 376/87 - não são organicamente inconstitucionais, porque nela não se definem a natureza do ilícito disciplinar, nem os tipos de sanções, nem as regras gerais do processo disciplinar, não se podendo, por isso, considerar como incluídas no
‘regime geral de punição das infracções disciplinares’.'
Por sua vez, a tese sustentada pelo Ministério Público, oposta à acolhida na decisão, situa-se em diferente enfoque.
Com efeito, verificando-se que o regime geral das infracções e do processo disciplinar consta de diploma próprio – então, o Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84, de 16 de Janeiro, na sequência de autorização legislativa concedida pela Lei nº 10/83, de 13 de Agosto - teve-se presente que o nº 2 do artigo 1º desse texto legal, reportando-se ao âmbito da sua aplicação, dispõe dele se excluirem os funcionários e agentes que possuam estatuto especial, o que significa, para o recorrente, que o próprio diploma que contém o regime geral ou comum do ilícito e do processo disciplinar expressamente ressalva a eventual existência de estatutos disciplinares especiais, criados sempre que assim o imponha a especificidade das funções cometidas a determinados agentes administrativos.
Nesta perspectiva - e sempre na tese do recorrente - os preceitos relativos ao procedimento disciplinar e às penas aplicáveis aos funcionários judiciais 'limitam-se a adequar as normas e princípios vigentes para a generalidade dos funcionários e agentes da Administração à especificidade das funções cometidas às secretarias judiciais' que, na verdade, não se configuram como simples órgãos da Administração, antes se recortando como órgãos auxiliares dos tribunais judiciais, assegurando o expediente inerente ao exercício da função jurisdicional por estes órgãos de soberania desempenhado, expediente esse que cumpre às repartições e secretarias judiciais, nos termos do artigo 97º da Lei nº 38/87, de 23 de Dezembro ('Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais', LOTJ).
Sustenta-se, nomeadamente na argumentação desenvolvida:
'[...] verifica-se que, quanto à definição da natureza do ilícito disciplinar, o artigo 124º do Decreto-Lei nº 367/87 tipifica como infracção disciplinar - para além dos factos que impliquem ‘violação dos deveres profissionais’ (no que coincide perfeitamente com o artigo 3º do Decreto-Lei nº 24/84), também ‘os actos ou omissões da sua vida pública ou que nela se repercutam incompatíveis com a dignidade indispensável ao exercício das suas funções’ - em termos paralelos aos que constam do Estatuto dos Magistrados Judiciais. Trata-se, como é óbvio, de simples corolário da existência de um dever especial de comportamento, decorrente da específica natureza das funções exercidas, em
órgãos auxiliares daquelas a que está cometida a tarefa de administração da Justiça. Tal ‘extensão’ do conceito de ‘infracção disciplinar’ não assumiu, aliás, qualquer relevância no caso ‘sub judicio’, já que o recorrente foi punido disciplinarmente em consequência de comportamentos tidos no exercício das suas funções de escrivão-adjunto. Relativamente aos tipos de sanções aplicáveis e seus limites verifica-se que a sanção disciplinar concretamente aplicável - a pena de inactividade pelo período de 18 meses - prevista no artigo 127º, nº 1, alínea e), e no artigo 131º, nºs. 1 e 3 do Decreto-Lei nº 367/87, está igualmente prevista no diploma que estabelece o regime geral do ilícito disciplinar [artigo 11º, nº 1, alínea d), do Decreto-Lei nº 24/84], sendo definida precisamente nos mesmos termos (artigo
12º, nº 3) e sendo para ela estabelecidos idênticos limites (artigo 12º, nº 5) - verificando-se, pois, que o legislador, ao editar o Estatuto dos Funcionários Judiciais, se limitou a decalcar, neste ponto, o regime que já decorria do estipulado no Decreto-Lei nº 24/84. Finalmente - e no que se reporta às regras gerais do processo disciplinar - não se vê que o regime procedimental instituído pelo Decreto-Lei nº 367/87 se afaste, em termos significativos ou ‘estruturais’, dos princípios gerais enunciados pelos artigos 35º e seguintes do Decreto-Lei nº 24/84 - não constando, por outro lado, do processo referência a qualquer regime especial ou excepcional que contrariasse as regras gerais que devem moldar tal forma de processo. Aliás, a principal especificidade terá consistido na atribuição da competência disciplinar ao COJ - sendo certo, todavia, que a própria decisão recorrida não detectou qualquer ‘inconstitucionalidade’ neste regime'.
4. - Tem razão o magistrado recorrente, nos termos em que se pronuncia quanto à não inconstitucionalidade orgânica das normas que constituem o objecto do recurso de constitucionalidade.
Na verdade, quer na definição da natureza do ilícito disciplinar (a que se refere o artigo 124º), quer no tocante ao tipo de normas relativas às sanções aplicáveis e respectivos limites (artigos 131º, 136º, 138º,
139º e 141º do mesmo diploma) – tendo, particularmente, em atenção a sanção em concreto aplicada – não se verifica qualquer especial disposição que contenda com o regime geral do processo disciplinar, pelo que as normas em causa não se mostram afectadas de inconstitucionalidade orgânica.
Note-se, a finalizar, que o Tribunal Constitucional julgou materialmente inconstitucionais, no seu acórdão nº 145/2000, publicado no Diário da República, II Série, de 18 de Outubro de 2000, as normas dos artigos
95º e 107º, alínea a), do Decreto-Lei nº 376/87, por violação do disposto no nº
3 do artigo 218º da Constituição da República, sendo certo, porém, que, ao caso sub judicio, estas normas não constituem objecto do recurso de constitucionalidade, não tendo sido desaplicadas na decisão ora recorrida.
III
Em face do exposto, concede-se provimento ao recurso e, em consequência, ordena-se a reformulação da decisão recorrida em conformidade com o presente juízo de constitucionalidade. Lisboa, 4 de Julho de 2001 Alberto Tavares da Costa Vítor Nunes de Almeida Artur Maurício Maria Helena Brito Paulo Mota Pinto Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa