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Processo n.º 306/13
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A. e reclamada a B., S.A., o primeiro reclamou, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho de 17 de janeiro de 2013, que não admitiu recurso para o Tribunal Constitucional.
2. O reclamante requereu que sobre o despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de janeiro de 2012 recaísse acórdão, sustentando, entre o mais, o seguinte:
«17-Ora se a notificação ocorre num período em que o trabalho oficial está suspenso, parece obvio, que deverá o segmento normativo do n.º 3 do art.º 254 do C.P.C..«NO PRIMEIRO DIA ÚTIL SEGUINTE» que deverá ser aplicável.
18- E uma diferente interpretação, é inclusive inconstitucional, salvo o devido respeito.
19 - Então as férias não seriam para todos os operadores judiciais – e uma tal interpretação, que violaria o princípio da igualdade consignado no art.º 13 da Constituição da República.
20-Uma Vez que os advogados, ficariam «prejudicados, privados» no seu direito a férias, o que o art.º 13 da C.R. interdita».
3. Através do acórdão de 18 de outubro de 2012, o despacho do relator foi mantido. Notificado desta decisão, o reclamante dela interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, através de requerimento onde se pode ler, entre o mais, o seguinte:
“No requerimento apresentado em 30 de Janeiro de 2012, no qual se requereu que sobre o despacho de fls 370 e sgnts recaísse acórdão, aduziu-se, sob o n.º 19, que o segmento normativo do n.º 3 do art.º 254 do C.P.C. «no primeiro dia útil seguinte», viola o princípio da igualdade, consignado no art.º 13 da C.R. – uma vez que quando o terceiro dia útil seja um dia correspondente a férias judiciais, todos os operadores judiciais gozariam férias com exceção dos advogados. (L.T.C. art.º 75-A n.º 2)
Termos em que respeitosamente se requer a V. Ex. que se digne admitir o presente recurso (L.T.C. art.º 76)”.
4. Foi então proferido o despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade, com o seguinte teor:
«A inconstitucionalidade da norma a que o req. se refere – art. 13 da CRPortuguesa – não foi suscitada em tempo de apreciação no processo, designadamente no despacho de fls 370-372
Logo, não se admite o recurso para o Tribunal Constitucional».
5. É esta decisão que é agora objeto da presente reclamação, sustentando o reclamante o seguinte:
«1-No requerimento apresentado em 30 de Janeiro de 2012, no qual se requereu que sobre o despacho de fls 370 e sgnts recaísse acórdão, aduziu-se, sob o n.º 19, que o segmento normativo do n.º 3 do art.º 254 do C.P.C. «no primeiro dia útil seguinte», viola o princípio da igualdade, consignado no art.º 13 da C.R..
2-Uma vez que quando o terceiro dia útil seja um dia correspondente a férias judiciais, todos os operadores judiciais gozariam férias com exceção dos advogados. (L.T.C. art.º 75-A n.º 2).
(…)
8-Então o ora reclamante requereu que sobre o despacho em questão recaísse acórdão, invocando na sua argumentação, apresentada em 30 de Janeiro de 2012, a nulidade do douto despacho e que ao caso, o n.º 3 do art.º 254 do C.P.C. deveria ser aplicável o segmento legal «NO PRIMEIRO DIA ÚTIL SEGUINTE»isto é após ter decorrido o período de férias judiciais.
9-Pois, a presunção legal constante no introito deste normativo seria inconstitucional –cfr. n.ºs 18, 19 e 20 do requerimento apresentado em 30 de Janeiro de 2012- nos casos em que o terceiro dia útil fosse período de férias judiciais.
10-Todos os operadores judiciais, sem exceção, disfrutam do período de férias judiciais, com exceção dos advogados — facto que viola o disposto no art.º 13 da C.R.
11-Ora, contrariamente ao referido no despacho que não admitiu o recurso para este Venerando Tribunal e, salvo o devido respeito, por opinião contrária, a inconstitucionalidade foi suscitada, relativamente à norma adjetiva constante no introito do n.º 3 do art.º 254 do C.P.C., cuja interpretação literal, além de violar o princípio da igualdade, relativamente aos Mandatários judiciais, viola também o disposto no art.º3º - A do C.P.C.
12-Ora, o art.º 70 n.º 1 alínea b) da Lei 28/82 de 15 de Novembro, reza assim:
(…)
13-Nesta conformidade dúvidas não subsistem que a inconstitucionalidade do disposto no do n.º 3 do art. 254 do C.P.C. foi arguida no incidente em questão
CONCLUSÕES:
(…)
D) O reclamante arguiu no requerimento apresentado em 30 de Janeiro de 2012, sob os n.ºs 18 a inconstitucionalidade do disposto no n.º 3 do art.º254 do C.P.C.».
6. Neste Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento da reclamação, nos seguintes termos:
«1. Por decisão proferida em 14 de Abril de 2010, pelo Senhor Conselheiro Relator, não foi admitido o recurso que A. interpôs para aquele Supremo Tribunal, de um acórdão da Relação de Lisboa.
2. Dessa decisão, reclamou o recorrente para a conferência, nos termos do artigo 700.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
3. Tendo a reclamação foi entregue no primeiro dia útil após o termo do prazo, foi o recorrente notificado nos termos do n.º 6 do artigo 145.º, do Código de Processo Civil, para efectuar o pagamento da multa respectiva.
4. O recorrente, fazendo uma contagem diferente do prazo da reclamação, sustentou que a reclamação fora apresentada dentro do prazo, não havendo lugar ao pagamento de qualquer multa.
5. O Senhor Conselheiro Relator entendeu que a Secretaria tinha andado bem ao notificar o recorrente para efectuar o pagamento da multa, pois a reclamação dera entrada no primeiro dia útil após ter terminado o prazo.
6. Desta decisão do Senhor Conselheiro Relator o recorrente reclamou para a conferência, tendo esta, por Acórdão de 18 de Outubro de 2012, indeferido a reclamação.
7. Interposto recurso para o Tribunal Constitucional (ao abrigo da alínea b) do n.º 1, do artigo 70.º da LTC) do acórdão da conferência, como o mesmo não foi admitido, reclamou o recorrente para este mesmo Tribunal.
8. Vendo o requerimento de interposição do recurso, parece-nos claro que ali não vem enunciada uma questão de inconstitucionalidade normativa passível de constituir objecto idóneo do recurso de constitucionalidade.
9. Por outro lado, na reclamação para a conferência – o momento processual próprio – também não vem suscitada uma questão de inconstitucionalidade com aquela natureza, designadamente com o que vem afirmado no ponto 19 dessa peça, como alega o reclamante.
10. Na própria reclamação agora apresentada continua a não se vislumbrar, com o mínimo de clareza, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.
11. O que o recorrente sempre questionou foram as decisões proferidas nas instâncias que entenderam que o início para a contagem do prazo da reclamação era 26 de Abril de 2011 (primeiro dia após férias judiciais) e que o recorrente se considerava notificado da decisão do Senhor Conselheiro Relator que não admitiu o recurso (vd. nº 1), em 18 de Abril de 2011 (férias judiciais)».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
No Supremo Tribunal de Justiça foi proferido o despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade interposto do acórdão de 18 de outubro de 2012, com fundamento na não suscitação prévia da questão de constitucionalidade que se pretende ver apreciada.
O reclamante sustenta que, no requerimento de 30 de outubro de 2012, através do qual pediu que sobre o despacho de 12 de janeiro de 2012 recaísse acórdão, questionou efetivamente a constitucionalidade da norma que indica no requerimento de interposição de recurso – “o segmento normativo do n.º 3 do art.º 254 do C.P.C. «no primeiro dia útil seguinte»”.
De acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Requisito que não se pode dar como verificado nos presentes autos.
Com efeito, quando requereu que sobre o despacho de 12 de janeiro de 2012 recaísse acórdão o reclamante não questionou a constitucionalidade do segmento normativo do n.º 3 do artigo 254º do C.P.C. «no primeiro dia útil seguinte». Nomeadamente não o fez nas passagens que identifica na presente reclamação (n.ºs 18, 19 e 20). Sustenta que uma diferente interpretação deste preceito legal – que não chega a identificar – é inconstitucional, mas não questiona aquele segmento normativo.
Em face do exposto, é de concluir que o reclamante não cumpriu o ónus de suscitação prévia da questão de constitucionalidade cuja apreciação pretende, pelo que há que confirmar a decisão de não admissão do recurso de constitucionalidade.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão de não admissão do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 21 de maio de 2013. – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria Lúcia Amaral.