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Processo n.º 308/13
1.ª Secção
Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A. e reclamado B., a primeira reclamou do despacho daquele Tribunal que, em 21 de fevereiro de 2013, não admitiu recurso para o Tribunal Constitucional.
2. A aqui reclamante foi condenada em 1.ª instância a pagar ao autor a quantia de € 1.144,54, acrescida de juros de mora à taxa legal vencidos e vincendos desde a citação até integral pagamento, sendo absolvida do demais peticionado, mais se julgando a reconvenção parcialmente procedente foi o autor condenado a entregar à ré os bens móveis identificados no ponto 27 dos factos provados, absolvendo-o do demais peticionado.
Inconformado, o autor interpôs recurso para a Relação de Lisboa, que, por acórdão de 3 de julho de 2012, com um voto de vencido, concedeu provimento ao recurso, revogando a decisão do tribunal de 1.ª instância no tocante à absolvição da apelada do demais peticionado pelo apelante na parte em que excedia a medida da sua condenação e condenando a mesma a pagar ao apelante a quantia total de € 12.700,82, acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento.
Desse acórdão a ré interpôs recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça que, por acórdão de 17 de janeiro de 2013, decidiu não o admitir.
Interposto recurso para o Tribunal Constitucional, como o mesmo não foi admitido, reclamou dessa decisão para este mesmo Tribunal.
3. O despacho reclamado não admitiu o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, porquanto a questão de constitucionalidade da norma do artigo 721.º-A do Código de Processo Civil (CPC) não foi suscitada tempestivamente.
4. A Reclamante sustenta a Reclamação, em síntese, nos seguintes fundamentos:
“(…)- A reclamante não se conformando com o despacho proferido em vinte um de fevereiro de 2013 pelo senhor Colendo Juiz Relator do Supremo Tribunal de Justiça, que não admitiu o recurso interposto pela reclamante em 25/09/2012, para o Supremo Tribunal de Justiça, vem do referido despacho reclamar.
- Uma vez que, o mesmo considerou não admitir o recurso, porque entender que a inconstitucionalidade suscitada extemporânea;
- Ora, assim não entende a reclamante, uma vez que, o recurso é admissível, dado a inexistência de dupla conforme;
- Na verdade foi proferida sentença em 21 de fevereiro de 2012, pelo Tribunal de 1.a Instância, tendo sido a reclamante parcialmente absolvida do pedido, não se conformando com tal sentença, a ré veio dela interpor recurso para o Venerando Tribunal da relação de Lisboa tendo sido remetido em 29 de maio de 2012. A sentença aí proferida, foi contrária á prolatada em 1.a instância.
- Não concordando com a sentença proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa em 25/09/2012, dela recorreu para o S.T.J, uma vez que, a sentença de que recorria era diversa da sentença proferida em 1.a Instância.
- Pelo que, não existia dupla conforma.
- Tal recurso foi indeferido, em 17 janeiro de 2013 com fundamento da circunstância de ter sido lavrado um voto vencido, obstando a admissibilidade da revista excecional.
E também, por o motivo da inexistência do pressuposto primeiro: sobreposição integral do julgado, pela verificação de uma situação de dupla conforme.
- E foi nesse despacho de indeferimento do citado recurso que existiu urna errada interpretação da norma art.º 721º A a) b) c) do Código do Processo Civil, daí que, foi interposto em 4 de fevereiro de 2013 recurso para TC.
- Veio tal Tribunal indeferir-lhe o mesmo, uma vez que, entende que questão de inconstitucionalidade deveria ser suscitada há mais tempo.
- Ora, assim não entende a reclamante, uma vez que, tal questão somente se verificou, precisamente agora, ou seja, aquando da prolação do despacho proferido em 21 janeiro de 2013.
Nestes termos, nos mais de direito aplicáveis, e com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve a presente reclamação ser julgada procedente, considerando-se que a inconstitucionalidade foi suscitada atempadamente,(…)”
5. O Exmo. Representante do Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação, considerando que a reclamante não suscitou previamente a questão de constitucionalidade, não estando dispensada desse ónus, além de entender que a questão suscitada no recurso de constitucionalidade interposto não tem objeto normativo.
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
6. Dispõe o n.º 4 do referido artigo 76.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (doravante designada por LTC), que do despacho que indefira o requerimento de interposição de recurso ou retenha a sua subida cabe reclamação para o Tribunal Constitucional.
7. A reclamante interpôs recurso da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça que não admitiu a revista excecional que requerera, insurgindo-se contra a interpretação dada pelo tribunal recorrido ao preceito legal contido no artigo 721.º-A do CPC.
Nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade haja sido suscitada durante o processo. Suscitação que há de ter ocorrido de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).
Ora, independentemente da falta de verificação de outros requisitos, relativamente à “norma” cuja apreciação é requerida pela reclamante, certo é que não pode dar-se como verificado o requisito objetivo de suscitação prévia da questão de constitucionalidade, invocado no despacho reclamado como fundamento da não admissão do recurso.
A razão da imposição deste requisito de conhecimento do recurso de constitucionalidade, prende-se com a necessidade de colocação da questão de inconstitucionalidade de forma a vincular o juiz ao seu conhecimento.
Constituindo a decisão recorrida na apreciação de pedido de admissão de revista excecional, cujos pressupostos de admissibilidade se encontram estabelecidos no artigo 721.º-A, n.º 1 do CPC, impunha-se que, logo no momento da apresentação do referido pedido a recorrente suscitasse a questão de inconstitucionalidade reportada ao referido preceito legal.
Além do mais, o reclamante não estava dispensado do ónus de suscitação prévia porque a interpretação acolhida no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nada oferece de surpreendente.
III – Decisão
8. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 21 maio de 2013. – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria João Antunes – Maria Lúcia Amaral.