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Processo n.º 235/2013
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Por Acórdão de 18 de dezembro de 2012, proferido no processo n.º 631/06.5TAEPS.G1, decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães, além do mais, conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público da decisão da primeira instância que condenou o arguido A., ora reclamante, na pena única de 14 anos e 6 meses de prisão, pela prática, em concurso, de um crime de tráfico de estupefacientes e de um crime de branqueamento de capitais, e negar provimento aos recursos interpostos pelo referido arguido, quer da decisão que indeferiu o seu pedido de junção aos autos dos relatórios e informações de ação encoberta, quer da decisão final condenatória, alterando para 15 anos e 6 meses de prisão, por agravamento de pena parcelar, a pena única que lhe havia sido aplicada.
O arguido, inconformado, dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça e, por requerimento apresentado em juízo no dia imediatamente seguinte, para o Tribunal Constitucional, a fim de ver apreciada a inconstitucionalidade, por omissão, do «diploma constante da Lei 101/2001, de 25/8 quando interpretado com o sentido da não obrigatoriedade de dar conhecimento aos visados, designadamente ao arguido, de que foi levada a cabo um ação encoberta» e, ainda, a inconstitucionalidade material da «norma constante do artigo 4.º, nº 1 do mesmo diploma (…) quando interpretado no sentido de além da absoluta indispensabilidade para a prova, fazer depender a junção aos autos da ação encoberta, ainda recair o ónus sobre o arguido de demonstrar que no respetivo processo foi levada a cabo uma ação encoberta», por violação, em ambos os casos, dos «princípios do acusatório, do direito de defesa e de audiência, constantes dos artigos 32.º e 34.º da Constituição da República Portuguesa».
O Tribunal da Relação de Guimarães admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça mas rejeitou, por intempestivo, o recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do n.º 2 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC). É desta última decisão que o arguido, fazendo uso da faculdade prevista no n.º 4 do artigo 76.º da LTC, reclama, invocando em síntese que, embora tenha interposto o recurso de constitucionalidade sem esgotar os meios ordinários de recurso, o fez por mera cautela, pelo que deve a reclamação ser deferida e o recurso admitido, por tempestivo.
O Ministério Público, em resposta, emitiu parecer no sentido do indeferimento da reclamação porquanto o arguido, tendo interposto recurso do acórdão do Tribunal da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça – já admitido – e para o Tribunal Constitucional, não esgotou os recursos ordinários que, no caso cabiam, pelo que, não estando a decisão recorrida «consolidada no âmbito da ordem jurisdicional respetiva», não se mostra observado o requisito de admissibilidade do recurso imposto pelo n.º 2 do artigo 70.º da LTC.
Cumpre apreciar e decidir.
2. O arguido não indicou, no requerimento de interposição do recurso, como lhe competia (artigo 75.º-A, n.º 1, da LTC), qual a norma ao abrigo da qual interpõe o recurso de constitucionalidade. Afigura-se, contudo, que o fez ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, o que decorre da circunstância de invocar, na referida peça processual, a observância do ónus de prévia suscitação imposto, para essa modalidade de recurso, pelo n.º 2 do artigo 72.º da LTC, reconhecendo, por outro lado, na presente reclamação, não ter esgotado os meios ordinários de recurso que o n.º 2 do artigo 70.º da LTC impõe como condição da sua admissão, requisito de admissibilidade que a decisão ora em reclamação, nesse pressuposto, julgou inverificado.
É, pois, à luz das condições de admissão do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC e, em particular, da condição imposta pelo n.º 2 deste normativo legal, que se apreciará a presente reclamação.
Os autos demonstram que o arguido recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça, não apenas da decisão final condenatória proferida pelo Tribunal da Relação, mas também da decisão que julgou improcedente o recurso interlocutório que o mesmo arguido havia interposto do despacho de indeferimento do pedido de junção aos autos dos relatórios e informações de ação encoberta, em cujo âmbito relevam as questões de inconstitucionalidade que integram o objeto do presente recurso de constitucionalidade.
Com efeito, e independentemente de se mostrarem observadas, no caso, as exigências processuais de que depende o conhecimento do recurso, nessa parte, pelo Supremo Tribunal de Justiça, a verdade é que o arguido também invocou perante esta última instância de recurso «o direito de ser informado se, nos presentes autos, foi levada a cabo uma ação encoberta e, em caso, positivo, o elementar direito de controlar a sua legalidade», requerendo, com esse fundamento, «a junção aos autos da respetiva ação encoberta», por se tratar de meio de prova indispensável à descoberta da verdade material e à demonstração da sua inocência.
É, pois, manifesto, que a decisão do Tribunal da Relação de Guimarães, na parte em que julgou improcedente o referido recurso interlocutório, sendo, ainda, em abstrato, passível de modificação, por força da interposição do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, não constituía, à data da interposição do recurso de constitucionalidade – momento processualmente relevante para aferir dos respetivos pressupostos processuais –, a última decisão proferida pelas instâncias sobre tal questão, não se verificando, assim, o requisito de esgotamento dos recursos ordinários que o n.º 2 do artigo 70.º da LTC impõe, como condição de admissão do recurso, em ordem a garantir a própria utilidade do recurso de constitucionalidade.
Impõe-se, pois, sem necessidade de mais considerações, o indeferimento da presente reclamação, confirmando-se, em consequência, a decisão que, por essa razão, indeferiu o recurso de constitucionalidade interposto, nos presentes autos, pelo arguido A..
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 18 de abril de 2013. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral.