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Processo n.º 21/13
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Fernando Ventura
Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Por acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19 de novembro de 2012, foi negado provimento ao recurso do arguido A. e confirmada a decisão proferida em 13 de fevereiro de 2012 pelo Tribunal Judicial de Vieira do Minho, que revogou a suspensão da execução da pena de um ano de prisão em que aquele havia sido condenado, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3º, nºs 1 e 2, do Decreto-Lei nº 2/98, de 3 de janeiro.
2. O arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, vindo, neste Tribunal, a ser proferida a decisão sumária nº 50/2013, em que se decidiu não conhecer do recurso apresentado por ineptidão do requerimento de interposição de recurso.
O recorrente, reclamou dessa decisão sumária para a Conferência, impulso conhecido e decidido pelo Acórdão nº 112/2013, no sentido do seu indeferimento e da confirmação da decisão sumária nº 50/2013.
Veio, então, o recorrente arguir a nulidade e requerer a retificação ou correção desse acórdão, o que foi indeferido pelo Acórdão nº 185/2013, de 20 de março de 2013.
3. Nessa sequência, em 5 de abril de 2011, veio o recorrente A., dirigindo-se ao “Ex.mo Senhor Presidente”, formular o seguinte requerimento:
“1. Nos presentes autos (Reclamação para a Conferência e Requerimento de Fls…, que aqui se dão por transcritos) vão suscitadas questões que integram claras divergências jurisprudências - em matéria de constitucionalidade – nesse Alto Tribunal, as quais importa evitar.
2. Acresce que, a própria natureza da questão a decidir assume especial relevo em matéria de interposição e admissão de recurso para o Tribunal Constitucional.
Pelo que antecede, dada a excecionalidade da questão, vem trazê-la ao conhecimento de Vª Exª para os fins tidos por adequados e convenientes, designadamente tendo em vista, ainda, uma intervenção do Plenário, no caso dos autos em apreço.”
4. Sobre esse requerimento recaiu, em 17 de abril de 2013, o seguinte despacho:
“Veio o recorrente, na sequência do Acórdão nº 185/2013, requerer que se suscite “uma eventual intervenção do Plenário”, invocando, para tanto, “a excecionalidade da questão de que se trata”.
O Ministério Público tomou posição pelo indeferimento do requerido, face ao disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 79ºA, da LTC.
Cumpre apreciar e decidir.
Importa começar por referir que, não identificando o recorrente a base normativa em que suporta o pedido formulado, resulta claro dos seus termos que não estamos perante pretensão de interposição de recurso para o Plenário, assente na afirmação de julgamentos diversos sobre a mesma questão normativa de constitucionalidade em qualquer das secções, nos termos previstos no artigo 79º-D, da LTC.
E, acrescente-se, caso assim fosse, não estariam reunidos os requisitos para a uniformização da jurisprudência, na medida em que não nos encontramos na presença de julgamentos de mérito em oposição, mas sim, na ótica do recorrente, partilhada nesse ponto pelo Ministério Público, perante divergência jurisprudencial sobre questões situadas no plano da admissibilidade e da cognoscibilidade do recurso.
Aliás, o recorrente reconhece que a questão assume relevo tão somente “em matéria de interposição e admissão de recurso para o Tribunal Constitucional”, ou seja, quanto à interpretação de normas atinentes ao processo no Tribunal Constitucional.
Cabe, então, equacionar o requerimento em apreço perante o preceituado no artigo 79.ºA, da LTC.
Acontece que, nos termos do n.º 2 do artigo 79.ºA, da LTC, tratando-se de recurso interposto em processo penal, como aqui acontece, a intervenção do Plenário apenas pode ser desencadeado antes da distribuição do processo, momento processual já ultrapassado.
Face ao exposto, por inadmissível, indefiro o requerido.
Notifique.”
4. Em 6 de maio de 2013, veio o recorrente reclamar desse despacho para a Conferência, invocando o disposto no artigo 78.º, n.º3 da LTC, nos seguintes termos:
“1. O Requerimento de Fls..., dos autos do Recorrente, sobre o qual recaiu o douto despacho ora reclamado, dirigia-se ao “Ex.mo Senhor Presidente” (do Tribunal Constitucional).
2. Por isso que, ressalvado o devido respeito, se afigura que o Ex.mo Senhor Juiz Conselheiro Relator não tinha poderes para se pronunciar/decidir sobre aquela matéria (Art. 79.º-A da LTC).
3. O douto despacho em apreço é assim inexistente por se pronunciar sobre matéria que não podia conhecer.
4. Sendo inexistente, o mesmo é desprovido de eficácia e insuscetível de produzir quaisquer efeitos jurídico-processuais.
5. Inexistência (do ato jurídico) é a “inidoneidade tanto atual como potencial para a produção de efeitos jurídicos” – Alberto dos Reis in C.P.Civil Anotado, Vol. V, p. 117.
Mas,
6. Quando assim se não entendesse, sempre se trata(ria) de nulidade absoluta e insanável, que deve ser declarada.
7. Pois que, o Ex.mo Senhor Juiz Conselheiro Relator – através do douto Despacho reclamando – conheceu de questão de que não podia tomar conhecimento (Art. 668.º, n.º1, al. d) CPC e Art. 69.º LTC).
8. O que aqui se invoca para os legais efeitos.
Termos em que, deverá ser julgada procedente a presente Reclamação e ser revogado o douto Despacho reclamado, seguindo-se os ulteriores termos.”
5. Notificado, o Ministério Público veio responder, dizendo o seguinte:
“1.º Na douta decisão de fls. 372 e v, o Senhor Conselheiro Relator, apreciando o requerimento do recorrente e face ao seu conteúdo, entendeu que não se estava “perante pretensão de interposição de recurso para o Plenário”.
2.º No entanto, também se acrescentou que mesmo que assim não fosse, não estariam reunidos os requisitos para a uniformização de jurisprudência.
3ª E, por último, entendeu que a intervenção do Plenário também não podia ter lugar, face ao que dispõe o artigo 79.º-A, da LTC.
4.º Concordamos inteiramente com a decisão objeto da reclamação.
5.º Esta matéria também já foi, por nós, tratada nas anteriores promoções (fls. 355 a 357 e 369 a 371), nada mais tendo a acrescentar.
6.º Quanto ao despacho ter sido proferido pelo Exm.º Senhor Conselheiro Relator quando o requerimento se dirigia ao Senhor Presidente do Tribunal Constitucional, apenas diremos que mesmo que esse requerimento fosse considerado, inequivocamente, um recurso para o Plenário, sempre caberia ao Senhor Conselheiro Relator proferir despacho de admissão, ou não (artigo 79.º-D, n.ºs 2 e 3 da LTC).
7.º Por outro lado, neste processo, e como resulta do que se disse no douto despacho reclamado, quando se apreciou a questão à luz do artigo 79.º-A da LTC, o Senhor Presidente deste Tribunal já não poderia ter qualquer intervenção.
8.º Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.”
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
6. O reclamante pretende que se declare a inexistência ou, subsidiariamente, a nulidade absoluta do despacho que indeferiu o requerimento que apresentou em 5 de abril de 2013. Alicerça essa pretensão na circunstância de ter dirigido o requerimento ao Presidente do Tribunal Constitucional e na consideração de que o Relator não tinha poderes para se pronunciar e decidir sobre a matéria.
Não lhe assiste razão, desde logo no relevo atribuído ao endereçamento aposto no requerimento.
7. A competência para o conhecimento de qualquer pretensão ou impulso processual afere-se pelo seu objeto, e não pelo órgão judicial a quem é dirigido, pois não assiste às partes o poder de conferir ou subtrair a competência para o conhecimento de qualquer questão diversamente do fixado no ordenamento adjetivo pertinente.
Ora, sendo o requerimento formulado dirigido a provocar a intervenção do plenário, sem especificar a norma legal em que alicerçava tal pretensão, incumbia ao Relator, de acordo com o disposto no artigo 78.º, n.º1 da LTC, apreciar da admissibilidade processual desse impulso, procedendo previamente à sua caracterização.
Assim, encontra-se no despacho reclamado a consideração de que não se tratava de requerimento de interposição de recurso fundado no artigo 79.ºD, pelo que não havia que proferir o despacho previsto no artigo 685.º-C do CPC, aplicável ex vi artigo 69.º da LTC (cfr. Acórdão n.º 541/2012).
E, prosseguindo a análise, considerou o relator que se estava perante impulso que procurava desencadear a apreciação prevista no artigo 79.ºA da LTC, mas que, por há muito esgotado o quadro normativo em que tal intervenção era admissível, havia que indeferir o requerido.
Tratou-se, então, na economia do despacho reclamado, de considerar o requerimento como consubstanciando incidente anómalo, porque inteiramente alheio à regular tramitação e à faculdade discricionária inicial cometida ao Presidente do Tribunal Constitucional no artigo 79.ºA da LTC, e de negar o seguimento pretendido, por inadmissível. Não se tratou, como pretende o recorrente, de chamar a si a apreciação sobre o mérito da intervenção do Plenário sobre a questão.
8. Ora, a competência exercida pertence inequivocamente ao Relator, a quem incumbe, nos termos expressos no artigo 78.º, n.º1 da LTC, o poder-dever de “julgar os incidentes suscitados”, aí se incluindo os incidentes anómalos.
Inexiste, pelo exposto, vício competencial na prolação do despacho reclamado e, em consequência, improcede manifestamente a arguição da sua inexistência e de verificação de nulidade absoluta.
III – Decisão
9. Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixadas em 20 unidades de conta, de acordo com o impulso em presença e os critérios seguidos pelo Tribunal.
Notifique.
Lisboa, 29 de maio de 2013. – Fernando Vaz Ventura – Pedro Machete – Joaquim de Sousa Ribeiro.