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Processo nº 171/06
 
 2.ª Secção
 Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
 
  
 
  
 
  
 
                  Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 A – Relatório
 
  
 
  
 
                  1 – A. recorre, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do 
 artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC), do 
 acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de Dezembro de 2005, que negou 
 provimento ao recurso interposto do despacho do 3.º Juízo do Tribunal Cível da 
 Comarca de Lisboa, de 8 de Agosto de 2005.
 
  
 
                  2 – A Comissão das Comunidades Europeias intentou, perante o 
 referido Juízo Cível, processo especial contra o Instituto Tecnológico para a 
 Europa Comunitária (ITEC), com sede no Instituto Superior Técnico, Avenida 
 Rovisco Pais, em Lisboa, requerendo a sua declaração de insolvência, com base, 
 em síntese, no facto de o requerido estar impossibilitado de pagar o montante de 
 
 191.631,59 Euros, proveniente da diferença entre o montante de contribuições 
 efectuadas pela requerente em favor do requerido, no âmbito de dois contratos 
 relativos à realização de projectos de investigação e programas de promoção para 
 a realização de estágios e intercâmbios profissionais, e os custos apresentados, 
 nos respectivos mapas.
 
  
 
                  3 – Por sentença de 11 de Julho de 2005, o referido tribunal 
 cível julgou procedente o pedido e, entre o mais, decretou a insolvência do 
 requerido, e fixou a residência da Administração do insolvente, constituída pela 
 sua Direcção, mencionando entre os membros desta e como exercendo o cargo em 
 nome próprio pelo administrador “INETI-Instituto Nacional de Engenharia e 
 Tecnologia Industrial, o ora recorrente.
 
  
 
                  4 – Notificado nos termos do art. 37.º, n.º 1, do Código da 
 Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, 
 de 18 de Março (CIRE), o ora recorrente deduziu embargos contra esta sentença, 
 alegando, em resumo, ter sido substituído no cargo do devedor declarado 
 insolvente, em 24 de Abril de 2002, e não ter participado, a partir desta data, 
 em qualquer deliberação, reunião ou subscrito qualquer documentação ou 
 correspondência em nome do ITEC, pelo que a sentença não lhe podia ter fixado 
 residência.
 
  
 
                  5 – Pelo despacho acima mencionado, de 8 de Agosto de 2005, o 
 tribunal indeferiu liminarmente os embargos à sentença, com o fundamento de que 
 as razões alegadas, não tendo por efeito jurídico afastar os fundamentos da 
 sentença que declarara a insolvência, não constituíam fundamento idóneo de 
 embargos, nos termos do art. 40.º, n.º 2, do CIRE.
 
  
 
                  6 – Inconformado com esta decisão, o ora recorrente interpôs 
 recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, defendendo a tese de que a 
 impugnação, em sede de facto, da qualidade de administrador do insolvente, que 
 fora fixada com base na presunção decorrente da sua menção no registo comercial, 
 poderia ser feita através de embargos, resultando essa legitimidade do disposto 
 no art. 40.º, n.º 1, alínea f), do CIRE e que “se o art. 40.º, n.º 2 do CIRE for 
 interpretado pela forma que resulta da douta sentença recorrida (…) é 
 inaplicável por violar directamente o art. 32.º, n.º 1 da Constituição da 
 República e indirectamente o art. 13.º, n.º 1 da mesma Constituição (…)”.
 
  
 
                  7 – Pelo referido acórdão, o Tribunal da Relação de Lisboa 
 negou provimento ao recurso, discreteando do seguinte jeito:
 
  
 
 «Assiste total razão ao agravante quando refere “A identificação dos 
 administradores do insolvente e a fixação da sua residência é elemento 
 obrigatório e essencial de sentença de declaração de insolvência, nos termos do 
 art. 36º al. C) e art. 39º nº 1, ambos do CIRE….Os administradores do 
 insolvente, a quem tenha sido fixada residência são notificados pessoalmente da 
 sentença de insolvência (art. 37º nº 1 do CIRE) e têm legitimidade para deduzir 
 embargos (art. 40º nº 1 al. F) do CIRE)….A identificação de um cidadão como 
 administrador de pessoa colectiva insolvente tem consequências sancionatórias 
 que pode ir até à declaração de inabilitação para o exercício de funções de 2 a 
 
 10 anos, e que passa pela prestação de serviços gratuitos.” 
 Daí a possibilidade de alguém, como o agravante, na qualidade de membro do 
 devedor, impugnar a sentença, deduzindo embargos à sentença declaratória de 
 insolvência ou interpondo recurso desta última (art. 40º e 42º do CIRE) 
 No que respeita aos embargos o seu fundamento é o previsto no art. 40º nº 2 CIRE 
 
 (última parte), ou seja, factos ou meios de prova que não tenham sido tidos em 
 conta pelo Tribunal e que possam afastar os fundamentos da declaração de 
 insolvência. 
 Fundamentos estes, previstos no art. 3º do CIRE e que mais não são do que a 
 insustentabilidade económico-financeira do insolvente. 
 Ora, torna-se evidente que a causa de pedir dos presentes embargos não são de 
 molde a afastar os fundamentos da declaração da insolvência, porquanto ainda que 
 se decidisse que o agravante não seria membro da Direcção e da Administração do 
 insolvente, o ITEC permaneceria na situação de insolvente. 
 Logo, bem andou o Exmo. Juiz ao indeferir liminarmente os presentes embargos. 
 Dir-se-á que os fundamentos dos embargos apresentados pelo agravante são 
 relevantes e que não podem ser omitidos pela Ordem Jurídica… e seguramente que o 
 são, até pela envolvente traçada nas conclusões. 
 No entanto, o agravante tinha ao seu dispor o direito de interpor recurso da 
 sentença declaratória da insolvência, tal como já referimos. 
 E com essa interposição o agravante não estava limitado aos fundamentos dos 
 embargos, tendo toda a possibilidade de salvaguardar os interesses juridicamente 
 relevantes invocados. 
 Tanto mais, que é inequívoco que a identificação do agravante como membro da 
 Administração e fixação da residência, com as legais consequências, é um dos 
 elementos da sentença – art. 36º do CIRE. 
 Logo, não se levantam quaisquer questões de inconstitucionalidade do art. 40º nº 
 
 2 do CIRE, porquanto a interposição dos embargos, constituindo um meio 
 especifico de impugnação da sentença declaratória, atentos os especiais 
 interesses jurídicos que se debatem nesta última, não vedam ao agravante 
 impugnar aquela com outros fundamentos, nomeadamente, os alegados no âmbito 
 destes embargos, por via do recurso da sentença. 
 Desta forma, com estes meios de impugnação cumulativos, ou não, fica assegurado 
 todo o direito de defesa e de audiência do embargante.
 Não pode é o agravante, por esta via, desvirtuar o objectivo último dos 
 embargos, traduzido numa impugnação específica dos fundamentos previstos no art. 
 
 3º do CIRE, como ocorreria ao invocar o fundamento do erro na identificação do 
 administrador do ITEC. 
 Para tal, teria que recorrer da sentença declaratória da insolvência e não 
 deduzir embargos 
 Nestes termos, improcedem todas as conclusões: 
 
 *************** 
 Acordam em negar provimento ao agravo, confirmando a decisão impugnada».
 
  
 
                  8 – Dizendo-se mais uma vez inconformado, o embargante recorreu 
 para o Tribunal Constitucional, pretendendo a apreciação da 
 inconstitucionalidade da norma constante do artigo 46.º, n.º 2, do Código da 
 Insolvência e da Recuperação de Empresas, na interpretação – segundo veio a ser 
 fixado por despacho do relator, no Tribunal Constitucional, transitado em 
 julgado – “segundo a qual os fundamentos dos embargos à sentença declaratória de 
 insolvência são apenas os que visem afastar os fundamentos de insustentabilidade 
 económico-financeira do insolvente, com exclusão dos fundamentos constantes 
 daquela sentença relativos à decisão de identificação dos administradores do 
 devedor insolvente e da fixação de residência aos mesmos, estes de acordo com o 
 disposto na alínea c) do art. 36.º do CIRE”.
 
  
 
                  9 – Alegando, no Tribunal Constitucional, o recorrente 
 condensou a argumentação, aí desenvolvida, nas seguintes proposições 
 conclusivas:
 
  
 
              «1.                O presente recurso vem de um acórdão do 
 Venerando Tribunal da Relação de Lisboa que negou a possibilidade de oposição 
 por embargos quando se não alegassem factos tendentes a inquinar os fundamentos 
 da declaração de insolvência (art. 40º nº 2 do CIRE) que seriam tão somente os 
 que levaram a sentença a considerar o insolvente, ITEC, como possuindo um 
 passivo manifestamente superior ao activo. 
 
  
 
 2.         O Recorrente entende que os fundamentos da declaração de insolvência 
 são não só aquele, como também todos os fundamentos que o juiz teve de invocar 
 para tomar todas as decisões que o art. 36º do CIRE lhe impõe, a propósito da 
 declaração de insolvência. 
 
  
 
 3.         Decisão que no caso concreto foi a de considerar o recorrente como 
 administrador actual do ITEC e em consequência, por força do disposto na r. C) 
 do art. 36º do CIRE, lhe fixou residência, com fundamento em Certidão da 
 Conservatória do Registo Comercial, onde tal inscrição consta.
 
  
 
 4.         Notificado o recorrente da sentença, nos termos do nº 1 do art. 37º 
 do CIRE, o recorrente reagiu por embargos em que alegava ter já sido substituído 
 como administrador e não exercer, desde essa substituição quaisquer funções no 
 ITEC e ser a presunção decorrente do registo “júris tantum” e portanto elidível.
 
  
 
 5.         Os embargos foram liminarmente rejeitados pelo fundamento já 
 referido, tendo o douto acórdão do Tribunal da Relação, ao reconhecer o carácter 
 sancionatório para o recorrente da decisão do Tribunal, acrescentado que o 
 recorrente podia ter usado o meio do recurso em vez dos embargos. 
 
  
 
 6.         Que a identificação dos administradores e a respectiva fixação de 
 residência tem carácter sancionatório não oferece dúvidas, visto que abre o 
 caminho para a prestação de serviços gratuitos obrigatórios e para a 
 inabilitação para o exercício da profissão, nem o acórdão recorrido põe tal 
 situação em causa. 
 
  
 
 7.         O que já oferece dúvidas é que o administrador possa indistintamente 
 e “ad libitum” socorrer-se do recurso e dos embargos quando a lei aponta os 
 embargos para discussão de matéria de facto não apreciada na sentença (art. 40º 
 nº 2 do CIRE) e o recurso para apreciação de matéria de direito (art. 42º nº 1 
 do CIRE), entendimento que a doutrina sufraga. 
 
  
 
 8.         E, nos embargos, o recorrente alegava novos factos para elidir a 
 presunção em que a sentença se baseava. 
 
  
 
 12      Mas a interpretação dada pelo Acórdão recorrido ao art. 40º nº 2 do CIRE 
 não só era em si mesma duvidosa em face da Lei vigente, como seria 
 inconstitucional por violar os arts. 32º nº 10 e 13º nº 1 da Constituição da 
 República Portuguesa, coarctando toda a possibilidade de o recorrente se 
 defender. 
 
  
 
 10.   Para além da sua inconstitucionalidade, tal interpretação viola ainda o 
 art. 3º-A do Código de Processo Civil, que é uma emanação e uma concretização do 
 princípio da igualdade estabelecido no art. 13º nº 1 da C.R., também ele 
 violado. 
 
  
 
 11.   É o que não é indiferente recorrer ou embargar. O recorrente está limitado 
 quanto ao oferecimento de novas provas, entre outras normas, pelo disposto no 
 art. 712º do CPC; está impedido de oferecer testemunhas ou requerer perícias, 
 enquanto nos embargos tem ampla liberdade de produzir toda a prova.
 
  
 
  
 
 12.   Assim um cidadão, notificado/citado nos termos do art. 42º nº 1 do CIRE 
 não está, na interpretação em causa, em pé de igualdade com qualquer outro 
 cidadão citado para medida menos sancionatória que a aqui em causa.
 
  
 
  
 
 13.   Assim não há dúvida que a interpretação do art. 36º nº 2 do CIRE em causa, 
 ocasiona uma ofensa do princípio da igualdade constante do art. 13º nº 1 da 
 C.R., concretizado no art. 3º-A do CPC também violado, e do art. 32º nº 10 da 
 Constituição da República. 
 
  
 
  
 Assim devem Vs. Exas. Deliberar: 
 Considerar ilegal e inconstitucional, por violar o art. 3º-A do Código de 
 Processo Civil e os arts. 13º nº 1 e 32º nº 10 da Constituição da República 
 Portuguesa a interpretação, feita no Acórdão recorrido, do art. 40º nº 2 do CIRE 
 segundo a qual a expressão final deste artigo e número limita a impugnação por 
 embargos ao fundamento económico da sentença de declaração de insolvência (que é 
 o da impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas ou, para 
 as pessoas colectivas e patrimónios autónomos, que o passivo seja manifestamente 
 inferior ao activo) e não permite a impugnação por embargos de qualquer outro 
 fundamento que o juiz emita nas decisões que, de acordo com o disposto no art. 
 
 36º do CIRE, tem de tomar na sentença declaratória de insolvência». 
 
  
 
                  10 – Não houve contra-alegações no recurso de 
 constitucionalidade.
 
  
 
                  Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 B – Fundamentação
 
  
 
  
 
                  11.1 – Antes de mais, cumpre notar que não cabe ao Tribunal 
 Constitucional apreciar se a decisão recorrida determinou, correctamente, face 
 
 às pertinentes regras de hermenêutica jurídica, o direito infraconstitucional 
 que utilizou como fundamento normativo da decisão, mas, tão só, indagar se a 
 referida norma do CIRE, tal como atrás ficou definida, viola, como se alega, os 
 preceitos ou princípios constitucionais, convocados ou outros.
 
                  Deste modo, não importa saber se a melhor interpretação dos 
 artigos 36.º, 40.º, n.º 2, e 42.º do CIRE é a que o recorrente defende ou seja, 
 a de que podem constituir fundamentos de embargos todos aqueles “que serviram ao 
 juiz para proferir a sentença prevista no art. 36.º do CIRE e na qual, 
 epigrafado genericamente como sentença de declaração de insolvência, toma uma 
 série de decisões, relacionadas com a declaração de insolvência, mas que cada 
 uma delas tem que ter o seu fundamento próprio”, sendo que diferente dos 
 fundamentos de declaração de insolvência “são os fundamentos da situação de 
 insolvência, de que trata o art. 3.º do CIRE”.
 
                  Assim sendo, julgam-se improcedentes, da perspectiva do recurso 
 de constitucionalidade, todas as conclusões que o recorrente formulou, nas quais 
 questiona a bondade do direito infraconstitucional – conclusões 1.ª a 8.ª.
 
  
 
                  11.2 – O recorrente sustenta que a norma questionada ofende o 
 princípio do contraditório, na medida em que viola o direito, que qualquer 
 cidadão tem, de ser ouvido e de apresentar a sua defesa”, sendo, todavia, 
 
 “perfeitamente admissível, e não ofende o princípio do contraditório, que se 
 postergue a audiência [dos administradores do devedor] para depois de uma 
 decisão, neste caso, necessariamente, provisório”, que “é o que o CIRE faz, 
 mandando notificar, posteriormente, à decisão de insolvência, os administradores 
 do devedor e, até, por forma muito especial, e com cautelas redobradas (art. 
 
 37.º, n.º 1, do CIRE), determinando que sejam utilizadas as regras de citação e 
 lhes sejam entregues cópias da petição inicial (e não só da sentença)”, sediando 
 esse princípio do contraditório no n.º 10 do art. 32.º da Constituição [Anote-se 
 que o recorrente nas alegações para a Relação conexionou o direito de impugnar a 
 sentença, na parte recorrida, com o disposto no art. 32.º, n.º 1, da 
 Constituição].
 
                  Subjacente à argumentação do recorrente está a ideia, aliás 
 afirmada no n.º 6 das conclusões, que a identificação dos administradores e a 
 respectiva fixação de residência, “na sentença que declarar a insolvência”, 
 determinada na alínea c) do art. 36.º do CIRE “tem carácter sancionatório”, como 
 o acórdão da Relação teria reconhecido [sentido este que não se vê explicitado 
 em qualquer asserção feita no acórdão recorrido].
 
  
 
                  O preceito do n.º 2 do artigo 40.º do CIRE de que foi inferida 
 a norma questionada constitucionalmente dispõe do seguinte jeito:
 
                  
 
                  “2 – Os embargos devem ser deduzidos dentro dos cinco dias 
 subsequentes à notificação da sentença ao embargante ou ao fim da dilação 
 aplicável, e apenas são admissíveis desde que o embargante alegue factos ou 
 requeira meios de prova que não tenham sido tidos em conta pelo tribunal e que 
 possam afastar os fundamentos da declaração de insolvência”.
 
  
 
                  Por seu lado, dispõe o preceito constitucional que o recorrente 
 convoca como parâmetro (n.º 10 do art. 32.º):
 
  
 
                  “Nos processos de contra-ordenação, bem como em quaisquer 
 processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e 
 defesa”.
 
  
 
                  No caso concreto, é de notar que a sentença, confirmada pelo 
 acórdão recorrido, declarou a insolvência do requerido ITEC e, dando cumprimento 
 ao disposto na referida alínea c) do art. 36.º do CIRE, fixou residência aos 
 administradores do devedor, identificando, entre eles, como estando em 
 representação do INETI-Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial, 
 o ora recorrente.
 
                  Por outro lado, é ainda de mencionar que a mesma sentença não 
 procedeu, logo, a qualquer qualificação da insolvência como culposa ou fortuita, 
 de acordo com o disposto no art. 189.º do CIRE, tendo-se cingido, na perspectiva 
 de futura decisão sobre a matéria, a declarar “aberto o incidente de 
 qualificação da insolvência com carácter limitado” ou seja, a ordenar a abertura 
 do procedimento previsto no art. 191.º, do mesmo código, sendo, ainda, certo que 
 a qualificação atribuída “não é vinculativa para efeitos da decisão de causas 
 penais nem das acções a que se reportam os nºs 2 e 3 do art. 82.º” do CIRE (art. 
 
 185º do CIRE) – acções judiciais em que os administradores do devedor poderão 
 ser demandados, em certas circunstâncias.
 
                  De acordo com o disposto no art. 189.º do CIRE, apenas a 
 qualificação da insolvência como culposa impõe (n.º 2) que o juiz (i) 
 identifique as pessoas que ficam afectadas com tal qualificação, (ii) decrete a 
 inabilitação das pessoas afectadas por um período de 2 a 10 anos, (iii) declare 
 essas pessoas inibidas para o exercício do comércio, durante um período de 2 a 
 
 10 anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de 
 sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade 
 económica, empresa pública ou cooperativa e (iiii) determine a perda de 
 quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelas 
 pessoas afectadas pela qualificação e a sua condenação na restituição dos bens 
 ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.
 
                  Na ausência de uma qualificação da falência como culposa, como 
 ocorre no caso, a identificação e a fixação de residência do administrador do 
 devedor, por banda da sentença que declara a insolvência, tem, até à 
 eventualidade da declaração de uma tal qualificação, apenas o sentido de 
 identificar quem, segundo tal qualidade, pode exercer ou contra quem podem ser 
 exercidos determinados direitos substantivos ou processuais, verificados que 
 sejam os pressupostos substantivos ou adjectivos fixados na lei, como sejam o de 
 deduzir embargos e/ou interpor recurso da sentença de declaração de insolvência 
 
 (art. 42.º); o de exercer os respectivos poderes nos órgãos sociais do devedor, 
 que se mantêm em funções, após a declaração de insolvência, embora sem 
 remuneração; o de poder renunciar aos cargos nesses órgãos com efeitos imediatos 
 
 (art. 82.º, n.º 1); o de poder ser demandado em acções de responsabilidade (art. 
 
 82.º, n.º 2); o de alegar o que tiver por conveniente para efeito da 
 qualificação da insolvência como fortuita ou culposa [art. 191.º, alínea a)], 
 todos os preceitos do CIRE.
 
                  Estando arredada a possibilidade de no processo de insolvência 
 se efectuar apuramento de qualquer responsabilidade penal ou contraordenacional 
 dos administradores do declarado insolvente, pela eventual prática de ilícitos 
 previstos na lei penal (cf. Art. 227.º e 228.º do Código Penal) ou 
 contraordenacional (seja esta de que natureza for, como, v.g. fiscal), não se vê 
 que os direitos e deveres, acabados de elencar, mesmo na situação – que aqui não 
 ocorre – de existência de uma qualificação judicial da insolvência como culposa, 
 tenham natureza sancionatória que caia fora do âmbito da capacidade civil ou 
 comercial e que seja abrangido pelo conceito constitucional de “quaisquer 
 processos sancionatórios” a que se refere o n.º 10 do art. 32.º da Constituição.
 
                  Daí que não se vislumbre que seja esse o parâmetro 
 constitucional mais adequado, com o qual a norma impugnada deva ser confrontada.
 
                  Mais pertinente e idóneo à aferição da validade constitucional 
 da norma, com tais contornos prescritivos, é o direito constitucional de acesso 
 aos tribunais, consagrado no art. 20.º da Constituição, maxime, nas dimensões 
 concretizadas nos seus nºs 1, 4 e 5.
 
                  
 
                  A propósito da densificação do direito de acesso aos tribunais 
 ou à tutela jurisdicional, afirmam Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição 
 da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista págs. 163 e 164) que no 
 
 âmbito normativo daquele preceito constitucional se integra, além de outras 
 dimensões, «a proibição da “indefesa” que consiste na privação ou limitação do 
 direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se 
 discutem questões que lhe dizem respeito. A violação do direito à tutela 
 judicial efectiva, sob o ponto de vista de limitação do direito de defesa, 
 verificar-se-á sobretudo quando a não observância de normas processuais ou de 
 princípios gerais de processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer 
 o seu direito de alegar, daí resultando prejuízos efectivos para os seus 
 interesses».
 
                  Idêntico ponto de vista tem vindo a ser definido pela 
 jurisprudência do Tribunal Constitucional, em vários dos seus arestos. Assim, no 
 Acórdão n.º 508/02, assumindo jurisprudência anterior, acentuou-se:
 
  
 
            “O direito de defesa do réu ou demandado judicialmente, ou o chamado 
 princípio da proibição da indefesa é indiscutivelmente um direito de natureza 
 processual ínsito no direito de acesso aos tribunais, constante do artigo 20º da 
 Constituição, e cuja violação acarretará para o particular prejuízos efectivos, 
 decorrentes de um impedimento ou um efectivo cerceamento ao exercício do seu 
 direito de defesa. 
 Como se escreveu no Acórdão n.º 271/95 (Acórdãos do Tribunal Constitucional, 31º 
 vol., págs. 359 e segs.) :
 
  
 E neste domínio é particularmente significativo o direito à protecção jurídica 
 consagrado no artigo 20º da Constituição, no qual se consagra o acesso ao 
 direito e aos tribunais que, para além de instrumentos da defesa dos direitos e 
 interesses legítimos dos cidadãos, é também elemento integrante do princípio 
 material da igualdade e do próprio princípio democrático, pois que este não pode 
 deixar de exigir a democratização do direito.
 Para além do direito de acção, que se materializa através do processo, 
 compreendem-se no direito de acesso aos tribunais, nomeadamente: (a) o direito a 
 prazos razoáveis de acção ou de recurso; (b) o direito a uma decisão judicial 
 sem dilações indevidas; (c) o direito a um processo justo baseado nos princípios 
 da prioridade e da sumariedade no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser 
 aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas; (d) o direito a um 
 processo de execução, ou seja, o direito a que, através do órgão jurisdicional 
 se desenvolva e efective toda a actividade dirigida à execução da sentença 
 proferida pelo tribunal.
 Há-de ainda assinalar-se como parte daquele conteúdo conceitual “a proibição da 
 
 `indefesa’ que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do 
 particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que 
 lhes dizem respeito. A violação do direito à tutela judicial efectiva, sob o 
 ponto de vista da limitação do direito de defesa, verificar-se-á sobretudo 
 quando a não observância de normas processuais ou de princípios gerais de 
 processo acarreta a impossibilidade de o particular exercer o seu direito de 
 alegar, daí resultando prejuízos efectivos para os seus interesses” (cfr. Gomes 
 Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., 
 Coimbra, 1993, pp. 163 e 164 e Fundamentos da Constituição, Coimbra, 1991, pp. 
 
 82 e 83).
 Entendimento similar tem vindo a ser definido pela jurisprudência do Tribunal 
 Constitucional, que tem caracterizado o direito de acesso aos tribunais como 
 sendo entre o mais um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se 
 deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e 
 independência, possibilitando-se, designadamente, um correcto funcionamento das 
 regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas 
 razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do 
 adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras (cfr. Os 
 acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 404/87, 86/88 e 222/90, Diário da 
 República, II série, de, respectivamente, 21 de Dezembro de 1987, 22 de Agosto 
 de 1988 e 17 de Setembro de 1990).
 
  
 
 […]
 Em todas as tramitações de natureza declarativa que conduzem à emissão de um 
 julgamento (judicium) por parte de um tribunal, tem de existir um debate ou 
 discussão entre as partes contrapostas, demandante e demandado, havendo o 
 processo jurídico adequado (a due rocesso f law clause, da tradição 
 anglo-americana) de garantir que cada uma dessas partes deva ser chamada a dizer 
 de sua justiça (audiatur et altera pars). E esta exigência alarga-se a todas as 
 outras tramitações processuais cíveis, salvo contadas excepções, mesmo nos 
 processos executivos, em especial quando são deduzidas oposições à própria 
 execução ou à penhora. Como escreveu Manuel de Andrade, a estruturação 
 
 “dialéctica ou polémica do processo teria partido do contraste dos interesses 
 dos pleiteantes, ou até só do contraste das suas opiniões […] para o 
 esclarecimento da verdade. É tal a sua vantagem – seu rendimento – que as leis a 
 consagram mesmo onde repelem ou cerceiam o princípio dispositivo […]. Espera-se 
 que, também para os efeitos do processo, da discussão nasça luz; que as partes 
 
 (ou os seus patronos), integrados no caso e acicatados pelo interesse ou pela 
 paixão, tragam ao debate elementos de apreciação (razões e provas) que o juiz, 
 mais sereno mas mais distante dos factos e menos activo, dificilmente seria 
 capaz de descobrir por si […]” (Noções Elementares de Processo Civil, com a 
 colaboração de Antunes Varela, edição revista por Herculano Esteves, Coimbra, 
 
 1979, pág. 379)”.
 
  
 
                  Antes de mais, importa notar que, no caso sub judicio, estamos 
 perante uma acção de natureza civil ou uma acção em que se procuram fazer valer 
 em juízo direitos de natureza civil e/ou comercial. O recorrente não figura como 
 parte na relação jurídica controvertida que o tribunal decidiu, não sendo 
 directa e imediatamente afectado pela solução jurídica dada ao pleito. Partes 
 nessa relação são, na fase processual em causa, apenas o ITEC e a requerente da 
 insolvência. O recorrente apenas é atingido pela decisão recorrida na medida em 
 que esta acaba por considerá-lo elemento, a título representativo do INETI, da 
 Direcção da Administração do devedor insolvente e, como tal, sujeito às 
 referidas eventuais consequências (v. g. perda da remuneração, possibilidade de 
 ser demandado em acção de responsabilidade e das demais previstas no art. 189.º 
 do CIRE, estas no caso de a insolvência vir a ser julgada culposa).
 
                  Como efeito jurídico sequencial, cuja existência, apenas, 
 poderá despoletar-se em caso de declaração da insolvência e de as pessoas virem 
 a ser consideradas na sentença que a declare como membros da Direcção do devedor 
 insolvente, que, assim, constituem seus pressupostos jurídicos, não poderá 
 deixar de reconhecer-se às pessoas, com a qualidade atribuída ao recorrente, o 
 direito de se defenderem, visando arredá-las da posição jurídica que poderá ser 
 fonte das referidas desvantagens.
 
                  Mas, como bem acaba o recorrente por afirmar, nada impede, 
 atento até o momento a partir do qual esses efeitos jurídicos poderão ocorrer, 
 que o direito de defesa dos membros da direcção do devedor insolvente, apenas, 
 lhes seja reconhecido depois de declarada a insolvência, que constitui, deste 
 modo, o pressuposto da superveniência das eventuais desvantagens.
 
                  Foi o caminho que o legislador do CIRE escolheu. Por outro 
 lado, não pode deixar de reconhecer-se ao legislador uma certa 
 discricionariedade normativo-constitutiva quanto à eleição dos meios ou 
 instrumentos jurídicos processuais, tidos por funcionalmente aptos para 
 assegurar a defesa desses direitos e interesses dos administradores do devedor 
 insolvente. Ponto é que esses meios não se revelem desadequados, irrazoáveis ou 
 arbitrários para poderem propiciar a defesa dos direitos em causa.
 
                  Nesta óptica, bem poderá o legislador reservar o meio de 
 oposição à sentença declaratória de insolvência, por embargos, apenas para os 
 casos em que o embargante “alegue factos ou requeira meios de prova que não 
 tenham sido tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da 
 declaração de insolvência” (art. 40.º, n.º 2, do CIRE), tal como entendeu a 
 decisão recorrida, obrigando a que toda a outra defesa seja feita através do 
 meio processual do recurso da sentença declaratória de insolvência.
 
                  A opção do legislador de cingir a utilização do meio processual 
 dos embargos para as situações em que, apenas, se discuta a correcção do 
 julgamento dos pressupostos de facto em que o tribunal assentou a declaração de 
 insolvência – advenha essa falta de correcção da não consideração de novos 
 factos ou de meios de prova que não foram tidos em conta na sentença – cabe na 
 discricionariedade normativa do legislador e não se mostra, de qualquer jeito, 
 desadequada, arbitrária ou irrazoável. Ela revela, aliás, a intenção de colocar 
 os embargos no mesmo plano do julgamento inicial da acção, no que 
 verdadeiramente é determinante para o seu desfecho: a fixação do quadro de facto 
 plausível à solução da questão de direito que é colocada ao tribunal – a 
 existência de uma situação de insolvência.
 
                  A circunstância de o meio processual apto para a defesa dos 
 direitos do recorrente ser, legalmente, o recurso não demanda, necessariamente, 
 que tenha de admitir-se qualquer restrição quanto à utilização dos meios de 
 prova que forem necessários à defesa da sua pretensão em juízo. A existir, na 
 prática, uma tal situação, a insanidade constitucional verificar-se-ia nas 
 normas que consentissem um tal efeito.
 
                  De resto, poderá adiantar-se que, no caso dos autos, nem sequer 
 se vê que o recorrente, agindo em representação de outrem (o INETI), esteja 
 privado de fazer prova documental de ter cessado a representação e, apenas, o 
 possa demonstrar em juízo, mediante a produção de prova testemunhal, como 
 argumenta, nas suas alegações, para poder infirmar a presunção decorrente da 
 inscrição no registo comercial do recorrente como membro da Direcção da 
 Administração do devedor insolvente (cf. Art. 11.º do Código do Registo 
 Comercial).
 
                  A norma impugnada não ofende, deste modo, o direito de acesso 
 aos tribunais, na sua acepção de proibição de indefesa e de municiação dos 
 instrumentos jurídico-processuais – meios de acção judicial, oposição ou recurso 
 
 – funcionalmente aptos a propiciar a defesa dos direitos e interesses 
 protegidos.
 
                    
 
                  11.3 – Pretexta, ainda, o recorrente que a norma 
 constitucionalmente sindicada ofende o princípio da igualdade, consagrado no 
 art. 13.º, n.º 1, da Constituição, por colocar quem está na situação do 
 recorrente em posição diferente daquele cidadão que é chamado pela primeira vez 
 no processo para tomar conhecimento de uma decisão que pode trazer sanções para 
 o chamado.
 
                  A respeito da existência de uma pretensa situação de violação 
 do princípio da igualdade processual, a que acaba por reconduzir-se a alegação 
 do recorrente, escreveu-se, no Acórdão n.º 422/99, publicado Diário da República 
 II Série, de 29 de Novembro de 1999, que “[…] as prescrições tendentes à 
 adjectivação não podem desligar-se da diversidade de institutos jurídicos de 
 cariz, quantas vezes acentuadamente diferenciado, que pautam, verbi gratia, o 
 direito civil, o direito penal e o direito administrativo, pelo que as soluções 
 decorrentes dessa adjectivação podem, e muitas vezes até devem, ser 
 diferentemente perspectivadas, até tendo em conta preceitos, princípios e 
 garantias que a própria Constituição impõe que sejam observados em determinados 
 ramos de direito. Seria, por exemplo, incurial e contrário à Lei Fundamental que 
 no processo criminal se estabelecessem ónus probatórios a cargo do arguido, 
 provas por confissão, sancionamentos cominatórios penais ou presunções de 
 responsabilidade ou culpabilidade criminal, o mesmo já se não podendo dizer se 
 um tal estabelecimento decorrer da lei processual civil, ao adjectivar as formas 
 de tutela do incumprimento de obrigações civis” (cf., entre outros, na mesma 
 linha, os Acórdãos, n.º 236/00, publicado in Diário da República, de 2 de 
 Novembro de 2000, e n.º 676/05, publicado no mesmo Jornal, de 6 de Fevereiro de 
 
 2006). 
 
  
 
                  Ainda a propósito do princípio da igualdade, é de lembrar o que 
 se afirmou no Acórdão n.º 39/88, publicado no Diário da República I Série, de 3 
 de Março de 1988: 
 
  
 
            «A igualdade não é, porém, igualitarismo. É, antes, igualdade 
 proporcional. Exige que se tratem por igual as situações substancialmente iguais 
 e que, a situações substancialmente desiguais, se dê tratamento desigual, mas 
 proporcionado: a justiça, como princípio objectivo, «reconduz-se, na sua 
 essência, a uma ideia de igualdade, no sentido de proporcionalidade» – acentua 
 Rui de Alarcão (Introdução ao Estudo do Direito, Coimbra, lições policopiadas de 
 
 1972, p. 29). 
 O princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. 
 Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento 
 sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação 
 razoável, segundo critérios de valor objectivo, constitucionalmente relevantes. 
 Proíbe também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E 
 proíbe ainda a discriminação; ou seja: as diferenciações de tratamento fundadas 
 em categorias meramente subjectivas, como são as indicadas, 
 exemplificativamente, no n.º 2 do artigo 13.º.
 Respeitados estes limites, o legislador goza de inteira liberdade para 
 estabelecer tratamentos diferenciados.
 O princípio da igualdade, enquanto proibição do arbítrio e da discriminação, só 
 
 é, assim, violado quando as medidas legislativas contendo diferenciações de 
 tratamento se apresentem como arbitrárias, por carecerem de fundamento material 
 bastante».
 
  
 
                  Ora, importa, desde logo, acentuar que a posição do recorrente 
 não se ajusta àquela, com base na qual constrói a sua argumentação. Em primeiro 
 lugar, não existe sequer, no nosso sistema jurídico-processual civil, qualquer 
 regra, que possa ser convocada como tertium comparationis, nos termos da qual o 
 chamado, inicialmente, ao processo possa exercer, sempre, a sua defesa por 
 embargos, no caso de contra ele já haver sido proferida uma decisão 
 desfavorável. Há, aliás, outras situações como a do art. 388.º, alínea a), do 
 Código de Processo Civil, em que o requerido não pode embargar, mas antes, 
 apenas, recorrer do despacho que decretou a providência, quando defenda a 
 posição de que, “face aos elementos apurados ela não deveria ter sido deferida”.
 
                  Neste domínio, como acima já se disse, não pode deixar de 
 reconhecer-se ao legislador discricionariedade normativo-constitutiva, no 
 exercício da qual possa atender à diferente natureza dos múltiplos direitos e 
 interesses jurídicos cuja tutela jurisdicional pode ser pedida, sendo que a 
 defesa desses interesses, no caso, passa pela execução universal e célere dos 
 bens do devedor insolvente, em favor de todos os credores. 
 
                  Ora, a diferente natureza substancial desses direitos e 
 interesses justificam que o legislador possa, ou mesmo deva, adoptar soluções 
 processuais também diferentes, no que respeita aos instrumentos ou meios de 
 defesa, facultados ao seu titular, sem sair violado o princípio da igualdade ou, 
 até, por mor do respeito a tal princípio.
 
                  Depois, há que reconhecer que, não obstante o administrador do 
 devedor insolvente se achar, na defesa dos seus interesses próprios, no 
 processo, numa situação material muito diferente da do declarado insolvente, até 
 porque, desde logo, constitui um mero e eventual efeito da declaração judicial 
 da insolvência, nem por isso tal administrador se encontra em diferente posição 
 no que toca aos meios de defesa a deduzir contra a sentença, excepção feita à 
 situação abrangida pelo referido n.º 2 do art. 40.º do CIRE.
 
                  Mesmo do ponto de vista da racionalidade interna do regime 
 adoptado pelo CIRE, o administrador não é diferenciado em relação ao seu 
 representado. Também este, afora na situação abrangida pelo referido n.º 2 do 
 art. 40.º do CIRE, apenas pode exercer o meio do recurso (art. 42.º, n.º 2, do 
 CIRE).
 
                  Improcede, pois, este fundamento do recurso.
 
  
 
  
 C – Decisão
 
  
 
  
 
                  12 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional 
 decide negar provimento ao recurso e condenar o recorrente nas custas, fixando a 
 taxa de justiça em 20 Ucs.
 Lisboa, 27 de Junho de 2006
 Benjamim Rodrigues
 Mário José de Araújo Torres
 Maria Fernanda Palma
 Paulo Mota Pinto
 Rui Manuel Moura Ramos