 Imprimir acórdão
 Imprimir acórdão   
			
Processo nº 362/06
 
 1ª Secção
 Relator: Conselheiro Rui Moura Ramos
 
  
 
  
 
  
 
  
 
  
 Acordam, em conferência na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
 
  
 
  
 
  
 
  
 
  
 I. Relatório.
 
  
 
 1. Nos presentes autos de recurso, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que 
 
 é recorrente A. e recorridos B. e mulher, C., foi interposto recurso para o 
 Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), 
 da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional 
 
 (LTC).
 
  
 Do requerimento de interposição foi feito constar o seguinte teor:
 
 «A. […] notificada do douto Acórdão, inconformada, vem dele apresentar recurso 
 para o Tribunal Constitucional nos seguintes termos: 
 
 1-                                       O recurso é interposto nos termos da 
 al.b) do art.70º da lei n.º28/82, de 15 de Novembro, na redacção conferida pela 
 Lei n.º85/89, de 07 de Setembro e pela Lei n.º13-A/98, de 26 de Fevereiro;
 
 2-                                       Pretende-se ver apreciada a questão da 
 inconstitucionalidade do art.712º do Cód. de Proc. Civil, na interpretação que 
 foi aplicada no processo em causa, que confere competência ao Tribunal da 
 Relação para fixar pela primeira vez nos autos, matéria de facto controvertida, 
 e com base nela proferir Acórdão, quando a selecção dessa matéria de facto foi 
 feita sem que tivesse havido produção de prova de qualquer género, quer na 
 primeira ou na segunda instância, e sem que fosse dada às partes a possibilidade 
 de reclamar dessa selecção ou de carrearem para o processo meios de prova.
 
 3-                                       De outra forma, pretende-se ver 
 apreciada a inconstitucionalidade da interpretação dada ao dispositivo do 
 art.713º do Cód. de Proc. Civil, no sentido de que a fixação da matéria de facto 
 pelo Tribunal da Relação não admite a reclamação prevista no art.511º, n.º2, do 
 mesmo Cód. de Proc. Civil. 
 
 4-                                       E ainda, pretende-se ver apreciada a 
 questão da inconstitucionalidade do art.678º do mesmo diploma legal, quando 
 interpretado no sentido de impedir que o Supremo Tribunal de Justiça aprecie em 
 recurso, mesmo em causas de valor inferior à alçada respectiva, o Acórdão da 
 Relação que pela primeira vez no processo decide de matéria de facto e em 
 consequência de mérito.
 
 5-                                       O sentido dado a tais normas violam o 
 art.20º, n.º1, da Constituição da República e os princípios constitucionais de 
 justiça, de processo equitativo, de contraditório e de duplo grau de 
 jurisdição». 
 
  
 
  
 
 2. Por se haver entendido que não podia conhecer-se do objecto do recurso, foi 
 proferida a decisão sumária ora reclamada.
 Da fundamentação aí utilizada, são de destacar, com relevo para a decisão a 
 proferir, as seguintes as passagens:
 
 «O presente recurso foi interposto ao abrigo da al.b) do art.70º da LTC, 
 preceito que se refere àqueles que tenham por objecto decisões que apliquem 
 norma cuja constitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. 
 Tais recursos, conforme vem sendo pacificamente entendido, encontram-se 
 sujeitos, quanto à possibilidade da sua admissão, a um conjunto de pressupostos 
 cumulativos, consistindo um deles na obrigatoriedade de a questão de 
 inconstitucionalidade suscitada se referir a norma de que a decisão recorrida 
 haja feito efectiva aplicação.
 Daí se segue que a resposta à questão de saber se, no caso em apreço, tal 
 pressuposto foi ou não observado pela recorrente não dispensará a identificação 
 prévia da decisão concretamente visada pela interposição do recurso. 
 Pese embora diferente possa ser o sentido sugerido pela pretensão manifestada 
 pela recorrente em ver apreciada a questão da inconstitucionalidade do art.712º 
 do Cód. de Proc. Civil na “interpretação (…) aplicada no processo em causa”, bem 
 como a questão da “inconstitucionalidade da interpretação dada ao dispositivo do 
 art.713º do Cód. de Proc. Civil” – sentido esse, de resto, que adiante 
 igualmente se ponderará - cremos que preponderantes elementos impõem que como 
 certo se assuma que a decisão recorrida corresponderá ao Acórdão proferido pelo 
 Supremo Tribunal de Justiça, constante de fls.258 a 263 dos autos.
 
 […]
 Identificada, nos descritos termos, a decisão recorrida a considerar para os 
 efeitos que se seguem, é altura de verificar se, conforme se disse já 
 indispensável, tal decisão fez efectiva aplicação das normas em que a recorrente 
 apoia as questões de inconstitucionalidade suscitadas. 
 A resposta, sendo embora de idêntico sentido, verá o seu fundamento variar em 
 função da norma ou normas que concretamente se considerem.
 
 […]
 A conclusão de que a decisão recorrida não aplicou, na respectiva fundamentação 
 argumentativa, os normativos invocados pela recorrente não pode bastar-se, 
 porém, com a constatação de que os mesmos não são mencionados no Acórdão. 
 E isto porque a aplicação da norma, para além de expressa, pode ser implícita, o 
 que sucederá nos casos em que, embora sem mencionar explicitamente o preceito 
 que se alega haver sido interpretado em sentido constitucionalmente desconforme, 
 a decisão recorrida não deixa de nele apoiar os fundamentos que sustentam o 
 sentido do respectivo pronunciamento. 
 E, assim sendo, necessário se torna fazer notar que, entre os argumentos 
 enunciados no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça para confirmar 
 a não admissibilidade do recurso que se considerou interposto pela ré do Acórdão 
 proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa aos 27 de Janeiro de 2005, se conta 
 o de que o Tribunal da Relação, por ter a incumbência de pronunciar-se em todos 
 os recursos interpostos das decisões dos tribunais de primeira instancia, é 
 sempre competente para conhecer quer da matéria de facto, quer da matéria de 
 direito, razão pela qual, quando adita matéria factual à anteriormente fixada na 
 primeira instância, mesmo que tenha assente matéria de facto controvertida, 
 actua sempre no âmbito dos seus poderes de sindicância da decisão recorrida, 
 podendo, quando muito, incorrer em erro de julgamento ou nulidade. Com a 
 consequência de o recurso interposto com base na violação das regras da 
 competência em razão da hierarquia carecer sempre de fundamento.
 Pois bem.
 Embora em tal passagem seja de reconhecer um pronunciamento implícito sobre o 
 
 âmbito dos poderes de cognição atribuídos ao Tribunal da Relação ao nível da 
 sindicância da matéria de facto e, por lógica decorrência, sobre o uso possível 
 das faculdades que lhe são conferidas pelo art.712º do Cód. de Proc. Civil, o 
 certo é que, conforme resulta da natureza ostensivamente subsidiária da 
 correspondente linha argumentativa, jamais na referida asserção poderia 
 identificar-se a “ratio decidendi” da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de 
 Justiça. 
 Ora, conforme constitui pacífica e consolidada jurisprudência deste Tribunal, o 
 requisito de admissibilidade de que vimos cuidando pressupõe não apenas que a 
 norma com que se relaciona a questão de inconstitucionalidade suscitada haja 
 sido efectivamente aplicada pela decisão recorrida, como ainda que tal aplicação 
 constitua a sua ratio decidendi.
 E nesta última acepção, o pressuposto assim enunciado encontra-se notoriamente 
 ausente. 
 Com efeito, conforme textualmente resulta do Acórdão proferido pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça, a decisão de não admitir o recurso que se considerou 
 interposto pela ré do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 27 de 
 Janeiro de 2005 ficou a dever-se ao facto de tal recurso haver sido considerado 
 intempestivamente apresentado, somente a título subsidiário - ou, na expressão 
 empregue, “apenas por facilidade de raciocínio” - se tendo solucionado a questão 
 de saber se, a admitir-se que fora interposto em tempo, o mesmo poderia vir a 
 ser recebido sem interferência da regra estabelecida no n.º1 do art.678º do Cód. 
 de Proc. Civil que condiciona tal recebimento ao valor da causa no confronto com 
 o valor da alçada do Tribunal da Relação.
 
 É, portanto, no suplementar e residual esforço argumentativo assim desenvolvido 
 que se inscreve o único argumento em que poderia reconhecer-se uma implícita 
 aplicação do art.712º do Cód. de Proc. Civil e que é, conforme se fez já notar, 
 o argumento segundo o qual o Tribunal da Relação dispõe sempre de competência 
 para conhecer da matéria de facto, mesmo nos casos em que, aditando matéria 
 factual à anteriormente fixada pela primeira instância, tenha assente matéria de 
 facto controvertida, entendimento este que, na conclusão extraída pelo Acórdão, 
 tornaria desprovido de fundamento o recurso interposto para o Supremo Tribunal 
 de Justiça sob alegada violação das regras da competência em razão da 
 hierarquia, impedindo-o de ser recebido, caso tempestivo fosse, ao abrigo do 
 regime de excepção previsto no n.º2 do art.678º do Cód. de Proc. Civil. 
 Idêntica ordem de considerações valerá relativamente à pretensão formulada pela 
 recorrente em ver apreciada a questão da inconstitucionalidade do art.678º do 
 Cód. de Proc. Civil, quando interpretado no sentido de impedir que o Supremo 
 Tribunal de Justiça aprecie em recurso, mesmo em causas de valor inferior à 
 alçada respectiva, o Acórdão da Relação que pela primeira vez no processo decide 
 de matéria de facto e, em consequência, de mérito.
 A este propósito e por clareza de exposição, é conveniente começar por fazer 
 notar que, mercê do défice de precisão evidenciado pela recorrente na 
 identificação do Acórdão concretamente recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça 
 considerou alternativamente duas possíveis hipóteses: na primeira, assumiu que o 
 recurso teria por objecto o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa 
 aos 07 de Abril de 2005, considerando-o seguidamente inadmissível, quer por se 
 não integrar em qualquer uma das hipóteses que, excepcionando a regra consagrada 
 no art.678º, n.º1, do Cód. de Processo Civil, tornam, através da previsão dos 
 respectivos e subsequentes incisos, sempre admissível o recurso 
 independentemente do valor da causa, quer por, em face do estatuído no art. 670º 
 do mesmo diploma legal, a decisão sobre a nulidade não ser passível de recurso 
 quando seja de indeferimento; na segunda, concertando-se com o esclarecimento 
 feito pela própria recorrente no requerimento para que sobre a matéria do 
 despacho proferido pelo Juiz Conselheiro Relator incidisse Acórdão, assumiu que 
 o recurso teria por objecto o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de 
 Lisboa aos 27 de Janeiro de 2005.
 Ora, uma vez que, de acordo com próprios termos em que a questão de 
 inconstitucionalidade é suscitada, só a este último aresto se poderá querer 
 referir a recorrente quando contesta a conformidade à Constituição da 
 interpretação dada ao art.678º do Cód. de Proc. Civil no sentido de impedir que 
 o Supremo Tribunal de Justiça aprecie em recurso, mesmo em causas de valor 
 inferior á alçada respectiva, o Acórdão da Relação que pela primeira vez no 
 processo decide de matéria de facto e em consequência de mérito, a questão de 
 saber se a aplicação do art.678º do Cód. de Proc. Civil constituiu ou não a 
 
 “ratio decidendi” da decisão recorrida encontrar-se-á logicamente cingida à 
 declaração de extinção da instância, pelo não conhecimento do recurso, supondo-o 
 interposto do Acórdão que julgou procedente a apelação. 
 E o que se verifica é que, conforme feito já notar, o recurso interposto para o 
 Supremo Tribunal de Justiça tendo por objecto o Acórdão proferido pelo Tribunal 
 da Relação de Lisboa aos 27 de Janeiro de 2005 não foi aí recebido por haver 
 sido considerado extemporaneamente apresentado, razão pela qual a aplicação do 
 art.678º do Cód. de Proc. Civil, embora tenha ocorrido nos subsidiários termos 
 acima já referidos, não constituiu a “ratio decidendi” da decisão recorrida, 
 cujo sentido, por directamente se apoiar na ultrapassagem do prazo previsto no 
 art.685º, n.º1, do Cód. de Proc. Civil, permaneceria obviamente inalterado, 
 ainda que, na hipótese de vir a conhecer do objecto do interposto recurso de 
 constitucionalidade, sufragasse este Tribunal o entendimento que vem defendido 
 pela recorrente. 
 Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 389/00, 
 
 “encontrando-se na decisão recorrida outro fundamento, para além da aplicação da 
 norma impugnada [neste caso, do sentido normativo impugnado] só por si 
 suficiente para chegar a tal decisão, não existe, pois, interesse processual que 
 justifique o conhecimento da questão pelo Tribunal Constitucional – seja qual 
 for o sentido da decisão que recaia sobre a questão, manter-se-á inalterado o 
 decidido pelo tribunal recorrido” (Diário da República, II Série, de 13 de 
 Novembro de 2000).
 Daí que, conforme a propósito se concluiu ainda no Acórdão do Tribunal 
 Constitucional nº 366/96, “não visando os recursos dirimir questões meramente 
 teóricas ou académicas, a irrelevância ou inutilidade do recurso de 
 constitucionalidade sobre a decisão de mérito torna-o uma mera questão académica 
 sem qualquer interesse processual, pelo que a averiguação deste interesse 
 representa uma condição da admissibilidade do próprio recurso” (Diário da 
 República, II Série, de 10 de Maio de 1996).
 E uma vez que, em consequência do carácter instrumental do recurso interposto ao 
 abrigo da al.b) do art.70º da LTC, a decisão sobre a suscitada questão de 
 constitucionalidade haverá necessariamente de “influir utilmente na decisão da 
 questão de fundo” (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 169/92, Diário da 
 República, II Série, de 18 de Setembro de 1992), facilmente se percebe que, 
 tendo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça concluído pela inadmissibilidade 
 do recurso interposto em razão da sua intempestividade, um eventual juízo de 
 inconstitucionalidade nos termos preconizados pela recorrente seria sempre 
 insusceptível de se repercutir proveitosamente na decisão impugnada. 
 Com efeito, ainda que porventura viesse a ser considerado constitucionalmente 
 desconforme o entendimento de que à admissibilidade do recurso interposto do 
 Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa se opõe o disposto no 
 art.678º do Cód. de Proc. Civil, inalterável permaneceria o sentido da decisão 
 proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça, já que a verificada declaração de 
 extinção da instância pelo não conhecimento do recurso se bastaria, em quaisquer 
 circunstâncias, com o reconhecimento da sua intempestiva interposição. 
 
 […]».
 
  
 
  
 
 2. De tal decisão sumária vem agora a recorrente reclamar para a conferência, o 
 que faz ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 78º-A da LTC e através de 
 fundamentação cujo essencial seguidamente se transcreve:
 
 « […]
 
 7. Para o Ilustre Relator a decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça 
 naquele Acórdão é baseada na intempestividade da sua interposição e não 
 propriamente na aplicação das normas cuja constitucionalidade é posta em causa.
 
 8. Ou, dizendo de outro modo “tendo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 
 concluído pela inadmissibilidade do recurso interposto em razão da sua 
 intempestividade, um eventual juízo de inconstitucionalidade nos termos 
 preconizados pelo recorrente seria sempre insusceptível de se repercutir 
 proveitosamente na decisão impugnada (folhas 22).
 
 9. É desta decisão e em especial do seu fundamento que ora se reclama. 
 
 […]
 
 10. De facto, o recurso interposto é do Acórdão proferido a 14 de Março de 2006 
 pelo Supremo Tribunal de Justiça e que em síntese não admitiu o recurso 
 interposto e desatendeu à reclamação feita, mantendo-se o despacho do relator 
 que declarou extinta a instância pelo não conhecimento do seu objecto.
 
 […] 
 
 12. Procurando sistematizar o andamento processual da presente questão temos o 
 seguinte:
 
 […]
 f) Por se entender que nos termos dos artigos 508º-A e 511º do CPC (aplicável 
 por força do artigo 787º do CPC) a selecção da matéria de facto assente 
 pressupõe debate prévio ou pelo menos admite reclamação, e porque o ponto seis 
 da “especificação” feita não resultava de documento autêntico e pior que isso 
 foi directa e especificadamente impugnado na contestação apresentada pela ré 
 
 […], não podendo o Tribunal da Relação considerar como facto assente algo que 
 foi directamente impugnado, a inquilina apresentou em requerimento duas coisas:
 
 - arguiu a nulidade do Acórdão por ter conhecido de questões que não podia tomar 
 conhecimento;
 
 - reclamou da selecção da matéria de facto feita pelo Tribunal da Relação.
 
                                        […]
 h) Já sobre a reclamação da selecção da matéria de facto feita, o mesmo Tribunal 
 da Relação decidiu indeferi-la a 7 de Abril de 2005, o que justificou a 21 de 
 Abril de 2005 que a inquilina, ora reclamante, interpusesse recurso para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, que embora admitido no Tribunal a quo (folhas 138 
 dos autos), veio o Supremo Tribunal de Justiça declarar extinta a instância de 
 recurso por não o admitir nos termos do art.726º e 700º, n.º1, al.e) do CPC, 
 decisão primeiramente proferida pelo Juiz Relator e depois assumida em Acórdão 
 desse Supremo Tribunal datado de 14 de Março do corrente ano.
 i) Embora se reconheça que o Supremo Tribunal de Justiça decidiu correctamente a 
 questão da nulidade do Acórdão porque foi intempestivo o Recurso quanto a essa 
 matéria, já que só teria possibilidade de ser analisado se tivesse sido 
 interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 27 de Janeiro 
 de 2005 porque a arguição da nulidade não suspende os prazos de recurso, já 
 quanto à Reclamação da matéria de facto não nos parece que a sua decisão tenha 
 sido clara e legal. 
 j) De facto a reclamação foi feita nos termos do artigo 511º n.º2 do CPC, e a 
 decisão quanto a esta só era passível de recurso nos termos do artigo 511º, n.º1 
 e do artigo 670º, n.º4 e 669º, n.º2, todos do CPC, recurso esse a ser interposto 
 do último Acórdão que se pronunciou sobre a reclamação feita. 
 k) Ora, o STJ não admitiu esse recurso e no fundo veio a considerar que a 
 selecção da matéria de facto feita pelo Tribunal da Relação não era passível de 
 segunda análise, mesmo quando sobre ela tenha havido reclamação apresentada pela 
 Recorrente e indeferida pelo próprio Tribunal da Relação.
 l) É esta a questão fundamental: será que a decisão do Tribunal da Relação de 
 Lisboa que considera pela primeira vez que um determinado facto está admitido 
 por acordo […] não é passível de ser reanalisado em recurso, como entendeu o 
 Supremo Tribunal de Justiça, é constitucional?
 
 13. Como nos parece resultar do Requerimento de interposição de Recurso para o 
 Tribunal Constitucional, a primeira questão a suscitar a constitucionalidade é a 
 de saber se o art.678º do CPC pode ser interpretado no sentido de não ser 
 admissível recurso mesmo em causas de valor inferior à alçada respectiva, do 
 Acórdão da Relação, que pela primeira vez decide de matéria de facto e em 
 consequência de mérito, impossibilitando a reanalise dessa decisão.
 
 14. E essa questão foi exclusivamente colocada e decidida pelo Supremo Tribunal 
 de Justiça e só nesse Tribunal poderia ser decidida.
 
 15. A questão de constitucionalidade que está a ser levantada neste Tribunal tem 
 a ver com a inadmissibilidade decidida por Acórdão do Supremo Tribunal de 
 Justiça de um Recurso interposto de um Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 
 que não admitiu reclamação quanto à matéria de facto e que assim impediu uma 
 segunda análise a essa matéria de facto decisiva para a decisão judicial aí 
 proferida. 
 
 16. Dito de outro modo, a interpretação do art.678º do mesmo Código de Processo, 
 no sentido de impedir que o Supremo Tribunal de Justiça aprecie em recurso, 
 mesmo em causas de valor inferior á alçada respectiva, o Acórdão da Relação que 
 pela primeira vez no processo decide de matéria de facto e em consequência de 
 mérito, ao abrigo do art.712º do Código de Processo Civil, quando a selecção da 
 matéria de facto foi aí feita sem que tivesse havido produção de prova de 
 qualquer género, quer na primeira ou segunda instância, e sem que fosse dada às 
 partes a possibilidade de reclamar dessa selecção ou de carrearem para o 
 processo meios de prova (não admitindo a reclamação prevista no art.511º, n.º2, 
 do mesmo Código de Processo Civil) viola em nosso entendimento, o art.20º, n.º4, 
 da Constituição da República, e os princípios constitucionais de justiça, de 
 processo equitativo, de contraditório e de duplo grau de jurisdição. 
 
 […]
 
 18. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça veio interpretar o artigo 678º do 
 CPC no sentido de que não é admissível recurso mesmo em causas de valor inferior 
 
 à alçada respectiva, do Acórdão da Relação que pela primeira vez no processo 
 decide de matéria de facto e em consequência de mérito, impossibilitando a 
 reanalise dessa decisão, mesmo que ela esteja em contradição com outros Acórdãos 
 proferidos sobre a mesma matéria.
 
 19. A questão da intempestividade do recurso foi colocada sobre a questão da 
 nulidade do Acórdão do Tribunal da Relação e o Supremo decidiu matéria que não 
 está em análise e que estava de facto definitivamente ausente. 
 
  […]»
 
  
 
  
 II. Fundamentação.
 Analisado o teor da presente reclamação verifica-se que as objecções colocadas à 
 fundamentação seguida na decisão reclamada, mais propriamente ao segmento 
 argumentativo com que a reclamante se revela particularmente inconformada [ 
 ponto 9 do requerimento de reclamação], relevam da associação à ocorrida 
 aplicação do art.678º do Código de Processo Civil pela decisão recorrida de uma 
 dimensão normativa diversa da originariamente enunciada. 
 Vejamos mais de perto:
 Conforme se fez notar na decisão reclamada, no acórdão proferido pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça e objecto do recurso pretendido interpor para este Tribunal, 
 duas hipóteses foram sucessivamente consideradas quanto à identificação da 
 decisão sob censura. 
 Em primeiro lugar, admitiu-se que o recurso dirigido àquele Tribunal viria 
 interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa aos 07 de 
 Abril de 2005, através do qual foi decidido desatender a reclamação apresentada 
 pela aí apelada contra a selecção da matéria de facto imputada ao Acórdão 
 anteriormente proferido e julgar improcedente a nulidade concomitantemente 
 arguida. 
 Pressupondo-o assim interposto, o Supremo Tribunal de Justiça considerou 
 inadmissível o recurso, quer por se não integrar em qualquer uma das hipóteses 
 que, excepcionando a regra consagrada no art.678º, n.º1, do Cód. de Processo 
 Civil, tornam, através da previsão dos respectivos e subsequentes incisos, 
 sempre admissível o recurso independentemente do valor da causa, quer por, em 
 face do estatuído no art. 670º do mesmo diploma legal, a decisão sobre a 
 nulidade não ser passível de recurso quando seja de indeferimento.
 Seguidamente, louvando-se no esclarecimento feito pela própria recorrente no 
 requerimento para que sobre a matéria do despacho proferido pelo Juiz 
 Conselheiro Relator incidisse Acórdão, o Supremo Tribunal de Justiça assumiu que 
 o recurso teria por objecto o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de 
 Lisboa aos 27 de Janeiro de 2005, aresto através do qual havia sido concedido 
 provimento ao recurso de apelação interposto da decisão proferida em primeira 
 instância.  
 Assim figurada a decisão sob censura, o Supremo Tribunal de Justiça considerou 
 inadmissível o recurso pretendido interpor pela ora reclamante pela 
 circunstância de o haver considerado apresentado depois de o prazo previsto no 
 art.685º, n.º1, do Cód. de Proc. Civil para a respectiva interposição. 
 Aceitando-se, embora apenas por facilidade de raciocínio, que o recurso havia 
 sido atempadamente deduzido, sustentou-se, todavia, não ocorrer qualquer uma das 
 circunstâncias em que o recurso, nos termos do art.678º do Cód. de Proc. Civil, 
 
 é sempre admissível, já que, de acordo com o entendimento expresso, o Tribunal 
 da Relação, por ter a incumbência de pronunciar-se em todos os recursos 
 interpostos das decisões dos tribunais de primeira instancia, é sempre 
 competente para conhecer quer da matéria de facto quer da matéria de direito, 
 razão pela qual, quando adita matéria factual à anteriormente fixada na primeira 
 instância, mesmo que tenha assente matéria de facto controvertida, actua sempre 
 no âmbito dos seus poderes de sindicância da decisão recorrida, podendo, quando 
 muito, incorrer em erro de julgamento ou nulidade. Por tal razão, concluiu-se 
 ainda, recurso interposto com base na violação das regras da competência em 
 razão da hierarquia seria sempre infundado.
 Relembrada que fica a estrutura decisória do aresto proferido pelo Supremo 
 Tribunal de Justiça para não admitir o recurso pretendido interpor pela vencida 
 apelada, é altura de fazer notar que, ao enunciar a dimensão normativa que, a 
 partir da aplicação feita do art.678º do Cód. de Processo Civil, pretendeu 
 sujeitar à fiscalização deste Tribunal, a ora reclamada o fez através da 
 seguinte formulação: “pretende-se ver apreciada a questão da 
 inconstitucionalidade do art.678º do mesmo diploma legal, quando interpretado no 
 sentido de impedir que o Supremo Tribunal de Justiça aprecie em recurso, mesmo 
 em causas de valor inferior à alçada respectiva, o Acórdão da Relação que pela 
 primeira vez no processo decide de matéria de facto e em consequência de 
 mérito”.
 Ora, porque o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação acusado de haver 
 decidido, pela primeira vez no processo, «de matéria de facto e em consequência 
 de mérito», só pode ser o Acórdão que, aos 27 de Janeiro de 2005, julgou 
 procedente a apelação e decretou o despejo, por elementar imposição lógica se 
 considerou, na decisão reclamada, que a questão de saber se a aplicação do 
 art.678º do Cód. de Proc. Civil teria constituído ou não a “ratio decidendi” da 
 decisão recorrida só podia dizer respeito à declaração de extinção da instância 
 pelo não conhecimento do recurso, supondo-o interposto do primeiro dos dois 
 arestos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa. 
 E, nesse legítimo e fundado pressuposto, considerou-se que não, o que se fez 
 através da enunciação de fundamentos para cuja infirmação não se vê como possam 
 contribuir os reparos feitos agora pela reclamante. 
 Com efeito, a argumentação desenvolvida no requerimento de reclamação, para além 
 de pretender restaurar e prevalecer-se do originário défice de precisão na 
 identificação do aresto objecto do recurso dirigido ao Supremo Tribunal de 
 Justiça – assim desconsiderando a circunstância de, no requerimento para que 
 sobre a matéria do despacho proferido pelo Juiz Conselheiro Relator incidisse 
 Acórdão, se haver expressamente esclarecido que o aresto visado pelo recurso 
 pretendido interpor era o proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa aos 27 de 
 Janeiro de 2001 [ponto 5 de fls.247 verso] – evidencia a tentativa de rescrever 
 os termos em que foi originariamente enunciada a questão da 
 inconstitucionalidade do critério interpretativo que presidiu à aplicação do 
 art.678º do Código de Processo Civil pelo Supremo Tribunal de Justiça, de modo a 
 referi-la não já apenas ao segmento do Acórdão proferido por aquele Tribunal que 
 conduziu à decisão de não admitir o recurso supondo-o interposto do aresto 
 datado de 27 de Janeiro de 2001, mas ainda ao pronunciamento expresso na decisão 
 recorrida para suportar a concluída inadmissibilidade do recurso, assumindo que 
 teria por objecto o Acórdão proferido pela Relação de Lisboa aos 07 de Abril de 
 
 2005. 
 Só assim, com efeito, pode ser entendida a afirmação produzida sob o ponto 15 do 
 requerimento de reclamação – e, de resto, antecipável já em função do alegado 
 sob as alíneas i) a k) do respectivo ponto 12 - segundo a qual «a questão de 
 constitucionalidade que está a ser levantada neste Tribunal tem a ver com a 
 inadmissibilidade decidida por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de um 
 Recurso interposto de um Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que não 
 admitiu reclamação quanto à matéria de facto e que assim impediu uma segunda 
 análise a essa matéria de facto decisiva para a decisão judicial aí proferida». 
 
 É certo que, sob o ponto 16 do requerimento de reclamação, mais precisamente 
 através do estratégico emprego da expressão «dito de outro modo», a reclamante 
 se esforça por iludir a dissemelhança que notoriamente existe entre a dimensão 
 normativa originariamente enunciada e aquela que agora enuncia em acumulação. 
 Atento, porém, o que resulta do disposto no art.684º, n.º3, do Cód. de Processo 
 Civil, aplicável ex vi do preceituado no art.69º da LTC, tal esforço jamais 
 poderia revelar-se bem sucedido. 
 Com efeito, porque o requerimento dirigido a este Tribunal define o objecto 
 possível do recurso de constitucionalidade e, no requerimento apresentado pela 
 reclamante, a única dimensão normativa que efectivamente se associou à 
 verificada aplicação do art.678º, do Cód. de Processo Civil, diz respeito ao uso 
 que de tal norma foi feito para não admitir o recurso pretendido interpor para o 
 Supremo Tribunal de Justiça, supondo-o a incidir sobre o primeiro dos dois 
 arestos proferidos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a argumentação 
 desenvolvida na decisão reclamada pode resistir, sem dificuldade, às objecções 
 que lhe são dirigidas pela reclamante, já que, por assim ser, da reclamação nada 
 resulta capaz de abalar o entendimento aí expresso e segundo o qual a aplicação 
 do art.678º do Cód. de Processo Civil ocorreu em termos meramente subsidiários, 
 não tendo constituído a ratio decidendi da decisão recorrida. 
 
  
 
  
 III. Decisão.
 Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, 
 confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do 
 recurso.
 Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de 
 conta.
 Lisboa, 19 de Julho de 2006
 Rui Manuel Moura Ramos
 Maria João Antunes
 Artur Maurício