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Proc. nº 1003/98
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I Relatório
1. J... instaurou, junto do Supremo Tribunal Administrativo, processo de contencioso eleitoral, impugnando as eleições para presidente do Tribunal Central Administrativo e vice-presidente da 1ª Secção, realizadas em 1 de Outubro de 1997.
Tais eleições (de 1 de Outubro de 1997) ocorreram quinze dias depois da instalação do Tribunal. O impugnante foi informado da realização das eleições no dia 26 de Setembro de 1997.
Na sequência de tal informação, o impugnante requereu que as eleições fossem marcadas em data posterior (nos termos do artigo 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, pode realizar-se nos 120 dias posteriores
à instalação do Tribunal), de forma a que: o quadro de juízes da 1ª Secção se encontrasse completo; os juízes do Tribunal Central Administrativo tivessem efectiva oportunidade de se candidatarem; os candidatos tivessem oportunidade de intervir na eleição; e os eleitores tivessem liberdade de escolha.
O requerimento foi indeferido por despacho do Presidente em exercício do Tribunal Central Administrativo, datado de 1 de Outubro de 1997, tendo sido eleito o então presidente em exercício.
O impugnante sustentou, no requerimento inicial apresentado junto do Supremo Tribunal Administrativo, que os actos preparatórios do acto eleitoral violam, o seu direito de acesso electivo a cargo público, bem como os princípios de direito eleitoral consagrados nos artigos 50º, nºs 1 e 2, e 116º, nºs 1 e 3, da Constituição. Na sequência de tal afirmação, o impugnante referiu o seguinte:
'caso assim se não entenda, então tal interpretação dos artigos 16º, 38º e 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, viola o disposto nos artigos
50º, nºs 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, da Constituição'.
O impugnante requereu ainda a isenção de preparos e custas, nos termos do artigo 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho.
O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 21 de Outubro de
1997, julgou improcedentes as considerações aduzidas no sentido da declaração de nulidade das eleições. Para tanto, considerou (em função do que consta das actas referentes ao acto eleitoral) que se encontrava presente a totalidade dos juízes que constituem o universo dos eleitores elegíveis, o que significa que qualquer um podia ser escolhido pelos seus pares (nomeadamente, o próprio recorrente).
Por outro lado, o tribunal considerou que a circunstância de o quadro dos juízes não estar completo não impede a realização das eleições, desde que às mesmas sejam chamados todos os elementos que, no momento, integram o colégio eleitoral (o que aconteceu).
O tribunal afirmou ainda que as eleições em causa não comportam qualquer período de esclarecimento do eleitorado. Em relação à falta de fundamentação do despacho que indeferiu o adiamento das eleições, o tribunal considerou ser indiferente o motivo por que a data não foi adiada.
O Supremo Tribunal Administrativo indeferiu, por último, o pedido de isenção de preparos e custas, uma vez que tal isenção não abrange os litígios de natureza estatutária em que o magistrado seja parte.
2. J... interpôs recurso do acórdão de 21 de Outubro de 1997 para o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo.
Nas respectivas alegações, o recorrente sustentou que o despacho de
1 de Outubro de 1997 violava o disposto no artigo 268º, nº 3, da Constituição. Sustentou, também, que o artigo 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, interpretado restritivamente, violava o disposto nos artigos 18º, nº 3 e
20º, nº 1, da Constituição.
Nas respectivas conclusões, o recorrente reiterou a inconstitucionalidade dos artigos 16º, 38º e 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº
129/84, de 27 de Abril, sustentando também a inconstitucionalidade do artigo
17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho.
O Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 15 de Julho de 1998, negou provimento ao recurso e condenou o recorrente em custas.
Para tanto, considerou que o despacho de 1 de Outubro de 1997 se encontra suficientemente fundamentado; que dos elementos dos autos não resultam indícios da violação do direito do recorrente de acesso efectivo a cargo público; e que não tem aplicação o disposto no artigo 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, uma vez que o direito que o recorrente pretende fazer valer no processo, a existir, adviria não do desempenho de funções mas do seu estatuto.
3. J... interpôs recurso de constitucionalidade do acórdão de 15 de Julho de 1998, ao abrigo do disposto nos artigos 280º, nº 1, alínea b), da Constituição, e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da conformidade à Constituição das normas contidas nos artigos 123º, nº 2, alínea d), 124º, nº 1, alíneas a), b) e c) e 125º, nºs 1 e 2, do Código do Procedimento Administrativo, 16º, 18º, 37º, 38º, 99º, nº 1, alínea g) e 116º, nº
1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, e 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº
21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº 10/94, de 5 de Maio.
Junto do Tribunal Constitucional, o recorrente apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:
Objecto do recurso de constitucionalidade O objecto do presente recurso de constitucionalidade é dado pela inconstitucionalidade das seguintes normas legais: o os artigos 123º, nº 2, alínea d), 124º, nº 1, alíneas a), b) e c), e
125º, nºs 1 e 2 todos do CPA, que na interpretação acolhida violam o princípio da fundamentação dos actos violadores de direitos ou interesses legalmente protegidos consagrado no art º 268º, nº 3, da Constituição; o os art. 16º, art. 18º, art. 37º, art. 38º, art. 116º, nº 1, e art. 99º, nº 1, alínea g), todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, que na interpretação acolhida violam o princípio de co-participação na gestão da magistratura da jurisdição administrativa, consagrado nas disposições conjuntas dos art. 48º nº 1, art. 267º, nº 1, 214º, nº 2, da Constituição, os art. 16º, art. 38º, e art. 116º, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, que na interpretação acolhida violam o conjunto dos princípios do direito eleitoral português, consagrado nas disposições conjuntas dos art. 50º, nºs 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, da Constituição. o art. 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº 10/94, de 5 de Maio (norma que concede a isenção de custas ao recorrente), na interpretação restritiva seguida, que viola o disposto nos artºs
18º, nº 3, e 20º, nº 1, da Constituição. Os factos O Tribunal Central Administrativo é um novo tribunal superior da jurisdição administrativa e fiscal, tendo sido criado pela Lei nº 49/96, de 4 de Setembro, e pelo Decreto-Lei nº 229/96, de 29 de Novembro, e declarado instalado a partir de 15 de Setembro de 1997 pela Portaria nº 398/97, de 18 de Junho. No Tribunal Central Administrativo, enquanto não houvesse presidente eleito, o cargo era exercido pelo juiz que dsempenhava idêntica função no Tribunal Tributário de 2ª Instância à data da sua extinção – in casu, o recorrido particular Dr. JP... - artº 116º, nº 2, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril. Em 23.9.97 o 'presidente em exercício' do Tribunal Central Administrativo, o recorrido particular Dr. JP..., dirigiu a todos os juizes do tribunal a comunicação de fls. 29, do seguinte teor: 'no próximo dia 1 de Outubro [de 1997] pelas 12 horas, se procederá à eleição do Presidente do T.C.A. e do Vice-Presidente da 1ª Secção. [ ] Logo que eleito este, procurará acordar-se no dia e hora para a sessão da 1ª Secção, elaborar-se-á a escala e tratar-se-á dos assuntos que interessem ao bom desempenho do serviço'. Em 30.9.97, o requerente dirigiu ao 'presidente em exercício' do Tribunal Central Administrativo, o recorrido particular Dr. JP..., a petição de fls.
30/33, na qual solicitava a designação de nova data para a eleição, de forma que: o quadro de juízes da 1ª Secção se encontrasse completo, sendo esta uma obrigação imediata que impende sobre o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais; o os juízes do Tribunal Central Administrativo tivessem oportunidade efectiva de se candidatarem aos cargos de Presidcnte (e membro do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais por inerência) e Vice-Presidente do Tribunal Central Administrativo; o os candidatos tivessem oportunidade efectiva de intervir nessa eleição, com inteira liberdade, e os eleitores tivessem plena liberdade de escolha. A petição foi indeferida pelo recorrido particular Dr. JP..., com a seguinte fundamentação:
'Ouvi pessoalmente todos os juízes que, neste momento, compõem o tribunal. Só um dos juízes, além do peticionante, foi da opinião de que se deveria procurar encontrar prazo mais razoável. Em face do exposto, e porque só estão em causa juízos de oportunidade e conveniência, que não a violação de qualquer norma e, porque em meu entender não são atendíveis indefiro o pedido'. Em 1 de Outubro de 1997, pelas 12 horas, tiveram lugar as referidas eleições, tendo sido eleitos o recorrido particular Dr. JP..., para o cargo de Presidente do Tribunal Central Administrativo e por inerência membro do Conselho Superior dos Tribunais Admmistrativos e Fiscais, e o também recorrido particular Dr. E..., para o cargo de Vice-presidente da 1ª Secção. Discussão A eleição é uma escolha de pessoas destinadas a preencher cargos determinados.
É apontado pela doutrina que os princípios gerais de direito eleitoral político constantes da Constituição constituem princípios gerias de direito eleitoral, válidos para as eleições não políticas que se realizem tanto no domínio do direito administrativo, como no do direito civil. Nos termos do art. 116º, nº 2, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, enquanto não houver presidente eleito no Tribunal Central Administrativo, o cargo é exercido pelo juiz que desempenhava idêntica função no Tribunal Tributário de 2ª Instância à data da sua extinção - in casu, o recorrido particular Dr. JP.... De acordo com o nº 1 do citado art. 116º, a eleição do presidente e dos Vice-presidentes do Tribunal Central Administrativo tem lugar dentro dos 120 dias subsequentes à data do início de funcionamento do tribunal.
É insólita a pressa traduzida por eleições marcadas para 1 de Outubro de 1997, menos 15 dias após a instalação do Tribunal Central Administrativo. O extenso período de 120 dias concedido pela lei para a eleição dos primeiros presidente e vice-presidente encontra uma das justificações precisamente na necessidade de conhecimento mútuo dos juizes do Tribunal Central Administrativo. Por inerência, o presidente do Tribunal Central Administrativo é membro do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (art. 99º, nº 1, alínea d)), sendo substituído pelo vice-presidente por si designado substituto, ou pelo sénior (art. 99º, nº 4). Os cargos em causa - presidente de tribunal superior e (por inerência) membro de
órgão de gestão e disciplina da magistratura, vice-presidente de tribunal superior - atenta a sua configuração integrados em órgãos do Estado, consubstanciam dois direitos fundamentais individuais caros à caracterização do Estado de direito democrático: o direito de acesso a cargo público electivo
(arts. 50º e 214º, nº 2, da Constituição), o direito de participação na gestão da coisa pública (arts. 48º, 267º, nº 1, e 219º, nº 2 da Constituição). O sufrágio directo, secreto e periódico constitui a regra geral de designação dos titulares dos órgãos do Estado (art. 113º, nº 1), estando as campanhas subordinadas aos princípios de liberdade de propaganda, igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas, imparcialidade das entidades públicas perante as candidaturas (art. 113º, nº 3), constituindo a regularidade e a validade dos actos de processo eleitoral matéria de reserva jurisdicional (art. 113º, nº 7). Uma vez que as eleições em causa poderiam ocorrer até 13 de Janeiro de 1998, a marcação das mesmas para 1 de Outubro de 1997, sem que os juízes em exercício no Tribunal Central Administrativo tenham tido oportunidade de se conhecerem uns aos outros, é manifesta precipitação, e viola os referidos direitos constitucionais de acesso electivo a cargo público e de participação na gestão da coisa pública. O recorrido particular Dr. JP..., como presidente em exercício do Tribunal Central Administrativo, e como órgão ad hoc de administração eleitoral, tinha a especial obrigação de assegurar a realização das eleições referidas, de acordo com os princípios eleitorais. Acresce a circunstância de o recorrido particular Dr. JP... ser interessado no resultado da eleição em causa, bem como a circunstância de que o recorrido particular Dr. JP..., no contexto em que se realizou a eleição impugnada, beneficiava de um estatuto de preponderância em relação aos outros colegas virtualmente elegíveis. O Despacho de 1.10.97 do Sr Presidente em exercício do Tribunal Central Administrativo, o recorrido particular Dr. JP..., que recaiu sobre o requerimento (direito de petição) do recorrente de 30.9.97, assenta em erro nos pressupostos de direito. já que estão em causa direitos fundamentais de acesso electivo a cargo público e de co-participação na gestão da coisa pública, mostrando-se ainda carecido de fundamentação, pelo que violador do disposto nos art. 268º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa, art. 123º, nº 2, alínea d), art. 124º, nº 1, alíneas a), b), e c), e art. 125º, nºs 1 e 2, todos do CPA. O presente recurso (de decisão que aplique normas cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo - art. 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro) tem como um dos pressupostos que a questão da inconstitucionalidade da norma tenha sido suscitada durante o processo. O Supremo Tribunal Administrativo está vinculado a não aplicar normas inconstitucionais - art. 204º da Constituição, e art. 4º, nº 3, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril. O bloco de legalidade a que os actos públicos estão sujeitos, resulta de um conjunto de normas constitucionais e legais pertinentes à solução normativa da questão que estiver subjacente a esses actos. Daí que, por um lado, no controle jurisdicional dos actos públicos, o juízo jurisprudencial deverá considerar oficiosamente a conformidade constitucional das normas legais propostas ao litígio. Quando, por outro, se invoca que determinado acto público viola o complexo normativo dado por uma amálgama de normas constitucionais e legais, tendente a uma determinada decisão proposta como parâmetro da legalidade que se reivindica, está-se a defender determinada interpretação constitucional, de tal forma que se isso não a proceder está aberta a via de recurso ao Tribunal Constitucional. Ao dizer, nas conclusões de recurso para o Pleno, que o acto viola o disposto nos art. 268º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa, art. 123º, nº 2, alínea d), art. 124º, nº 1, alíneas a), b), e c), e art. 125º, nºs 1 e 2, todos do CPA, pelo que a realidade devia ter sido anular o acto e consequentemente declarar a nulidade das eleições em causa, está o recorrente a invocar que a
única interpretação das normas legais apontadas conforme ao art. 268º, nº 3, da Constituição, é a que permita esse resultado, precisamente o resultado que é o pretendido pelo recorrente. Da mesma forma, ao referir que os actos preparatórios do acto eleitoral em causa violam os direitos fundamentais do recorrente (1) de acesso electivo a cargo público, consagrado nas disposições conjuntas dos art. 50º, nºs 1 e 2, art.
214º, nº 2, ambos da Constituição, e art. 16º, art. 18º, art. 37º, art. 38º e art. 116, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, e (2) de co-participação na gestão da magistratura de jurisdição administrativa, consagrado nas disposições conjuntas dos art. 48º, nº 1, art. 267º, nº 1, art.
21º, nº 2, todos da Constituição, e art. 99º, nº 1, alínea d), do Decreto-Lei nº
129/84, de 27 de Abril, está o recorrente a invocar que a única interpretação dos art. 16º, artº 18º, art. 37º, artº 38º, e art. 116º, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, conforme aos artº 50º, nºs 1 e 2, art.
214º, nº 2, ambos da Constituição ou do artº 99º, nº 1, alínea d), do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, conforme aos artº 48º, nº 1, artº 267º, nº 1, 21º, nº 2, todos da Constituição, é a que propõe traduzida no resultado que defende. Por outro lado, o tribunal recorrido aplicou efectivamente as normas legais invocadas pelo recorrente, em sentido divergente do defendido por este. Violação do artº 268º, nº 3, da Constituição O tribunal recorrido reconduz a exigência de 'fundamentação expressa [de actos que] afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos' constante do art. 268º, nº 3, da Constituição (versão de 1989), a uma mera indicação de razões, sejam elas quais forem. O acórdão recorrido limitou-se a sancionar o entendimento do acórdão de 21.10.97 da secção, expresso em considerar 'indiferente saber qual o fundamento por que tal data não foi adiada por decisão do presidente do colégio em causa, contrariando pretensão do mesmo recorrente' (sublinhado e destaque nossos). A garantia constitucional de fundamentação contempla um sentido de clareza de fundamentação, isto é, que as razões que levaram a tomar a decisão em concreto dêem a conhecer perfeitamente o respectivo processo lógico e jurídico, com repúdio de mera fraseologia; um sentido de Suficiência, que explique concretamente o processo decisório a culminar em determinada decisão, com afastamento das simples formulação de conclusões; um sentido de congruência, traduzida na harmonização adequada entre o fim prosseguido pela norma e a decisão. No exercício das suas funções de órgão ad hoc de administração eleitoral este está obrigado a explicar e justificar as decisões que tome, sobretudo se indeferem direitos invocados, e esta dimensão da explicação e esta dimensão da explicação e justificação não está contida no segmento do artº 268º, nº 3, da Constituição. Assim, o acórdão recorrido, ao aplicar os art.s 124º, alínea c), e 125º, nºs 1 e
2, do CPA, desvalorizando o momento justificativo, contido artº 268º, nº 3, da Constituição (fundamentação expressa e acessível), vem a fazer interpretação daquele complexo normativo em desconformidade com o âmbito de protecção da norma, o que gera o vício de inconstitucionalidade material. Violação dos artº 48º, nº 1, art. 267º, nº 1, art. 214º, nº 2, da Constituição Quanto à invocada pelo recorrente violação pelo actos preparatórios do acto eleitoral em causa, dos direitos fundamentais do recorrente (1) de acesso efectivo a cargo público e (2) de co-participação na gestão da magistratura da jurisdição administrativa, o acórdão recorrido considerou que os factos provados nada de relevante apresentam no sentido de comprovar a apontada violação. Verifica-se que o acórdão recorrido perfilha a doutrina afirmada pelo acórdão da secção de 21.10.97, em que se considera que as eleições referidas são eleições internas no seio de um órgão colegial e não integram qualquer período de esclarecimento do eleitorado, como acontece em geral nas eleições para cargos políticos. Não considerar que as disposições legais do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, que suportaram as eleições impugnadas - artº 16º, artº 18º, artº 37º, artº 38º, art. 116º, nº 1, e artº 99º, nº 1, alínea g) - encerram uma dimensão de direito de qualquer dos juizes do Tribunal Central Administrativo de acesso aos cargos de presidente (e por inerência vogal do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais) e de vice-presidente, e de co-participação na gestão da magistratura administrativa, é fazer aplicação de tal complexo normativo em desconformidade com o disposto nos art. 48º, nº 1, artº 267º, nº 1
, 214º, nº 2, da Constituição, o que gera a sua inconstitucionalidade.
Violação dos arts. 50º. nºs 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, da Constituição O apoucar dos princípios eleitorais efectuado pelo acórdão recorrido, vem a implicar que as disposições legais do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, que suportaram as eleições impugnadas - artº 16º, artº 38º, e artº 116º, nº 1, todos do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril - não encerrem um direito de acesso electivo a cargo público - pelo que se fez aplicação do invocado complexo normativo em desconformidade com o conjunto dos princípios do direito eleitoral português, consagrado nas disposições conjuntas dos artº 50º, nºs 1 e 2, 116º, nºs 1 e 3, da Constituição, o que gera a sua inconstitucionalidade.
Isenção de custas Quanto ao direito à isenção de custas, o acórdão recorrido considerou que o recorrente impugna a legalidade do acto eleitoral do presidente e do vice-presidente do T.C.Administrativo, estando em causa, não a função de 'dizer o direito', mas um direito estatutário, que é o de se candidatar à eleição para presidente ou vice-presidente do tribunal, por ser juiz desse tribunal, pelo que está sujeito à regra geral sobre o pagamento de custas, devendo recusar-se um privilégio que, como tal, é destituído de fundamento legal ou moral. O recorrente é titular do direito especial consagrado no artº 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº 10/94, de 5 de Maio. ex vi o artº 77º do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, consubstanciado na
'isenção de preparos e custas em qualquer acção em que o juiz seja parte principal ou acessória, por via do exercício das suas funções'. A defesa do Estatuto dos juízes cabe à iniciativa destes, pois de outra forma os juizes hipotecam a sua independência a quem se arrogue a defesa dos juízes. A isenção verifica-se em qualquer acção na qual o juiz seja recorrente ou requerido, por causa do exercício das suas funções, em que pretende uma determinada composição de um litígio suscitado por causa do exercício das suas funções. Um juiz está no exercício de funções quando se encontra em posição de poder actuar os poderes funcionais implicados na competência do tribunal a que está adstrto. Por isso, o exercício de funções deve constituir a causa de pedir da acção, de tal forma que aqui são contidos os litígios de natureza estatutário em que o juiz é parte; ou seja, a acção há-de fundar-se em factos directamente conexionados com o exercício das funções do juiz, pelo que a isenção concedida é uma isenção de tipo subjectivo - vide Acórdão do Tribunal Constitucional nº
466/97, in Diário da República, II, nº 245, de 22.10.97. O Acórdão do Tribunal Constitucional nº 279/98, de 10.3.98, Recurso nº 199/95,in Diário da República, II Série, nº 159, de 13.7.98, págs. 9675 e seguintes, e BMJ
475-196, considera que o acto de eleger vogais dos órgãos de gestão da magistratura se encontra indissoluvelmente ligado ao próprio exercício da função judicial. A isenção de custas pretendida pelo recorrente é de tipo subjectivo (Acórdão nº
466/97), surge em acção em que aquele é parte principal, por via do exercício de funções, já que visa a garantia jurisdicional do 'acto de eleger [...] indissoluvelmente ligado ao próprio exercício da função judicial' (Acórdão nº
279/98). Ao assim não considerar, o Acórdão recorrido procede a uma compressão do direito especial concedido pela lei, para além do que é intolerável em sede de interpretação, e gera a sua inconstitucionalidade do citado art. 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho. No acesso a tutela jurisdicional efectiva de juiz para defesa de direitos resultantes do Estatuto de juízes, o Acórdão recorrido lê na norma do art. 17º, nº 1, alínea g), uma condição não constante da sua letra, restringindo intoleravelmente o tipo legal, e denegando o direito ao Tribunal, ao Direito e à Justiça, na sua pretensão de o condicionar economicamente a pretexto de combater privilégios amorais, pelo que se verifica a violação do art. 2oº, nº 1, da Constituição. A violação do art. 18º, nº 3, da Constituição, assenta na circunstância de a restrição efectuada resultar, não de lei específica, nem da necessidade de salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, mas sim de uma interpretação da letra da lei que diminui consideravelmente a extensão e o alcance do conteúdo essencial do direito fundamental de acesso à justiça para julgamento da regularidade e da validade de procedimento eleitoral
(cfr. art. 116º, nº 7, da Constituição).
O recorrido não contra-alegou.
4. Corridos os vistos, cumpre decidir.
II Fundamentação A Delimitação do objecto do recurso
5. O recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade à Constituição das normas contidas nos artigos 123º, nº 2, alínea d), 124º, nº 1, alíneas a), b) e c) e 125º, nºs 1 e 2, do Código do Procedimento Administrativo. A questão de constitucionalidade relativa a estes preceitos prende-se com a alegada falta de fundamentação do despacho de 1 de Outubro de
1997. O recorrente sustenta que foi violado o artigo 268º, nº 3, da Constituição.
Ora, sendo o presente recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo dos artigos 280º, nº 1, da Constituição e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, é necessário, para que se possa tomar conhecimento do seu objecto, que a questão de constitucionalidade normativa haja sido suscitada durante o processo. O Tribunal Constitucional tem entendido este requisito num sentido funcional. De acordo com tal entendimento, uma questão de constitucionalidade normativa só se pode considerar suscitada de modo processualmente adequada quando o recorrente identifica a norma que considera inconstitucional, indica o princípio ou a norma constitucional que considera violados e apresenta uma fundamentação, ainda que sucinta, da inconstitucionalidade arguida. Não se considera assim suscitada uma questão de constitucionalidade normativa quando o recorrente se limita a afirmar, em abstracto, que uma dada interpretação é inconstitucional, sem indicar a norma que enferma desse vício, ou quando imputa a inconstitucionalidade a uma decisão ou a um acto administrativo.
Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem igualmente entendido que a questão de constitucionalidade tem de ser suscitada antes da prolação da decisão recorrida, de modo a permitir ao juiz a quo pronunciar-se sobre ela. Não se considera assim suscitada durante o processo a questão de constitucionalidade normativa invocada somente no requerimento de aclaração, na arguição de nulidade ou no requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade (cf., entre muitos outros, o Acórdão nº 155/95, D.R., II Série, de 20 de Junho de 1995).
O recorrente, nos presentes autos, só invocou a inconstitucionalidade das normas referidas (e mesmo aí, de modo pouco claro) no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade. Com efeito, e como aliás é reconhecido pelo próprio nas alegações do recurso de constitucionalidade , antes só imputou o vício de inconstitucionalidade à própria decisão, e nunca a uma dada norma jurídica.
De acordo com a jurisprudência unânime e pacífica do Tribunal Constitucional (cf. o citado Acórdão nº 155/95) e ao contrário do que o recorrente sustenta, a invocação da inconstitucionalidade de uma decisão ou de um despacho, sem identificar qualquer critério normativo, não consubstancia a suscitação de uma questão de constitucionalidade normativa para efeito de verificação do pressuposto processual do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo
70º da Lei do Tribunal Constitucional, referindo-se, antes, a um mero momento aplicativo do Direito, a uma tarefa subsuntiva levada a cabo pelo Tribunal recorrido, que não compete ao Tribunal Constitucional sindicar.
Nessa medida, e uma vez que o recorrente invoca desde o início do processo a falta de fundamentação do despacho de 1 de Outubro de 1997 (pelo que o sentido da decisão recorrida não se afigura objectivamente imprevisível), há que concluir que não foi suscitada durante o processo a questão de constitucionalidade relativa às referidas normas do Código do Procedimento Administrativo, pelo que não se tomará conhecimento do objecto do recurso nessa parte.
6. O recorrente pretende, por outro lado, que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade à Constituição das normas contidas nos
16º, 18º, 37º, 38º, 99º, nº 1, alínea g) e 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, sustentando que tais normas, interpretadas no sentido de não encerrarem 'uma dimensão do direito de qualquer dos juízes do Tribunal Central Administrativo de acesso aos cargos de presidente (...) e de vice-presidente, e de co-participação na gestão da magistratura administrativa', violam o disposto nos artigos 48º, nº 1, 267º, nº 1, e 214º, nº 2, da Constituição.
Ora, por um lado, não se apreende, das alegações do recorrente, qual
é a norma ou dimensão normativa impugnada. Com efeito, os preceitos invocados regulam matérias relativas à eleição do presidente do Supremo Tribunal Administrativo (artigo 16º); coadjuvação e substituição do presidente (artigo
18º); presidência e preenchimento das secções do Tribunal Central Administrativo
(artigos 37º e 38º); eleição do presidente e dos vice-presidentes (artigo 116º, nº 1); e composição do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais
(artigo 99º). Da sua conjugação e do confronto das mesmas com a decisão recorrida e com as alegações apresentadas não resulta qualquer dimensão normativa precisa imediatamente apreensível cuja conformidade à Constituição cumpra apreciar, e que não devesse ter sido explicitamente formulada pelo recorrente para que o Tribunal Constitucional dela possa tomar conhecimento.
Por outro lado, tal questão, com a configuração constante do requerimento do recurso de constitucionalidade, nunca foi suscitada antes da prolação da decisão recorrida. Na verdade, o recorrente, durante o processo, apenas se referiu aos actos preparatórios das eleições impugnadas, nunca suscitando a inconstitucionalidade de uma dada norma ou dimensão normativa resultante da interpretação conjugada dos preceitos mencionados.
Do que se deixa dito, resulta a não verificação no caso do pressuposto processual do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional consistente na suscitação durante o processo e de modo adequado de uma questão de constitucionalidade normativa. Nessa medida, também não se tomará conhecimento do objecto do recurso nessa parte.
8. O recorrente, por outro lado, submete à apreciação do Tribunal Constitucional as normas contidas nos artigos 16º, 38º, e 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, sustentando que as mesmas são inconstitucionais, por violação do disposto nos artigos 50º, nºs 1 e 2, e 116º, nºs 1 e 3, da Constituição.
Ora, mais uma vez, das alegações de recurso apresentadas não se apreende qual é a dimensão normativa resultante da conjugação dos referidos preceitos que o recorrente considera inconstitucional. Na verdade, o recorrente somente impugna a realização das eleições 15 dias após a instalação do Tribunal Central Administrativo, não questionando a regulamentação do respectivo processo eleitoral. Nessa medida, a única norma impugnada, na perspectiva da sua constitucionalidade, foi a contida no artigo 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº
129/84, de 27 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 229/96, de 29 de Novembro (norma que consagra o prazo de 120 dias a contar da data do início do funcionamento do Tribunal Central Administrativo para a realização da eleição do presidente e dos vice-presidentes) e não as contidas nos artigos 16º e 38º do mesmo diploma (que estabelecem o respectivo modo de eleição).
9. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional apenas apreciará a conformidade à Constituição das normas contidas nos artigos 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº
229/96, de 29 de Novembro, e 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº 10/94, de 5 de Maio.
B A questão da constitucionalidade do artigo 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 229/96, de 29 de Novembro
10. O preceito impugnado pelo recorrente tem a seguinte redacção: Artigo 116º Eleição do presidente e dos vice-presidentes do Tribunal Central Administrativo
1 - A eleição do presidente e dos vice-presidentes do Tribunal Central Administrativo tem lugar dentro dos 120 dias subsequentes à data do início de funcionamento do Tribunal.
(...)
O recorrente sustenta que tal preceito, interpretado no sentido de permitir a realização das eleições quinze dias depois do início do funcionamento do tribunal (tendo as mesmas sido comunicadas sete dias antes da respectiva data), impede a livre candidatura de todos os elegíveis, assim como a realização de um período de esclarecimento, pelo que é inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 48º, nº 1, 50º, nºs 1 e 2, 113º, nºs 1 e 3, 212º, nº 2 e
264º, nº 1, da Constituição (versão de 1997). O recorrente (de modo, aliás, pouco claro) impugna, assim, a norma que permite a realização das eleições no décimo quinto dia a contar da data de início de funcionamento do tribunal.
A Constituição assegura os direitos de acesso a cargos públicos, de eleger e de ser eleito e de participar na organização e gestão das instituições, devendo as eleições ser realizadas com observância dos princípios da igualdade e da imparcialidade, de modo a permitirem uma escolha, de entre os candidatos, efectiva e democrática. Não serão, assim, constitucionalmente admissíveis soluções normativas que, de alguma forma, impeçam ou ilegitimamente obstaculizem a candidatura de alguém que preencha os respectivos requisitos legais.
No entanto, não decorre da Constituição a uniformização do processamento de todos os actos eleitorais. Com efeito, as eleições legislativas
(por exemplo) decorrerão em moldes necessariamente diferentes daqueles em que decorrerão as eleições para a presidência de um tribunal superior, por força das respectivas especificidades (natureza do órgão, universo de eleitores, proximidade entre estes e os candidatos, etc.). Por outro lado, e em consequência disso mesmo, as condições gerais de garantia de tais princípios e direitos diferem de órgão para órgão. Dever-se-á, assim, averiguar se a norma que consagra a possibilidade de realização das eleições para a presidência do Tribunal Central Administrativo no prazo de quinze dias (a contar da data da respectiva instalação) impedirá o exercício dos direitos invocados e limitará a concretização dos princípios mencionados.
Para demonstrar como é que aquela norma em concreto interfere com o direito de participação na vida pública, tem interesse a descrição da forma como tal direito se manifestou no caso concreto. Assim, o recorrente impugnou (como aliás já se referiu) as eleições para os cargos de presidente do Tribunal Central Administrativo e de vice-presidente da
1ª Secção. Por outro lado, os interessados tinham conhecimento, desde o início do funcionamento do tribunal, de que tais eleições se iriam realizar nos cento e vinte dias posteriores a essa data. Os interessados foram informados atempadamente da realização das eleições, tendo comparecido no respectivo acto eleitoral (cf. fls. 37). Todos os juízes elegíveis encontravam-se nesse acto, nas mesmas condições do recorrente. Houve juízes, para além do juiz vencedor
(que foi eleito por maioria absoluta), que obtiveram votação. Por último, só um juiz, para além do recorrente, considerou adequado realizar as eleições em data diferente da marcada.
Consequentemente, dos elementos constantes dos autos (aos quais se acaba de fazer referência), verifica-se que o prazo de quinze dias permitiu a concretização dos princípios invocados, assim como se mostrou suficiente para o exercício dos direitos do recorrente. As eleições impugnadas (não obstante o referido prazo) decorreram com a normalidade inerente à eleição do presidente de um tribunal superior, não se vislumbrando, nessa medida, que a decisão que marcou o acto eleitoral para o dia 1 de Outubro de 1997 (décimo quinto dia posterior à instalação do tribunal) tenha assentado numa interpretação normativa violadora do núcleo essencial dos princípios e direitos (constitucionalmente consagrados) invocados pelo recorrente. Se o recorrente (ou qualquer outro juiz) tinha a intenção de se candidatar aos cargos em questão, poderia, desde o início do funcionamento do tribunal, diligenciar nesse sentido, nomeadamente através da manifestação aos colegas, ou ao presidente em exercício, desse intuito.
Do artigo 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 229/86, não decorre (nem decorreu em concreto) nenhuma dimensão normativa que conduzisse à violação do direito de participação na vida pública e de acesso a cargos públicos (artigos 48º e 50º da Constituição). Não decorreu de tal norma, por força do critério normativo que consagra, qualquer impedimento efectivo e real da participação do recorrente na eleição (como eleitor e como candidato – cf. acta de fls. 37).
Também não se vislumbra que tal norma conduza à violação dos princípios gerais de direito eleitoral (artigo 113º da Constituição). Como se mencionou, a eleição do presidente de um tribunal superior não tem, necessariamente, de decorrer nos mesmos termos em que se processa a eleição de outros cargos públicos. Nessa medida, e em face do órgão em causa e da qualidade dos eleitores, o prazo de quinze dias permitido pela amplitude do prazo consagrado em tal norma não é, de qualquer modo, excessivamente exíguo para a concretização de tais princípios, nomeadamente o da liberdade de divulgação de ideias, o da igualdade e o da imparcialidade das candidaturas.
Por último, não se descortina que a norma em crise viole o disposto no artigo 212º, nº 2, da Constituição (que estabelece que o Presidente do Supremo Tribunal Administrativo é eleito de entre e pelos respectivos juízes), bem como o artigo 267º, nº 1, da Constituição. Com efeito, a aplicação de tal norma permitiu que o Presidente do Tribunal Central Administrativo tenha sido eleito de entre e pelos juízes, e, por outro lado, o recorrente teve (como resulta dos elementos constantes dos autos – nomeadamente, da acta de fls. 37) oportunidade de participar nessa eleição. O que se acaba de afirmar não é afectado pela circunstância de o quadro dos juízes do Supremo Tribunal Administrativo não estar completo no momento em que se realizaram as eleições impugnadas. Com efeito, da Constituição não resulta que a eleição do Presidente só seja possível após o efectivo e completo preenchimento do quadro de juízes, nem que haja, verdadeiramente, qualquer obrigação constitucional de preenchimento do quadro.
Se é verdade que as eleições poderiam ter sido realizadas noutra data, o Tribunal Constitucional não se poderia pronunciar, todavia, sobre tal ponto. Tal juízo (que é o que o recorrente faz) não se confunde com um juízo de constitucionalidade normativa que compete ao Tribunal Constitucional.
Deverá concluir-se, pelas razões expendidas, que a norma impugnada não viola as disposições constitucionais invocadas.
C O artigo 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº 10/94, de 5 de Maio
11. O recorrente sustenta que a interpretação restritiva do artigo
17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº
10/94, de 5 de Maio, no sentido de o não considerar isento de custas nos presentes autos, é inconstitucional, por violação do disposto nos artigos 18º, nº 3, e 20º, nº 1, da Constituição. A norma impugnada estabelece a isenção de preparos e custas nas acções em que o juiz seja parte principal ou acessória, por via do exercício das suas funções.
A interpretação restritiva que o recorrente refere pressupõe que os efeitos do exercício da função de juiz, dada a sua natureza, pode acarretar uma litigiosidade acrescida. Segundo esse entendimento, contestado pelo recorrente, o legislador apenas pretendeu não sujeitar os juizes às regras gerais sobre custas nas acções em que intervenham, fundamentalmente, em virtude da sua actividade profissional. É apenas essa a ratio essendi da norma na interpretação impugnada.
Segundo tal interpretação, não se trata, pois, de um privilégio pessoal. Assim, a isenção em causa não seria concedida em qualquer acção em que o juiz interviesse, apenas o seria nas acções em que o juiz interviesse 'por via do exercício das suas funções'.
Para além do mais, nos presentes autos, o recorrente decidiu tão-só impugnar as eleições para os cargos de presidente e de vice-presidente do Tribunal Central Administrativo. Assim, se é verdade que tal pretensão é legítima por o recorrente ser juiz desse tribunal, não se trata, contudo, de uma acção em que o juiz tenha intervindo por via do exercício das suas funções, segundo a interpretação referida. Com efeito, para tal interpretação não existe conexão directa entre a acção interposta e o exercício da profissão de magistrado, uma vez que aquela não surge como decorrência de uma actuação profissional do juiz. Trata-se da mera efectivação judicial de um direito de participação activa na organização do tribunal e na composição dos respectivos cargos electivos, em função de uma decisão de consciência, enquanto profissional interessado no funcionamento da instituição.
Ora, não decorre da Constituição a exigência de qualquer privilégio nas condições de acesso à justiça em função do mero estatuto de Magistrado Judicial e da respectiva participação em actos eleitorais para a presidência dos tribunais. Consequentemente, não se verifica qualquer violação do disposto nos artigos 18º, nº 3, e 20º, nº 1, da Constituição. Na verdade, a interpretação acolhida pela decisão recorrida não limita o acesso aos tribunais nem qualquer direito, liberdade ou garantia.
III Decisão
12. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide: a. Não tomar conhecimento do objecto do recurso relativamente às normas dos artigos 123º, nº 2, alínea d), 124º, nº 1, alíneas a), b) e c), e 125º, nºs
1 e 2, do Código do Procedimento Administrativo; b. Não tomar conhecimento do objecto do recurso relativamente às normas dos artigos 16º, 18º, 37º, 38º e 99º, nº 1, alínea g), do Decreto-Lei nº 129/84, de
27 de Abril; c. Não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 116º, nº 1, do Decreto-Lei nº 129/84, de 27 de Abril, na redacção do Decreto-Lei nº 229/96, de
29 de Novembro; d. Não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 17º, nº 1, alínea g), da Lei nº 21/85, de 30 de Julho, na redacção da Lei nº 10/94, de 5 de Maio; e. Negar provimento ao recurso, confirmando, consequentemente, a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs. Lisboa, 14 de Julho de 1999 Maria Fernanda Palma Guilherme da Fonseca Paulo Mota Pinto Bravo Serra Luís Nunes de Almeida