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Processo n.º 395/13
2.ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
Relatório
Por sentença transitada em julgado o arguido A. foi condenado na pena única de 6 meses de prisão, a cumprir em 36 períodos de 36 horas cada.
O arguido veio requerer uma reavaliação extraordinária da pena em que foi condenado.
Por despacho da 1.ª instância foi indeferido o requerido.
O arguido interpôs recurso deste despacho para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão proferido em 6 de novembro de 2012, negou provimento ao recurso, mantendo o despacho recorrido.
O arguido recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, não tendo o recurso sido admitido por despacho do Desembargador Relator.
O arguido reclamou desta decisão para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, tendo o Vice-Presidente deste Tribunal indeferido a reclamação.
O arguido recorreu desta decisão e do Acórdão da Relação de Évora para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
“…não se conformando com o douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora de 23 de novembro de 2010 e com aquela douta decisão de indeferimento, vem interpor o presente Recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo (artigo 78º, n.º 4 da L.T.C), para o EGRÉGIO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ao abrigo do disposto no art. 70º, n.º 1, al. b) da L.T.C. - inconstitucionalidade suscitada durante o processo, mormente, em sede de Recurso anteriormente interposto, e formalmente rejeitado, para o Supremo Tribunal de Justiça do aludido douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora e, bem assim, em sede de Reclamação apresentada dessa mesma rejeição.
Desde logo, por entender ser de apreciar a Nulidade e Inconstitucionalidade do douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, por manifesta falta de fundamentação, em clara violação do preceituado nos arts. 374º, n.º 2 e 379º, n.º 1, als. a) e c) do C.P.Penal e art. 205º da Constituição da República Portuguesa.
Na verdade, e não obstante o ora Recorrente haver impugnado, nos termos devidos, a matéria de facto tida como provada, e, haver pugnado pela subsunção da sua conduta à figura do crime continuado, o douto Acórdão em crise limita-se a 'negar', sem mais, tais pretensões, descurando a devida análise às mesmas mas, acima de tudo, descurando o seu dever legal de fundamentação.
Donde, e ainda que com todo o devido e merecido respeito, conclui o ora Recorrente pela Inconstitucionalidade do douto acórdão recorrido, na medida em que, o mesmo não dá, por qualquer forma, cumprimento integral ao disposto nos arts. 205º, n.º 1 da C.R.P. e 374º, n.º 2 do C.P.Penal, porquanto, não faz uma exposição dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam aquela sua decisão, mormente, no que se refere aos meios de prova indicados pelo ora Recorrente e, ainda, do porquê de haver entendido por não verificada a figura do crime continuado na conduta do Recorrente.
Ademais, e sem conceder do exposto, vem, ainda, o presente recurso do facto de considerar o Recorrente que os arts. 400º, n.º 1, al. f) e 432º, n.º 1, al. f) do C.P.Penal foram interpretados de forma inconstitucional na decisão da reclamação apresentada, na medida em que, e conforme referido nessa reclamação, a interpretação dos mesmos no sentido da não admissibilidade do recurso interposto na parte respeitante a uma eventual Inconstitucionalidade do Acórdão objeto, sempre viola o direito do ora Reclamante ao recurso, direito esse constitucionalmente consagrada no art. 32º da Constituição da República Portuguesa.
Porquanto, por não estarmos perante uma qualquer Inconstitucionalidade já anteriormente julgada por este Egrégio Tribunal Constitucional, essa não admissão de recurso sempre poderá redundar numa recusa, por parte deste Egrégio Tribunal, em tomar conhecimento do seu recurso no que a tal matéria respeita, caso V. Exas. sejam de entender não haver tal Inconstitucionalidade sido suscitada, de forma formalmente válida, durante o processo, tendo-se colocando assim em 'xeque' o direito do Recorrente de vir perante este Egrégio Tribunal Constitucional discutir, via recurso próprio para o efeito, a constitucionalidade de um Acórdão condenatório e atentatório da sua liberdade pessoal e enquanto cidadão.
O Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça proferiu despacho de não admissão do recurso para o Tribunal Constitucional.
O arguido reclamou desta decisão nos seguintes termos:
“…1. Sempre com o devido e muito respeito, permite-se o Reclamante discordar com o entendimento explanado pelo Venerando Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, quando alude à inviabilidade de um qualquer julgamento sobre a inconstitucionalidade nos termos suscitados pelo ora Reclamante e, consequentemente, não admite o Recurso interposto para este Egrégio Tribunal.
2. Ora, salvo melhor opinião e com todo o devido respeito, entende o Recorrente que tal decisão se mostra indevidamente ajuizada, na medida em que, no que concerne ao segmento do requerimento de interposição do recurso onde se suscita a inconstitucionalidade de certas e determinadas normas, decide, desde logo, pela inviabilidade de um qualquer julgamento sobre as mesmas, porquanto refere que as normas invocadas não foram sequer critério e fundamento da decisão que indeferiu a Reclamação.
3. Ora, e na verdade, bem refere o Venerando Juiz Conselheiro que tais normas não foram 'consideradas' naquela douta Decisão, no entanto, sempre se diga que, a indicação das aludidas normas constantes dos referidos arts. 400, n.º 1, al. f) e 432º, n. º 1, al. f) do C.P.Penal foram, obviamente, fruto de manifesto lapso por parte do ora Reclamante, situação que, atendendo ao teor da Reclamação anteriormente dirigida àquele Egrégio Supremo Tribunal de Justiça, não poderia ter sido desconsiderada por aquele Venerando Juiz Conselheiro,
4. Sendo certo que, resultando manifestamente que uma tal indicação, porquanto a norma que havia sido invocada (e corretamente invocada) em sede de Reclamação havia sido a norma do art. 400, n. º 1, al. c) e, porque, a norma do art. 432º, n.º 1, al. f) nem sequer existe, sempre se entende, com todo o devido e merecido respeito, deveria o ora Reclamante ter sido convidado a esclarecer o teor do seu Requerimento de Interposição de Recurso para este Egrégio Tribunal Constitucional.
5. E, nessa sequência, sempre se entende que a decisão proferida, da qual agora se reclama, se mostra indevidamente ajuizada, nomeadamente na parte que decide pela inviabilidade de qualquer julgamento sobre a inconstitucionalidade das normas que estão em causa nos presentes, as quais facilmente se identificam como sendo as constantes dos arts. 400º, n.º 1, al. c) e 432º, n.º 1, al. b) do C. P. Penal.
6. Sendo certo que, ainda que por mero lapso a indicação das normas em 'crise' haja sido indevidamente efetuada, a verdade é que, sempre o ora Reclamante cumpriu com o seu ónus legal,
7. Tendo especificado, devidamente, qual a questão da inconstitucionalidade que pretendia ver apreciada, naturalmente no que às normas constantes dos aludidos arts. 400º, n.º 1, al. c) e 432º, n.º 1, al. b) do C.P.Penal se refere,
8. E, bem assim, tendo suscitado uma tal questão de inconstitucionalidade no decurso do processo, tendo apresentado a dita Reclamação para o ST], do Despacho que não admitiu o recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora,
9. Na qual especificamente referiu que ao não ser admitido o recurso então interposto, e ao interpretar-se o preceituado nos identificados arts. 400º, n.º 1, al. c) e 432º, n.º 1, al. b) do C.P.Penal, por forma a que um tal recurso não fosse admissível, sempre estaríamos perante uma clara e manifesta violação do direito constitucional do Recorrente ao recurso.
10. Manifestando-se, por isso, uma vez mais, e sempre com o devido e merecido respeito, discordância com o decidido, devendo conhecer-se do objeto do recurso.
11. Ao demais, e a acrescer a tudo o exposto, sempre entende o Recorrente que, ainda que, efetivamente, não tivesse cumprido integralmente com a sua obrigação legal de indicar concretamente e corretamente qual, ou quais, a(s) interpretação(ões) normativa(s) daqueles preceitos legais que considerar como inconstitucionais,
12. Sempre aqui se impunha fosse proferido um despacho de aperfeiçoamento, de molde a permitir que o Recorrente suprisse as deficiências do seu requerimento de interposição de recurso.
13. Assim não tendo acontecido, vê o ora Reclamante a sua posição processual prejudicada, coartando-lhe a possibilidade de ser apreciada a questão das inconstitucionalidades suscitadas,
14. Afrontando, além do mais, o disposto no art. 75º- A, nºs 5 e 6 da L.T.C. que assegura a possibilidade de um qualquer Recorrente colmatar eventuais deficiências do seu requerimento antes de ver precludido o seu direito de conhecimento do recurso.”
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da reclamação ser indeferida.
Fundamentação
No requerimento de interposição de recurso o Recorrente havia suscitado duas questões de constitucionalidade.
Ambas não foram admitidas pelo despacho reclamado.
O Recorrente apenas reclama da não admissão do pedido de declaração de inconstitucionalidade da interpretação dos artigos 400.º, n.º 1, f), e 432.º, n.º 1, f), do Código de Processo Penal, no sentido da não admissibilidade do recurso interposto de um acórdão na parte respeitante a uma eventual inconstitucionalidade do Acórdão da Relação, pelo que apenas cumpre verificar se estão reunidos os requisitos essenciais ao conhecimento do recurso nessa parte.
O despacho reclamado não admitiu o recurso com o fundamento em que a decisão recorrida não havia aplicado os preceitos legais aos quais o Recorrente imputava a questionada “interpretação”.
O Recorrente na reclamação alega que se registou um lapso de escrita na indicação das alíneas dos preceitos em causa, procedendo à retificação desse lapso.
Mesmo aceitando-se esta retificação, verifica-se que a questão de constitucionalidade é colocada relativamente à decisão de não admissão do recurso e não a qualquer critério normativo que fundamente essa decisão.
Ora, no sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Constitucional cinge-se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformidade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já não das questões de inconstitucionalidade imputadas diretamente a decisões judiciais, em si mesmas consideradas.
Por esta razão não pode o recurso interposto ser conhecido, pelo que se indefere a reclamação apresentada.
Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada por A..
Custas pelo Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os elementos referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (artigo 7.º do mesmo diploma).
Lisboa, 15 de Julho de 2013. – João Cura Mariano – Ana Guerra Martins – Joaquim de Sousa Ribeiro.