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Proc. nº 274/99
3ª Secção Rel. Cons. Tavares da Costa
Acordam, na 3ª Secção, do Tribunal Constitucional
1. - J..., Procurador da República no Círculo Judicial de Abrantes, recorreu para o Pleno da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo
(STA) do acórdão da 1ª Secção, 2ª Subsecção, de 9 de Dezembro de 1997, que rejeitou, por intempestividade, o recurso por si interposto do acórdão do Conselho Superior do Ministério Público, de 2 de Julho de 1997, nos termos do qual não é aplicável à pena disciplinar de multa que lhe foi aplicada por acórdão do mesmo Conselho, o perdão previsto no artigo 8º, nº 1, alínea c), da Lei nº 15/94, de 11 de Maio.
Nas alegações apresentadas critica-se, nomeadamente, a interpretação que tem por 'excessivamente literal e restritiva' do artigo 28º do Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho (Lei de Processo nos Tribunais Administrativos, LPTA), não respeitando o espírito que dimana do mesmo diploma, tanto do proémio como logo do seu artigo 1º, deste modo decorrendo de tal interpretação e subsequente aplicação 'uma situação que poderá eventualmente suscitar questões de constitucionalidade ou legalidade afloradas no artigo 280º da Constituição da República Portuguesa'.
O Pleno, por acórdão de 9 de Dezembro de 1998, negou provimento ao recurso e confirmou o acórdão da Secção.
No tocante à transcrita alegação, não deixou de ponderar ser manifesto tratar-se de 'alegação completamente inócua, na medida em que o recorrente não concretiza, como lhe competia, em que se traduziria a violação daquele dispositivo constitucional, não afirma essa violação concreta, limitando-se a colocar essa possibilidade'; no respeitante ao fundo, confirmou-se a natureza substantiva do prazo previsto naquele artigo 28º, como tal não sujeito às regras dos artigos 144º e 145º do Código de Processo Civil.
2. - Inconformado, pretendeu o interessado interpor recurso do assim decidido para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
O Conselheiro relator, por despacho de 5 de Março
último, não admitiu esse recurso, dado que o aresto impugnado não aplicou qualquer norma cuja inconstitucionalidade houvesse sido suscitada pelo recorrente, que se limitou a aludir, sem concretizar, a uma questão de constitucionalidade.
3. - Deste despacho, o magistrado recorrente veio reclamar, invocando para o efeito o disposto nos artigos 76º, nº 4, e 77º, nº 1, da Lei nº
28/82, defendendo que, 'desde logo e ao longo do processo', foi suscitada a questão da constitucionalidade da norma 'cuja aplicação estava a ser feita por virtude da interpretação dada' - a do artigo 28º da LPTA - pelo que, assim, 'não estará a ser respeitada aquela garantia a que alude o artigo 268º, nº 4, da Constituição da República'.
4. - Mantida a anterior posição do Conselheiro relator, por despacho de 9 de Abril último, já neste Tribunal Constitucional foram os autos ao visto do Ministério Público que assim se pronunciou:
'A presente reclamação é manifestamente infundada, já que o reclamante não suscitou durante o processo - isto é, antes da prolação da decisão que pretendia impugnar - qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, idónea para suportar o recurso de fiscalização concreta que interpôs: na verdade, a alegação que consta da conclusão 4ª, integrada na alegação que produziu perante o STA, não traduz suscitação adequada de uma questão de inconstitucionalidade de normas.'
Dispensaram-se os restantes vistos, dada a simplicidade da questão (nº 3 do artigo 77º da Lei nº 28/82).
5. - Constitui objecto do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, a questão de constitucionalidade de norma ou dimensão normativa ou, ainda, de uma sua dada interpretação, constituindo seus pressupostos de indispensável verificação, entre outros, o da oportuna suscitação dessa questão - durante o processo, no sentido funcional que a jurisprudência deste Tribunal vem dando a esta locução, reiterada e uniformemente - e o da efectiva aplicação pela decisão recorrida dessa norma, em termos que constituam ratio decidendi.
6. - Ora, no concreto caso, e como observa neste Tribunal o Procurador-Geral adjunto, contrariamente ao que pode depreender-se do discurso do reclamante, este não suscitou - ou não suscitou adequadamente - qualquer questão de constitucionalidade, limitando-se a defender a ilegalidade da interpretação dada ao artigo 28º da LPTA, com desrespeito ao estatuído no artigo
144º do Código de Processo Civil, situação 'que poderá eventualmente suscitar inconstitucionalidade ou ilegalidade afloradas no artigo 268º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa', como se lê na conclusão 4ª a que se refere, no seu visto, aquele magistrado (curiosamente, a inicial convocação do artigo 280º foi substituída pela desta última norma).
7. - Assim sendo é, na verdade, manifesta a falta de fundamento da reclamação.
Com efeito, independentemente de, desde logo, se poder dizer que mais do que a adequação constitucional do conteúdo normativo, estará em causa a impugnação do critério decisório cuja reapreciação, no fundo, é o que se pretende, o certo é que a questão equacionada não reúne adequada formulação, já que o recorrente e reclamante se tem limitado - não interessando abordar, sequer, a questão da oportunidade - a argumentar que a interpretação normativa alegadamente aplicada 'pode eventualmente suscitar uma questão de inconstitucionalidade' - o que, além de inócuo, como diz o Supremo, não tem a virtualidade de equacionar essa questão clara e efectivamente, de modo a ser necessariamente conhecida pelo tribunal a quo. Não tendo sido suscitado, autonomamente, de forma inequívoca, reportada a uma concreta aplicação da norma, manifestamente o recurso não pode ser admitido, tão pouco alterando esse destino o eventual convite, feito à sombra do nº 2 do artigo 75º-A da Lei nº 28/82, dada a irrecuperabilidade, no caso, dos pressupostos em falta de admissibilidade do recurso.
8. - Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas a cargo do reclamante, com taxa de justiça que se fixa em 15 unidades de conta. Lisboa, 15 de Junho de 1999 Alberto Tavares da Costa Maria dos Prazeres Beleza Luís Nunes de Almeida