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Processo n.º 38/2013
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A. e mulher, B., intentaram contra C. e mulher, D., ação de condenação, sob a forma de processo ordinário, pedindo fosse revogado o contrato de doação que celebraram com os réus, por ingratidão destes, com a consequente restituição aos autores da propriedade dos bens doados, tendo sido proferida sentença que, além do mais, julgou a ação procedente, por provada, revogando a doação em causa e condenando os réus à restituição dos bens doados, como peticionado.
Os réus, inconformados, apelaram para o Tribunal da Relação do Porto e, tendo o recurso improcedido, requereram revista ao Supremo Tribunal de Justiça, que, contudo, lhe negou provimento, confirmando, em consequência, a decisão recorrida.
Os réus, notificados desta última decisão, requereram, então, o julgamento alargado da revista, ao abrigo do n.º 2 do artigo 732.º-A do Código de Processo Civil (CPC), tendo o relator proferido despacho que não o admitiu, nos termos do n.º 1 do citado normativo legal, na redação anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, uma vez que já havia sido proferido acórdão, o que a conferência, na competente reclamação, veio a confirmar por Acórdão de 15 de março de 2012.
Os réus, não se resignando com a rejeição do recurso ampliado de revista, recorreram para o Tribunal Constitucional da decisão da conferência que assim decidiu, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alíneas b), c) e) e f), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), a fim de verem apreciada a inconstitucionalidade do artigo 732.º-A do CPC, na referida redação, quando interpretado «no sentido de que só o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça pode pedir a revista ampliada» e, ainda, no sentido de que «as partes devem pedir a revista ampliada, antes de saberem o projeto de decisão do STJ, quando declaram nas suas alegações que têm a intenção de recorrer à revista ampliada, a manter-se a solução apontada pelo acórdão recorrido», por violação do direito de acesso ao direito e dos artigos 20.º, nºs. 1 a 5, e 202.º da Constituição da República Portuguesa.
O recurso de constitucionalidade foi, contudo, rejeitado, por despacho do relator, por não verificação dos respetivos pressupostos processuais, tendo os recorrentes reclamado do aludido despacho para a conferência, arguindo a sua nulidade, por falta de fundamentação, e pedindo que sobre a questão da admissibilidade do recurso de constitucionalidade recaísse acórdão, tendo a conferência indeferido a arguição de nulidade e não tomado conhecimento do (restante) objeto da reclamação, atento o disposto no artigo 76.º, nºs. 1 e 4, da LTC.
Os recorrentes vieram, então, reclamar da decisão de rejeição do recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 77.º da LTC, tendo o Supremo Tribunal de Justiça admitido liminarmente o respetivo incidente.
Remetidos os autos a este Tribunal Constitucional, foi pelo Ministério Público emitido parecer no sentido do indeferimento da reclamação, porquanto os reclamantes, não estando dispensados do correspondente ónus, não suscitaram perante o Tribunal recorrido qualquer questão de inconstitucionalidade normativa atinente ao preceito do artigo 732.º-A do CPC, o que inviabiliza a admissão do recurso previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Os reclamantes recorreram para o Tribunal Constitucional ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alíneas b), c), e) e f), da LTC, pretendendo, por esse meio, ver apreciada a inconstitucionalidade do artigo 732.º-A do CPC, na redação anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, em interpretação alegadamente adotada pelo Tribunal recorrido na decisão que rejeitou o recurso ampliado da revista por si requerido.
Porém, estando em causa a alegada aplicação, pelo Tribunal recorrido, de norma que os reclamantes reputam inconstitucional, é evidente que não é de admitir o recurso, nas modalidades previstas nas invocadas alíneas c), e) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, que pressupõem, ou a recusa de aplicação, pelo tribunal recorrido, de norma constante de ato legislativo, com fundamento na sua ilegalidade, por violação de lei com valor reforçado ou do estatuto de uma região autónoma, ou a aplicação de norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer desses fundamentos, não se verificando, no caso, em qualquer dessas vertentes, um problema de aplicação, ou recusa de aplicação, de norma que a parte, ou o Tribunal, consideram por tais razões ilegal.
Mas, e como ajuizado pelo Tribunal recorrido, também não é de admitir, por não verificação dos respetivos pressupostos processuais, o recurso previsto no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC.
Com efeito, se é certo que o citado normativo legal admite recurso para o Tribunal Constitucional das decisões que apliquem norma inconstitucional, é necessário, para esse efeito, que a parte que dela recorre tenha suscitado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida essa mesma questão de inconstitucionalidade, alegando, no tempo oportuno e pela forma processualmente correta, que essa norma, por violar os parâmetros constitucionais a que deve obediência, não pode ser aplicada à questão, de direito adjetivo ou substantivo, a decidir (artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC).
Ora, analisado o teor da reclamação para a conferência deduzida pelos recorrentes contra o despacho do relator que não admitiu o recurso ampliado de revista (fls. 765), que veio a ser apreciada pelo acórdão de que foi interposto o presente recurso de constitucionalidade, verifica-se que nela não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa atinente à norma, ora sindicada, do artigo 732.º-A do CPC, pelo que, não se verificando nenhuma razão excecional que os pudesse dispensar do correspondente ónus, é de confirmar, também nessa parte, a decisão de rejeição do recurso.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 27 de fevereiro de 2013. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral.