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Processo nº 633/2006.
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra.
1. Em 6 de Julho de 2006 o relator proferiu a
seguinte decisão: –
“1. Inconformado com o acórdão proferido em 21 de Fevereiro de 2003
pelo tribunal colectivo da 9ª Vara Criminal de Lisboa que – pela prática de
factos que foram subsumidos ao cometimento de um crime de tráfico de
estupefacientes, previsto e punível pelo nº 1 do artº 21º do Decreto-Lei nº
15/93, de 22 de Janeiro, e por um crime de detenção de arma proibida, previsto e
punível pelo nº 3 do artº 275º do Código Penal – o condenou na pena única de
sete anos de prisão, recorreu o arguido A. para o Tribunal da Relação de Lisboa,
o qual, por acórdão de 9 de Julho de 2003, alterou a pena parcelar atinente ao
primeiro ilícito e a pena única, fixando esta em seis anos de prisão.
De novo irresignado, recorreu o arguido para o Supremo Tribunal de
Justiça que, por acórdão de 4 de Fevereiro de 2004, determinou a remessa dos
autos à segunda instância para aí se providenciar pela sanação do vício de falta
de fundamentação parcial.
Na sequência do assim decidido, foi, em 31 de Maio de 2004, lavrado,
acórdão na 9ª Vara Criminal de Lisboa, que impôs ao arguido penas parcelares e
única idênticas às que constavam do acórdão de 21 de Fevereiro de 2003.
Do aresto de 31 de Maio de2004 recorreu para o Tribunal da Relação de
Lisboa, o qual, por acórdão de 28 de Setembro de 2004, determinou a repetição do
julgamento levado a efeito na 1ª instância.
Tendo o tribunal colectivo da 9ª Vara Criminal de Lisboa, por acórdão
de 3 de Junho de 2005, absolvido o arguido do crime de detenção de arma proibida
e condenado o mesmo pela prática do ilícito de tráfico de estupefacientes na
pena de cinco anos e nove meses de prisão, recorreu ele para o Tribunal da
Relação de Lisboa, tendo, na motivação adrede apresentada, concluído, inter alia
e para o que ora releva: –
‘(…)
4. Além disso, ao tribunal a quo também estava vedado estribar-se, unicamente,
nas regras da experiência comum, conjugadas com a circunstância de se terem
demonstrado dois actos concretos de tráfico, confessados pelo arguido, para
considerar provado que a substância estupefaciente que lhe foi apreendida se
destinaria a venda posterior.
5. Pois que, em última análise, isso apenas significa que o tribunal, de entre
as várias hipóteses que se lhe deparavam e à míngua de provas, optou por
considerar provada a hipótese que lhe pareceu mais provável.
6. O que viola, frontalmente, o princípio in dubio pro reo, consagrado no art.º
32.º n.º 2 da CRP.
(…)
14. Pelo que a única decisão lógica que poderia decorrer de tal fundamentação –
e do princípio in dubio pro reo – era de considerar não apurado o destino que o
arguido visava dar ao estupefaciente apreendido.
(…)
22. Ao decidir de forma diversa, o Tribunal a quo violou, no entender do
recorrente, o disposto nos art.ºs 25.º al. a) do DL 15/93, e 22 de Janeiro, 61.º
n.º 1 c), 343.º n.º 1 e 345.º n.º 1, todos do CPP, 71.º do Cód. Penal e 32.º n.º
2 da CRP
(…)’
Tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 8 de Fevereiro
de 2006, concedido parcial provimento ao recurso, impondo ao arguido a pena de
cinco anos de prisão, recorreu ele para o Supremo Tribunal de Justiça,
concluindo a sua motivação do seguinte jeito, também para o que ora interessa: –
‘1. Da conjugação do texto do acórdão condenatório proferido nos autos com as
regras da experiência comum ressalta que ao tribunal de 1.ª instância,
necessariamente, se deveria ter colocado uma dúvida razoável quanto à prova de
que o arguido destinava à venda a heroína que lhe foi apreendida.
2. Por tal motivo, impunha-se àquela instância que tivesse optado por considerar
não provada a referida factualidade.
3. Por assim o impor o princípio constitucional in dubio pro reo, consagrado no
art.º 32.º n.º 2 da nossa Lei Fundamental.
4. A interpretação que o tribunal recorrido fez dos comandos legais definidores
dos poderes de apreciação da prova por parte do julgador, nomeadamente do art.º
127.º do CPP, é violadora do citado princípio constitucional.
5. Pois que o recurso a presunções judiciais ou naturais, no exercício dos
referidos poderes, conflitua flagrantemente com o citado princípio
constitucional in dubio pro reo.
6. Deve, por isso, ser revogado o acórdão recorrido e ordenada a sua
substituição por outro que, à luz do citado princípio constitucional, elimine
dos factos provados o aludido segmento da matéria de facto dada por assente pela
1.ª instância.
(…)
10. Ao decidir como decidiu, violou o tribunal recorrido o disposto nos art.ºs
61.º n.º 1 c). 127.º, 343.º n.º 1 e 345.º n.º 1, todos do CPP, e 25.º al. a) do
DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro’.
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 1 de Junho de 2006,
rejeitou o recurso por manifesta improcedência.
Desse aresto, no que ao caso tem pertinência, escreveu-se, a dado
passo: –
‘(…)
Repetidamente vem este Supremo Tribunal de Justiça decidindo o seguinte:
«Pretendendo os interessados solicitar o reexame da matéria de facto fixada em
1.ª instância por decisão final de tribunal colectivo, terão que o fazer
directamente para a Relação e nunca per saltum para o Supremo, uma vez que este
só julga de direito. É que, tendo os recorrentes ao seu dispor o Tribunal da
Relação para discutir a decisão de facto do tribunal colectivo e tendo aquele
tribunal mantido tal decisão, vedado lhe está pedir ao Supremo Tribunal uma
reapreciação da decisão de facto tomada pelo Tribunal da Relação e, muito menos,
directamente do acórdão sobre os factos do tribunal colectivo de 1.ª instância»
«A competência das relações, quanto ao conhecimento de facto, esgota os poderes
de cognição dos tribunais sobre tal matéria, não podendo pretender-se colmatar o
eventual mau uso do poder de fazer actuar aquela competência, reeditando-se no
Supremo Tribunal de Justiça pretensões pertinentes à decisão de facto que lhe
são estranhas, pois se hão-de haver como precludidas todas as razões quanto a
tal decisão invocadas perante a Relação, bem como as que o poderiam ter sido»
…….
Ora, o reexame/revista (pelo STJ) exige/subentende a prévia definição (pelas
instâncias) dos factos provados (art. 729.1 do CPC).
E, no caso, a Relação – avaliando a regularidade do processo de formação de
convicção do tribunal colectivo a respeito dos factos (re) impugnados no recurso
– manteve-os, em definitivo, no rol dos «factos provados».
A revista alargada ínsita no art. 410.2 e 3 do CPP pressupunha (e era essa a
filosofia original, quanto a recursos, do Código de Processo Penal de 1987) um
único grau de recurso (do júri e do tribunal colectivo para o STJ e do tribunal
singular para a Relação) e destinava-se a suavizar, quando a lei restringisse a
cognição do tribunal de recurso a matéria de direito (o recurso dos acórdãos
finais do júri ou do colectivo; e o recurso, havendo renúncia ao recurso em
matéria de facto, das sentenças do próprio tribunal singular), a não
impugnabilidade (directa) da matéria de facto (ou dos aspectos de direito
instrumentais desta, designadamente «a inobservância de requisito cominado sob
pena de nulidade que não devesse considerar-se sanada»).
Essa revista alargada (do STJ) deixou, porém, de fazer sentido – em caso de
prévio recurso para a Relação quando, a partir da reforma processual de 1998
(Lei 59/98), os acórdãos finais do tribunal colectivo passaram a ser
susceptíveis de impugnação, «de facto e de direito», perante a Relação (art.ºs
427.º e 428.1).
Actualmente, com efeito, quem pretenda impugnar um acórdão final do tribunal
colectivo, de duas uma: se visar exclusivamente o reexame da matéria de direito
(art. 432.d), dirige o recurso directamente ao Supremo Tribunal de Justiça e, se
o não visar, dirige-o, «de facto e de direito», à Relação, caso em que da
decisão desta, se não for «irrecorrível nos termos do art. 400.°», poderá depois
recorrer para o STJ (art. 432.b).
Só que, nesta hipótese, o recurso – agora, puramente, de revista – terá que
visar exclusivamente o reexame da decisão recorrida (a da Relação) em matéria de
direito (com exclusão, por isso, dos eventuais «erro(s)» – das instâncias «na
apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa».
……
O recurso de revista terá assim que circunscrever-se a questões «exclusivamente»
de direito. Pois que insiste-se – as questões «de facto» deverão considerar-se
definitivamente decididas pela Relação.
Vêm estes comentários a propósito por ter o recorrente invocado, mais uma vez,
que o tribunal violou o princípio ‘in dubio pro reo’ na apreciação da prova,
apreciação esta que em regra é livre, nos termos do art.º 127.º do CPP, pois
essa é uma questão que se prende com a fixação da matéria de facto e que ficou
definitivamente decidida no Tribunal da Relação. É insindicável no recurso de
revista a eventual violação das regras de presunção natural na fixação dos
factos, pois tal equivaleria a conhecer das provas e do seu conteúdo, o que,
obviamente, não é matéria exclusivamente de direito.
De resto, o Tribunal da Relação não mostrou ter dúvidas na fixação da matéria de
facto e, por isso, não se coloca a questão de direito associada àquele
princípio, que é a da decisão tirada contra o arguido apesar dos factos que
estão fixados patentearem a dúvida (por exemplo, não ficou provada a quantidade
de droga que se destinava à venda, mas decide-se que não era diminuta).
Assim, os factos provados consideram-se definitivamente adquiridos.
(…)’
Do acórdão de que a parte relevante para a vertente situação se
encontra extractada, interpôs o arguido recurso para o Tribunal Constitucional
ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, o
que fez mediante requerimento em que fez escrever: –
‘(…)
No recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa, alegou o recorrente,
em síntese, que o tribunal de primeira instância, para concluir que o
estupefaciente encontrado na sua casa se destinava à venda, estribou-se,
unicamente, nas regras da experiência comum, conjugadas com a circunstância de
se terem provados dois actos concretos de venda, confessados pelo arguido.
Concluiu-se, por isso, que aquele tribunal não dispunha de elementos probatórios
suficientes para considerar provado, como considerou, que o arguido destinava à
venda o estupefaciente que lhe foi apreendido.
E, consequentemente, sustentou-se que àquela instância estava vedado proceder
como procedeu, sob pena de violar o princípio constitucional in dubio pro reo,
vertido no art.º 32.º n.º 2 da Lei Fundamental.
Apesar de todo o alegado, o Tribunal da Relação de Lisboa veio negar razão ao
recorrente, sustentando, em síntese, que:
a 1.ª instância decidiu a matéria de facto como decidiu pela razão simples de
que é o comércio ou o consumo o destino ‘normal’ da heroína;
ao julgador é cometida a obrigação de se munir com os dados de experiência
corrente;
esse processo mental desenvolve-se pelo recurso às presunções judiciais, sem as
quais, não raro, o descritivo sentencial ficaria tão lacunoso quanto
incompreensível e inútil.
Tal entendimento, porém e segundo o recorrente, consagra uma interpretação
inaceitável e inconstitucional dos poderes de apreciação da prova por parte do
julgador, nomeadamente do disposto no art.º 127.º do CPP, por violação do
mencionado princípio constitucional in dubio pro reo.
Por tal motivo, impetrou o recorrente a esse Venerando Tribunal a revogação do
aludido acórdão e que fosse ordenada a sua substituição por outro que, à luz do
citado princípio constitucional, eliminasse dos factos provados o aludido
segmento da matéria dada como assente pela 1.ª instância.
Contudo, o Supremo Tribunal de Justiça, através do acórdão recorrido, veio a
considerar ser ‘... insindicável no recurso de revista a eventual violação das
regras de presunção natural na fixação dos factos, pois tal equivaleria a
conhecer das provas e do seu conteúdo, o que, obviamente, não é matéria
exclusivamente de direito’.
Ora, pese embora se discorde, salvo o devido respeito, de tal entendimento, a
verdade é que, ao decidir como decidiu, acabou esse Tribunal por confirmar a
decisão que o TRL havia tomado sobre tal questão.
Com o que o recorrente se não conforma.
Pois que, como atrás se referiu, entende o recorrente que não podiam as
instâncias, face à ausência de provas, assumidamente, decidir a matéria de facto
com recurso a presunções judiciais que, em bom rigor, mais não são do que a
consagração da arbitrariedade das decisões judiciais, sempre que inexistem
provas concretas dos factos imputados ao agente.
Pelo que se continua a entender que a interpretação do citado art.º 127.º do
CPP, no sentido que lhe foi dado pelas instâncias, é manifestamente violador do
citado princípio constitucional.
Inconstitucionalidade que se pretende sindicar através do presente recurso.’
O recurso interposto por via do requerimento acima transcrito foi
admitido por despacho prolatado em 28 de Junho de 2006 pelo Conselheiro Relator
do Supremo Tribunal de Justiça.
2. Porque tal despacho não vincula este Tribunal (cfr. nº 3 do artº
76º da Lei nº 28/82) e porque se entende que o recurso não deveria ter sido
admitido, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a presente
decisão, por intermédio da qual se não toma conhecimento do objecto da vertente
impugnação.
Na verdade, é por demais óbvio que o mais Alto Tribunal da ordem dos
tribunais judiciais, no aresto intentado colocar sob a censura deste órgão de
fiscalização concentrada da constitucionalidade, não aplicou a norma (resultante
de um processo interpretativo incidente sobre o preceito ínsito no artº 127º do
diploma adjectivo criminal) cuja apreciação se deseja ser levada a efeito pelo
recurso que determinou a remessa dos autos ao Tribunal Constitucional.
Antes, e como bem deflui da transcrição acima efectuada da pertinente
parte de tal acórdão, formulou um juízo de harmonia com o qual – atentos os
poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, nos recursos penais em que
houve recurso de facto e de direito da decisão proferida pela 1ª instância para
o tribunal da relação – lhe era vedado pronunciar-se sobre a matéria fáctica
dada por assente pelo tribunal de 2ª instância, a este, e unicamente, cabendo
avaliar a regularidade e legalidade do processo de convicção do tribunal de 1ª
instância referente a tal matéria.
Neste contexto, torna-se acentuadamente claro que o aresto pretendido
pôr em crise, na parte que agora interessa, tão somente convocou, para a decisão
a ela referente, os comandos adjectivos que regulam os poderes cognitivos do
tribunal «de revista» quanto à matéria de facto, não discorrendo minimamente (e
logo, não fazendo aplicação, directa ou indirecta, explícita ou implícita) de
qualquer normativo extraído do artº 127º do Código de Processo Penal.
Em face do exposto, de concluir é que, no acórdão sub specie, não foi
aplicada a norma querida submeter ao veredicto deste Tribunal, motivo pelo qual
falece, neste particular o pressuposto do recurso previsto na alínea b) do nº 1
do falado artº 70º da Lei nº 28/82, justamente o que consiste na aplicação, na
decisão recorrida, da norma sobre a qual se deseja a pronúncia, do ponto de
vista da sua compatibilidade com o Diploma Básico, por este órgão jurisdicional.
Termos em que se não toma conhecimento do objecto do recurso,
condenando-se o impugnante nas custas processuais, fixando-se a taxa de justiça
em seis unidades de conta, sem prejuízo de, não havendo pagamento voluntário, se
atentar no benefício de apoio judiciário de que o mesmo desfruta.”
Da decisão supra transcrita veio o arguido
reclamar nos termos do nº 3 do artº 78º-A da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, o
que fez mediante requerimento com o seguinte teor: –
“1. Por decisão de fls. …, foi decidido não tomar conhecimento do objecto do
recurso oportunamente interposto, invocando-se, para tanto, o disposto no n.º 1
do art.º 78.º‑A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.
2. Com efeito, na decisão de que ora se reclama, invocou-se, em síntese, que o
STJ não teria aplicado a norma do art.º 127.º do CPP, cuja conformidade,
pretensamente, o recorrente desejaria ver sindicada pelo Tribunal
Constitucional.
E, bem assim, que aquele Alto Tribunal apenas se pronunciou sobre os comandos
adjectivos que regulam os poderes cognitivos do tribunal «de revista» quanto à
matéria de facto, não discorrendo minimamente (e logo, não fazendo aplicação,
directa ou indirecta, explícita ou implícita) de qualquer normativo extraído do
art.º 127.º do Código de Processo Penal.
Pelo que, necessariamente, se teria de concluir que, no acórdão proferido pelo
STJ, não foi aplicada a norma querida submeter ao veredicto deste Tribunal,
motivo pelo qual não estaria verificado o pressuposto legal do recurso previsto
na alínea b) do n.º 1 do art.º 70.º da Lei n.º 28/82.
3. Salvo o devido respeito, discorda o recorrente de tal decisão, pelos motivos
que seguidamente se indicam.
4. Na verdade, entende o ora reclamante que o STJ, ao decidir que não se podia
pronunciar sobre a questão que lhe foi colocada pelo recorrente, implicitamente
(pelo menos), pronunciou-se sobre a questão a decidir.
5. Assim sendo, necessariamente, se terá de concluir que o STJ decidiu
definitivamente a questão suscitada pelo recorrente.
6. Pelo que, só a partir da prolação de tal decisão, podia o ora reclamante
colocar a questão de constitucionalidade, já por si suscitada perante a 1.ª
instância, ao Tribunal Constitucional.
7. Refira-se, de resto, que o reclamante não possui o dom da adivinhação e é
imperativo legal que sejam esgotados os recursos ordinários para que o mesmo
possa colocar a questão de constitucionalidade perante esse tribunal.
8. Ora, ao interpor recurso para o STJ, o reclamante desconhecia que tal
instância iria manter a decisão do TRL, pelas razões constantes do acórdão
recorrido.
9. Pelo que sempre o recorrente estaria em tempo para colocar perante esse
tribunal a questão de constitucionalidade por si oportunamente suscitada - cfr.,
neste sentido, o art.º 70.º n.º 6 e 75.º n.º 2, ambos da citada Lei n.º 28/82.
10. Assim, entende o reclamante que, a manter-se o decidido, sempre lhe
assistirá o direito de interpor recurso para esse tribunal do acórdão do TRL de
8 de Fevereiro de 2006, para apreciação da mesma questão de constitucionalidade.
11. O que, salvo melhor opinião, constitui para o reclamante manifesto desvio ao
princípio da economia processual que deve reger toda a actividade judicial.
12. Em conclusão, entende-se que o STJ se pronunciou, ainda que implicitamente,
sobre o thema decidendum, tendo entendido sancionar afirmativamente a decisão do
TRL.
13. Caso não se perfilhe tal entendimento, sempre o recurso interposto pelo
reclamante para o Tribunal Constitucional teria cabimento por referência ao
citado acórdão do TRL, uma vez que ainda se mostra tempestiva a sua
interposição.
14. Pelo que, sob pena de ser postergado o princípio da economia processual,
sempre o presente recurso deverá ser admitido e apreciado.”
Ouvido sobre a reclamação, o Ex.mo
Representante do Ministério Público pronunciou-se nos seguintes termos: –
1 - A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2 - Desde logo – e como é evidente – a decisão que o recorrente quis impugnar é
obviamente o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, pelo que carece
de sentido pretender agora convolar de tal recurso para outro, reportado ao
acórdão anteriormente proferido nos autos pela Relação – e obviamente
‘consumido’ pela decisão final do pleito pelo Supremo Tribunal de Justiça.
3 - Em segundo lugar, não ocorre manifestamente qualquer pronúncia ‘implícita’
do Supremo Tribunal de Justiça sobre a questão de constitucionalidade
equacionada quanto ao artigo 127° do Código de Processo Penal limitando-se o
Supremo, como seria, aliás, normalmente previsível, a lembrar que lhe não
compete sindicar a livre valoração da prova pelas instâncias, por tal envolver
‘questões de facto’, naturalmente subtraídos aos seus poderes cognitivos.
Cumpre decidir.
2. É, a todos os títulos, improcedente a
vertente reclamação.
Efectivamente, como se assinalou na decisão sub
iudico, o aresto prolatado no Supremo Tribunal de Justiça não aplicou o
normativo cuja compatibilidade com a Lei Fundamental o ora reclamante pretendia
se efectuada por este órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade,
e isso, justamente, porque, atentos os seus poderes cognitivos, devidamente
prescritos na lei, lhe era vedado entrar na discussão da matéria de facto, a
qual tinha sido objecto de impugnação perante o tribunal da 2ª instância.
A manutenção do decidido pelo Tribunal da
Relação de Lisboa, como bem se extrai do acórdão de 1 de Junho de 2006,
fundou-se na circunstância de, tendo o Supremo Tribunal de Justiça de dar por
assente a matéria fáctica alcançada por aquele Tribunal, não ser, na óptica
deste Alto Tribunal, de censurar juridicamente a decisão do acórdão da 2ª
instância.
Não houve, assim, de todo, qualquer pronúncia
implícita, por parte do mais elevado Tribunal da ordem dos tribunais judiciais,
referentemente ao artº 127º do Código de Processo Penal.
Por outro lado, tendo em atenção que o
requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional
inequivocamente se reportava ao acórdão lavrado no Supremo Tribunal de Justiça,
é por demais óbvio que não poderia o mesmo vir a ser «convolado» por forma a
querer dizer respeito ao aresto tirado no Tribunal da Relação de Lisboa que,
aliás, quanto à sua decisão então em recurso – e nos termos em que foram
figurados por aquele Supremo – foi «consumido» pelo acórdão emitido por este
mesmo Supremo. E, de todo o modo, mesmo na perspectiva seguida pelo reclamante,
não se deixará de dizer que nem sequer o que foi escrito na motivação do recurso
para aquele último dos indicados tribunais e que, na decisão agora reclamada, se
encontra extractado, poderia ser considerado a suscitação de uma questão de
inconstitucionalidade normativa, já que a violação do nº 2 do artº 32º do
Diploma Básico estava direccionada ao acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
(cfr. transcrita «conclusão» 22) e não a qualquer normativo ínsito no
ordenamento ordinário.
Em face do que se deixa dito, indefere-se a
reclamação, condenando-se o impugnante nas custas processuais, fixando-se em
vinte unidades de conta a taxa de justiça, sem prejuízo de, não havendo
pagamento voluntário, se atentar no benefício de apoio judiciário de que ele
desfruta.
Lisboa, 20 de Julho de 2006
Bravo Serra
Gil Galvão
Artur Maurício