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Processo nº 462/06
1ª Secção
Relatora: Conselheiro Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, em que é
recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso para o
Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da
Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
2. Em 20 de Junho de 2006, foi proferida decisão sumária, pela qual se entendeu
não tomar conhecimento do objecto do recurso (artigo 78º-A, nº 1, da LTC), com
os seguintes fundamentos:
«Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do
nº 1 do artigo 70º da LTC a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio
decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelo recorrente. E
bem se compreende que assim seja: a “exigência, de que a norma aplicada
constitua o fundamento da decisão recorrida, resulta do facto de só nesse caso a
decisão da questão de constitucionalidade poder reflectir-se utilmente no
processo” (Acórdão do Tribunal Constitucional nº 497/99, não publicado)
Ora, no caso em apreço, a decisão recorrida – o acórdão do Tribunal da Relação
de Évora, de 4 de Abril de 2006 – decidiu indeferir o requerimento de arguição
de nulidade, considerando que “a audiência teve lugar nos termos prescritos na
lei e decorreu também com observância das respectivas formalidades legais, não
ocorrendo a nulidade arguida pelo recorrente”. Para o efeito, a decisão
interpretou e aplicou o artigo 119º, alínea c), do Código de Processo Penal, que
integra o regime das nulidades por violação ou inobservância da lei do processo
penal, pelo que só norma constante deste artigo poderia ser objecto do presente
recurso de constitucionalidade.
Como a norma identificada no requerimento de interposição do recurso – a do
artigo 421º, nº 1, do Código de Processo Penal aplicada no sentido de que
dispensa a aplicação da norma do artigo 312º, nº 4, do mesmo diploma – não foi
aplicada, como ratio decidendi, pela decisão recorrida, impõe-se concluir pelo
não conhecimento do objecto do recurso, o que justifica a prolação da presente
decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC)».
3. Desta decisão reclamou o recorrente, ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo
78º-A da LTC, invocando o seguinte:
«Tendo o recorrente advogado constituído, foi marcado julgamento sem observância
do artº 312º, nº 4 do CPP.
O advogado do recorrente comunicou ao Tribunal que já tinha outro serviço
judicial marcado nos termos do artº 155º, nº 2 do CPC aplicável ex vi do artº
312º, nº 4 do CPP.
Era isto que devia fazer e não recorrer porque o despacho de marcação de
julgamento era irrecorrível, ou, pelo menos, só poderia recorrer depois de
cumprida esta obrigação.
É inegável o interesse do defensor constituído do arguido na audiência porque
ele é que conhece o processo e não o defensor oficioso indicado no momento.
Poderá dizer-se, como exemplo, que o defensor constituído, conhecedor do
processo, poderia alegar o facto de o ofendido ter dito na audiência de
julgamento que não se sentiu ofendido com as expressões, tal como consta da
gravação que foi transcrita.
Isto, poderia, eventualmente conduzir a uma absolvição.
São, portanto, abundantes as razões da lei para mandar proceder como manda, não
parecendo que se possa fazer o contrário, ao abrigo de uma norma, sem se violar
a constituição».
4. Notificado da reclamação, o representante do Ministério Público junto deste
Tribunal respondeu nos termos seguintes:
«1 – A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2 – Na verdade, a argumentação do reclamante em nada abala os fundamentos da
decisão reclamada, no que toca à evidente inverificação dos pressupostos do
recurso interposto»
Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
A decisão sumária reclamada concluiu pelo não conhecimento do objecto do recurso
interposto, com fundamento na não aplicação pela decisão recorrida, como ratio
decidendi, da norma identificada no respectivo requerimento de interposição – a
peça processual que define o objecto do recurso.
Como então se sustentou, o Tribunal da Relação de Évora não aplicou o artigo
421º, nº 1, do Código de Processo Penal, no sentido de que dispensa a aplicação
da norma do artigo 312º, nº 4, do mesmo diploma, quando conheceu da nulidade
arguida pelo ora reclamante, à luz do disposto no artigo 119º, alínea c), do
Código de Processo Penal. Só norma extraída deste artigo poderia, de resto,
constituir objecto do recurso interposto, atendendo ao objecto da decisão
recorrida.
Com a presente reclamação em nada fica abalado o anteriormente decidido, na
medida em que do seu teor nada resulta no sentido de o tribunal recorrido ter
aplicado, como ratio decidendi, a norma formulada no requerimento de
interposição de recurso para o Tribunal Constitucional.
Justifica-se, assim, confirmar a decisão reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão sumária proferida.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 19 de Julho de 2006
Maria João Antunes
Rui Manuel Moura Ramos
Artur Maurício