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Processo nº 823/2005
2ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I
Relatório
1. Nos presentes autos, a Juíza de Instrução Criminal do Tribunal de Vila
Franca de Xira proferiu, em 9 de Março de 2001, o seguinte despacho:
Indiciam os autos a prática de, pelo menos, um crime de homicídio.
Pelas indicações fornecidas pela PJ e constantes da douta promoção que antecede,
há razões para crer que as requeridas intercepções telefónicas se revestem de
grande interesse para a descoberta da verdade.
Assim, por estarem reunidos os pressupostos legais – art° 187, n° 1, al. a) –
autorizo as intercepções telefónicas requeridas, e respectivas gravações,
referentes aos nºs 11.1111111, 22.2222222, 33.3333333, da rede móvel (art° 269,
n°1, al. c) do CPP).
Prazo: 60 dias.
Solicite às operadoras o envio periódico à PJ da facturação detalhada dos
números supra referidos, desde esta data e durante 60 dias, o registo de trace
back e a localização celular (artºs 187, 269, n°1, als. C) e D) do CPP).
A mesma magistrada proferiu novo despacho, a 5 de Abril de 2001, com o
seguinte conteúdo:
Conforme promovido, encontram-se reunidos nos autos pressupostos que permitem a
realização da intercepção telefónica requerida (artºs 187 a 190 do CPP).
Pelas indicações fornecidas pela PJ e constantes da douta promoção que antecede;
há razões para crer que as requeridas intercepções telefónicas se revestem de
grande interesse para a descoberta da verdade.
Assim, por estarem reunidos os pressupostos legais – artº 187, n°1,
al a):
I.
l. Autorizo as requeridas intercepções telefónicas, referente aos nºs
44.4444444, 55.5555555, 66.666666666, 77.7777777, 88.8888888, 99.9999999,
10.0000000, 11.0000000 a 12.0000000, da rede móvel (art° 269, n°1, al c). do
CPP;
Esta intercepção fica a cargo da PJ.
Prazo: 60 dias.
2. Esta intercepção é extensível a cartões que venham ou estejam a ser
utilizados pelos mesmos aparelhos (IMEI) que, utilizam os cartões com os números
supra referidos pelo mesmo período.
3.Confcrme promovido, solicite às operadoras o envio de facturação detalhada –
chamadas efectuadas e recebidas – dos números supra referidos bem como dos
respectivos IMEI e outros números que se encontrem associados, desde 26.02.01 e
durante os próximos 60 dias, o registo de trace back e a localização celular
(artºs 187, 269, n°1, als. C) e D) do CPP).
A 11 de Maio de 2001 foi proferido novo despacho, com o seguinte teor:
I.
Requerimento de fls. 607 e 608: informe conforme promovido a fls. 594, ponto 2.
II.
Tomei conhecimento do teor das intercepções telefónicas a que se referem fls.
329 a 416 dos autos (art°188, n°1 do CPP)
Da informação constante destas folhas resulta que as gravações efectuadas
naquelas sessões contêm elementos relevantes para a prova.
Assim, ordeno a transcrição integral das gravações constantes das cassetes ora
juntas e referente a estas sessões, ficando a PJ encarregue de tal transcrição
(art° 188, nºs 1, 3 e 4 do CPP).
D.N.
Quanto às restantes intercepções realizadas deverá a PJ informar, por súmula, se
as mesmas têm ou não interesse enquanto meio de prova (art° 188, n°1 do CPP).
A 10 de Julho de 2001 foi proferido o seguinte despacho:
I. Requerimento de fls. 819 e sgs.
Como promovido, por se manterem rigorosamente inalteradas as circunstâncias que
determinaram a aplicação de medida de prisão preventiva aos arguidos A., B., C.
e D., aliás agravadas com os indícios que têm vindo a ser carreados para os
autos no inquérito, determina-se que estes aguardem julgamento sujeitos à
referida medida de coacção e indefere‑se o requerido (artºs 212 do CPP)
Notifique.
II.
Junte aos autos os autos de transcrição – apensos I – A a VIII – das escutas
telefónicas por serem relevantes para a prova (art° 188, nº 3 do CPP).
III. Intercepção telefónica.
Conforme promovido, encontram-se reunidos nos autos os pressupostos que permitem
a realização das intercepções telefónicas requeridas (artºs 187 a 190 do CPP).
Pelas indicações fornecidas pela PJ e constantes da douta promoção que antecede,
há razões para crer que as requeridas intercepções telefónicas se revestem de
grande interesse para a descoberta da verdade.
Assim, por estarem reunidos os pressupostos legais — art° 187, n° 1,
al a):
1.Autorizo as requeridas intercepções telefónicas, referente aos imeis nºs
AAAAAAAAAAAAAAA, BBBBBBBBBBBBBBB, CCCCCCCC CCCCCCCC e DDDDDDDDDDDDDDD (art°
269, n°1, al. c) do CPP).
Esta intercepção fica a cargo da PJ.
Prazo: 60 dias.
2. Esta intercepção é extensível a cartões que venham ou estejam a ser
utilizados pelos mesmos aparelhos (IMEI) que utilizam os cartões com os números
supra referidos, pelo mesmo período.
3. Solicite às operadoras o envio de facturação detalhada – chamadas efectuadas
e recebidas — dos números supra referidos bem como dos que sejam utilizados no
mesmo IMEI, desde esta data e durante os próximos 60 dias, o registo de trace
back e a localização celular (artºs 187, 269, n°1, als. C) e D) do CPP).
IV.
Renovo o meu despacho da fia. 75, ponto 1, nºs 1 a 3, por mais 60 dias
relativamente aos IMEIS correspondentes aos telemóveis com os números
33.3333333, 13.0000000, 14.0000000 e 15.0000000 (art° 269, n°1, al. C) do CPP).
V.
Solicite às operadoras o envio de facturação detalhada – chamadas efectuadas e
recebidas – dos números abaixo referidos bem como dos que sejam utilizados no
mesmo IMEI, desde o dia 1 de Março de 2001 e durante os próximos 60 dias, bem
como o registo de trace back e a localização celular (artºs 187, 269, n°1, als.
C) e D) do CPP):
EEEEEEEEEEEEEEE
FFFFFFFFFFFFFFF
GGGGGGGGGGGGGGG
HHHHHHHHHHHHHHH
16.0000000
17.0000000
18.0000000”
Realizado o julgamento na Comarca de Alenquer, o Tribunal Colectivo decidiu
condenar o arguido E. na pena única de 20 anos e 6 meses de prisão, pela prática
de um crime de homicídio qualificado, de 3 crimes de roubo, de 1 crime de furto
qualificado e de 1 crime de auxílio à imigração ilegal, e o arguido B., na pena
única de 21 anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio qualificado,
de 4 crimes de roubo, de 1 crime de auxílio à imigração ilegal e de um crime de
sequestro.
2. Os arguidos haviam interposto recursos do despacho de pronúncia,
recursos esses relativos ao indeferimento das arguições de nulidade das escutas
telefónicas realizadas.
Os arguidos, por outro lado, requereram o acréscimo do prazo de 10 dias ao
prazo para interposição de recurso da decisão condenatória, requerimento que foi
indeferido por despacho de 14 de Março de 2003. Os arguidos interpuseram
recursos de tal decisão.
Os quatro recursos foram admitidos com subida diferida.
Interpostos recursos da decisão condenatória, subiram todos os recursos.
Relativamente à impugnação das escutas telefónicas, os recorrentes
apresentaram alegações de conteúdos idênticos. Concluíram do seguinte modo:
1- Nas escutas telefónicas atribuídas ao recorrente ou em que ele seria
interveniente, cujas transcrições constam dos autos, ocorreu uma falta de
suficiente controle jurisdicional das escutas, caracterizado na ausência de
qualquer auto ou sequer escrito onde se revele terem sido as gravações ouvidas e
seleccionadas e mandadas transcrever por um Juiz.
2- Debalde se procura nos autos qualquer referência sequer à apresentação em
juízo das fitas magnéticas recolhidas pelo OPC, mas tão somente das suas
transcrições.
3- Os despachos judiciais sobre as transcrições limitam-se a mandar juntar aos
autos, nunca ali aparecendo sequer qualquer menção ao facto de o Juiz ter ouvido
as fitas magnéticas.
4- O art. 188º nº 3 conjugado com o n°. 1 determina que o Juiz deve ouvir as
fitas magnéticas pois só assim as poderá seleccionar e mandar transcrever.
5- A consequência de tal omissão só poderá fazer concluir pela inexistência de
controlo jurisdicional das escutas.
6- O que acarreta a Nulidade Absoluta por constituir método proibido de prova em
flagrante violação do art. 32º n°. 6 da CRP.
7- Tendo sido tudo praticamente efectuado pelo OPC. e não pelo Juiz houve
violação das regras de competência do Tribunal – art. 269° n°. 1 al. e) e d),
187°, 190º, 17°, 188° n°3 e 101° n° 2 e 3° – o que só por si, na medida em que
invadem competências estritamente judiciais, constitui Nulidade Insanável – art.
119° al. e) do CPP8
8- O OPC demorou imenso tempo a apresentar os resultados das escutas telefónicas
em juízo bem como as transcrições.
9- Qualquer que seja a interpretação da palavra “imediatamente” ínsita no art.
188° n° 1 do CPP, o certo é que não pode corresponder ao tempo que demorou.
10- Preteridas as formalidades exigidas por esse artigo as consequências só
podem ser a declaração de nulidade, visto que se trata de métodos proibidos de
prova – art. 126° n°. 3 do CPP.
11- E inconstitucional qualquer interpretação do art. 188° n° 1 que não imponha
que o auto de intercepção e gravação de conversações telefónicas seja, de
imediato, lavrado e levado ao conhecimento do Juiz, por violação do n°. 6 do
art. 32° da Constituição da República Portuguesa, o que desde já se argui.
12- Pelo exposto afigura – se que deverá ser declarada a nulidade das
transcrições das escutas telefónicas realizadas nos autos, ordenando – se o seu
desentranhamento bem como a sua destruição e a dos respectivos suportes
técnicos, e bem assim dos actos que, subsequentemente praticados, as tenham
levado em conta, designadamente a acusação. E em consequência deverá ser
anulado, pois todo o processado a seguir à Acusação e esta inclusive, devendo o
processo ser remetido para novo inquérito que não tenha em atenção estas provas
consideradas nulas.
Quanto aos recursos da decisão de indeferimento de prorrogação do prazo,
foram as seguintes as conclusões tiradas (também iguais em ambos os recursos):
“1 - Após consulta dos autos no dia 17 Março 2003 – 2ª Feira, pelas 11H o
signatário verifica que consta nos mesmos um despacho de indeferimento do
requerimento de 7 Março de 2003, o qual só foi notificado umas horas mais tarde
via fax, após 10 dias do seu requerimento e a um dia do prazo de 15 dias da
entrega da interposição e motivação do recurso.
2 - O signatário só na 2ª feira foi buscar ao Tribunal de Alenquer as 13
cassetes gravadas do julgamento, após seu telefonema, na 6ª feira, 14 Março
2003, por volta das 15h30, para o Tribunal de Alenquer, lhe terem dito que as
cassetes já estavam todas gravadas e que as podia ir levantar, face ao adiantado
da hora e por o signatário àquela hora se encontrar em Lisboa e a caminho do
EPCaxias, não foi possível ir buscar as cassetes. É de realçar que o signatário
não foi notificado que as cassetes estavam gravadas e que podia proceder ao seu
levantamento.
3 - Quer agora a Meritíssima Juiz “a quo” que o signatário oiça 13 cassetes de
1h30m cada, o que dá cerca de 19H30m e faça um recurso sobre matéria de facto
até amanhã, dia 18 de Março 2003 – 3ª Feira, o mais tardar a ser entregue nos
correios de Cabo Ruivo – Lisboa até às 23h ou enviado via fax até às 23h59m. Se
isto não é prejudicar os direitos de defesa, designadamente o direito ao
Recurso, e dentro deste o Recurso sobre matéria de facto, o que será?
4 - O arg°. defende que beneficia do regime estabelecido no at°. 698°, nº. 6 do
C.P.Civil, por este se aplicar subsidiariamente ao processo penal.
5 - Regendo sobre a “integração de lacunas”, o art. 4° estabelece que nos casos
omissos, quando as disposições do CPPenal se não puderem aplicar por analogia se
devem observar as normas do processo civil que se harmonizem com o processo
penal.
6 - Face ao art. 411° do CPP, numa primeira e menos cuidada análise, ser – se –
ia levado a concluir pela inexistência de qualquer lacuna, quer no que respeita
ao prazo de interposição de recurso, quer no que toca ao prazo de apresentação
da respectiva motivação.
7 - Porém, entende-se que não é bem assim.
Confrontando os ditos preceitos legais com os que no CPCivil regulam matéria
idêntica – art°s. 685°, 687°, 698° e 743º, facilmente se conclui que o
legislador, no intuito inequívoco de imprimir celeridade ao processo penal
reuniu num só acto, aquilo que em processo civil se reporta por 2 actos
processuais distintos, a interposição do recurso e a apresentação das alegações.
8 - E não se diga que a motivação em processo penal e as alegações em processo
civil são coisas distintas. Pese embora o legislador lhes haja atribuído
denominação diferente – o legislador do processo penal reservou o termo
“alegações” para a peça processual oral ou escrita onde os recorrentes e os
recorridos, em sede de audiência realizada no tribunal de recurso, expõem as
razões da tese que defendem –, é manifesta a identidade da sua natureza, ambas
consubstanciando a enunciação e o resumo dos fundamentos e razões de facto ou de
direito em que a parte finda a pretensão de ver alterada a decisão proferida –
cfr. Art. 412º do CPPenal e 690º do CPCivil.
9 - Em processo penal (como já se fazia em processo civil) e na sequência da Lei
59/98 de 25 de Agosto, se institui o efectivo recurso sobre a matéria de facto,
exigindo o art. 412º nº. 3, que o recorrente especifique os pontos de facto que
considera incorrectamente julgados – alínea a) –, as provas que impõem decisão
diferente dá recorrida – alínea b) – (à semelhança do citado art. 690º. A, nº. 1
do CPCivil) e ainda as provas que devem ser feitas por referência aos suportes
técnicos, havendo lugar a transcrição.
10 - Preconizando, o entendimento de que quanto à realização da transcrição há
que fazer isso, subsidiário do regime do CPCivil, impõem-se reconhecer que nos
recursos penais, tal como nos de natureza civil, subsistem, de forma manifesta e
bem mais premente, as razões que estiveram na base do alargamento do prazo para
apresentação das alegações instituído, no art. 698º nº. 6 do CPCivil.
11 - A elaboração de um recurso em matéria de facto envolve, em regra,
considerável dispêndio de tempo e o prazo de recurso e motivação em processo
penal é bem mais curto do que o aqueles de que dispõe o recorrente em processo
civil para interpor e motivar o recurso. E no caso em apreço não é num dia que
se ouve 13 cassete de 1H30m cada.
12 - Apesar do exposto, o CPPenal não contém norma que alargue o prazo de
apresentação de motivação, no caso de através do recurso se pretender a
reapreciação de matéria de facto, quando a prova tenha sido gravada, as cassetes
sejam entregues um dia antes do final do prazo do recurso e haja de ser feita a
transcrição.
13 - Não havendo razões para crer que o legislador do CPPenal tenha querido
adoptar regime diferente que, pelas razões apontadas, se traduziria em infundada
limitação do direito de recurso –, existe caso omisso, e não havendo no mesmo
Código disposição passível de aplicação analógica, o mesmo deve ser integrado
com a observância da norma do processo civil que versa sobre a matéria, desde
que esta se harmonize com o processo penal – art. 4º.
14 - Atento o paralelismo estrutural das duas situações consideradas, não se vê
por que razões esta harmonia deva ser negada.
15 - Na verdade a interposição de recurso em processo penal configura-se, em
regra, como um acto múltiplo, no sentido em que nele se contém, não só a
declaração de vontade de recorrer, mas também a apresentação dos respectivos
fundamentos. Interposição de recurso e apresentação da motivação são, por
imposição da lei, partes integrantes do mesmo acto e a preterição desta regra
determina a rejeição do recurso salvo no caso deste ser interposto por
declaração em acta, receber directamente na sua regulamentação os contributos
que para cada uma devam.
16 - Se assim é, qualquer destas partes integrantes pode advir do CPCivil, por
via do art. 4ºdo CPPenal.
17 - E, coerentemente, cada uma dessas partes integrantes deverá receber também,
designadamente no tocante à sua tempestividade, as alterações que reflexamente
lhe são impostas por paralelas alterações introduzidas directamente na outra.
18 - Isto é, devendo a interposição do recurso e a apresentação da motivação ter
lugar simultaneamente, o acréscimo de prazo que o sistema legal permitir para a
apresentação da motivação – “ex vi” do art. 698º nº. 6 do CPCivil – valerá
automaticamente para – aquela interposição.
19 - Pelo exposto é de concluir que quando o recurso tenha por objecto a
reapreciação de prova gravada, esse prazo de 15 dias é acrescido de 10 (dez)
dias, por força do disposto no art. 698º, nº. 4 e 6 do C.P. Civil
20 - Deste modo o prazo para interposição de recurso do acórdão dos autos
terminaria não a 18 de Março 2003 – 3ª feira mas a 28 de Março 2003 – 6ª feira.
21 - No sentido do recorrente ver o acórdão da Relação de Coimbra de 20 de
Setembro de 2000, CJ, Ano XXV, Tomo IV – 2000, pág. 49, que diz no seu sumário
que “havendo recurso sobre matéria de facto em que se vise a reapreciação da
prova gravada, a transcrição desta cabe ao recorrente, que, pode beneficiar na
apresentação da sua motivação do acréscimo do prazo de 10 dias estabelecido no
art. 698º nº. 4 do CPCivil, “ex vi” art. 4 do CPPenal; ver o acórdão da Relação
do Porto de 16 de Janeiro de 2001, CJ, Ano XXVII – Tomo 1 – 2002, pág. 225, que
diz no seu sumário que “quando o recurso tenha por objecto a reapreciação de
prova gravada, esse prazo de 15 dias é acrescido de 10 dias, por força do
disposto no art. 698º, nº. 6, do CPCivil.
22 - E lógico que quando este recurso for admitido pela Juiz “a quo” e em
principio sem efeito suspensivo que o prazo do recurso de 15 dias já estará
ultrapassado e que por uma questão de cautela o argº. irá interpôr o seu recurso
do acórdão dentro do prazo de 15 dias, obviamente com prejuízo do seu direito ao
recurso em matéria de facto, pois nesta parte o mesmo apresentará as suas
deficiências. Mas servirá para expôr esta situação no Tribunal. Constitucional e
no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem e para não serem condenados nas custas
do incidente.
23 - O despacho de que se recorre ao não acrescer ao prazo normal de 15 dias
para o recurso, os 10 dias viola as garantias de defesa do processo criminal
previstas no art. 32º, principalmente no seu nº. 1 da Constituição da República
Portuguesa.
Neste artigo condensam – se os mais importantes princípios materiais do processo
criminal – a constituição processual criminal. A forma do nº. 1 é, sobretudo,
uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo, que todas
elas são, em última análise, garantias de defesa.
Todavia, este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora
de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam
de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa
do arguido em processo criminal. Todas as garantias de defesa engloba
indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o
arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical
desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder
institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta mediante especificas
garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. Este preceito pode portanto
ser fonte autónoma de garantias de defesa. Em suma, a orientação para a defesa
do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos
fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem
neles um limite infrangível.
O MP teve 12 meses para fazer a acusação, o Tribunal Colectivo teve quase 30
dias para fazer e ler o Acórdão e agora o argº. através do seu defensor tem
pouco mais que um dia, de 2ª feira, dia 17 de Março de 2003 para 3ª feira, dia
18 de Março de 2003, para ouvir e ouvir 13 cassetes de 1H30m e ver se o que as
testemunhas disseram está de acordo com o que está escrito no acórdão. Isto
trata de uma clara violação das garantias de defesa do argº.
Violaram-se deste modo os arts: 698º, nº. 4 e 6, 685º, 687º,743º, 690º,690º-A,
nº. 1, 2 e 4, todos do CPCivil, 4º, 411º, nº. 1 e 3, 413º nº. 1, 412º nº. 3
CPPenal e art. 32º, nº. 1 da CRPortuguesa.
Nestes termos, deve o presente Recurso ser julgado procedente, devendo a decisão
recorrida ser substituída por outra que acresça ao prazo de recurso de 15 dias
mais 10 dias, por se ir recorrer em matéria de facto e por força do estabelecido
no art. 698º nº. 4 e 6 do CPCivil, “ex vi” art. 4º do CPPenal.
Assim se fazendo a costumada justiça.”
O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 20 de Abril de
2005,considerou o seguinte:
4. RECURSO INTERPOSTO DO DESPACHO DE PRONÚNCIA, NA PARTE EM QUE INDEFERIU A
ALEGADA NULIDADE DAS ESCUTAS TELEFÓNICAS:
A) É do seguinte teor o despacho recorrido:
«Nulidade das escutas telefónicas.
Os arguidos E. e B. invocam a nulidade das escutas telefónicas com base no facto
de não ter existido um acompanhamento judicial tempestivo das mesmas e também
porque o juiz se limitou a ordenar o sugerido pela PJ.
Argumentos semelhantes são invocados pelo arguido A., referindo este que o juiz
se limitou a ordenar a transcrição e junção das escutas telefónicas sugeridas
pela PJ, que não foi nomeado intérprete para a elaboração das transcrições, que
em várias sessões não se refere o número que efectuou ou recebeu a chamadas, bem
como a data e hora em que as mesmas foram efectuadas e, por fim, que foi junto
aos autos o termo de juntada de auto de fim de intercepção e gravação
telefónica, mas não consta do mesmo que será elaborada a respectiva transcrição.
Determina o art° 189 do CPP, que, constitui nulidade dependente de arguição, o
não preenchimento dos requisitos da realização de escutas telefónicas
determinados pelos art°s 187 e 188.
O art° 187 do CPP estabelece os crimes em que são admissíveis escutas
telefónicas e determina que as mesmas só podem ser ordenadas ou autorizadas por
despacho do juiz, estabelecendo, por seu turno o art° 188 do mesmo diploma legal
as formalidades das operações.
Assim, impõe a lei as seguintes formalidades:
a realização de auto, o qual junto com as fitas gravadas ou elementos análogos é
imediatamente levado ao conhecimento do Juiz;
caso o Juiz considere os elementos recolhidos importantes para a prova, ordena a
sua transcrição em auto e fá-lo juntar ao processo; caso contrário, ordena a sua
destruição.
No presente caso, e conforme acima se referiu, entre os vários argumentos
invocados constam, por um lado, a não existência de acompanhamento judicial
tempestivo das escutas telefónicas e, por outro, a passividade do juiz que se
limitou a ordenar a junção das conversas sugeridas pela PJ, sem que tenha
efectuado o controle das mesmas.
Vejamos se assiste razão, quanto a estes argumentos, aos arguidos. Quanto ao não
acompanhamento judicial tempestivo das escutas telefónicas - constata-se que:
por despacho de 09.03.01, foi autorizada a intercepção telefónica referente aos
n°s 11.1111111, 22.2222222 e 33.3333333, pelo prazo de 60 dias (fls. 31), tendo
em 23.03.01 sido declarada cessada as intercepções referentes aos números
11.1111111, 22.2222222 (fls. 76);
- Em 23.03.2001 foi autorizada, por 60 dias a intercepção telefónica referente
aos números 19.0000000, 14.0000000, 33.3333333, 13.0000000, 20.0000000 e
15.0000000, bem como dos imeis referidos a fls. 75.;
— Em 05.04.2001 foi ainda autorizada, por 60 dias a intercepção telefónica
referente aos números 44.4444444, 55.5555555, 66.66666666, 77.7777777,
88.8888888, 99.9999999, 10.0000000, 11.0000000 e 12.0000000, bem como dos imeis
referidos a fls. 123;
— Em 21 de Abril de 2001 foram apresentadas as transcrições das intercepções
telefónicas, referentes aos números 44.444444444, 55.5555555, 66.66666666,
77.7777777, 88.8888888 e 99.999999999, as quais foram validadas por despacho
judicial de 11 de Maio de 2001 (fls. 329 a 416 e 614);
— Por despacho datado de 10 de Julho de 2001 foram validadas as transcrições das
intercepções telefónicas referentes aos números 21.0000000, 10.0000000,
44.44444444, 22.0000000, 23.0000000 e 11.0000000 (fls. 839).
— Foram nessa data autorizadas novas intercepções e prorrogado o prazo de
intercepção de outros números fls. 839 e 840), sendo que nada mais foi recolhido
com interesse para os presentes autos e, por isso, foi em 2 de Abril de 2002,
ordenada a destruição de todos os restantes suportes magnéticos (fls. 1348).
De acordo com os despachos acima referidos, bem como os relatórios da PJ que os
antecederam e promoções do Ministério Público, concluímos que as intercepções
telefónicas cuja nulidade ora se suscita, decorreram no período situado entre 9
de Março de 2001 e 21 de Junho de 2001.
Ao longo deste tempo o Juiz teve conhecimento do teor das conversações,
designadamente em 21 de Abril de 2001, 11 de Maio de 2001 e 10 de Julho de 2001.
Muito se tem discutido recentemente qual a interpretação a dar à expressão “de
imediato” utilizada pelo legislador.
Na esteira do que já foi decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, a
expressão de imediato deve ser entendida no sentido de “no tempo mais rápido
possível” (cf. Ac. Rel. Lisboa de 16.08.96, Col. de Jur., 1996,4, 155).
O Juiz, no presente caso, e de acordo com o que acima ficou exposto, teve
conhecimento do teor das intercepções telefónicas ainda durante o período de
vigência das mesmas, sendo certo que a partir do momento da detenção dos
arguidos (21 de Abril de 2001), nenhum outra conversa digna de registo e com
interesse para a prova destes autos foi carreada.
Assim, não considero que tenha sido violado o disposto no art° 188, n°1 do CPP,
quanto ao invocado não acompanhamento judicial tempestivo das escutas
telefónicas.
O segundo argumento utilizado pelos arguidos para suscitarem a nulidade das
intercepções telefónicas é o de que o juiz se limitou a ordenar a junção das
conversas sugeridas pela PJ, sem que tenha efectuado o controle das mesmas, ou
seja, “andou a reboque” do critério da PJ.
Dos vários despachos judiciais proferidos ao longo do processo, é unânime a
afirmação de que os elementos recolhidos têm interesse para a prova e,
efectivamente, têm tal interesse.
A lei processual penal limita-se a determinar que o juiz, se considerar que os
elementos recolhidos têm interesse para a prova, ordene a sua junção. Ora, foi o
que sucedeu nos autos.
Por fim, o arguido A. veio ainda alegar que não foi nomeado intérprete para a
elaboração das transcrições, que em várias sessões não se refere o número que
efectuou ou recebeu a chamada, bem como a datas e hora em que as mesmas foram
efectuadas e, por fim, que foi junto aos autos o termo de juntada de auto de fim
de intercepção e gravação telefónica, mas não consta do mesmo que será elaborada
a respectiva transcrição.
Quanto a estas questões importa salientar, relativamente à primeira - falta de
nomeação de intérprete - que a mesma não corresponde à verdade, a intérprete foi
nomeada e consta do inicio de cada auto de transcrição.
Quanto às restantes “falhas” apontadas, importa ter presente que a lei não
comina as mesmas com nulidade, pelo que nunca poderiam gerar o efeito requerido.
Assim, não existiu, contrariamente ao alegado, qualquer violação das normas
legais citadas pelos arguidos, pelo que improcede, em consequência, a nulidade
das escutas telefónicas, suscitada.»
B) Desta decisão, recorreram os arguidos — B. e E, de fls. 2225 a fls. 2244,
tendo apresentado motivações, das quais extraíram as seguintes
«CONCLUSÕES:
1- Nas escutas telefónicas atribuídas aos recorrente ou em que eles seriam
intervenientes, cujas transcrições constam dos autos, ocorreu uma falta de
suficiente controle jurisdicional das escutas, caracterizado na ausência de
qualquer auto ou sequer escrito onde se revele terem sido as gravações ouvidas e
seleccionadas e mandadas transcrever por um Juiz.
2- Debalde se procurará nos autos qualquer referência sequer à apresentação em
juízo das fitas magnéticas recolhidas pelo OPC, mas tão somente das suas
transcrições.
3- Os despachos judiciais sobre as transcrições limitam — se a mandar juntar aos
autos, nunca ali aparecendo sequer qualquer menção ao facto de o Juiz ter ouvido
as fitas magnéticas.
4- O art. 188° n° 3 conjugado com o n°. 1 determina que o Juiz deve ouvir as
fitas magnéticas pois só assim as poderá seleccionar e mandar transcrever.
5- A consequência de tal omissão só poderá fazer concluir pela inexistência de
controlo jurisdicional das escutas.
6- O que acarreta a Nulidade Absoluta por constituir método proibido de prova em
flagrante violação do art. 32º nº. 6 da CRP.
7- Tendo sido tudo praticamente efectuado pelo OPC. e não pelo Juiz, houve
violação das regras de competência do Tribunal — art. 269° n°. 1 al. c) e d),
187°, 190°, 17°, 188° n°3 e 101 o n° 2 e 3° - o que só por si, na medida em que
invadem competências estritamente judiciais, constitui Nulidade Insanável - art.
119º al. e) do CPP.
8- O OPC demorou imenso tempo a apresentar os resultados das escutas telefónicas
em juízo bem como as transcrições.
9- Qualquer que seja a interpretação da palavra “imediatamente” ínsita no art.
188° n° 1 do CPP, o certo e que não pode corresponder ao tempo que demorou.
10-Preteridas as formalidades exigidas por esse artigo as consequências só podem
ser a declaração de nulidade, visto que se trata de métodos proibidos de prova –
art. 126° n°. 3 do CPP.
11- E inconstitucional qualquer interpretação do art 188° n° 1 que não imponha
que o auto de intercepção e gravação de conversações telefónicas seja, de
imediato, lavrado e levado ao conhecimento do Juiz, por violação do n°. 6 do
art. 32° da Constituição da República Portuguesa, o que desde já se argui.
12- Pelo exposto afigura-se que deverá ser declarada a nulidade das transcrições
das escutas telefónicas realizadas nos autos, ordenando-se o seu
desentranhamento bem como a sua destruição e a dos respectivos suportes
técnicos, e bem assim dos actos que subsequentemente praticados, as tenham
levado em conta, designadamente a acusação. E em consequência deverá ser
anulado, pois todo o processado a seguir à Acusação e esta inclusive, devendo o
processo ser remetido para novo inquérito que não tenha em atenção estas provas
consideradas nulas.
VIOLARAM -SE OS ARTIGOS:
— 188° nº. 1 do CPP porque o Juiz não ouviu as gravações, nem as seleccionou,
antes se limitou a ordenar a junção das transcrições que lhe foram trazidas pelo
OPC, e este último demorou imenso tempo a fazer o que a lei impõe
“imediatamente”;
— 269°n°1 al c) e d), 187°, 190, 17º, 188° n°3 e 101° n° 2 e 3 todos do CPP,
porque o OPC invade competências estritamente judiciais;
— art. 99° do CPP porque uma diligência de audição e selecção de escutas
telefónicas deve ser efectuadas por um Juiz e reduzidas a Auto,
— 18°, 32° n°. 6, 34° 37° todos da C .R. Portuguesa;
— 271 ° do CPP, uma vez que não se respeitou o princípio do contraditório.»
Este recurso foi admitido a fls. 2250, sendo o efeito atribuído, a subir com o
1°, que vier a ser interposto da decisão final.
C) O M°P° da 1ª instância, a fls. 2257/2259, propõe, que a decisão seja mantida.
D) Neste Tribunal, o Digno PGA teve “ vista”.
E) CUMPRE APRECIAR:
Como referem Manuel Simas Santos e Manuel Leal Henriques, assim como Maia
Gonçalves: constituirá nulidade insanável a falta de ordem ou de autorização do
Juiz para as escutas e que integrarão a espécie de nulidades sanáveis,
dependentes de arguição, a inobservância de qualquer dos demais requisitos
mencionados nos arts. 187° e 188° do CPP;
a) No caso “sub judice” as escutas telefónicas foram sempre, oportunamente,
autorizadas por despacho do magistrado judicial;
b) Também foram, nos autos, respeitados os restantes pressupostos estabelecidos
nos arts. 187° e 188° do CPP;
c) O art. 188° do CPP foi alterado pela Lei n°59/98, de 25 de Agosto, e pelo DL
n° 320-C/2000, de 15 de Dezembro;
d) O novo preceito do n° 4 do art. 188° do CPP (após a revisão operada pela Lei
n°59/98, de 25 de Agosto) confere ao Magistrado Judicial, quando o entender
conveniente, que seja coadjuvado por funcionários do OPC, o que lhe concede uma
ampla margem de manobra funcional;
f) Além disso, após a alteração do n°1 do art. 188° do CPP, levada a cabo
através do DL n°320‑C/2000, de 15 de Dezembro, até é permitido, que o Juiz possa
limitar a audição das gravações às passagens indicadas pelo OPC, como relevantes
para a prova, sem prejuízo de as gravações efectuadas lhe serem integralmente
remetidas;
g) O termo “imediatamente” empregue no art. 188°, n° 1, do CPP, reporta-se à
junção ao processo do auto de transcrição das intercepções, sendo certo que a
expressão em causa deve ser entendida no sentido de a junção daquele auto, o
dever ser, no mais breve espaço de tempo, que o permitam as condições humanas,
técnicas e de trabalho, ao dispor das instituições.
Pelo que, sem necessidade de mais considerações e EM CONCLUSÃO, entende -se:
que nada de anormal ocorreu com as intercepções telefónicas, pois sempre houve
adequado controlo judicial, tendo sido respeitados todos os formalismos legais
inerentes à recolha de tal prova; as escutas telefónicas foram autorizadas,
efectuadas, validadas e transcritas nos autos;
e determina-se, que o douto despacho recorrido seja mantido na íntegra, por não
ter sido violada nenhuma das invocadas disposições legais; improcedendo, pois,
os recursos interpostos pelos arguidos JORZA e OFROV.
5. RECURSO DO DESPACHO, QUE INDEFERIU O PEDIDO DE PRORROGAÇÃO DO
PRAZO, PARA APRESENTAÇÃO DE RECURSO DA DECISÃO FINAL:
A) Pelos il.s Defensores dos arguidos — E., B. e A. foi requerido, que, de
acordo com o art.° 698°, n° 6 do CPC, fosse prorrogado o prazo de 15 dias, para
apresentação dos recursos do Acórdão dos autos, por mais 10 dias.
B) Foi do seguinte teor, o despacho da Mma Juiz, sobre o requerido:
«Vem o ilustre defensor oficioso dos arguidos E. e B. requerer a este Tribunal
que, e além do mais, lhe seja concedida a prorrogação do prazo a que alude o
art. 698° n° 6 do CPC, aplicável ao processo penal.
Igual requerimento apresentou a Ilustre defensora do arguido A., fundamentando a
prorrogação do prazo na especial complexidade dos autos.
O Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento do requerido. Cumpre
apreciar e decidir.
Salvo o devido respeito por melhor opinião, adiantamos desde já que nenhuma
razão assiste ao que vem de se requerer pelos arguidos.
Desde logo, como o alega o arguido A., a especial complexidade dos autos em nada
releva para a prorrogação do prazo para a apresentação das motivações, relevando
apenas para os prazos da medida de prisão preventiva — cfr. art. 215 n° 3 do CPP
— e para a duração máxima do inquérito — cfr. art. 276° n° 2 al.c) do CPP.
Por outro lado, entendemos também no processo penal que nenhuma lacuna ou
omissão existe, que à luz dos arts. 4° do CPP e 10 °n°1 e 2 do CC deva se
integrada.
E assim sendo na verdade, não haverá que aplicar subsidiariamente as regras do
processo civil, “maxime” a contida no art.698° n°6 desse compêndio legal.
Por um lado, porque como entendemos, o processo penal regula exaustivamente toda
a matéria atinente aos recursos (sendo certo que à elaboração do Código do
Processo Penal está inerente o estabelecimento de uma regulamentação total e
autónoma do respectivo processo, tornando‑a mais independente do processo
civil), e por outro, porque a hipótese contemplada no indicado art. 698° n° 6 do
CPC não tem qualquer correspondência no regime de recursos estabelecidos no
processo penal, regime esse que o legislador, poderia se o quisesse, ter
alterado, como o fez com a reforma operada pela Lei n° 59/98, de 25.08, por via
da qual alterou o prazo para a interposição do recurso, passando-o de dez para
quinze dias.
Tal é a orientação da Jurisprudência encontrada nos Acórdãos do TRP de 24.02.02,
de 14.03.01, 05.06.02, 30.01.02, 09.10.02, 18.12.02 e de 16.10.00, encontrados
no site wwwi.http.trp.pt.
Termos em que se indefere o requerido.
Custas incidentais a cargo dos arguidos recorrentes, com taxa de justiça fixada
para cada um, em 2 UCs — sem prejuízo do preceituado no art.522°/2 do CPP.
Notifique.»
C) Deste despacho, recorreram os arg°s B. e E., a fls. 2959 a 2796, tendo
apresentado motivações e as respectivas conclusões:
«O despacho de que se recorre ao não acrescer ao prazo normal de 15 dias para o
recurso, os 10 dias viola as garantias de defesa do processo criminal previstas
no art. 32°, principalmente no seu n°. 1 da Constituição da República
Portuguesa. Neste artigo condensam‑se os mais importantes princípios materiais
do processo criminal — a constituição processual criminal. A formula do n°. 1 é,
sobretudo, uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo,
que todas elas são, em última análise garantias de defesa.
Todavia, este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora
de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes hajam
de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa
do arguido em processo criminal. Todas as garantias de defesa engloba
indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o
arguido defender a sua posição e contrariar a acusação.
Dada a radical desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente
apoiada no poder institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta
mediante específicas garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. Este
preceito pode portanto ser fonte autónoma de garantias de defesa Em suma, a
orientação para a defesa do processo penal revela que ele não pode ser neutro em
relação aos direitos fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do
arguido), antes tem neles um limite infrangível.
O MP teve 12 meses para fazer a acusação, o Tribunal Colectivo teve quase 30
dias para fazer e ler o Acórdão e agora o arg°. através do seu defensor tem
pouco mais que um dia, de 2ª feira, dia 17 de Março de 2003 para 3° feira, dia
18 de Março de 2003, para ouvir e ouvir 13 cassetes de lh30m e ver se o que as
testemunhas disseram está de acordo com o que está escrito no acórdão.
Isto trata de uma clara violação das garantias de defesa dos arg°s.
Violaram-se deste modo os arts. 698º, nº. 4 e 6, 685°, 687°, 743°, 690°, 690°-A,
nº. 1, 2 e 4, todos do CPCivil, 4º, 411º, nº. 1 e 3, 413° nº. 1, 412º nº. 3
CPPenal e art. 32°, nº. 1 da CRPortuguesa
Nestes termos, deve o presente Recurso ser julgado procedente, devendo a decisão
recorrida ser substituída por outra que acresça ao prazo de recurso de 15 dias
mais 10 dias por se ir recorrer em matéria de facto e por força do estabelecido
no art. 698° n°. 4 e 6 do CPCivil, “ex vi” art 4° do CPPenal.»
D) O M°P° da 1ª instância tomou posição, no sentido de dever ser mantida a
decisão recorrida.
E) Neste Tribunal, o Digno PGA teve “ vista”.
F) CUMPRE APRECIAR:
Vem o presente recurso interposto do douto despacho de fls. 2600, que indeferiu
aos arguidos recorrentes, o pedido de prorrogação de prazo para interposição de
recursos, por mais 10 dias.
Na verdade, não é possível a aplicação subsidiária, neste caso, do art. 698° n°
6 do Código de Processo Civil, em virtude de o Código Processo Penal regular
expressa e exaustivamente esta matéria e a hipótese contemplada nessa norma não
ter qualquer correspondência com o regime dos recursos estabelecido no Código
Processo Penal.
Não existe fundamento legal para a prorrogação do prazo de interposição de
recurso, uma vez que a lei não estabelece qualquer distinção ou excepção.
Isto porque não estamos perante uma lacuna da lei que careça de integração por
analogia, pelo que não há lugar ao citado art° 40 do Código Processo Penal.
Um dos princípios orientadores do novo Código Processo Penal, nomeadamente no
que respeita a recursos, foi o de passar a obedecer a princípios próprios,
possuindo uma estrutura normativa autónoma - cfr. Cunha Rodrigues, RECURSOS,
“Jornadas de Direito Processual Penal”, O novo Código Processo Penal, pag. 384.
Esta parece a solução acertada, desde logo, porque apesar das sucessivas
alterações introduzidas n o Código Processo Penal, não viu o legislador
necessidade de proceder a qualquer alteração nesta matéria, no âmbito do
Processo Penal.
Se o julgador quisesse, que o recorrente, que impugnasse o julgamento da matéria
de facto, beneficiasse do prazo de mais 10 dias, tê-lo-ia dito expressamente,
tanto mais que na mesma reforma processual (a introduzida pela Lei 5 9/98) se
alterou de 10 para 15 dias o prazo de interposição de recurso.
A versão actual do art° 412° do Código Processo Penal é francamente posterior à
entrada em vigor do art° 690-A do Código de Processo Civil e manifestamente
optou por uma solução diferente em processo penal, agora consagrada no Assento
STJ 2/2002: ao invés de cometer ao recorrente a transcrição das passagens da
gravação em que se funda, optou por lhe cometer a referência a suportes
técnicos.
Sendo a transcrição a elaborar oficiosamente, subsequentemente, à motivação de
recurso, compreende-se, porque o Código Processo Penal não inscreveu disposição
paralela à do n° 6 do art° 698° do Código de Processo Civil.
Acresce que a hipótese contemplada no art° 698° nº 6 do Código de Processo Civil
não tem qualquer correspondência ao regime de recursos estabelecido no processo
penal, seja porque neste, o prazo de recurso é de 15 dias, seja porque a
extensão do prazo prevista no n° 6 do art° 698° do CPC se aplica apenas às
alegações na “apelação”, articulado que o Código Processo Penal nem sequer
prevê, nesta fase.
Na eventualidade de se verificar essa necessidade, por motivos imputáveis ao
recorrente ou por atraso de Secretaria na entrega das cassetes - o que parece
que não foi o caso, já que outros recorrentes dispuseram das cassetes em tempo
considerado útil — sempre o recorrente se poderia socorrer do disposto nos art°
145° e/ou 146° do Código de Processo Civil, esses sim, subsidiariamente
aplicáveis ao Processo Penal.
Este regime do C.P.P. assegura plenamente os direitos de defesa das partes, não
violando qualquer preceito ou princípio constitucional.
Aliás, contrariando a argumentação dos recorrentes, sempre se poderá dizer, que
é manifesto que, a admitir-se a aplicação subsidiária do art° 698° do Código
Processo Civil, à questão “sub judice”, dela também beneficiaria os restantes
interessados na interposição de recursos, também, o Ministério Público, já que
não se concebe, como parece resultar do argumento da “compensação das garantias
de defesa” que fosse possível estabelecer, que tal norma só seria de aplicação
subsidiária nos casos em que recorrente fosse o próprio arguido.
Nesta medida, a interpretação de que o regime de recursos em processo penal é
completo e autónomo, não se aplicando o disposto no art° 698° do Código de
Processo Civil, subsidiariamente, não viola qualquer direito Constitucional nem
quaisquer outras normas processuais, designadamente as invocadas pelo
recorrente.
Assim, improcederá o recurso interposto pelos arg°s B. e E., mantendo-se o
despacho recorrido.
3. Os arguidos interpuseram recursos de constitucionalidade da decisão que
confirmou o indeferimento da arguição de nulidade das escutas telefónicas e da
decisão que confirmou o indeferimento de prorrogação do prazo.
Os requerimentos de interposição dos recursos relativos às escutas
(requerimentos de novo iguais) referem as alíneas b) e g) do nº 1 do artigo 70.º
da Lei do Tribunal Constitucional.
No que respeita à alínea b), os recorrentes pretendem ver apreciada a
seguinte questão:
111°
Pretende‑se com presente Recurso ver aplicada a inconstitucionalidade da norma
do art. 188º, Nº 1 e 3 do CPP ou da mesma norma com a interpretação com que foi
aplicada na decisão recorrida, isto é, quando não imponha que o auto de gravação
e transcrição de escutas telefónicas seja de imediato lavrado e levado ao
conhecimento do juiz, e não passados mais de 30 dias como aconteceu nos autos;
quando não imponha que autorizada a intercepção e gravação por determinado
período, seja concedida autorização para a sua continuação sem que o juiz tome
conhecimento do resultado anterior, o que sucedeu nos presentes autos, e mais
grave ainda, em momento algum, foram as escutas telefónicas vistas e
seleccionadas pela Juiz; quando não imponha que seja o juiz, com exclusão de
qualquer outra entidade, a seleccionar quais as escutas relevantes a serem
juntas aos autos e quais as irrelevantes a serem destruídas, o que sempre imporá
o visionamento prévio das escutas, antes de serem juntas aos a tos as
transcrições, pelo juiz, Independentemente das sugestões e coadjuvações de quem
quer que seja e que materialize esse seu acto em auto de visionamento, uma
espécie de “termo de responsabilidade”, um vez que é uma situação processual em
que não se pode presumir que tal tenha acontecido, ou aconteceu ou não
aconteceu; é a materialização por parte do juiz de que efectivamente ouviu, viu,
seleccionou e ordenou junção aos autos das transcrições das escutas, da prova
recolhida e com interesse probatório, o verdadeiro e exclusivo garante do
efectivo acompanhamento judicial das escutas telefónicas, e que dá tranquilidade
ao cidadão.
Relativamente à alínea g), os recorrentes afirmam que o artigo 188º, nºs 1 e
3, do Código de Processo Penal foi aplicado nos autos no sentido que o Tribunal
Constitucional julgou inconstitucional nos Acórdãos nºs 407/97, 347/01 e 582/02.
Relativamente ao recurso da decisão que confirmou o indeferimento da
prorrogação do prazo, os recorrentes (uma vez mais com requerimentos iguais)
pretende ver apreciada a seguinte questão:
Nestes termos, requer‑se a V. Exa. que se digne admitir o presente Recurso e
feito o mesmo subir, com o efeito próprio, seguindo‑se os demais termos legais,
e em resultado afigura‑se que deverá ser declarada inconstitucional as normas
dos art°s. 4º, 411°. nº. 1 e 3 e 412°. nº. 3 todos do C.P.Penal e as normas dos
art°s. 685°., 687°., 690º., 690°‑A nº. 1 e 2, 698°. nº. 4 e 6 e 743º todos do
C.P.Civil ou das mesmas normas com a interpretação com que foi aplicada na
decisão recorrida, isto é, quando não imponha que havendo Recurso sobre matéria
de facto em que se vise a reapreciação da prova gravada, o recorrente pode
beneficiar na apresentação da sua motivação que é de 15 (quinze) dias do
acréscimo do prazo de 10 dias estabelecido no art. 698°. nº. 6 do C.P.Civil, “ex
vi” art. 4°. do C.P.Penal sob pena de violação das garantias de defesa do
processo criminal previstas no art. 32°., principalmente no seu n°. 1 da
Constituição da República Portuguesa. E em consequência da inconstitucionalidade
deverá ser dado ao arg°. recorrente o prazo de 10 (dias) para apresentar as suas
motivações de Recurso do douto acórdão da 1ª Instância o que implicará o reenvio
dos presentes autos para o tribunal de 1ª. Instância para posteriormente ai
nesse Tribunal apresentar as suas motivações de Recurso.
As alegações dos recursos relativos às escutas (também iguais) foram
concluídas do seguinte modo:
“1 - O que o arg°. vem neste recurso pôr em causa é a questão da Nulidade ou
Validade das Escutas Telefónicas , das quais foram transcritas conversas em que
o requerente e outros foram intervenientes e o seu nome foi referido.
2 - Assim sendo, pretende – se obter a nulidade dos resultados das escutas
telefónicas, que se acham transcritas nos apensos e nas folhas dos autos, por
estas se encontrarem feridas de ilegalidade. Existe uma violação do formalismo
legal, dado não ter havido acompanhamento judicial tempestivo dos mesmos.
3 - Não existe qualquer controlo jurisdicional das escutas autorizadas,
caracterizado na ausência de qualquer auto ou sequer escrito, onde se revela
terem sido as gravações ouvidas e seleccionadas, apenas existe o despacho de
fls. 614 em que a Meritíssima Juiz manda a PJ proceder à transcrição do conteúdo
das sessões indicadas pela PJ e que estas consideram que são relevantes para a
prova.
4 - O despacho da Exma. Juiz de fls. 614 dos autos, de 11.05.2001, diz apenas o
seguinte:
“Tomei conhecimento do teor das intercepções telefónicas a que se referem fls.
329 a 416 dos autos (art°. 188°. nº. 1 do CPP). Da informação constante destas
folhas resulta que as gravações efectuadas naquelas sessões contêm elementos
relevantes para a prova.
Assim ordeno a transcrição integral das gravações constantes das cassetes ora
juntas e referente a estas sessões, ficando a PJ encarregue de tal transcrição
(art°. 188°. nº 1, 3 e 4 do CPP).
Quanto às restantes intercepções realizadas deverá a PJ informar, por súmula, se
as mesmas têm ou não interesse enquanto meio de prova (art°. 188°. nº 1 do CPP).
5 - A fls. 615 e 616 dos autos em 11.05.2001 foi a PJ notificada do seguinte:
“Tenho a honra de informar V. Exa. que foi ordenada a transcrição integral das
gravações constantes das cassetes ora juntas e referentes às sessões de fls. 329
a 416 dos autos, ficando esse Policia encarregue de tal transcrição – art°. 188°
nº. 1, 3 e 4 do CPP.
Quanto às restantes intercepções realizadas deverá essa polícia informar, por
súmula, se as mesmas têm ou não interesse enquanto meio de prova (art°. 188°.
nº. 1 do CPP).
A Juiz de Direito”.
6 - Ora, o porquê da prorrogação dos prazos de intercepção telefónica?
Para tal suceder, os suportes áudio teriam de ser ouvidos, seleccionados e
mandadas transcrever as partes com interesse para os autos, mas sempre por um
Juiz. Este apenas diz que “tomei conhecimento do teor das intercepções
telefónicas a que se referem as fls. 329 a 416 dos autos e que da informação
constante destas fls... resulta que as gravações efectuadas naquelas sessões
contenham elementos relevantes para a prova”. Não foi a Meritíssima Juiz a ouvir
e a seleccionar as partes com interesse para os autos destes suportes áudios
constantes destas fls., foi a PJ, a Juiz sem as ouvir e seleccionar, mandou a PJ
efectuar a transcrição integral das sessões que a PJ indicou e que disseram que
eram relevantes para a prova. A Juiz disse ainda que “quanto às restantes
intercepções realizadas deverá a PJ informar por súmula se as mesmas têm ou não
interesse enquanto meio de prova”. Mais uma vez não foi a Meritíssima Juiz a
ouvir e a seleccionar as escutas com interesse, é a PJ que o deve fazer.
7 - Nunca deverá existir uma prorrogação sem ser lavrado um auto nesse sentido,
no qual conste terem sido ouvidas pelo juiz as escutas anteriores a o mesmo
número e assim, por ele, confirmada a necessidade de continuação do recurso a
este método de prova.
8 - E a própria PJ que tudo faz e nos seus relatórios sugere, limitando-se o
juiz a ordenar a transcrição e sua junção aos autos, sem as ter ouvido e
selecionado.
9 - As escutas que não constam das fls. 329 a 416 e respectivos apensos resultam
também da relação por parte dos senhores da PJ, os quais transcreveram o que
eles e não a Juiz acharam com interesse.
10 - A relação das conversações gravadas e transcritas foi feita segundo o
critério da PJ, limitando-se a Juiz a mandar juntar aos autos as transcrições
nos exactos termos sugeridos pela PJ, não se tendo permitido a finalização e
fiscalização judicial adequada, sendo ainda que aquando das prorrogações, a
autoridade judicial não tomou prévio conhecimento das intercepções anteriormente
efectuadas.
11 - Quanto a esta nulidade, de que o Juiz se limitou a ordenar a junção das
conversas sugeridas pela PJ, sem que tenha efectuado o controle das mesmas, ou
seja, “andou a reboque” do critério da PJ. E a própria Juiz que o confirma ao
dizer no despacho de que se recorre que “dos vários despachos judiciais
proferidos ao longo do processo, é unânime a afirmação de que os elementos
recolhidos têm interesse para a prova e, efectivamente, têm tal interesse. A lei
processual penal limita – se a determinar que o juiz, se considerar que os
elementos recolhidos têm interesse para a prova, ordene a sua junção. Ora, foi o
que sucedeu nos autos”. Nada refere quanto ao efectivo controlo jurisdicional
das escutas autorizadas, caracterizado na ausência de qualquer auto ou sequer
escrito, onde se revele terem sido as gravações ouvidas e seleccionadas, o que
leva a concluir que nada disto aconteceu.
12 - Confirma ainda esta nulidade quando refere no despacho da decisão
instrutória que “em 21 de Abril de 2001 foram apresentadas as transcrições das
intercepções telefónicas, referentes aos números 44.4444444, 55.5555555,
66.6666666, 77.7777777, 88.8888888 e 99.999999999, as quais foram validadas por
despacho judicial de 11 de Maio de 2001 (fls. 329 a 416 e 614)”.
13 - Devemos aceitar a intercepção dada pelas BAC às conversações escutadas sem
ter havido previamente a definição de um critério por um juiz?
14 - Não
15 - O Acórdão do Tribunal Constitucional de 21 de Maio de 1997 (in BMJ 467‑199
e segts.), veio julgar inconstitucional, por violação do disposto no nº 6 do
art. 32° da Constituição, a norma do n° 1 do art. 188° do CPP, quando
interpretada em termos de não impor que o auto de intercepção e gravação de
conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato lavrado e levado ao
conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção
ao processo ou a destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e, bem
assim, também atempadamente, decidir, antes da junção ao processo de novo auto
da mesma espécie, sobre a manutenção ou alteração da decisão que ordenar as
escutas.
Nesta linha de pensamento se insere também o Acórdão do tribunal da relação do
Porto de 8 de Maio de 2000.
Mais recentemente, o Acórdão do Tribunal Constitucional de 10 de Julho de 2001
(in 2ª série do DR de 9 de Novembro de 2001), retomou a mesma linha de
orientação nas exigências de conformidade constitucional a observar na
realização de intercepções telefónicas, impondo, no que às formalidades
essenciais respeita, a necessidade de verificação de:
- “a imediação entre o Juiz e a recolha de prova através da escuta telefónica”;
- “pressupondo acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da
fonte (...) que comporte a possibilidade real em função do decurso da escuta ser
mantida ou alterada a decisão que a determinou”;
- “ a expressão imediatamente não poderá (...) reportar — se apenas ao momento
em que as transcrições se mostrarem feitas;
- “pressupondo (...) um efectivo acompanhamento e controlo da escuta pelo Juiz”.
16 - E o Tribunal Constitucional, pelo Acórdão n.° 407/97 decidiu que seria
inconstitucional uma interpretação que não impusesse que o auto de intercepção e
gravação de conversações telefónicas fosse imediatamente lavrado após toda a
escuta efectuada e levado ao conhecimento do juiz, com a necessária transcrição
das conversações efectuadas.
17 - A justificação para a imediação na apresentação das escutas ao juiz,
consagrada pelo legislador e defendida pelo Tribunal Constitucional é a de que o
juiz possa controlar atempadamente a necessidade do prosseguimento das escutas
por si determinadas.
18 - A consulta dos autos, revela que em momento algum, foram as gravações
ouvidas e seleccionadas pelo Juiz e foram mandadas transcrever pela PJ pela Juiz
sem as ouvir e seleccionar.
19 - Ora o porquê da prorrogação dos prazos de intercepção telefónica, sem
controlo judicial prévio do resultado da intercepção anterior?
20 - É assim inevitável considerar nulas as transcrições das fis dos autos e dos
apensos por não terem sido asseguradas com o adequado controlo judicial.
21 - O Juiz de Instrução autorizou prorrogações sem previamente ter acautelado o
acesso aos elementos que lhe permitiriam ajuizar da necessidade e adequação da
subsistência de um tal meio de prova, em desrespeito, pois, dos normativos
inseridos nos art°s. 118°/3, 112°,188° e 189° do CPP, bem como as normas
constitucionais insertas nos art°s. 18°, 34° e 37° da CRP.
22 - E decisivo que se verifique, e os autos a documentem, uma intervenção
judicial substancial (e não um mero tabelionato) no controlo da efectivação de
um delicado meio de prova, como são as escutas telefónicas.
23 - Tal nunca sucedeu, mais uma prova da falta de controlo jurisdicional.
24 - O desrespeito da Lei, salvo o devido respeito por opinião diversa, é
evidente, uma vez que se juntaram aos autos transcrições, sem que algum Juiz
houvesse previamente analisado o seu conteúdo e concluído no sentido do seu
interesse para o processo (neste sentido douto Acórdão do Tribunal da Relação de
Coimbra, de 16 de Agosto de 2001).
25 - A consequência de tal omissão só poderá fazer concluir pela inexistência de
supervisão judicial das escutas.
26 - Assim e para garante constitucional dos direitos fundamentais, tal situação
acarreta a nulidade absoluta, uma vez que constitui método proibido de prova em
flagrante violação dos artes. 18°, 32° n°. 6, 34º e 37º todos da C.R.P. e
nulidade insanável, art. 119° al. e) do CPP, uma vez que todos os actos foram
praticados pela PJ e não pela Juiz, existindo invasão pela PJ de competência
exclusivamente judiciais, sendo violados os art°s. 269° al. a) e d), 187°, 190º,
188°, 189°, 118°/3 e 122°, todos do CPP.
27 - Não houve supervisão jurisdicional das escutas realizadas a partir dos
postos de escuta, na medida em que se não mostra ter sido ouvida pelo M. Jic
qualquer cassete contendo elementos de prova recolhidos a partir da audição das
fitas magnéticas com as conversações interceptadas.
28 - Não se consigna em lado algum que foram ouvidas as intercepções telefónicas
pela J.I.C., não existe o respectivo auto.
29 - Atendendo a que o M. Juiz se limitou a ordenar a junção nos termos
sugeridos pelos Senhores Agentes da PJ unicamente obedeceu ao critério escolhido
pela entidade policial, não tendo sido respeitado o nº 3 do art° 188°, nem o
prazo consignado no n° 1 daquele artigo.
30 - Não houve supervisão jurisdicional atempada das escutas telefónicas,
constatando-se que toda a iniciativa e verificação do interesse de matéria
interceptada ficou a cargo dos elementos da PJ, o que não se coaduna com o
vertido no art° 188° nº 1-3 do C.P.P..
31 - Não resultaram pois as transcrições da selecção feita pelo M. JIC, mas sim
pela PJ, pelo que se está perante acto jurisdicional levado a cabo por quem não
está investido desse poder, pelo que tal acto terá de ser considerado
inexistente.
32 - Consequentemente não deverão as gravações dessas cassetes referentes aos
registos magnéticos ser valoradas pelo Tribunal.
33 - Já o mesmo se não passará quanto à selecção pela PJ, através da
transcrição, das partes das gravações que continham elementos relevantes para os
autos, estamos perante a prática de um acto jurisdicional por quem não está
investido nesse poder, pelo que devemos considerar esse acto como juridicamente
inexistente.
34 - Daqui resulta que as transcrições das gravações constantes das escutas
devem ser consideradas inexistentes, não podendo, pois, ser valorado o seu
conteúdo, através das intercepções.
35 - Exigindo a lei que o JIC efectue uma selecção entre as gravações efectuadas
dos elementos relevantes para a prova e que só esses elementos sejam valorados,
procedendo-se à destruição do demais, de modo a não se verificar uma devassa
desnecessária da vida privada dos escutados, não tendo sido efectuada essa
selecção, não pode o Tribunal utilizar em julgamento, como meio de prova, as
gravações sem terem sido previamente seleccionados pelo órgão competente sob
pena de se verificar essa devassa injustificada da vida privada.
36 - A lei processual no art. 188°, do C.P.P., consignou que os resultados das
intercepções telefónicas para serem valorados, como meio de prova, deveriam ser
transcritos em auto, restrito apenas às conversações consideradas relevantes
pelo JIC.
37 - Não o tendo sido (uma vez que a forma como o foram deve ser considerada
juridicamente inexistente), não podem essas gravações ser valoradas sem que
tenha sido efectuada essa selecção.
38 - O Tribunal «a quo» fez errada interpretação das normas contidas no art.
187° do C.P.P. quanto à não fundamentação do despacho a autorizar a intercepção
dos postos telefónicos, designadamente para se aferir da necessidade ou não da
intromissão nos postos telefónicos e também errada interpretação das normas
contidas no art. 188°, quanto às condições previstas naquele artigo referente
aos elementos recolhidos através da intercepção das postos telefónicos, em que o
M. JIC, não supervisionou, nem seleccionou os elementos relevantes para a prova,
nem os apreciou para aferir da necessidade de prosseguimento das escutas.
39 - Também não foi de imediato, lavrado auto e levado ao seu conhecimento, as
mesmas escutas, tendo sido violados os princípios constitucionais, art. 32-8,
34-1-4 e 18-2 da C.R.P.
40 - A arguição da nulidade revista no art. 189°, por inobservância do
preceituado no art. 187°, 188°, haverá de ser considerada atempada
consubstanciando a proibição de prova prevista no n° 3 do art. 126° CPP, e
acarretando a nulidade da prova através daquela obtida, nulidade que, de um
lado, implica a impossibilidade da sua utilização e, de outro, a destruição de
todo o processado posterior.
41 – O Meritíssimo Juiz deve tomar conhecimento das gravações efectuadas e só
depois face à ponderação destas e ordenada a sua junção, deverá prorrogar o
prazo de intercepção e fundamentar essa prorrogação, o que não foi o caso,
conforme despachos.
42 - Não houve supervisão jurisdicional das escutas realizadas a partir dos
postos de escuta, na medida em que se não mostra ter sido ouvida pelo M. JIC
qualquer cassete contendo elementos de prova recolhidos a partir da audição das
fitas magnéticas com as conversações interceptadas, nem consta nenhum auto de
junção das fitas magnéticas para serem ouvidas, seleccionadas e ordenada a
destruição do que não interessa.
43 - Atendendo a que o M. Juiz se limitou a ordenar a junção nos termos
sugeridos pelos Senhores Agentes da PJ unicamente obedeceu ao critério escolhido
pela entidade policial, não tendo sido respeitado o n° 3 do art. 188°, nem o
prazo consignado no n° 1 daquele artigo.
44 - Não houve supervisão jurisdicional atempada das escutas telefónicas,
constatando-se que toda a iniciativa e verificação do interesse de matéria
interceptada ficou a cargo dos elementos da Polícia Judiciária, o que não se
coaduna com o vertido no art. 188° n° 1-3 do C.P.P.
45 - Não resultaram pois as transcrições da selecção feita pelo M. JIC, mas sim
pela PJ, pelo que se está perante acto jurisdicional levado a cabo por quem não
está investido desse poder, pelo que tal acto terá de ser considerado
inexistente.
46 - Consequentemente não deverão as gravações dessas cassetes referentes aos
registos magnéticos ser valoradas pelo Tribunal, porque as normas que
consideraram válidas aqueles registos magnéticos fizeram uma errada
interpretação dos princípios constitucionais violadores dos arts. 34º, 32°-8 e
205° da C.R.P.
47 - Considerando que toda a iniciativa e verificação do interesse da matéria
interceptada ficou a cargo exclusivo dos elementos da PJ, as quais não foram de
imediato apresentadas ao M. Juiz, entende-se que as escutas realizadas aos
postos telefónicos são nulas e consequentemente nulo o valor das provas obtidas
mediante o recurso às mesmas, pelo que o Tribunal «a quo» fez errada
interpretação das normas contidas no art. 189°, conjugado com o art. 126°-6 do
C.P.P., violadora dos princípios constitucionais, nos termos dos artigos 34°,
32°-8 da C.R.P.
48 - Deve considerar-se inconstitucional por violação das disposições conjugadas
dos arts. 32°-8, 34°-1-4 e 18° da C.R.P., a norma constante do art. 188° n° 1 do
C.P.P., na redacção à altura, quando interpretada no sentido de não impor que o
auto de intercepção e gravação de conversações telefónicas, seja de imediato
lavrado e, levado ao conhecimento do Juiz e que, autorizada a intercepção e
gravação por certo período, seja concedida a autorização para a sua continuação,
sem que o Juiz tome conhecimento do resultado anterior. Neste sentido Ac. do
Trib. Const. 10 J/01, 1ª Secção, Proc. 299/01.
49 - A arguição de nulidade prevista no art. 189°, por inobservância do
preceituado no art. 187° e 188°, haverá de ser considerada atempada,
consubstanciando a proibição de prova prevista no n° 3 do art. 126°, e
acarretando a nulidade da prova através daquela obtida, nulidade que, de um
lado, implica a impossibilidade da sua utilização e, de outro, a destruição de
todo o processado posterior.
50 - Assim sendo, considerando que todo a iniciativa e verificação do interesse
da matéria interceptada ficou a cargo exclusivo dos elementos da Polícia
Judiciária, até fls. as quais não foram de imediato apresentadas ao M. Juiz,
entende-se que as escutas realizadas aos postos telefónicos são nulas e
consequentemente nulo o valor das provas obtidas mediante o recurso às mesmas,
nos termos dos artigos 34°, 32°-18 da C.R.P. e 189° e 126° do C.P.P.
51 - A não se entender desta forma, deve considerar-se inconstitucional por
violação das disposições conjugadas dos arts. 32° - 8, 34º - 1- 4 e 18° da
C.R.P., a norma constante do art° 188° nº 1 do C.P.P., quando interpretada no
sentido de não impor que o auto de gravação de conversações telefónicas, seja de
imediato lavrado e levado ao conhecimento do Juiz e que, autorizada a
intercepção e gravação por certo período, seja concedida autorização para a sua
continuação, sem que o Juiz tome conhecimento do resultado anterior.
Neste sentido Ac. do Trib. Constitucional 10/01, 1ª Secção, Proc. 299/01.
52 - Devem julgar-se juridicamente inexistentes os autos de transcrição das
gravações telefónicas, não podendo ser valoradas como elemento de prova.
53 - A não se entender desta forma, o Tribunal fez errada interpretação do art°
189° por não cumprimento do art° 187° e 188° do C.P.P., sendo violados os
princípios consignados nos arts. 26°, n° 1 e 32°, nº 6, da C.R.P..”.
54 - A PJ demorou imenso tempo a apresentar os resultados das escutas
telefónicas em juízo bem como as transcrições, se algumas delas demoraram dias
outras demoram um mês a um mês e meio bem como meses.
55 - O art. 188° do CPP contém um dispositivo que todos conhecemos. A questão
tem residido na interpretação da palavra “imediatamente”.
E a este respeito o arg°. apenas diz que, consultado qualquer dicionário e
raciocinando de boa fé, nunca poderemos aceitar que “imediatamente” seja o tempo
que demorou.
Tanto bastará.
Assim, tem entendido a melhor e mais recente jurisprudência sobre o assunto, sem
esquecer dois acórdãos do próprio Tribunal Constitucional.
56 - As consequências de preterição das formalidades ínsitas no art. 188° do CPP
desencadeia as nulidades referidas no n° 3 do art. 126° do CPP sendo
inconstitucional qualquer interpretação do art. 188° do CPP que não imponha que
o auto de intercepção e gravação de conversações telefónicas seja, de imediato,
lavrado e levado ao conhecimento do Juiz de modo a este poder decidir
atempadamente sobre a junção ao processo ou destruição, etc... — Acórdão do
Tribunal Constitucional n° 407/97 exarado no processo n° 649/96 da 2 Secção.
57 - E flagrante o não respeito pelo princípio do imediatismo.
Aliás confirmada pela Juiz no despacho de que se recorre ao referir que “em
5.04.2001 foi ainda autorizada, por 60 dias a intercepção telefónica referente
aos números 44.44444444, 55.5555555,66.6666666, 77.7777777, 24.0000000,
99.9999999, 10.0000000, 11.0000000 e 12.0000000, bem como dos imeis referidos a
fls. 123” e que “em 21 de Abril de 2001 foram apresentadas as transcrições das
intercepções telefónicas, referentes aos números 44.4444444,
55.5555555,66.6666666, 77.7777777, 24.0000000, 99.9999999, 10.0000000, as quais
foram validadas por despacho judicial de 11 Maio de 2001 (fls. 329 a 416 e
614)”.
58 - A interpretação a dar à expressão imediatamente no contexto das finalidades
das operações telefónicas, terá de ser outra que, não aquela que foi dada pelo
Despacho de Pronúncia e pelo Acórdão de que ora se recorre.
Terá de ser aquela que já foi dada, quer por esse Tribunal, Rec. 347/01, 407/97,
quer do STJ, proc. 111145/98- 5ª Secção;
59 - Resulta claramente, que a interpretação dada pela Exma. J.I.C. e pelo
Tribunal da Relação de Lisboa, quanto ao segmento da norma do n° 1 do art° 188°
do C.P.P., é inconstitucional por violação do art° 32° nº 1 e n° 6 e art°
34°-1-4 da C.R.P..
60 - Consequentemente, deverá ser declarada inconstitucional e, em consequência
declararem-se inválidos todos os actos que dependerem das intercepções
telefónicas realizadas conforme arts. 122 e 189° do C.P.P..
61 - Trata-se aqui de precisar o conteúdo constitucionalmente viável do trecho
do artigo 188° n° 1 do CPP, onde surge a expressão «imediatamente». Ora,
partindo do pressuposto consubstanciado na proibição de ingerência nas
telecomunicações, resultante do nº 4 do artigo 34º da Lei Fundamental, a
possibilidade de ocorrer diversamente (de existir ingerência nas
telecomunicações), no quadro de uma previsão legal atinente ao processo criminal
(a única constitucionalmente tolerada), carecerá sempre de ser compaginada com
uma exigente leitura à luz do princípio da proporcionalidade, subjacente ao
artigo 18 nº 2 da Constituição, garantindo que a restrição do direito
fundamental em causa (de qualquer direito fundamental que a escuta telefónica,
na sua potencialidade danosa, possa afectar) se limite ao estritamente
necessário à salvaguarda do interesse constitucional na descoberta de um
concreto crime e punição do seu agente.
62 - Nesta ordem de ideias, a imediação entre o juiz e a recolha da prova
através da escuta telefónica, aparece como o meio que melhor garante que uma
medida com tão específicas características se contenha nas apertadas margens
fixadas pelo texto constitucional.
63 - O actuar desta imediação, potenciadora de um efectivo controlo judicial das
escutas telefónicas, ocorrerá em diversos planos, sendo um deles o que pressupõe
uma busca de sentido prático para a obrigação de levar «imediatamente» ao juiz o
auto da intercepção e “fitas gravadas ou elementos análogos”, de que fala a lei.
64 - Ora, já se indicou que o critério interpretativo neste campo não pode
deixar de ser aquele que assegure a menor compressão possível dos direitos
fundamentais afectados pela escuta telefónica. Também já se assentou – e importa
lembrá-lo de novo – que a intervenção do juiz é vista como uma garantia de que
essa compressão se situe nos apertados limites aceitáveis e que tal intervenção,
para que de uma intervenção substancial se trate (e não de um mero tabelionato),
pressupõe o acompanhamento da operação de intercepção telefónica. Com efeito, só
acompanhando a recolha de prova, através desse método em curso, poderá o juiz ir
apercebendo os problemas que possam ir surgindo, resolvendo-os e, assim,
transformando apenas em aquisição probatória aquilo que efectivamente pode ser.
Por outro lado, só esse acompanhamento coloca a escuta a coberto dos perigos -
que sabemos serem consideráveis – de uso desviado.
65 - Com isto, não se quer significar que toda a operação de escuta tenha de ser
materialmente realizada pelo juiz. Contrariamente a tal visão maximalista, do
que aqui se trata é, tão só, de assegurar um acompanhamento contínuo e próximo
temporal e materialmente da fonte (imediato, na terminologia legal),
acompanhamento esse que comporte a possibilidade real de em função do decurso da
escuta ser mantida ou alterada a decisão que a determinou.
66 - Refere-se ainda o Acórdão a dificuldades práticas que a situação é
susceptível de criar (“Sabemos, isso sim, que a Polícia Judiciária como muitos
outros departamentos do Estado, nos quais se incluem os tribunais, seguramente
carece, cronicamente, de meios técnicos e humanos que lhe não permitem cumprir,
muitas vezes, as suas tarefas em tempo normal”) moldando, no que não deixa de
ter um certo sentido correctivo, o conceito de «imediatamente» (“usado por um
legislador excessivamente preocupado com a aceleração processual, porém
esquecido das grandes lacunas e dos grandes estrangulamentos do sistema”) ao que
qualifica de entendimento “em termos hábeis”. A saber: aquele em que
«imediatamente» equivale a «no tempo mais rápido possível». Ora, o “mais rápido
possível” significou aqui longos períodos de tempo em que as escutas não foram
acompanhadas (= a controladas) pelo juiz e, mais ainda, espaços muito
significativos de tempo em que as escutas já haviam terminado e o processo
continuava sem ter qualquer conhecimento do seu teor (vejam-se as conclusões 2ªe
4ª de fls. 4 v°, tendo-se presente que as datas aí indicados obtêm confirmação
nos autos).
67 - É a teorização interpretativa que sufraga esta situação que de modo algum
se pode ter por conforme ao disposto no artigo 34° nº 4 da Constituição, lido à
luz do princípio da proporcionalidade. Se é certo que se não podem ignorar, pura
e simplesmente, os aspectos práticos de uma situação, designadamente as
dificuldades técnicas que esta ou aquela opção interpretativa possa ocasionar,
não é menos verdade que o ónus dessas dificuldades técnicas, num processo crime,
sempre correrá por conta do Estado (a quem compete ultrapassá-las) jamais por
conta do arguido.
68 - Trata-se, pois, de fixar a interpretação constitucionalmente conforme do
artigo 188° nº 1 do CPP no segmento em que se insere a expressão
«imediatamente», sendo certo ser tal expediente possível ainda nos limites da
interpretação.
69 - Assim sendo, «imediatamente» não poderá, desde logo, reportar-se apenas ao
momento em que as transcrições se mostrarem feitas (pois ficaria aberto o
caminho à existência de largos períodos de falta de controlo judicial à escuta
sempre que a transcrição se atrasasse). Em qualquer dos casos, «imediatamente»,
no contexto normativo em que se insere, terá de pressupor um efectivo
acompanhamento e controlo da escuta pelo juiz que a tiver ordenado, enquanto as
operações em que esta se materializa decorrerem. De forma alguma «imediatamente»
poderá significar a inexistência, documentada nos autos, desse acompanhamento e
controlo ou a existência de largos períodos de tempo em que essa actividade do
juiz não resulte do processo.
70 - Em qualquer caso, tendo em vista os interesses acautelados pela exigência
de conhecimento imediato pelo juiz, deve considerar-se inconstitucional, por
violação do n° 6 do artigo 32° da Constituição, uma interpretação do n° 1 do
artigo 188° do CPP que não imponha que o auto de intercepção e gravação de
conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao
conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção
ao processo ou a destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e bem
assim, também atempadamente, a decidir, antes da junção ao processo de novo auto
de escutas posteriormente efectuadas, sobre a manutenção ou alteração da decisão
que ordenou as escutas.
É esta, exposta com a minúcia possível, a interpretação conforme à Constituição.
A ela importa vincular o intérprete – “juiz incluído” como este Tribunal tem
repetidamente referido em situações onde faz uso deste recurso interpretativo”.
[. . .]
71 - Por sua vez, no Acórdão n° 347/01, decidiu o Tribunal Constitucional, na
parte que ora importa, “julgar inconstitucional, por violação das disposições
conjugadas dos artigos 32° n° 8, 34° n°s 1 e 4 e 18° nº 2 da Constituição, a
norma constante do artigo 188°, nº 1 do Código de Processo Penal, na redacção
anterior à que foi dada pela Lei n° 59/98, de 25 de Agosto, quando interpretada
no sentido de não impor que o auto da intercepção e gravação de conversações e
comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do
juiz”. Para concluir desta forma escudou-se aquele aresto na seguinte
fundamentação:
Entre nós, só com o CPP de 1987 o legislador se propôs enunciar os princípios
gerais do regime processual penal das escutas telefónicas, nos artigos 187° e
seguintes, mas de modo algum se poderá entender que em tais normas se contempla
um quadro exaustivo de regulamentação legal positiva abrangente, o que desde
logo resulta evidente em matéria do dever de sigilo a que ficam obrigados todos
os que intervenham nas operações materiais de transcrição (cfr., nomeadamente,
os artigos 101° e 86° do CPP).
Os tribunais superiores portugueses têm sido chamados a pronunciar-se sobre a
problemática das escutas telefónicas e, em particular, sobre as normas dos
artigos 187° e 188° do CPP, podendo dizer-se que, em geral, tal jurisprudência
interpreta o inciso “imediatamente” constante do artigo 188°, nº 1 do CPP no
sentido que foi seguido nos presentes autos pelo Tribunal da Relação de Lisboa
(cfr, a título exemplificativo, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de
29.10.1998, in BMJ nº 480, 1998, pág. 292).
72 - A questão também não é nova para o Tribunal Constitucional, que se
pronunciou sobre a constitucionalidade da norma constante do artigo 188°, n°. 1
do CPP no Acórdão n° 407/97 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional 37° vol.
pp. 245 e segs.).
73 - Sendo certo que a norma do artigo 32°, n° 1 da CRP, ao assegurar “todas as
garantias de defesa”, pode ser fonte autónoma de direitos dos arguidos, na
medida em que naquela expressão se englobam “todos os direitos e instrumentos
necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a
acusação (Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República
Portuguesa Anotada, 3 edição, pág. 202), a verdade é que, para a apreciação do
caso sub judicio, aquela norma, como parâmetro de constitucionalidade, é
“consumida” pelas que constam do no 8 do mesmo artigo e dos n°s 1 e 4 do artigo
34° da CRP, consagrando expressamente a nulidade de todas as provas obtidas
mediante “abusiva intromissão (…) nas telecomunicações”, a inviolabilidade do
sigilo da correspondência “e dos outros meios de comunicação privada” e a
proibição da “ingerência das autoridades públicas (..) nas telecomunicações
(...) salvo os casos previstos na lei em matéria de processo penal’.
74 - Ora, no citado Acórdão no 407/97, a que – diga-se desde já – inteiramente
se adere, estava também em causa a interpretação do inciso “imediatamente” do
artigo 188° n° 1 do CPP (na redacção anterior à que resultou da Lei n° 59/98, de
25 de Agosto) que na decisão então recorrida comportaria, sem infracção
constitucional, a junção aos autos do auto de transcrição das escutas
efectuadas, quatro e seis meses depois da data da intercepção e gravação.
75 - Sempre apelando para a ponderação a que necessariamente se tem de operar
entre os sacrifícios ou perigos que a escuta telefónica implica e os interesses
mais relevantes da perseguição penal, particularmente difícil em matéria de
tráfico de estupefacientes – a tensão dialéctica entre os direitos individuais
de defesa do arguido e o “ius puniendi’ do Estado – o Acórdão n° 407/97 do
Tribunal Constitucional acolhe as seguintes ideias-chave:
a) Consagrada constitucionalmente a proibição de ingerência nas telecomunicações
(artigo 34° nº 4 da CRP), a possibilidade de existir essa ingerência no quadro
do que é constitucionalmente tolerado (“matéria de processo criminal’) impõe que
ela seja “compaginada com uma exigente leitura à luz do princípio da
proporcionalidade, subjacente ao artigo 18° nº 2 da Constituição’.
b) A restrição do direito fundamental em causa deve, assim, limitar-se “ao
estritamente necessário à salvaguarda do interesse constitucional na descoberta
de um concreto crime e punição do seu agente’
c) “A imediação entre o juiz e a recolha da prova através da escuta telefónica
aparece como o meio que melhor garante que uma medida com tão específicas
características se contenha nas apertadas margens fixadas pelo texto
constitucional’
d) A garantia que representa a intervenção do juiz “pressupõe o acompanhamento
da operação de intercepção telefónica”
e) Não se impondo que a escuta seja materialmente realizada pelo juiz, deve
assegurar-se “um acompanhamento contínuo e próximo temporal e materialmente da
fonte (imediato na terminologia legal), acompanhamento que comporte a
possibilidade real em função do decurso da escuta ser mantida ou alterada a
decisão que a determinou’
f) A expressão “imediatamente” “não poderá (...) reportar-se apenas ao momento
em que as transcrições se mostrarem feitas (pois ficaria aberto o caminho à
existência de largos períodos de falta de controlo judicial à escuta sempre que
a transcrição se atrasasse)’
g) Pressupondo aquela expressão (“imediatamente”) um efectivo acompanhamento e
controlo da escuta pelo juiz que a tiver ordenado enquanto as operações
decorrerem, ela não poderá significar “a inexistência, documentada nos autos,
desse acompanhamento e controlo ou a existência de largos períodos de tempo em
que essa actividade do juiz não resulte do processo”
76 - Ora, no caso dos autos, a norma do artigo 188° nº 1 do CPP, com a
interpretação acolhida no acórdão impugnado, não se isenta do mesmo vício de
inconstitucionalidade.
77 - Na verdade, fazer equivaler o inciso “imediatamente” “ao tempo mais rápido
possível’, em termos de “cobrir” situações como a de o auto de transcrição ser
apresentado ao juiz meses depois de efectuadas a intercepção e gravação das
comunicações telefónicas, mesmo tendo em conta a gravidade do crime investigado
e a necessidade daquele meio de obtenção da prova, restringe
desproporcionadamente o direito à inviolabilidade de um meio de comunicação
privada e faculta uma ingerência neste meio para além do que se considera ser
constitucionalmente admissível.
78 - Ficar no desconhecimento do juiz, durante tal lapso de tempo, o teor das
comunicações interceptadas, significa o desacompanhamento próximo e o controlo
judiciais do modo como a escuta se desenvolve, o que se entendeu no citado
Acórdão n° 407/97 – como aqui se entende – colidir com os interesses acautelados
pela exigência de conhecimento imediato pelo juiz. E impede, ainda, a
destruição, em tempo necessariamente breve, dos elementos recolhidos sem
interesse relevante para a prova, a que, só por si, não obsta a fixação pelo
juiz de um prazo para a intercepção, no termo da qual esta deve findar.
79 - E certo que, tal como a decisão recorrida no Acórdão no 407/97, o Despacho
impugnado faz apelo às dificuldades práticas – a reconhecida carência de meios
técnicos e humanos – para justificar o entendimento dado ao referido inciso
“imediatamente”, num quadro de exigências de repressão da criminalidade grave,
praticada por redes altamente organizadas.
A esse argumento se respondeu, ainda no Acórdão n° 407/97, em termos que também
aqui se acolhem, que tais dificuldades constituem, num processo crime, ónus do
Estado de direito democrático, ónus que não pode estar a cargo do arguido, ainda
que, no limite, isso signifique deixar impunes alguns criminosos. Não é de todo
admissível num Estado de Direito democrático, caracterizado pela publicização do
“ius puniendi”, fazer reverter contra o arguido o ónus da escassez de meios e
dificuldades na obtenção de prova para o condenar.
80 - Note-se que na nova redacção dada ao artigo 188° (em especial, no nº 3)
pela Lei no 59/98 (actualmente pelo Decreto-Lei no 320-C/2000, de 15 de
Dezembro) se procurou obviar às alegadas dificuldades de transcrição imediata
dos elementos recolhidos, pois esta só será judicialmente ordenada depois de o
juiz considerar tais elementos relevantes para a prova'.[...]
81 - Assim sendo, verifica-se que a jurisprudência do Tribunal Constitucional
atrás referida, que, como se salientou já, mantém inteira validade e a que aqui
integralmente se adere, conduz a que, também no caso dos autos, tenha de
considerar-se inconstitucional a interpretação do nº 1 do artigo 188° do Código
de Processo Penal, na redacção anterior à que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº
320-C/2000, de 15 de Dezembro, que foi acolhida pela decisão recorrida. Com
efeito, entender que situações como as que ocorreram no presente processo em
que os autos de intercepção e gravação de conversações telefónicas que tinham
sido entretanto autorizadas só foram levados ao conhecimento do juiz que as
ordenou vários dias depois de elas terem tido início – são ainda abrangidas pela
expressão imediatamente, colide frontalmente com os interesses que se pretendem
acautelar com aquela exigência, na medida em que impede o seu acompanhamento
próximo pelo juiz.
82 - Resta apenas acrescentar, de modo semelhante ao que se fez nos acórdãos
deste Tribunal citados supra, que o Tribunal Constitucional somente tem poderes
para verificar a constitucional idade de normas, situando-se já fora do âmbito
da sua intervenção retirar as consequências da interpretação da norma com o
sentido apontado. Isto significa que é ao tribunal recorrido que compete
reformar a sua decisão em conformidade com o presente juízo de
constitucionalidade, extraindo dele as consequências pertinentes ao nível do
direito infraconstitucional e do concreto processo crime em causa.
83 - O M. Juiz ao não ter fundamentado nos despachos, fez errada interpretação
das normas contidas no artº 97° nº 4 e 187° nº 1 do C.P.P., por violação do
dever de fundamentação – artº 205° nº 1 e direito ao recurso, artº 32° nº 1 da
C.R.P., pelo que nos termos supra referidos e do artº 189° são nulos, sendo
consequentemente as escutas dependentes desses despachos.
84 - O douto acórdão infringiu assim a Constituição da República Portuguesa, ao
recusar aplicar legislação obrigatória.
85 – Pretende‑se com o presente Recurso ver aplicada a inconstitucionalidade da
norma do art. 188° n° 1 e 3 do CPP ou da mesma norma com a interpretação com que
foi aplicada na decisão recorrida, isto é, quando não imponha que o auto de
gravação e transcrição de escutas telefónicas seja de imediato lavrado e levado
ao conhecimento do juiz, e não passados mais de 30 dias como aconteceu nos
autos; quando não imponha que autorizada a intercepção e gravação por
determinado período, seja concedida autorização para a sua continuação sem que o
juiz tome conhecimento do resultado anterior, o que sucedeu nos presentes autos,
e mais grave ainda, em momento algum, foram as escutas telefónicas vistas e
seleccionadas pela Juiz; quando não imponha que seja o juiz, com exclusão de
qualquer outra entidade, a seleccionar quais as escutas relevantes a serem
juntas aos autos e quais as irrelevantes a serem destruídas, o que sempre imporá
o visionamento prévio das escutas, antes de serem juntas aos autos as
transcrições, pelo juiz, independentemente das sugestões e coadjuvações de quem
quer que seja e que materialize esse seu acto em auto de visionamento, uma
espécie de “termo de responsabilidade”, um vez que é uma situação processual em
que não se pode presumir que tal tenha acontecido, ou aconteceu ou não
aconteceu; é a materialização por parte do juiz de que efectivamente ouviu, viu,
seleccionou e ordenou junção aos autos das transcrições das escutas, da prova
recolhida e com interesse probatório, o verdadeiro e exclusivo garante do
efectivo acompanhamento judicial das escutas telefónicas, e que dá tranquilidade
ao cidadão.
86 - O presente recurso é ainda interposto ao abrigo da alínea g) do nº 1 do
art. 70º da Lei n° 28/82 de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei nº 85/89,
de 7 de Setembro, e pela Lei n° 13-A/98, de 26 de Fevereiro.
87 - O Tribunal “a quo” aplicou a referida norma, artigo 188° n°. 1 e 3 do CPP,
com um sentido, já anteriormente julgado inconstitucional pelo TC, nos acórdãos
n°s. 407/97, 347/01 e 582/02.
88 - A interpretação feita pelo tribunal “a quo” da norma anteriormente
referida, não pode ser tida como em acordo com a já efectuada pelo TC. Não há
correspondência entre o raciocínio que serviu de base do não provimento total do
recurso.
Nestes termos, deve ser julgada inconstitucional, por violação do disposto no nº
6 do art. 32° da Constituição, a norma do nº 1 do art. 188° do CPP, quando
interpretada em termos de não impor que o auto de intercepção e gravação de
conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato lavrado e levado ao
conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção
ao processo ou a destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e, bem
assim, também atempadamente, decidir, antes da junção ao processo de novo auto
da mesma espécie, sobre a manutenção ou alteração da ‘decisão que ordenar as
escutas.
Nestes termos, deve também ser julgada inconstitucional por violação das
disposições conjugadas dos arts. 32° - 8, 34 - 1- 4 e 18° da C.R.P., a norma
constante do art° 188° nº 1 do C.P.P., quando interpretada no sentido de não
impor que o auto de gravação de conversações telefónicas, seja de imediato
lavrado e levado ao conhecimento do Juiz e que, autorizada a intercepção e
gravação por certo período, seja concedida autorização para a sua continuação,
sem que o Juiz tome conhecimento do resultado anterior.
Nestes termos, deve ainda ser julgada inconstitucional, por violação das
disposições conjugadas dos artigos 32° nº 8, 34º nºs 1 e 4 e 18° nº 2 da
Constituição, a norma constante do artigo 188°, nº 1 do Código de Processo
Penal, na redacção anterior à que foi dada pela Lei no 59/98, de 25 de Agosto,
quando interpretada no sentido de não impor que o auto da intercepção e gravação
de conversações e comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado
ao conhecimento do juiz.
Nestes termos, deve por fim ser julgada inconstitucional norma do art. 188°. N°.
1 e 3 do CPP ou da mesma norma com a interpretação com que foi aplicada na
decisão recorrida, isto é, quando não imponha que o auto de gravação e
transcrição de escutas telefónicas seja de imediato lavrado e levado ao
conhecimento do juiz, e não passados mais de 30 dias como aconteceu nos autos;
quando não imponha que autorizada a intercepção e gravação por determinado
período, seja concedida autorização para a sua continuação sem que o juiz tome
conhecimento do resultado anterior, o que sucedeu nos presentes autos, e mais
grave ainda, em momento algum, foram as escutas telefónicas vistas e
seleccionadas pela Juiz; quando não imponha que seja o juiz, com exclusão de
qualquer outra entidade, a seleccionar quais as escutas relevantes a serem
juntas aos autos e quais as irrelevantes a serem destruídas, o que sempre imporá
o visionamento prévio das escutas, antes de serem juntas aos autos as
transcrições, pelo juiz, independentemente das sugestões e coadjuvações de quem
quer que seja e que materialize esse seu acto em auto de visionamento, uma
espécie de “termo de responsabilidade”, um vez que é uma situação processual em
que não se pode presumir que tal tenha acontecido, ou aconteceu ou não
aconteceu; é a materialização por parte do juiz de que efectivamente ouviu, viu,
seleccionou e ordenou junção aos autos das transcrições das escutas, da prova
recolhida e com interesse probatório, o verdadeiro e exclusivo garante do
efectivo acompanhamento judicial das escutas telefónicas, e que dá tranquilidade
ao cidadão.
Finalmente devem V. Exas. considerar que o Tribunal “a quo” aplicou a referida
norma, artigo 188° nº 1 e 3 do CPP, com um sentido, já anteriormente julgado
inconstitucional pelo TC, nos acórdãos n°s. 407/97, 347/01 e 582/02 e que a
interpretação feita pelo tribunal “a quo” da norma anteriormente referida, não
pode ser tida como em acordo com a já efectuada pelo TC
Fazendo-se assim a costumada JUSTIÇA
Os recursos relativos ao prazo de recurso interposto pelos recorrentes
(recursos também iguais) foram por seu turno concluídos do seguinte modo:
1 - O arg°. em 7 Março 2003 — 6ª. Feira requereu por o recurso a ir ser
interposto teria por objecto a reapreciação de prova gravada que ao prazo de 15
dias para a interposição de o recurso fixado no art. 411° n°1 do CPP seja
acrescido de 10 dias, por força do disposto no art. 698° n. 6 do C.P.Civil e
pelas razões apontadas nos Acs. R.C., 20/09/2000, C.J., IV, 49 e R.P.,
16/01/2002, C.J.,1,225.
2 - Após consulta dos autos no dia 17 Março 2003 – 2ª. Feira, pelas 11H o
signatário verifica que consta nos mesmos um despacho de indeferimento do
requerimento de 7 Março de 2003, o qual só foi notificado umas horas mais tarde
via fax, após 10 dias do seu requerimento e a um dia do prazo de 15 dias da
entrega da interposição e motivação do recurso.
3 - O signatário só no dia 17.03.2003 foi buscar ao Tribunal de Alenquer as 13
cassetes gravadas do julgamento, após seu telefonema, na 6ª feira, 14 Março
2003, por volta das 15h30, para o Tribunal de Alenquer, lhe terem dito que as
cassetes já estavam todas gravadas e que as podia ir levantar, face ao adiantado
da hora e por o signatário àquela hora se encontrar em Lisboa e a caminho do
EPCaxias, não foi possível ir buscar as cassetes. E de realçar que o signatário
não foi notificado que as cassetes estavam gravadas e que podia proceder ao seu
levantamento.
4 - Quis a Meritíssima Juiz “a quo” que o signatário ouvisse 13 cassetes de
lh30m cada, o que dá cerca de 19H30m e faça um recurso sobre matéria de facto
até ao dia 18 de Março 2003 – 3ª Feira, o mais tardar a ser entregue nos
correios de Cabo Ruivo – Lisboa até às 23h ou enviado via fax até às 23h59m. Se
isto não é prejudicar os direitos de defesa, designadamente o direito ao
Recurso, e dentro deste o Recurso sobre matéria de facto, o que será?
5 - O arg°. defende que beneficia do regime estabelecido no art° 698°, n° 6 do
C.P.Civil, por este se aplicar subsidiariamente ao processo penal.
6 - Regendo sobre a “integração de lacunas”, o art. 4° estabelece que nos casos
omissos, quando as disposições do CPPenaI se não puderem aplicar por analogia se
devem observar as normas do processo civil que se harmonizem com o processo
penal.
7 - Assim, desde logo urge determinar se, havendo recurso sobre a matéria de
facto onde se vise a reapreciação da prova gravada, existe lacuna no CPPenal,
quanto ao prazo de apresentação da respectiva motivação.
8 - No art. 411° nº 1 do CPPenal diz – se expressamente que o prazo de
interposição de recurso é de 15 dias, contados a partir da notificação da
decisão ou, tratando – se de sentença, do respectivo depósito na secretaria.
9 - E como meios de interposição do recurso, o nº 3 do 411º do CPPenal, prevê o
requerimento.
10 - Impõe o mesmo preceito legal que o requerimento de interposição de recurso
seja motivado, sob pena de rejeição, admitindo todavia, que a fundamentação do
recurso seja apresentada no prazo de 15 dias, quando este seja interposto por
declaração em acta.
11 - Face à regulamentação exposta, numa primeira e menos cuidada análise, ser –
se – ia levado a concluir pela inexistência de qualquer lacuna, quer no que
respeita ao prazo de interposição de recurso, quer no que toca ao prazo de
apresentação da respectiva motivação, sendo que este último só se mostra
autónomo em relação ao primeiro quando o recurso é interposto por meio de
declaração feita para a acta.
12 - Porém, entende – se que não é bem assim.
Confrontando os ditos preceitos legais com os que no CPCivil regulam matéria
idêntica – art°s. 685°, 687°, 698° e 743°, facilmente se conclui que o
legislador, no intuito inequívoco de imprimir celeridade ao processo penal
reuniu num só acto, aquilo que em processo civil se reporta por 2 actos
processuais distintos, a interposição do recurso e a apresentação das alegações.
13 - E não se diga que a motivação em processo penal e as alegações em processo
civil são coisas distintas. Pese embora o legislador lhes haja atribuído
denominação diferente – o legislador do processo penal reservou o termo
alegações” para a peça processual oral ou escrita onde os recorrentes e os
recorridos, em sede de audiência realizada no tribunal de recurso, expõem as
razões da tese que defendem –, é manifesta a identidade da sua natureza, ambas
consubstanciando a enunciação e o resumo dos fundamentos e razões de factos ou
de direito em que a parte funda a pretensão de ver alterada a decisão proferida
— cfr. Art. 412° do CPPenal e 690º do CPCivil.
14 - Havendo impugnação da decisão sobre matéria de facto, o legislador, no art.
690° A, nº 1 e 2 do CPCivil – redacção introduzida pelo DL n° 39/95, de 15/02,
para além de indicar as especificações a fazer pelo recorrente, sobre ele faz
incidir – quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na
apreciação das provas tenham sido gravados – o ónus de proceder à transcrição,
mediante escrito dactilográfico, das passagens da gravação em que constam os
elementos probatórios que, em seu entender, impõem decisão diversa da recorrida
quanto aos pontos de facto que reputa de incorrectamente julgados. E segundo o
n° 3 do mesmo art. incumbe à parte contrária, sem prejuízo dos poderes de
investigação do tribunal proceder, na contra – alegação que apresente, à
transcrição dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente.
15 - Ciente do dispêndio de tempo que essa tarefa implica e visando seguramente
que tal encargo não redundasse em arma beliscadora do direito de recurso, no
n°.6 do art. 698°, fez acrescer 10 (dez) dias ao prazo para a apresentação das
alegações, quando o recurso tiver por objecto a reapreciação de prova gravada.
16 - Também em processo penal e na sequência da Lei 59/98, de 25 de Agosto, se
institui o efectivo recurso sobre a matéria de facto, exigindo o art. 412° nº 3,
que o recorrente especifique os pontos de facto que considera incorrectamente
julgados – alínea a) – , as provas que impõem decisão diferente da recorrida –
alínea b) — (à semelhança do citado art. 690°. A, n° 1 do CPCivil) e ainda as
provas que devem ser feitas por referência aos suportes técnicos, havendo lugar
a transcrição.
17 - Preconizando, o entendimento de que quanto à realização da transcrição há
que fazer isso, subsidiário do regime do CPivil, impõem – se reconhecer que nos
recursos penais, tal como nos de natureza civil, subsistem, de forma manifesta e
bem mais premente, as razões que estiveram na base do alargamento do prazo para
apresentação das alegações instituído no art. 698° n° 6 do CPCIviI.
18 - A elaboração de um recurso em matéria de facto envolve, em regra,
considerável dispêndio de tempo e o prazo de recurso e motivação em processo
penal é bem mais curto do que o aqueles de que dispõe o recorrente em processo
civil para interpor e motivar o recurso. E no caso em apreço não é num dia que
se ouve 13 cassete de lH30m cada.
19 - Apesar do exposto, o CPPenal não contém norma que alargue o prazo de
apresentação de motivação, no caso de através do recurso se pretender a
reapreciação de matéria de facto, quando a prova tenha sido gravada e haja de
ser feita a transcrição.
20 - Não havendo razões para crer que o legislador do CPPenal tenha querido
adoptar regime diferente que, pelas razões apontadas, se traduziria em infundada
limitação do direito de recurso –, existe caso omisso, e não havendo no mesmo
Código disposição passível de aplicação analógica, o mesmo deve ser integrado
com a observância da norma do processo civil que versa sobre a matéria, desde
que esta se harmonize com o processo penal – art. 4°.
Atento o paralelismo estrutural das suas situações consideradas, não se vê por
que razões esta harmonia deva ser negada.
21 - Poderá objectar – se contra esta solução que a hipóteses em que a
apresentação da motivação é posterior à interposição do recurso são, como se
disse já, desvios à regra geral aqui vigente, que é, repete – se, da
simultaneidade da interposição da motivação
22 - Na verdade, porém, a interposição de recurso em processo penal
configura‑se, em regra, como um acto múltiplo, no sentido em que nele se contém,
não só a declaração de vontade de recorrer, mas também a apresentação dos
respectivos fundamentos. Interposição de recurso e apresentação da motivação
são, por imposição da lei, partes integrantes do mesmo acto e a preterição desta
regra determina a rejeição do recurso salvo no caso deste ser interposto por
declaração em acta.
23 - Se assim é, qualquer destas partes integrantes pode receber directamente na
sua regulamentação os contributos que para cada uma devam advir do CPCivil, por
via do art. 4°.
24 - E, coerentemente, cada uma dessas partes integrantes deverá receber também,
designadamente no tocante à sua tempestividade, as alterações que reflexamente
lhe são impostas por paralelas alterações introduzidas directamente na outra.
25 - Isto é, devendo a interposição do recurso e a apresentação da motivação ter
lugar simultaneamente, o acréscimo de prazo que o sistema legal permitir para a
apresentação da motivação – “ex vi” do art. 698° n° 6 do CPCivil – valerá
automaticamente para aquela interposição.
26 - Pelo exposto é de concluir que quando o recurso tenha por objecto a
reapreciação de prova gravada, esse prazo de 15 dias é acrescido de 10 (dez)
dias, por força do disposto no art. 698°, n° 4 e 6 do C.P. Civil.
27 - Deste modo o prazo para interposição de recurso do acórdão dos autos
terminaria não a 18 de Março 2003 – 3 feira mas a 28 de Março 2003 – 6ª feira.
28 - O despacho de que se recorre ao não acrescer ao prazo normal de 15 dias
para o recurso, os 10 dias viola as garantias de defesa do processo criminal
previstas no art. 32°, principalmente no seu nº 1 da Constituição da República
Portuguesa.
Neste artigo condensam – se os mais importantes princípios materiais do processo
criminal – a constituição processual criminal. A fórmula do n° 1 é, sobretudo,
uma expressão condensada de todas as normas restantes deste artigo, que todas
elas são, em última análise, garantias de defesa.
Todavia, este preceito introdutório serve também de cláusula geral englobadora
de todas as garantias que, embora não explicitadas nos números seguintes, hajam
de decorrer do princípio da protecção global e completa dos direitos de defesa
do arguido em processo criminal. Todas as garantias de defesa engloba
indubitavelmente todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o
arguido defender a sua posição e contrariar a acusação. Dada a radical
desigualdade material de partida entre a acusação (normalmente apoiada no poder
institucional do Estado) e a defesa, só a compensação desta mediante específicas
garantias, pode atenuar essa desigualdade de armas. Este preceito pode portanto
ser fonte autónoma de garantias de defesa. Em suma, a orientação para a defesa
do processo penal revela que ele não pode ser neutro em relação aos direitos
fundamentais (um processo em si, alheio aos direitos do arguido), antes tem
neles um limite infrangível.
29 - O MP teve 12 meses para fazer a acusação, o Tribunal Colectivo teve quase
30 dias para fazer e ler o Acórdão e agora o arg°. através do seu defensor tem
pouco mais que um dia, de 2ª feira, dia 17 de Março de 2003 para 3ª feira, dia
18 de Março de 2003, para ouvir e ouvir 13 cassetes de lH30m e ver se o que as
testemunhas disseram está de acordo com o que está escrito no acórdão. Isto
trata de uma clara violação das garantias de defesa do arg°.
30 - O douto acórdão infringiu assim a Constituição da República Portuguesa, ao
recusar aplicar legislação obrigatória.
Nestes termos, requer — se a V. Exas. que julguem inconstitucional as normas dos
art°s. 4°, 411° nº 1 e 3 e 412° nº 3 todos do C.P.Penal e as normas dos art°s.
685°, 687°, 690°, 690° A n° 1 e 2, 698° n° 4 e 6 e 743° todos do C.P. Civil ou
das mesmas normas com a interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida,
isto é, quando não imponha que havendo Recurso sobre matéria de facto em que se
vise a reapreciação da prova gravada, o recorrente pode beneficiar na
apresentação da sua motivação que é de 15 (quinze ) dias do acréscimo do prazo
de 10 dias estabelecido no art. 698° n° 6 do C.P.Civil,” ex vi “art. 4º do
C.P.Penal sob pena de violação das garantias de defesa do processo criminal
previstas no art. 32°., principalmente no seu n° 1 da Constituição da República
Portuguesa. E em consequência da inconstitucionalidade deverá ser dado ao arg°.
recorrente o prazo de 10 (dias) para apresentar as suas motivações de Recurso do
douto acórdão da lª. Instância o que implicará o reenvio dos presentes autos
para o tribunal de lª. Instância para posteriormente ai nesse Tribunal
apresentar as suas motivações de Recurso.
E assim se fará a costumada JUSTIÇA.
O Ministério Público contra-alegou concluindo o seguinte:
Nesta conformidade, e face ao exposto, conclui-se:
1 — Relativamente às normas dos n°s 1 e 3 do artigo 188° do Código de Processo
Penal, não foi adequadamente suscitada a questão de inconstitucionalidade, nos
termos do artigo 72°, n° 2, da Lei do Tribunal Constitucional, pelo que não
devem ser conhecidos, nesta parte, os recursos interpostos ao abrigo da alínea
b) do n° 1 do artigo 70° da citada Lei.
2 — Também o não devem ser relativamente à alínea g) do n° 1 do aludido artigo,
por inexistir exacta e adequada coincidência entre o objecto do decidido
anteriormente pelo Tribunal Constitucional e o que foi objecto de decisão pelo
tribunal recorrido.
3 — A entender-se de forma diferente, deverão os recursos improceder, na medida
em que não ocorreu qualquer interpretação inconstitucional das normas dos n°s 1
e 3 do artigo 188° do Código de Processo Penal, com eventual fundamento em falta
de controlo e acompanhamento judicial das operações aí contempladas.
4 — Não é inconstitucional a norma constante do artigo 411º, n°s 1 e 3 do Código
de Processo Penal, quando interpretada no sentido de que ao prazo de 15 dias aí
previsto para interposição e motivação do recurso, não acresce o prazo de 10
dias, a que alude o artigo 698°, n° 6 do Código de Processo Civil, em caso de
recurso que tenha por objecto a reapreciação da prova gravada, pelo que também
nesta matéria devem improceder os recursos.
Os recorrentes não responderam às questões prévias suscitadas pelo
Ministério Público.
4. Cumpre apreciar e decidir.
II
Fundamentação
A)
Questão prévia do conhecimento dos recursos relativa
à norma constante do artigo 188º, nºs 1 e 3
do Código de Processo Penal
5. Colocam-se no presente processo duas questões de constitucionalidade
ínsitas em dois conjuntos de recursos.
No primeiro conjunto de recursos, os arguidos suscitam a
inconstitucionalidade das normas do artigo 188º, nºs 1 e 3 do Código de Processo
Penal, ao abrigo das alíneas b) e g) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal
Constitucional.
Nos seus recursos para o Tribunal Constitucional quanto a esta questão, os
recorrentes alegam razões que permitem compreender que consideram
inconstitucional alguns procedimentos da Juíza de Instrução a partir dos quais
concluem que não se verificou controlo jurisdicional das escutas. Há,
obviamente, uma indefinição na formulação dos recorrentes entre o imputar a
questão de constitucionalidade a uma omissão por parte da Juíza de referências a
terem as gravações sido ouvidas e seleccionadas por ela e a invocação de um
verdadeiro critério normativo, nos termos do qual não terá de existir um
acompanhamento jurisdicional contínuo e próximo temporal e materialmente da
fonte nomeadamente, por não ser exigível que as gravações sejam ouvidas e
seleccionadas pelo Juiz, podendo este mandar transcrevê-las sem as ouvir e
seleccionar previamente.
Por outro lado, nos presentes recursos para o Tribunal Constitucional, a
dimensão normativa que se poderia intuir, sempre através de um esforço
interpretativo, é a que acentua a dispensa de controlo directo e prévio do
conteúdo das gravações, da qual decorre apenas a falta de uma supervisão
atempada.
A questão do carácter imediato da apresentação do auto de transcrição não é
colocada centralmente na argumentação substancial dos recursos, nem sequer como
indício de ausência de controlo jurisdicional, mas apenas como decorrência de
uma interpretação das decisões recorridas em que para os arguidos se evidencia a
falta de controlo pela Juíza do conteúdo das gravações.
No entanto, no recurso para o Tribunal da Relação a única dimensão normativa
explicitamente formulada pelos recorrentes é a que se refere ao sentido temporal
da palavra imediatamente. Assim, os recorrentes apenas invocam, nessa peça, a
inconstitucionalidade do artigo 188º, nº 1, do Código de Processo Penal na
“interpretação que não imponha que o auto de intercepção e gravação de
conversações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do
Juiz”. E em todo o conjunto das conclusões é acentuada a questão temporal e
nunca se formula, de modo explícito, como questão de constitucionalidade
normativa – isto é, como critério normativo de decisão – a dispensa de
supervisão ou controlo das gravações através de um procedimento de delegação nos
órgãos de polícia criminal.
O Tribunal recorrido foi confrontado apenas com uma questão de
constitucionalidade relacionada com o momento temporal em que foi apresentado ao
Juiz o auto de intercepção e gravação. Mas essa questão foi formulada sem
qualquer concretização, nomeadamente de referências ao momento processual em
causa, impedindo o tribunal recorrido de se aperceber da questão colocada, na
sua dimensão explícita. Na verdade, ela não foi sequer suscitada, tal como os
recorrentes o fizeram posteriormente no requerimento de recurso para o Tribunal
Constitucional, embora ainda de forma insuficiente, dizendo “e não passados mais
de 30 dias como aconteceu nos autos”. Tudo o mais, relativo ao controlo
jurisdicional, foi formulado como problema de decisão e de procedimento da
Juíza.
Deste modo, o Tribunal da Relação não foi confrontado, de modo explícito,
com uma questão de constitucionalidade normativa bem delimitada, mas sim com um
conjunto de argumentos misturados em que às críticas à decisão se acrescentava
uma crítica de constitucionalidade aos critérios normativos utilizados, apenas a
propósito da palavra imediatamente contida no artigo 188º, nº 1, do Código de
Processo Penal.
Perante uma falta de autonomização clara das razões e argumentos dos
recorrentes referentes à dispensa de controlo jurisdicional como questão de
constitucionalidade, o Tribunal recorrido abordou a questão fundamentalmente
como critério de decisão e de violação por esta da lei ordinária. E, com efeito,
não poderia o Tribunal recorrido fazer uma diferente abordagem, já que a questão
que formalmente surgiu como questão de constitucionalidade normativa se baseava
numa interpretação dos procedimentos da Juíza que não resulta sequer
inequivocamente dos autos. Na verdade, a Juíza de Instrução afirma
expressamente, no seu despacho de 5 de Novembro de 2001, que “tomou conhecimento
do teor das intercepções telefónicas”, não se podendo retirar, assim,
inequivocamente que tenha assumido um critério normativo de ausência de controlo
directo.
Por outro lado, também as referências temporais que suportariam a falta de
carácter imediato não são sequer formuladas pelos recorrentes, que se limitam a
referir o “imenso tempo” que demoraram as transcrições. Mas é claro que não é no
lapso de tempo, que não excede um mês, entre a autorização das escutas e o
conhecimento do respectivo teor pela Juíza, que os recorrentes assentam a
questão da dispensa de controlo das gravações, mas sim na ausência de despachos
fundamentados que evidenciem o controlo pela Juíza. E, como já se referiu, nesse
plano a argumentação dos recorrentes não se apoiou numa explícita ratio
decidendi normativa nem em comportamentos inequívocos reveladores da mesma.
Deste modo, a questão do carácter imediato, de teor normativo, perde a
conexão com a da falta de controlo do Juiz, relativa à decisão.
Mesmo que os recorrentes entendessem que a ratio decidendi não foi
explícita, porque se tratava de comportamentos omissivos, teriam então o ónus de
requerer a aclaração do sentido da interpretação da lei que presidia às decisões
recorridas, já que a Juíza sempre afirmara que tinha tomado conhecimento do teor
das gravações e fora emitindo despachos de acompanhamento das escutas mesmo
antes do termo do prazo que autorizara para a efectuação das intercepções.
Assim, não se pode concluir que tenha sido suscitada de modo claro uma
questão de constitucionalidade normativa, não só porque a questão temporal não é
materialmente enunciada como também porque surge associada a comportamentos
omissivos que não são identificáveis como ratio decidendi normativa da decisão
recorrida.
Deste modo, o problema que os recorrentes pretendiam suscitar relativo ao
controlo pelo Juiz das escutas foi referido fundamentalmente à decisão. Por
outro lado, o problema que invocaram relativo à imediação temporal não foi
substanciado de modo a ser perceptível a sua articulação com a falta de controlo
jurisdicional.
6. Finalmente, quanto ao pressuposto da alínea g) do nº 1 do artigo 70º,
também se conclui que tal pressuposto não se verifica.
Com efeito, os Acórdãos nºs 407/97 e 347/01 que os recorrentes invocam como
tendo julgado inconstitucional a norma do artigo 188º, nº 1, do Código de
Processo Penal apenas a julgaram inconstitucional na redacção anterior à que lhe
foi dada pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto e pelo Decreto-Lei nº 320-C/00, de
15 de Dezembro. E a versão do artigo 188º, nº 1, aplicada nos autos, como é
referido pelo Acórdão recorrido, é já a nova redacção. Por outro lado, o Acórdão
invocado, o nº 582/02, não existe como nota o Ministério Público.
Consequentemente, não há coincidência exacta entre a norma julgada
inconstitucional e a efectivamente aplicada neste processo.
Em conclusão, também quanto ao fundamento de recurso da alínea g) do
nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal, entende o Tribunal Constitucional não
poder tomar conhecimento do recurso.
B)
A questão de constitucionalidade normativa relativa
à norma constante do artigo 411º, nºs 1 e 3,
do Código de Processo Penal
7. Por último suscitam os recorrentes nos outros dois recursos, a questão de
constitucionalidade do artigo 411º, nºs 1 e 3 do Código de Processo Penal, na
interpretação segundo a qual o prazo de 15 dias para interposição e motivação do
recurso não deverá ser acrescido de mais dez dias, conforme o regime do artigo
698º, nº 6, do Código de Processo Civil, quando o recurso tenha por objecto a
reapreciação da prova gravada.
Esta norma já foi apreciada, nesta dimensão, em vários arestos tendo o
Tribunal Constitucional concluído pela sua não inconstitucionalidade, nos
Acórdãos nºs 542/04 e 30/06.
Não suscitando o presente recurso questão essencialmente diversa daqueles
Acórdãos, na medida em que também não se constata que os recorrentes não puderam
ter acesso às gravações no início do prazo de que dispunham para recorrer,
remete-se para a fundamentação neles acolhida.
III
Decisão
8. Ante o exposto, o Tribunal Constitucional decide:
a) Não tomar conhecimento dos recursos interpostos relativos às
normas constantes do artigo 188º, nºs 1 e 3 do Código de Processo Penal;
b) Não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 411º
nºs 1 e 3 do Código de Processo Penal.
Custas por cada um dos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 20
UCs.
Lisboa, 23 de Maio de 2006
Maria Fernanda Palma
Paulo Mota Pinto
Benjamim Rodrigues
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos