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Processo n.º 460/06
1ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Notificado do acórdão proferido em 30 de Março de 2006 no Supremo
Tribunal de Justiça, A. recorreu para o Tribunal Constitucional nos seguintes
termos:
A., Recorrente nos autos à margem referenciados, tendo sido notificado do
Acórdão de 30 de Março de 2006 que decidiu o seu requerimento de reforma do
anterior Acórdão de 30 de Setembro de 2004, do mesmo vem, ao abrigo do disposto
na alínea b) do n.º 1 e do nº 2 do art.. 70° da Lei nº. 28/82 de 15 de Novembro,
na sua redacção actualmente vigente, interpor recurso de fiscalização concreta
de constitucionalidade, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. O ora Recorrente requereu a reforma do Acórdão deste Supremo Tribunal de 30
de Setembro de 2004 com fundamento em lapso manifesto na qualificação jurídica
dos factos.
2. Tal invocado lapso consistia em se ter considerado, para efeitos de
prescrição do procedimento criminal que, dos factos que os autos patenteiam,
resulta que a decisão penal condenatória proferida transitou em julgado, no que
a este Arguido diz respeito, “logo em 20 de Setembro de 2002, ou no máximo, em
27 de Janeiro de 2003, data em que o TC confirmou a decisão do Supremo, na parte
em que não admitiu o seu recurso constitucional.” (SIC, página 15 do Acórdão
reformando, linhas 19 a 22);
3. O Recorrente entende e sustentou nos autos que o trânsito em julgado da
decisão penal que o condenou apenas ocorreu na sequência da prolação do Acórdão
do Tribunal Constitucional nº 129/2003 de 7 de Março de 2003, já depois de
decorrido o prazo de 18 anos aplicável in casu para a prescrição do procedimento
criminal.
4. Para tanto louvou-se no entendimento de que a sua Reclamação de 04.10.2002 da
não admissão pelo STJ do recurso por si interposto para o Tribunal
Constitucional do Acórdão do STJ de 11.04.2002, e posterior e sucessivamente, os
seus requerimentos, de 07.02.2003 de aclaração e de 01.03.2003 de reforma, do
Acórdão da Conferência do TC n° 43/2003 de 27.012003, obstaram e diferiram o
trânsito em julgado do referido Acórdão do STJ de 11.04.2002.
5. E no seu requerimento agora indeferido em que pediu a reforma do Acórdão
deste STJ de 30.09.2004 suscitou expressamente a questão de o estabelecimento do
referido trânsito em julgado “em 20 de Setembro de 2002, ou no máximo, em 27 de
Janeiro de 2003” constituir interpretação e aplicação -EXPLÍCITAS E / OU
IMPLÍCITAS- das normas dos art°s 670º, 677°, 668° e 669° do Código de Processo
Civil, aplicáveis ex vi do § único do art. lº do Código de Processo Penal de
1929, e do art°s 69°, 76° n°4, 77° e 78° n° 3 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro
(LTC), conjugados com o do art° 658° n° 1 do CPP 29, violadoras das garantias
constitucionais de defesa do Arguido em processo criminal – art. 32° da
Constituição da República Portuguesa -, dos fundamentos constitucionais da
prescrição do procedimento criminal, designadamente o princípio da necessidade
das penas e a sua relação com o decurso do tempo, constantes do art° 18° da CRP,
traduzidos no direito material de o Arguido não sofrer condenação penal
aplicada, que não chegou a transitar em julgado nos prazos que o legislador
assinalou à prescrição; bem como do direito à segurança contemplado no art. 27°
da Lei Fundamental, ligado à ideia do controle punitivo do Estado; além de
constituir ainda, com consequências desfavoráveis para o Arguido em matéria
penal, uma solução normativa não materialmente fundada e arbitrária, com
violação do princípio da proibição do arbítrio, integrante do princípio do
Estado de Direito democrático do art. 2° da CRP.
6. Já que uma interpretação que permita a atribuição de efeitos preclusivos da
invocação da prescrição à mera prolação da decisão apenas em certo sentido
final, desligada e autonomizada das respectivas eficácia e insusceptibilidade de
alteração associadas por natureza e definição ao conceito de trânsito em
julgado, é contrária às mencionadas normas constitucionais, bem como ao
princípio da legalidade - art° 3º da CRP.
7. E, em qualquer caso, a interpretação contra a qual se pugna implica ‘uma
ponderação constitutiva de soluções jurídicas’, que traduz uma ‘colisão entre as
possibilidades interpretativas utilizadas no caso e as autorizadas ao intérprete
pela reserva de lei, violando-se o artigo 29°, n°s 1 e 3, com a concretização
qualificada do artigo 164º, alíneas c) da Constituição’ (cfr. Acórdão do
Tribunal Constitucional n° 205/99, in BMJ n° 486, pág. 501).
8. Além de violar o expressamente decidido no Acórdão do Tribunal Constitucional
n° 129/2003, de 07.03.2003, por cujos termos foi declarado, e bem, que a decisão
condenatória apenas transitou em julgado com a prolação - em 07.03.2003 - desse
mesmo Acórdão n.º 129/03.
9. Já que só então a questão da não admissão do recurso com efeito suspensivo do
processo - art° 658° nº 1 do CPP de 29 - da decisão final condenatória, ficou
decidida em termos definitivos.
10. A decisão ora recorrida interpretou e aplicou ou afastou a aplicação de
todas as referidas normas, ao considerar explícita ou implicitamente, e em
violação das normas dos art°s 658° n° 1 do CPP29, 677° do CPC, 77° n.º 4 e 78°
n.° 3 da LTC, que não tiveram o efeito de obstar ao trânsito em julgado do
Acórdão do STJ de 11.04.2002:
- a dedução em 04.10.2002 de Reclamação para o TC da não admissão pelo STJ de
recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade desse Acórdão, nos
termos dos art°s 76° no 4 e 77° da LTC;
- a formulação em 10.02.2003 de pedido de aclaração do Acórdão do TC n° 43/2003
que decidiu a aludida Reclamação nos termos da alínea a) do n° 1 do art° 669° do
Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art° 69° da LTC, e dos art°s 716° e
666° n°3 do CPC;
-a formulação em 03.03.2003 de pedido de reforma do mesmo Acórdão no 43/2003,
nos termos da segunda parte da alínea a) do nº 2 do art° 669° e no n° 3 do art°
670° do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do art° 69° da LTC e dos
art°s 716° e 666° n° 3 do CPC.
11. Escamoteando que todas as três referidas reclamações constituem garantias
processuais de defesa legalmente admitidas, e eram potencialmente susceptíveis
de ditar a admissibilidade do recurso de constitucionalidade e, por via do seu
julgamento, a eventual alteração da condenação penal proferida por reforma do
Acórdão do STJ de 11.04.2002.
12.O presente recurso visa a fiscalização concreta da constitucionalidade das
referidas normas, e é admissível nos termos da alínea b) do n°. 1 do art° 70° da
Lei n° 28/82, na sua actual redacção.
13.A questão da constitucionalidade reporta-se a uma certa interpretação das
normas, no sentido em que elas foram tomadas no caso concreto e aplicadas na
decisão recorrida.
14.Face ao preceituado no art. 80 n°. 3 da Lei do Tribunal Constitucional, “a
questão da constitucionalidade pode reportar-se à interpretação da norma, no
sentido em que ela foi tomada no caso concreto e na decisão recorrida” ( cfr
Cardoso da Costa, ob. cit. e Ac. Trib. Constitucional n°. 634/94, de 29 de
Novembro de 1994, 2. Secção, in BMJ 446, pág. 44).
Em conclusão:
Para dar expresso e cabal cumprimento ao estatuído no art°. 75°-A n°s. 1 e 2 da
Lei do Tribunal Constitucional e da Fiscalização da Constitucionalidade, o ora
Recorrente esclarece:
I. Que o presente recurso se funda na alínea b) do art°. 70° da Lei do Tribunal
Constitucional e Fiscalização da Constitucionalidade;
II. Que a decisão recorrida é o Acórdão do STJ de 30 de Setembro de 2004,
integrado pelo Acórdão de 30 de Março de 2006 que decidiu o requerimento de
reforma do Recorrente;
III. Que as normas cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada, são as
dos arts 670°, 677°, 668° e 669° do Código do Processo Civil aplicáveis ex vi do
§ Único do art. 1° do Código de Processo Penal de 1929, as do art°s 69°, 76°
n°4, 77°e 78° n° 3 da Lei n°. 28/82 de 15 de Novembro (LTC), conjugadas com a do
art. 658° nº 1 do CPP 29, na interpretação, e consequente aplicação, que delas
foi feita pelo Tribunal a quo (cfr. art. 80° n.º 3 da Lei do Tribunal
Constitucional);
IV. Que as normas violadas foram as dos art°s 2°, 3°, 18° n° 2, 27°, 29° e 32°
da Constituição da República Portuguesa;
V. Que estas questões foram suscitadas perante este Supremo Tribunal de Justiça,
em requerimento de fls. em que pediu a reforma do Acórdão de 30 de Setembro de
2004,
VI. O Recorrente dispõe de legitimidade (art. 72° n° 1 alínea b)) e está em
prazo, nos termos do disposto no n° 1 do art° 75º da Lei n° 28/82 de 15.11
Termos em que espera ver admitido o presente recurso.
No Tribunal Constitucional, o relator emitiu decisão sumária de não conhecimento
do recurso nos seguintes termos:
São requisitos da interposição do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do
artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, a indicação da norma aplicada pela
decisão recorrida apesar da acusação da sua desconformidade constitucional, e a
suscitação prévia da questão de inconstitucionalidade normativa.
No presente caso, a mera indicação dos preceitos legais em que eventualmente se
contêm as normas impugnadas não representa a enunciação da norma, uma vez que o
Tribunal fica sem saber qual a dimensão normativa concretamente questionada pelo
recorrente.
Por outro lado, a suscitação das questões de inconstitucionalidade normativa
ocorreu, conforme aliás declara o recorrente, na reclamação apresentada depois
de proferido o acórdão recorrido, altura em que já não é possível ao Tribunal
apreciar questões novas.
Ora, embora fosse possível reparar a irregularidade relativa à não enunciação
das normas objecto do presente recurso, o certo é que a não suscitação – em
termos processualmente adequados – das questões de inconstitucionalidade
constitui obstáculo inultrapassável ao respectivo conhecimento (artigo 72º n.º 2
LTC).
Assim, com fundamento no n.º 1 do artigo 78º-A da citada LTC, decide-se não
conhecer do recurso.
Contra esta decisão reclama o recorrente, dizendo:
A., Recorrente nos autos à margem referenciados, tendo sido notificado da
decisão sumária de 5 de Junho de 2006 que decidiu não conhecer do recurso por si
interposto, com fundamento no nº 1 do art° 78°-A da LTC, vem, nos termos e ao
abrigo do disposto no n° 3 do mesmo art° 78°-A, da mesma reclamar para a
Conferência do Tribunal Constitucional, o que faz com os seguintes fundamentos:
1. São duas as razões, apodadas de irregularidades na interposição do recurso,
invocadas na decisão ora reclamada para não conhecimento do mesmo, embora a
primeira delas tenha sido considerada possível de reparar.
2. Entende o Recorrente que num e noutro caso não assiste razão ao Senhor
Conselheiro Relator.
3. Relativamente à primeira das referidas irregularidades, alegadamente
consistente na não indicação da norma aplicada pela decisão recorrida por a mera
indicação dos preceitos legais em que eventualmente se contêm as normas
impugnadas não representar a enunciação da norma, uma vez que o Tribunal fica
sem saber qual a dimensão normativa concretamente questionada pelo recorrente,
salvo o elevado respeito, pura e simplesmente, não se verifica.
Com efeito,
4. O ora Recorrente referiu expressamente que a interpretação e aplicação -
explícitas e / ou implícitas - feitas das normas dos art. 670º, 677°, 668° e
669° do Código de Processo Civil “que permita a atribuição de efeitos
preclusivos da invocação da prescrição à mera prolação da decisão apenas em
certo sentido final, desligada e autonomizada das respectivas eficácia e
insusceptibilidade de alteração associadas por natureza e definição ao conceito
de trânsito em julgado” (SIC), é contrária às concretas normas constitucionais
que igualmente indicou, bem como ao princípio da legalidade – art. 3° da CRP.
5. E referiu ainda que tais interpretação e aplicação implicam ‘uma ponderação
constitutiva de soluções jurídicas’, que traduz uma ‘colisão entre as
possibilidades interpretativas utilizadas no caso e as autorizadas ao intérprete
pela reserva de lei, violando-se o artigo 29°, n.º s 1 e 3, com a concretização
qualificada do artigo 164°, alíneas c) da Constituição’ (SIC).
6. É, pois, perfeitamente claro que o Recorrente procedeu à enunciação da norma
na dimensão normativa concretamente questionada.
7. Pelo que se impõe a conclusão de que cumpriu o ónus da indicação das normas
aplicadas cuja inconstitucionalidade suscitou - art°s 70º nº 1 alínea b) e 75°-A
nº 1 da LTC (na redacção da Lei nº 1 3-A/98 de 26 de Fevereiro), nos precisos
termos em que o Senhor Conselheiro Relator afirma considerar adequados.
8. E, em qualquer caso, ainda que a referida irregularidade houvesse sido
cometida, no que se não concede por ser evidente que o não foi, sempre deveria,
nos termos do nº 5 do art. 75°-A da LTC, ter o Senhor Conselheiro Relator
dirigido ao Recorrente o convite de aperfeiçoamento estabelecido naquela norma.
9. O que não fez.
10. Pelo exposto não se verifica a primeira irregularidade apontada ao
requerimento de interposição do recurso.
11. Quanto à segunda irregularidade apontada, consiste a mesma em a suscitação
prévia das questões de inconstitucionalidade normativa ter alegadamente ocorrido
em termos processualmente inadequados, por o Recorrente o ter feito em
reclamação apresentada depois de proferido o acórdão recorrido, altura em que já
não é possível ao Tribunal apreciar questões novas; o que constitui obstáculo
inultrapassável ao conhecimento do recurso.
Ora,
12. São de vária ordem as objecções que se erigem contra este entendimento.
13. O ora Reclamante pretendeu ser claro, rigoroso e preciso no requerimento de
interposição do recurso ao indicar que “a decisão recorrida é o Acórdão do STJ
de 30 de Setembro de 2004, integrado pelo Acórdão de 30 de Março de 2006 que
decidiu o requerimento de reforma do Recorrente” e que as questões da
inconstitucionalidade “foram suscitadas perante o Supremo Tribunal de Justiça,
em requerimento de fls. em que pediu a reforma do Acórdão de 30 de Setembro de
2004”.
14. Apenas com a prolação do referido Acórdão do STJ de 30 de Setembro de 2004,
cujo teor o surpreendeu, foi o Reclamante efectivamente prejudicado com
definitividade pela interpretação e aplicação de normas que reputa de
inconstitucionais, em termos de fazer nascer para si a utilidade do presente
recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade dessas normas.
15. Sendo certo, no entanto, que já anteriormente tinha suscitado nos autos, em
termos processualmente adequados de poderem e deverem ser apreciadas e
decididas, as mesmas questões de inconstitucionalidade, como adiante melhor se
explicitará, o que não foi levado em consideração na decisão sumária ora sob
reclamação.
16. Sucedeu foi que o Supremo Tribunal de Justiça então não incorreu na
interpretação e / ou aplicação de normas na dimensão expressamente apontada de
inconstitucional, dando indicação clara de ter acolhido o entendimento do
Recorrente.
17. E a verdade é que foi apenas o julgamento dessas questões feito no Acórdão
de 30 de Setembro de 2004 que integrou aplicação de normas em dimensão
desconforme à Lei Fundamental, e forneceu o fundamento da sua oposição.
18. Pelo que, em bom rigor, não lhe era exigível, antes dessa decisão, ter
suscitado as questões de inconstitucionalidade objecto do recurso que agora
interpôs, pela simples razão de apenas nesse Acórdão, e contra indicação
expressa e clara anterior, ter sido efectuada a interpretação e aplicação das
normas que reputa de desconformes à Constituição.
19.E por isso foi apenas na reacção processual a esse Acórdão que pôde, com
oportunidade e propriedade, questionar em termos concretos as
inconstitucionalidades que pretende ver apreciadas.
20. Quanto à substância desse Acórdão, não sendo do mesmo admissível recurso
ordinário, restava ao Recorrente arguir a respectiva nulidade nos termos do art.
668° nº 3 do Código de Processo Civil, pedir esclarecimentos de obscuridades ou
ambiguidades nos termos da alínea a) do nº 1 do art. 669°, ou requerer a sua
reforma nos termos do nº 2 do mesmo preceito.
21. E assim é por a lei não prever nenhum outro meio processual de reacção.
Ora,
22. Não ocorrendo qualquer das causas de nulidade previstas nas alíneas b) a e)
do nº 1 do art. 668°, e não contendo o Acórdão obscuridades ou ambiguidades que
pretendesse ver esclarecidas, restou ao ora Reclamante requerer a respectiva
reforma com fundamento em lapso manifesto na qualificação jurídica dos factos.
23. Tal lapso manifesto consistia em se ter considerado resultar dos factos que
os autos patenteiam que a decisão penal condenatória proferida nos presentes
autos transitou em julgado, no que a este Arguido diz respeito, “logo em 20 de
Setembro de 2002, ou no máximo, em 27 de Janeiro de 2003, data em que o TC
confirmou a decisão do Supremo, na parte em que não admitiu o seu recurso
constitucional.” (SIC, página 15 do Acórdão reformando, linhas 19 a 22);
24. E sustentou o ora Reclamante que, a não ter ocorrido tal lapso manifesto,
então é forçoso concluir que o Tribunal a quo interpretou e aplicou normas
inconstitucionais, nos termos ali indicados, e já acima referidos.
25. E foi por ter entendido que a suscitação relevante das questões de
inconstitucionalidade para efeitos da concreta aferição da admissibilidade do
presente recurso, foi a feita no requerimento de reforma do Acórdão de 30 de
Setembro de 2004, que no requerimento de interposição assim o indicou.
26. E não colhe o fundamento invocado na decisão sumária ora reclamada de que se
tratava de questões novas que ao STJ já não era possível apreciar depois de
proferido o acórdão recorrido.
27. Desde logo porque justamente não se tratava de questões novas, como
seguidamente se demonstra;
28. Mas, ainda e também, porque ao STJ era possível apreciá-las e decidi-las,
por se tratar de questões relevantes e determinantes quanto à efectivação da
responsabilidade penal do Recorrente, de conhecimento oficioso, expressamente
submetidas à sua apreciação, de forma reiterada, através dos meios legalmente
previstos e processualmente adequados, inscritas no fundamento legal admissível,
e tempestivamente.
29. Se assim se não entender, a utilidade do pedido de reforma nos termos do nº
2 do art. 669° do CPC ficaria esvaziada, não se justificando a sua possibilidade
jurídico-processual, se o Tribunal não estivesse obrigado a conhecer das
questões relevantes integrantes dos seus possíveis fundamentos legais.
30. Em todos os anteriores recursos de fiscalização concreta para o TC admitidos
no âmbito destes autos, todos providos, a suscitação das questões de
inconstitucionalidades ocorreu também sempre em reclamações posteriores aos
acórdãos recorridos, se bem que por nulidades e não visando obter a respectiva
reforma, mas formalmente equiparáveis, sendo a diferença de mero fundamento.
31. O que nunca obstou ao conhecimento dos respectivos objectos.
No entanto,
32. Suscitadas as questões de inconstitucionalidade, o STJ optou por decidi-las,
sem no entanto as apreciar, de forma a vários títulos censurável, no Acórdão de
30 de Março de 2006 que negou o pedido de reforma.
33. E dessa forma as contornou, na linha do que já vem sendo a sua actuação
habitual nestes autos, sempre motivo de oportunos insurgimento e denúncia do
Reclamante.
34. A verdade é que as questões de inconstitucionalidade que ora se pretende que
sejam apreciadas, se prendem com a determinação do momento do trânsito em
julgado da decisão penal condenatória e da sua relação e efeitos com o decurso
do prazo de prescrição.
35. Aí, com efeito, reside a única utilidade do recurso para o Recorrente
Arguido que há já muito constatou, o que os autos sobejamente titulam, a enorme
resistência do STJ a que beneficie de uma prescrição que efectivamente ocorreu.
36. Não hesitando, para o efeito, em lançar mão de artifícios processuais e das
teses juridicamente mais peregrinas e despudoradas, como é o dissociar o
trânsito em julgado de uma decisão penal condenatória da sua definitividade, i.
é, da insusceptibilidade de recurso ordinário ou de reclamação.
37. Em 1 de Março de 2003 a decisão penal condenatória proferida contra o ora
Reclamante ainda não transitara em julgado como, aliás, foi já decidido por este
Tribunal Constitucional no Acórdão n° 129/2003, de 07.03.2003, por cujos termos
foi declarado, bem, que a decisão condenatória apenas transitou em julgado com a
prolação - em 07.03.2003 - desse mesmo Acórdão nº 129/03.
38. E já tinha então decorrido o prazo prescricional de 18 anos in casu
reconhecidamente aplicável.
39. O que o ora Reclamante então invocou, quer no STJ quer neste Tribunal
Constitucional, através de requerimentos expressamente apresentados para o
efeito.
40. E desde então é escandalosa a postura assumida no STJ para obstar a qualquer
custo ao julgamento da extinção do procedimento criminal, com um argumentário
inadmissível a um aluno do primeiro ano de direito, e que é chocante num estado
de direito democrático em que os tribunais são titulares de soberania, garantes
da legalidade, e os cidadãos deviam poder confiar nos seus direitos e garantias
fundamentais.
41. Não é aceitável que um tribunal arbitrariamente cerceie o que na lei se
concede.
42. Não é admissível que se desvirtue a substância de um direito, por recurso
sistemático, e infundado, a artifícios interpretativos ilegais e a formalismos
de processo.
43. O ora Reclamante apercebeu-se das resistências ao exercício dos seus
direitos logo quando o Senhor Conselheiro Relator do STJ proferiu o despacho de
fls. 1901 dos autos criminais em que, depois de o ter convidado a apresentar
novas conclusões na sua alegação de recurso penal, e de este ter correspondido a
tal convite, considerou que não apresentou conclusões;
44. Reclamou desse despacho para a Conferência;
45. A Conferência negou provimento à reclamação por Acórdão de 30.04.1998;
46. O Reclamante interpôs recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade desse Acórdão;
47. Este Tribunal Constitucional deu provimento ao recurso por Acórdão de
05.05.1999;
48. O STJ, em Acórdão supostamente reformador de 01.07.1999, não acatou o
Acórdão do Tribunal Constitucional, e voltou a considerar não terem sido
apresentadas conclusões da alegação penal;
49. O Reclamante reclamou desse Acórdão por nulidades.
50. Por novo Acórdão de 11.11.1999 foi desatendida a arguição de nulidades;
51. O Reclamante interpôs novo recurso de fiscalização concreta de
constitucionalidade.
52. O Senhor Conselheiro Relator por despacho de 15.12.1999 não admitiu esse
recurso;
53. O Reclamante reclamou para a Conferência deste Tribunal Constitucional dessa
não admissão;
54. Por Acórdão de 24.04.200 1 foi atendida a reclamação e mandado admitir o
recurso;
55. E por novo Acórdão deste TC de 04.12.2001 foi concedido provimento ao
recurso, e ordenado ao STJ que procedesse à reforma do seu anterior Acórdão com
respeito pelos juízos de inconstitucionalidade formulados no anterior Acórdão do
TC de 05.05.1999;
56. Foi proferido em 11.04.2002 novo Acórdão supostamente reformador no STJ;
57. Do qual o Reclamante reclamou por nulidades;
58. Reclamação julgada improcedente por Acórdão de 27.06.2002;
59. Interpôs novo recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade de
normas;
60. O qual não foi admitido por intempestividade, através de despacho do Senhor
Conselheiro Relator do STJ de fls. 2372 dos autos penais;
61. Reclamou dessa não admissão para este TC;
62. O TC, por Acórdão nº 43/2003 de 27.01.2003, entendeu que o recurso era
tempestivo, mas não podia ser admitido por outra razão;
63.O Reclamante pediu a aclaração desse Acórdão, que foi desatendida por Acórdão
nº 96/2003 de 17.02.2003, e requereu a reforma desta última decisão, o que foi
negado pelo Acórdão nº 199/2003 de 11.04.2003;
64. E, em 07.03.2003, este TC proferiu ainda o Acórdão nº 129/03, no qual
considerou e declarou expressamente que a decisão penal condenatória proferida
pelas instâncias transitou em julgado nessa data, e decidiu, atendendo à
sequência processual que precedeu o requerimento de reforma do Acórdão n°43/03 e
os fundamentos no mesmo invocados, mandar extrair traslado e processar o mesmo
em separado, por ser manifesto que o que o requerente pretendia era obstar ao
cumprimento da decisão proferida nas instâncias;
Mas,
65. Tendo então, no entender do Reclamante, já anteriormente a essa data,
decorrido o prazo prescricional determinante da extinção do procedimento
criminal, requereu aos Senhores Conselheiros Relatores neste TC e no STJ que
assim fosse declarado, com todas as legais consequências.
66. E foi na sequência destes requerimentos que se começaram a esboçar as
questões de inconstitucionalidade que se pretendem ver apreciadas em sede do
recurso de fiscalização concreta agora decidido de não conhecer, pelo que remete
e dá por reproduzido esse processado e o subsequente até ao presente.
Com efeito:
67. No requerimento endereçado ao STJ a pedir que fosse declarada extinta a
instância penal por prescrição do procedimento criminal, o ora Reclamante alegou
desde logo, expressamente, “que não transitou ainda em julgado a condenação
penal proferida contra o Arguido, ora requerente, nos já citados termos do
disposto no art. 677° do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 69°
da Lei nº. 28/82 de 15 de Novembro e do art. 1° único do CPP de 1929 e art. 80°
da Lei do Tribunal Constitucional (...), sendo que qualquer outro entendimento
integra interpretação inconstitucional da referida norma do art. 677° do CPC,
por contrária ao disposto nos arts 18º, 20º e 32° da Constituição da República
Portuguesa.” (SIC dos artigos 11 e 12 do requerimento).
68. Por despacho do Senhor Conselheiro Relator do STJ de 04.04.2003 foi decidido
indeferir tal requerimento com dois fundamentos:
A) a dedução ou o conhecimento oficioso da excepção da prescrição do
procedimento criminal só podia ocorrer até à decisão final, nos termos do
disposto nos arts 140º e 155° do Código de Processo Penal de 1929, que fez
coincidir com a prolação do Acórdão do STJ de 14 de Abril de 2003; e
B) a pendência dos autos no Tribunal Constitucional, para ali serem apreciados e
julgados dois recursos de fiscalização concreta, constitui a causa de suspensão
da prescrição a que alude a 2ª parte da alínea a) do art. 120° do Código Penal
de 1995, escapando desse modo à disciplina do limite máximo de duração da
suspensão previsto no nº 2 do mesmo preceito, pelo que haverá que descontar esse
tempo.
69. Inconformado com o teor desse despacho quanto aos dois fundamentos
invocados, o ora Reclamante dele reclamou para a Conferência do STJ, requerendo
que sobre a matéria do mesmo recaísse acórdão.
70. E nessa reclamação sustentou, justificadamente, que ambos os fundamentos
invocados constituíam interpretação e aplicação de normas inconstitucionais, nos
sentidos em que foram tomadas.
71. E, designadamente quanto ao primeiro fundamento, que é o que subsiste e
agora releva, alegou o seguinte, nos artigos 5 a 17 dessa reclamação.
72. Por Acórdão de 05.06.2003 a Conferência do STJ decidiu a Reclamação nos
seguintes termos: “... Tendo em conta os argumentos invocados pelos reclamantes,
acorda-se em manter o despacho apenas no que concerne ao segundo fundamento -
aumento do prazo de suspensão da prescrição correspondente ao período de
pendência do processo no Tribunal Constitucional por efeito dos três recursos
para aí interpostos (...). Neste particular - tão só, pois, quanto ao apontado
segundo fundamento invocado no despacho reclamado - indeferem-se as reclamações
dos dois referidos RR. ...”(SIC).
73. Pelo que, e como atrás se referiu, se impõe a conclusão de que,
anteriormente ao requerimento de reforma do Acórdão do STJ de 30.09.2004, o
Reclamante tinha suscitado já nos autos, em termos processualmente adequados de
poderem e deverem ser apreciadas e decididas, as questões de
inconstitucionalidade agora objecto do recurso.
74. Bem como a de que a Conferência do STJ, no citado Acórdão de 05.06.2003, deu
indicação clara e expressa de ter acolhido o seu entendimento quanto a essas
questões, deferindo nessa parte a Reclamação apresentada.
75. Apesar de não ter feito qualquer apreciação aprofundada das apontadas
inconstitucionalidades, pois se limitou a referir que “tendo em conta os
argumentos invocados pelos reclamantes”, indeferia a parte restante da
Reclamação e apenas mantinha o decidido pelo Relator no que concerne ao segundo
fundamento.
Ou seja,
76. Por exclusão de partes e mera adesão em bloco aos fundamentos invocados
pelo(s) Arguido(s), a posição do STJ deixou de lhe(s) ser desfavorável quanto às
questões de inconstitucionalidade que agora interessam.
77. Sucede é que o mesmo STJ persistiu no seu propósito de obstar a qualquer
custo a declarar a prescrição.
78. O Reclamante interpôs para este TC novo recurso de fiscalização concreta da
constitucionalidade desse Acórdão da Conferência do STJ de 05.06.2003, limitado
às questão de inconstitucionalidade da norma da alínea a) do nº 1 do art. 120º
(ou 119º no CP 82) do Código Penal de 95, invocada e aplicada em apoio do
referido segundo fundamento das decisões de 04.04.2003 e de 05.06.2003, único
que subsistiu depois de julgadas as Reclamações para a Conferência.
79. Recurso esse a que este TC concedeu provimento por douto Acórdão de
03.12.2003.
80. E em 30.09.2004 o STJ proferiu o Acórdão reformador em consequência dos
juízos de inconstitucionalidade formulados, que é a decisão agora recorrida.
81. E nessa decisão, usando de alguma acrobacia e malabarismo, inflectiu, sem
directamente a contrariar, a posição anteriormente indiciada de adesão aos
juízos de inconstitucionalidade formulados pelo Reclamante sobre o momento do
trânsito em julgado.
Com efeito,
82. Apesar de considerar que o trânsito em julgado da decisão penal condenatória
ocorre logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação,
fazendo apelo às normas dos arts 668°, 669° e 677° do Código de Processo Civil,
ex vi do § único do art. l do CPP de 1929 -página 12 verso do Acórdão, linhas 27
a 29 - (anteriormente, no despacho do Relator de 04.04.2003, apenas haviam sido
invocados os arts 140° e 155° do CPP29),
83. E de fazer a referência expressa de que “nos autos consta a informação do TC
(fls. 2762) de que em relação a A., com a prolação do acórdão nº 129/03, de 7 de
Março, a decisão transitou de imediato” - linhas 20 a 22 da mesma página, e
linhas 24 e 25 da página 14 verso,
84. A verdade é que acabou por se louvar no processamento posterior ao seu
anterior Acórdão de 05.06.2003, para alicerçar o entendimento, diverso do
expendido in concreto por este TC a fls. 2762, de que a apresentação do pedido
de aclaração do Acórdão do TC nº 43/2003 de 27.01.2003 não impediu o trânsito em
julgado da decisão penal condenatória.
85. E diverso ainda do que seria expectável e de supor, face ao teor daquela
decisão na parte em que aderira aos fundamentos invocados pelos Reclamantes.
86. Nessa medida e nessa parte a decisão foi absolutamente inovadora e
engenhosa, e colheu o Reclamante de total surpresa, não sendo de forma alguma
legítimo exigir-lhe que se lhe antecipasse na suscitação das questões de
constitucionalidade que pretende ver apreciadas.
87. E o ora Reclamante mediu bem o uso dos termos malabarismo e acrobacia, já
que a habilidade consistiu em alterar um entendimento anterior, reputado de
inconstitucional, sobre a mesma questão, invocando preceituário legal diverso
apesar de ser de sentido e fundamento idênticos, mas em relação a um facto
superveniente, evitando dessa forma que se pudesse invocar e arguir a nulidade
do excesso de pronúncia, decorrente de ter já anteriormente ficado esgotado o
poder jurisdicional sobre tal matéria.
88. E não se coibiu em desrespeitar e contrariar o entendimento expresso a fls.
2762 por este TC sobre o momento do trânsito em julgado, ciente de que o mesmo
foi emitido fora de qualquer juízo de inconstitucionalidade que tivesse que ser
tido em conta e observado no Acórdão reformador a proferir, nos termos do art.
80º da LTC.
Por todo o exposto,
89. Não se vê em que outro momento ou porque outro meio ou forma poderia o ora
Reclamante ter suscitado as concretas questões de inconstitucionalidade apenas
levantadas com a prolação do Acórdão do STJ de 30.09.2004.
90. Sendo certo, no entanto, que já anteriormente levantara, noutro contexto,
questões de constitucionalidade da mesma precisa natureza, mas relativamente às
quais o Tribunal recorrido expressamente acolhera a sua posição.
91. E tem que considerar-se processualmente adequado, para efeitos do disposto
no nº 2 do art. 72° da LTC, tal modo de suscitação das questões de
inconstitucionalidade por, sendo o único ao alcance do Recorrente atento o
circunstancialismo descrito do caso concreto, não lhe ser exigível que o fizesse
de outro.
92. Induzido como estava até então pela própria Conferência do STJ de que tais
questões estavam ultrapassadas a seu contento.
93. O não se entender assim, equivaleria a privar o Reclamante da possibilidade
de ver concretamente fiscalizada a suscitada inconstitucionalidade de normas
aplicadas em decisão do processo. De qualquer forma,
94. O facto de o Reclamante já ter suscitado as mesmas precisas questões de
inconstitucionalidade na Reclamação para a Conferência do STJ que apresentou do
despacho do Relator de 04.04.2003 em termos de o STJ estar obrigado a delas
conhecer, sempre constituiria o modo processualmente adequado para os efeitos do
citado n°2 do art. 72° da LTC.
95. E o ora Reclamante apenas não fez essa referência no seu requerimento de
interposição do recurso, por ter considerado que as concretas interpretação e
aplicação de normas inconstitucionais que fundam o recurso que interpôs apenas
ocorreram no Acórdão de 30.09.2004.
96. Se, no entanto, fosse entendido ao abrigo do nº 2 do art. 75°-A da LTC que o
Reclamante deveria ter feito tal referência no requerimento de interposição do
recurso, sempre deveria o Senhor Conselheiro Relator, nos termos do nº 5 do art.
75°-A da LTC, ter-lhe dirigido o convite de aperfeiçoamento estabelecido naquela
norma.
97. Pelo que, em qualquer caso, a segunda irregularidade apontada na decisão
sumária sob reclamação, não se verificou, e uma eventual omissão de referência
no requerimento de interposição, sempre seria passível de reparação.
Termos em que, contando com o douto suprimento de Vªs. Exas, espera ver atendida
a presente Reclamação, e decidido conhecer do objecto do recurso interposto.
A esta reclamação contrapõe o representante do Ministério Público o seguinte:
O representante do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado da
reclamação deduzida no processo em epígrafe, vem responder-lhe nos termos
seguintes:
1 - A longa e prolixa reclamação, ora apresentada, apenas confirma que o
recorrente não logrou delinear, em termos inteligíveis, uma questão de
inconstitucionalidade normativa, susceptível de constituir objecto idóneo de um
recurso de fiscalização concreta, identificando adequadamente a interpretação
normativa que serviu de base à decisão proferida nos autos pelo Supremo Tribunal
de Justiça.
2 - Na verdade, a nosso ver, a interpretação normativa, acolhida pelo Supremo
Tribunal de Justiça no acórdão impugnado, pode definir-se nos termos seguintes:
transita em julgado o acórdão condenatório, proferido pelo Supremo, no preciso
momento em que o Tribunal Constitucional indefere, nos termos do nº 4 do artigo
77º da Lei do Tribunal Constitucional, a reclamação deduzida pelo não
recebimento de um recurso de constitucionalidade, não obstando a tal trânsito os
incidentes pós-decisórios, de cariz manifestamente dilatório, que o reclamante
deduziu na sequência da prolação do acórdão que julgou a dita reclamação
improcedente e que vieram a originar o uso pelo Tribunal Constitucional de
mecanismo processual previsto no artigo 84°, nº 8, da Lei nº 28/82?
3 - A definição da interpretação normativa efectivamente aplicada, como “ratio
decidendi”, pelo Supremo Tribunal de Justiça não pode, deste modo, prescindir da
qualificação, feita pelo próprio Tribunal Constitucional, dos incidentes
pós-decisórios suscitados como traduzindo um uso anormal do processo,
legitimando a extracção de traslado, nos termos do nº 8 do referido artigo 84°,
conjugado com o artigo 720° do Código de Processo Civil.
4 - Não se trata, pois, de saber, em abstracto, se certa decisão judicial
transita em julgado no momento da sua prolação, sem que se considere a
possibilidade de a parte suscitar ainda pedidos de aclaração, reforma ou
nulidade, mas de determinar, em concreto, se o uso abusivo de tais meios
processuais, judicialmente verificado, contende ainda com o momento do trânsito
em julgado da decisão condenatória.
5 - Ora, ao excluir do elenco de “normas” ou preceitos legais, arrolados de
forma, aliás, confusa, precisamente a que consta daquele nº 8 do artigo 84°, o
recorrente não delineou, como lhe cumpria, a interpretação normativa
efectivamente adoptada pelo acórdão recorrido, como “ratio decidendi”, o que
naturalmente condena liminarmente a admissibilidade do recurso de fiscalização
concreta interposto.
2. Cumpre decidir.
Na decisão sumária em reclamação entendera-se, em suma, que o recorrente não
definira, conforme era seu dever, a norma jurídica cuja conformidade
constitucional pretende questionar no presente recurso, e, além disso, que o
recorrente não suscitara, perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida,
conforme igualmente lhe impõe o artigo 280º n.º 4 da Constituição e o artigo 72º
n.º 2 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC), qualquer questão de
inconstitucionalidade que o habilitasse a propor o presente recurso, razões que
seriam impeditivas do seu conhecimento.
Procurando contrariar tais razões, começa o recorrente por enunciar a norma que
pretende sindicar.
Fá-lo no ponto 4. da reclamação, do seguinte modo:
[...]
4. O ora Recorrente referiu expressamente que a interpretação e aplicação -
explícitas e/ou implícitas - feitas das normas dos art. 670º, 677°, 668° e 669°
do Código de Processo Civil “que permita a atribuição de efeitos preclusivos da
invocação da prescrição à mera prolação da decisão apenas em certo sentido
final, desligada e autonomizada das respectivas eficácia e insusceptibilidade de
alteração associadas por natureza e definição ao conceito de trânsito em
julgado” (SIC), é contrária às concretas normas constitucionais que igualmente
indicou, bem como ao princípio da legalidade - art. 3° da CRP.
[...]
Deduz-se, portanto, que o recorrente visa sindicar uma norma, que extrai dos
artigos 670º, 677°, 668° e 669° do Código de Processo Civil, assim definida:
“que permita a atribuição de efeitos preclusivos da invocação da prescrição à
mera prolação da decisão apenas em certo sentido final, desligada e autonomizada
das respectivas eficácia e insusceptibilidade de alteração associadas por
natureza e definição ao conceito de trânsito em julgado”.
Torna-se, assim, bem patente que o recorrente não elege qualquer questão de
natureza normativa como objecto do seu recurso, circunstância que, só por si, é
impeditiva do seu conhecimento.
Na verdade, aquele enunciado não representa uma norma jurídica, uma regra dotada
de generalidade e abstracção, de cuja aplicação tenha decorrido a decisão tomada
pelo Tribunal recorrido. Com efeito, a realidade que o recorrente pretende assim
enunciar seria, quando muito, um resultado decisório indissoluvelmente ligado às
circunstâncias do caso concreto e aos juízos de adequação jurídica relativos ao
específico julgamento da questão, como são as referências à 'mera prolação' e a
'decisão apenas em certo sentido final', e ao juízo de 'desligada e autonomizada
das respectivas eficácia e insusceptibilidade de alteração associadas por
natureza e definição ao conceito de trânsito em julgado'. Acresce que em lado
algum o acórdão recorrido adopta um tal enunciado para decidir a questão que lhe
foi submetida.
Ora, esta circunstância é efectivamente impeditiva do conhecimento do presente
recurso, uma vez que o Tribunal Constitucional apenas pode sindicar, no âmbito
do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, normas aplicadas
nas decisões recorridas como sua ratio decidendi, e se verifica que o recorrente
não elege qualquer questão de natureza normativa como objecto do seu recurso.
Torna-se, por isso, desnecessário prosseguir a análise da reclamação.
3. Com este fundamento se decide indeferir a reclamação, confirmando
a decisão de não conhecimento do recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a
taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 11 de Julho de 2006
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria Helena Brito
Rui Manuel Moura Ramos