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Processo nº 92/2006.
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra
1. Vem o presente recurso interposto pelo Representante
do Ministério Público junto do 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Vila Nova de
Gaia do despacho proferido em 8 de Novembro de 2005 pelo Juiz daquele Juízo,
despacho esse que – tendo em conta que o sinistrado A. se opôs à remição da
pensão anual e vitalícia por acidente de trabalho que sofreu e que implicou uma
incapacidade permanente para o trabalho de 30%, (pensão essa que, com as
actualizações, estava actualmente fixada em € 1.386,8) – não autorizou tal
remição, para tanto tendo recusado, por violação dos artigos 13º, números 1 e 2,
e 59º, nº 1, alínea f), ambos da Constituição, a aplicação do disposto no artº
33º, nº 1, da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, e no artº 56º, nº 1, alínea a),
do Decreto-Lei nº 143/99, de 30 de Abril, quando interpretados no sentido de
deles resultar a imposição da remição obrigatória de pensões vitalícias
atribuídas por incapacidades parciais permanentes nos casos em que estas excedem
30%, mesmo contra a vontade do beneficiário dessas pensões que, assim, não podem
optar pela recepção da pensão fixada na forma de renda mensal.
2. Notificadas as «partes» para a apresentação de
alegações, rematou a entidade recorrente a por si produzida com as seguintes
«conclusões»: –
“1 – Face à firme corrente jurisprudencial, formada na esteira do decidido no
acórdão nº 56/05, não se conforma com o princípio constitucional da justa
reparação dos danos emergentes de acidentes laborais, estabelecido no artigo
59°, nº 1, alínea f), da Constituição da República Portuguesa o regime que se
traduz em impor ao trabalhador/sinistrado – contra a sua vontade expressa no
processo – a obrigatória remição das pensões vitalícias que – independentemente
do seu montante pecuniário – visam compensar graus elevados – superiores a 30% –
de incapacidade laboral.
2 – Tal entendimento tanto se justifica quanto às pensões fixadas anteriormente
à vigência do Decreto-Lei nº 143/99 (previstas no artigo 74°), como às pensões
decorrentes de acidentes já ocorridos após vigorar este diploma legal, cuja
remição obrigatória está prevista e regulada no artigo 56°.
3 – Não viola o princípio da igualdade, ao contrário do sustentado na decisão
recorrida, a circunstância de – em consequência da remição da pensão – certos
trabalhadores receberem um capital indemnizatório, que passam a administrar
livremente, enquanto os restantes continuam a receber uma indemnização expressa
em pensão ou renda vitalícia, não objecto de remição.
4 – Porém, a norma resultante do artigo 56°, nº 1, alínea a) do Decreto-Lei nº
143/99, conjugada com o artigo 33°, nº 1, da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro,
ao impor, independentemente da vontade do trabalhador, a remição obrigatória
total de pensões atribuídas por incapacidades parciais permanentes superiores a
30%, ofende o princípio constitucional da justa reparação de danos causados por
acidentes laborais.
5 – Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante
da decisão recorrida, em função deste parâmetro constitucional.”
Cumpre decidir.
3. Dispõem os preceitos constantes dos artigos 33º da
Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, e 56º do Decreto-Lei nº 143/99, de 30 de
Abril, cuja recusa de aplicação foi operada no despacho ora impugnado: –
Lei nº 100/97
Artigo 33.º
Remição de pensões
1 – Sem prejuízo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 17.º,
são obrigatoriamente remidas as pensões vitalícias de reduzido montante, nos
termos que vierem a ser regulamentados.
2 – Podem ser parcialmente remidas as pensões vitalícias
correspondentes a incapacidade igual ou superior a 30%, nos termos a
regulamentar, desde que a pensão sobrante seja igual ou superior a 50% do valor
da remuneração mínima mensal garantida mais elevada.
Decreto-Lei nº 143/99
Artigo 56.º
Condições de remição
1 – São obrigatoriamente remidas as pensões anuais:
a) Devidas a sinistrados e a beneficiários legais de pensões vitalícias que não
sejam superiores a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada
à data da fixação da pensão;
b) Devidas a sinistrados, independentemente do valor da pensão anual, por
incapacidade permanente e parcial inferior a 30%.
2 – Podem ser parcialmente remidas, a requerimento dos pensionistas ou das
entidades responsáveis e com autorização do tribunal competente, as pensões
anuais vitalícias correspondentes a incapacidade igual ou superior a 30% ou as
pensões anuais vitalícias de beneficiários em caso de morte, desde que
cumulativamente respeitem os seguintes limites:
a) A pensão sobrante não pode ser inferior a seis vezes a remuneração mínima
mensal garantida mais elevada;
b) O capital de remição não pode ser superior ao que resultaria de uma pensão
calculada com base numa incapacidade de 30%.
O despacho recorrido perfilhou a óptica de harmonia com
a qual, as transcritas disposições, quando comportassem uma interpretação de
onde resultasse a imposição à “vontade do beneficiário, não permitindo a este
optar pela recepção da sua pensão na forma de renda mensal – duodécimos da
pensão anual devida, tal como estabelecem e resulta dos artigos 17, 20, da L.
100/97 de 13/9 e 51 do D.L. 143/99 de 30/4, actualizáveis nos termos do artigo 6
do D.L. 141/99 de 30/4”, violavam o princípio da igualdade (discreteando com
certa abundância sobre este tipo de violação) e o que se consagra no artigo 59º,
nº 1, alínea f), da Lei Fundamental (realçando, neste particular, que o direito
do trabalhador a ser justamente indemnizado em virtude de um infortúnio de
natureza laboral se apresentar, com tal interpretação, como infringido de forma
infundada e desrazoável).
Deverá, desde logo, anotar-se, que, tendo a incapacidade
parcial permanente do trabalhador em causa sido fixada em 30%, o despacho
recorrido só poderá ser entendido (não obstante nele se mencionar, por mais de
uma vez, que em causa estaria uma pensão por incapacidade superior a 30%) como
se reportado a uma pensão cujo valor, à data da atribuição, não era superior a
seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada. E, sendo assim, o
despacho em apreço só é compreensível se, independentemente da percentagem da
incapacidade parcial permanente, o valor da pensão se postasse como não superior
àquele limite e à remição se opusesse o trabalhador beneficiário da pensão.
4. Este Tribunal, relativamente ao preceito sub iudicio,
teve já ocasião de se pronunciar.
Assim, no seu Acórdão nº 379/2002 (publicado na II Série
do Diário da República de 16 de Dezembro de 2002) concluiu no sentido de não
julgar desarmónico com a Lei Fundamental o preceito agora em apreço.
Fê-lo, todavia, “na precisa dimensão que deu lugar” à
recusa de aplicação operada na decisão judicial então impugnada perante o
Tribunal Constitucional, isto é, face a um caso em que o beneficiário da pensão
não era o trabalhador, que tinha falecido e, em consequência, num caso em que se
não haveria de “salvaguardar a liberdade de o beneficiário correr os riscos do
capital e remição”.
Também no seu Acórdão nº 21/2003 (publicado nos aludidos
jornal oficial e Série, de 19 de Abril de 2003), julgou o indicado preceito não
desconforme com a Constituição “quanto a pensões resultantes de acidente dos
quais resultou a morte do trabalhador”.
Por outro lado, no Acórdão nº 60/2003 (indicados jornal
oficial e Série, de 19 de Abril de 2003) também não foi julgado inconstitucional
o preceito ínsito na alínea a) do nº 2 do mesmo artº 56º.. Porém, neste último
aresto foi efectuada uma remissão para a fundamentação do já citado Acórdão nº
379/2002 em que, como se assinala no segundo parágrafo do seu ponto 6., se
postava em causa uma situação de remição de pensão por morte do trabalhador, ou
seja, discutia-se “uma interpretação normativa que impõe, obrigatoriamente, a
remição de pensões por morte dos trabalhadores acidentados, independentemente
das bases técnicas aplicáveis ao cálculo do capital de remição e das tabelas
práticas desses capitais de remição.
Por isso, não obstante o juízo de não
inconstitucionalidade formulado a final nesse Acórdão nº 60/2003 se reportar,
sem mais, à citada alínea a) do nº 2 do artº 56º, haverá que ter em conta que o
sentido normativo (ou seja, a norma alcançada por via de um processo
interpretativo) então em análise se não pode considerar como sendo aquele que
agora se analisa.
Efectivamente, está aqui em causa uma remição de pensão
de pequeno montante, fixada por um acidente de trabalho que consequenciou uma
incapacidade parcial permanente de 30%, remição essa relativamente à qual o
trabalhador, certamente ponderando o que, para si, representava como mais
favorável, se opôs.
É certo que, bem ou mal – e sobre esse juízo os poderes
deste Tribunal não lhe permitem qualquer juízo de sindicação –, o despacho
recorrido julgou aplicável à situação trazida ao seu veredicto, directamente a
norma precipitada na alínea a) do nº 1 do artº 56º do Decreto-Lei nº 143/99, e
não a que consta do regime transitório estabelecido no seu artº 74º. E,
justamente por não ter poderes sindicativos sobre esse particular, impõe-se a
este órgão de justiça saber se a norma inserta naquela primeira disposição, ao
impor obrigatoriamente a remição de pensões de pequeno montante (como serão
aquelas a que a mesma se reporta) – ou seja, no sentido de tal imposição se
operar nas situações em que o trabalhador acidentado se opõe à remição – é
conflituante com a Constituição.
5. Recentemente, o Tribunal Constitucional, no seu
Acórdão nº 34/2006 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) declarou a
inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, por violação da alínea f) do
nº 1 do artigo 59º da Constituição, a norma constante do artº 74º do Decreto-Lei
nº 143/99, quando interpretado no sentido de impor a remição obrigatória total
de pensões vitalícias atribuídas por incapacidades parciais permanentes do
trabalhador/sinistrado, nos casos em que elas excedam 30%.
Sendo evidente que uma tal declaração de
inconstitucionalidade teve por alvo um normativo que não é o aqui em questão
(tratava-se, pois do artº 74º e de incapacidades parciais permanentes superiores
a 30%), o problema que se põe é o de saber – sendo certo que aquele artigo não
deixa de ter como referente o regime estabelecido para a remição de pensões
prescrito no artº 56º – se o fundamental da argumentação que conduziu a essa
declaração poderá cobrar plena aplicação na análise da norma que agora se
aprecia, e numa hipótese em que a incapacidade parcial permanente foi fixada em
30%, a pensão é de reduzido montante (recte, não é superior a seis vezes a
remuneração mínima mensal garantida mais elevada à data da sua fixação) e o
trabalhador manifestou oposição à remição.
Neste particular, não se vá sem dizer que, não obstante
o que se surpreende na alegação produzida pelo Ex.mo Representante do Ministério
Público em funções junto deste Tribunal, a verdade é que o caso de onde emergiu
a presente recurso não se reporta a uma situação em que a incapacidade parcial
permanente do sinistrado foi fixada em medida superior a 30% (40%, como se
refere naquela alegação) mas, sim em, exactamente, 30%.
5.1. Da jurisprudência tirada pelo Tribunal
Constitucional em matéria de apreciação da conformidade ou desconformidade com a
Constituição relativamente à remição de pensões devidas por infortúnios laborais
retira-se que tem, numa primeira linha, sido dado relevo à tutela da autonomia
da vontade do trabalhador vítima de acidente laboral ou de doença profissional
que lhe impôs uma diminuição acentuada da sua capacidade para o trabalho, pois
somente ele poderá ponderar se é do seu interesse continuar a perceber
determinado quantitativo vitalício representativo daquela pensão ou se, pelo
contrário, a perda da sua capacidade de ganho pode ser compensada com um capital
ou um eventual rendimento do capital decorrente da remição. E isto desde que a
pensão que tenha sido atribuída seja representativa do asseguramento de um
rendimento susceptível de garantir uma existência minimamente condigna.
Outrotanto, e ainda segundo aquela jurisprudência, não
sucede se em causa se colocarem situações de acidentes de trabalho ou doenças
profissionais que não demandaram acentuada perda de capacidade de trabalho.
É que, em tais situações, o lesado pode ainda
desempenhar o seu labor e a compensação pelo infortúnio que sofreu – ponderando
os consabidamente diminutos montantes das pensões atribuídas nesses casos, a
natural degradação valorativa da moeda e a sempre tendencial elevação dos custos
– facilmente poderá, ao ser a pensão vitalícia «transformada», pela remição num
dado capital, ser considerável como uma «justa reparação» ancorada no direito
que é conferido pela alínea f) do nº 1 do artigo 59º da Constituição.
Neste ponto, tem cabimento a citação do que se escreveu
no Acórdão deste Tribunal nº 302/99 (in Diário da República, II Série, de 16 de
Julho de 1999), quando aí se considerou que a consagração da remição
impositivamente decretada tem a ver com a circunstância de a perda da capacidade
de trabalho não ter sido “por demais acentuada, o que o mesmo é dizer que o
acidente de trabalho não implicou a futura continuação do desempenho do labor
por parte do trabalhador”, permitindo que “a compensação correspondente à pensão
que lhe foi fixada – e sabido que é que, de uma banda, o montante das pensões é
de pouco relevo e, de outra, que o quantitativo fixado se degrada com o passar
do tempo – possa ser ‘transformada’ em capital, a fim de ser aplicada em
finalidades económicas porventura mais úteis e rentáveis que a mera percepção de
uma ‘renda’ anual cujo quantitativo não pode permitir a subsistência condigna a
quem quer que seja”.
E, por isso, se escreveu no Acórdão nº 468/02,
(publicado no indicado jornal oficial, II Série, de 4 de Janeiro de 2003), que
nas situações de acidentes de trabalho e doenças profissionais que implicaram
uma incapacidade permanente para o trabalho inferior a 30%, o que se prescreve
no acima transcrito artº 33º da Lei nº 100/97 traduz uma forma como o legislador
desejou que, “atentas as circunstâncias, se efectivasse o direito dos
trabalhadores a serem justamente reparados do infortúnio laboral que sofreram, o
que significa que veio consagrar um direito que, na sua óptica, para as ditas
circunstâncias, concretizava a justa reparação” a que alude a alínea f), do nº 1
do artigo 59º da Lei Fundamental.
Daí que se tenha entendido – considerando que,
teleologicamente, a imposição da remição das pensões nessas circunstâncias, se
justifica com base no raciocínio segundo o qual a privação de futuras e
eventuais actualizações dos respectivos quantitativos (que, como é facto notório
incarecido de demonstração, a experiência revela serem de mui pequena monta) – a
remição obrigatoriamente imposta ainda se inclui (como «contrapartida» da perda
da capacidade de trabalho e, logo, de ganho do trabalhador) no conceito de
«justa reparação».
Também o Tribunal Constitucional tem trilhado a senda
de, como «excepção» ao relevo da tutela da autonomia da vontade do trabalhador,
a par das situações de menos acentuada incapacidade permanente para o trabalho,
ter como não conflituante com a Lei Fundamental, os casos em que,
independentemente dessa incapacidade, o montante da pensão é de tal sorte
diminuto que não pode ser tido como apto para, de um modo mínimo, assegurar uma
condigna subsistência do lesado.
Porém, quanto a este último particular, como já se
disse, colocavam-se situações em que o trabalhador era já falecido e, por
conseguinte, nem sequer era equacionável a ponderação da sua vontade.
6. Como se viu, a situação sub iudicio cura da pretensão
de remição de uma pensão atribuída por um acidente de trabalho do qual resultou
para o trabalhador uma incapacidade permanente para o trabalho de 30%.
Neste conspecto, a corte argumentativa que conduziu à
declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral vertida no
Acórdão nº 34/2006, poderia não ser globalmente transponível para o caso em
apreço, já que se não trata de uma incapacidade parcial permanente superior a
30%.
Ainda assim, mesmo nesta perspectiva, não se vá sem
dizer que o raciocínio que formou o «fio condutor» daquele aresto foi o de,
porque a pensão, nas situações de “acidentes de trabalho ou doenças
profissionais cuja gravidade seja de tal sorte que vá acentuadamente diminuir a
capacidade laboral do trabalhador e, reflexamente, a possibilidade de auferir um
salário condigno com ao menos, a sua digna subsistência” [constituindo, pois, a
pensão um “complemento à parca (e por vezes nula) remuneração que aufere em
consequência da reduzida capacidade de trabalho”) e porque “a aplicação de um
capital – ainda que no momento em que essa intenção é formulada se apresente
como um investimento adequado, porquanto proporcionador de um rendimento mais
satisfatório do que o correspondente à percepção da pensão anual – é sempre
alguma coisa que, em virtude de ser aleatória, comporta riscos”, haveria que se
atender, por forma a ser respeitado direito consagrado na alínea f) do nº 1 do
artigo 59º da Constituição, à vontade expressa pelo trabalhador e não a uma
“imposição do risco do capital a receber”, a qual “limitaria o direito dos
trabalhadores a uma justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou
doença profissional”.
Ora, reportando-se a situação em espécie a um acidente
de trabalho de que resultou uma incapacidade parcial permanente de 30%, não se
poderá desconsiderar a circunstância de a lei ordinária, como deflui das
disposições combinadas dos artigos 33º da Lei nº 100/97 e 56º, nº 1, alínea b),
do Decreto-Lei nº 143/99, entender que as incapacidade parciais permanentes não
muito acentuadas são aquelas que se situam numa percentagem inferior a 30%.
E, nesse contexto, poder-se-ia enveredar por um
raciocínio semelhante ao que foi prosseguido no Acórdão 34/2006.
6.1. No entanto, como acima se viu, o despacho ora
impugnada só pode ser entendido como tendo considerado a situação que tinha que
decidir como se ela se reportasse a um acidente de trabalho ocorrido já na
vigência daqueles diplomas (e não a pensão fixada no domínio de lei anterior,
caso em que cobrava aplicação a norma do artº 74º do Decreto-Lei nº 143/99) e
estando em questão uma pensão cujo valor, à data da atribuição, não era superior
a seis vezes a remuneração mínima mensal garantida mais elevada, opondo-se o
trabalhador à remição.
De onde dever concluir-se que, para o caso em
apreciação, em que se depara uma oposição do trabalhador, não servirá a
jurisprudência deste Tribunal tirada a propósito da não insolvência
constitucional das dimensões normativas reportadas à alínea a) do nº 1 do artº
56º do Decreto-Lei nº 143/99 (cfr. Acórdãos acima citados).
Assim sendo, o problema que cumpre equacionar não se
coloca tanto ao nível de uma confrontação com o princípio da igualdade (cujo
parâmetro foi o utilizado nos citados acórdãos), mas sim, mais acentuadamente,
com o direito à justa reparação consagrado na alínea f) do nº 1 do artigo 59º do
Diploma Básico.
Vale isto por dizer que a pergunta cabida para a solução
da questão é a de saber se ofende aquele normativo a remição imposta pela alínea
a) do nº 1 do artº 56º do Decreto-Lei nº 143/99, se em causa estiver uma pensão
de valor não superior a seis vezes a remuneração mínima mensal mais elevada à
data da sua fixação, atribuída por um acidente de trabalho ou doença
profissional que acarretou uma incapacidade parcial permanente não inferior a
30%, opondo-se a tanto o trabalhador.
Ora, estando em causa um direito constitucionalmente
conferido aos trabalhadores, e porque se não trata de um infortúnio laboral de
que redundou uma perda de capacidade laboral inferior a 30%, não obstante o
montante da pensão (tido por reduzido pelo legislador ordinário), entende-se,
com a entidade recorrente, que a dimensão normativa daquele preceito que agora
se analisa, ao não devolver ao trabalhador “a sua livre opção sobre o modo como
pretende ser ressarcido” das consequências da incapacidade que o afecta (que o
próprio legislador ordinário considera não serem de pequena monta, justamente
por não ser inferior a 30%) deixa de privilegiar “em última análise, o valor
‘autonomia’ da vontade que, em regra, deverá funcionar como parâmetro
fundamental nesta sede”.
E, assim sendo, são, para a situação em presença,
transponíveis, quanto ao ponto conexionado com a relevância da autonomia da
vontade do trabalhador, as considerações que têm sido utilizadas pela
jurisprudência deste Tribunal para alcançar juízos de inconstitucionalidade
quanto à remição de pensões e a que acima se aludiu.
7. Em face do exposto, decide-se: –
a) Julgar inconstitucional, por violação do disposto na
alínea f) do nº 1 do artigo 59º da Constituição, o conjunto normativo constante
do nº 1 do artº 33º da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, e da alínea a) do nº 1
do artº 56º do Decreto-Lei nº 143/99, de 30 de Abril, quando interpretados no
sentido de imporem, independentemente da vontade do trabalhador, a remição total
de pensões cujo montante não seja superior a seis vezes a remuneração mínima
mensal garantida mais elevada à data da sua fixação, atribuídas em consequência
de acidentes de trabalho de que resultou uma incapacidade parcial permanente de
30% e ocorridos anteriormente à data da entrada em vigor daquela Lei;
b) Consequentemente, negar provimento ao recurso.
Lisboa, 4 de Maio de 2006
Bravo Serra
Gil Galvão
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Artur Maurício